Uma viagem fantástica

Todos dizem – e, por isso, não devo duvidar – que eu deveria ser mais simpático nas minhas relações. Há quem diga que a minha maneira ermitão de ser me apresenta arrogante aos olhos dos desavisados. 

Diante dessa avaliação que fazem de mim eu peço apenas um pouco de tolerância. Acho que não sou exageradamente assim. Tudo depende do lugar em que me encontra e das pessoas com as quais convivo.

Vou narrar um fato que, decerto, demonstrará que sou vítima de uma análise exacerbada da minha maneira de ser, muito embora admita que não sou mesmo muito simpático.

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A necessidade de ser e parecer correto

Sou dos tais que, sem temer parecer pretensioso, faz apologia da retidão. Não sei ser irresoluto quando o assunto é correção profissional. Quem convive comigo sabe que só sei reto. Erro aqui e acolá, peço outras vezes, saio da linha, porque isso é próprio da condição de ser humano. Contudo, sem demora, retomo o curso, procuro redefinir meus conceitos, para voltar ao caminho da retitude. Reconheço que nos dias de hoje ser correto e ter bom caráter parece um pecado, sobretudo em uma corporação. O que, outrora, era apanágio de qualquer homem de bem, nos dias de hoje, imperando a esperteza, é, às vezes, um pecado. Por ser – e parecer – correto é que, não raro, o detentor de tal predicado é visto como um perigo a ser evitado, um estropício a ser defenestrado. É arrogante e prepotente. Por ser – e parecer – correto tenho enfrentado, não raro, a ira dos que não suportam a inteireza e odeiam a probidade. Hodiernamente, ser reto, incitar e estimular a franqueza e a lealdade no trato com o semelhante, no desempenho do seu mister, passou a ser um equívoco.

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A clientela do direito penal e o princípio da isonomia

É do conhecimento de quem milita na área criminal – Delegados, Promotores, Juizes, Agentes de Polícia, Policial Militar, etc – que o sistema penal seleciona os setores que deva alcançar. O Direito Penal, com efeito, fez uma flagrante e discriminatória opção pelos pobres, a quem se destina, prioritariamente, a persecução criminal, conquanto a lei penal, em tese, tenha como destinatários todos os súditos, desde que não sejam inimputáveis. A lei penal, ensina a melhor doutrina, “ se destina a todas as pessoas que vivem sob a jurisdição do estado brasileiro, estejam no território nacional ou estrangeiro” 1, mas, na prática, alcança somente os desvalidos, os desprotegidos, os pobres.A norma penal tem valor absoluto e se dirige a todos, o que não significa, reafirmo, que a todos alcance. Esse aspecto, é de relevo que se diga, refoge, muitas vezes, do âmbito de atribuição de um magistrado. Ao magistrado – aquele que só tem compromisso com a sua consciência – se impõe o dever de aplicar a sanção penal ao infrator, indistintamente, seja ele pobre ou rico e ainda que se argumente que esse ou aquele criminoso do colarinho branco permaneça impune, malgrado contumaz agressor da ordem pública.

 

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É preciso ter esperança e fé

Estou retornando, hoje, agora, às minhas reflexões.

Nesse artigo vou refletir sobre a vida em sociedade e sobre o homem, a partir do exemplo de São Francisco de Assis.

Pois bem.

O que o ser humano faz de bom ao semelhante, a sua boa conduta, o seu apreço e respeito à família, tudo o mais que possa fazer em benefício da convivência pacífica numa sociedade, não precisa ser divulgado; deve apenas ser feito. É que ser bom, honesto, solidário, dentre outros predicados, é dever de todos nós. Sendo uma obrigação, não precisa ser destacado – nem divulgado.

Nos dias presentes, apesar das boas ações, a impressão que temos, em face de determinadas condutas de nossos iguais, é que estamos todos perdidos, sem rumo e sem prumo.

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Os livros e as férias

Há alguns dias não tenho alimentado o meu blog. É que estou de férias até o final deste mês e estive viajando.

Aproveitei esse período, como sempre faço, para ler e reler alguns livros. Estou relendo, por exemplo, depois de 13(treze) anos, a biografia de Assis Chateaubriand. Depois, farei algumas reflexões a propósito da monumental obra de Fernando de Morais.

Antes, tive a oportunidade ler o Código de Vida, de Saulo Ramos. Apesar do desfile de vaidades e arrogâncias, é um livro que deve ser lido, sobretudo pelos magistrados.

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Um magistrado tirânico

Tenho dito e redito, afirmado e reafirmado, que o Poder é para ser exercido com moderação e, sobretudo, equilíbrio. O Poder, ademais, é para ser exercido de acordo com o ordenamento jurídico, de conformidade, enfim com a Constituição e normas infraconstitucionais. Nessa perspectiva, repudio, com veemência, o tratamento descortês e arrogante que se tem dispensado aos acusados nos processos-crime, sobretudo porque egressos das classes menos favorecidas.  

Acerca dessa questão já tive a oportunidade de refletir neste blogue. Disse e reafirmo, agora, que tratar o réu com rispidez, humilhá-lo, dar murro na mesa, colocá-lo, enfim, em situação de total desconforto psicológico, não é papel de magistrado. Continue lendo “Um magistrado tirânico”

As corporações e os chalaças

O mais célebre – ou, pelo menos, o mais fiel – dentre os validos de D. Pedro I foi, sem dúvidas, Francisco Gomes da Silva, alcunhado “Chalaça”. “Chalaça” estava sempre disposto a servir ao amo, em todos os momentos, em todas as circunstâncias, pouco importando os escrúpulos, os meios ou os fins – e foi assim que ascendeu enquanto agente estatal.    

Francisco Gomes da Silva, com efeito, de simples criado particular do Paço, foi sucessivamente promovido pelo Imperador a ajudante de guarda de honra e, depois, a secretário particular, passando daí a ter excepcional influência no governo.

A influência de “Chalaça” era tamanha que os brasileiros e portugueses, se queriam algo do governo, tinham de cortejá-lo.

“Chalaça”, além de valido, era, demais, um emérito gozador. Bem-humorado, sob quaisquer circunstâncias, conquistou D. Pedro I, também em face desse talento, daí o apelido “Chalaça”, que quer dizer espirituoso, zombeteiro, gozador.

Por razões óbvias, o termo “Chalaça” será usado neste artigo como sinônimo de puxa-saco e não de espirituoso, zombeteiro, como antes mencionado.

 

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As mentiras que eles contam

Joe Navarro é agente do FBI e é especialista em mentira. Nos últimos anos, segundo a revista Veja, edição 2040, de 26 de dezembro de 2007, ele rastreou 100 sinais típicos dos mentirosos. 

Indagado por Veja se era capaz de flagrar qualquer pessoa na mentira, ele respondeu que, infelizmente, 10% dos mentirosos passam incólumes por qualquer detector de mentiras. Ele acrescentou que essas pessoas se destacam das demais pela rara habilidade que têm de mentir, ou seja, de camuflar os sinais típicos da mentira.

Em outro excerto da entrevista, Navarro afirmou que os brasileiros mentem mal, pois abusam das expressões e gestos, facilitando, assim, a percepção da afirmação mendaz.

Vou refletir acerca desse tema, a partir da minha experiência profissional, para demonstrar que os acusados mentem, não exclusivamente pelo extinto de defesa, não porque abusam das expressões e gestos, mas por falta de orientação profissional e por suporem que são muito espertos.

Com os episódios vivenciados, flagrados por mim, vou demonstrar, ademais, que, muitas vezes, não precisa ser um especialista, para flagrar uma mentira.

À medida que for recordando os episódios por mim vivenciados como magistrado, vou narrá-los nesse blog, porque são episódios interessantes exemplares e pedagógicos, sobretudo aos novos advogados.

Pois bem. Com quase trinta anos de atividades profissionais – como advogado, promotor e juiz de direito – já me deparei, claro, com incontáveis mentiras de acusados. A maioria dos mentirosos, no entanto, é flagrada por mim, muitas por pura inabilidade deles próprios e/ou de quem os orienta para mentira.

A mentira bem articulada passa, muitas vezes, à ilharga das nossas percepções. Eu já fui ludibriado incontáveis vezes, mas tive o prazer(?) de outras tantas vezes flagrar o réu e/ou a testemunha mendaz(es).

O episódio que vou narrar a seguir é cômico, não fosse trágico para defesa do acusado.

 

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