Dia-a-dia de um magistrado

CAPITULO IX
No dia de ontem lancei despacho em face de um pedido de LIBERDADE PROVISÓRIA. O inusitado, em face do pedido em comento, foi a manifestação do MINISTÉRIO PÚBLICO, ao postular a DECRETAÇÃO DA PRISÃO PREVENTIVA do acusado, já estando ele preso PROVISORIAMENTE, ou seja, já estando preso em flagrante. Esse tipo de pedido tem se repetido com freqüência e, com a mesma freqüência, tem me causado espanto.
Leia, abaixo, o teor do despacho, lançado, com simplicidade, mesmo porque a questão , de tão elementar, não reclama maiores indagações.
Processo nº 48312006
Ação Penal Pública
Acusado: F.A. S. L.
Vítima: Fausto Turin
Vistos, etc.

Cuida-se de ação penal deflagrada pelo MINISTÉRIO PÚBLICO contra F A. S. L. e outros por incidência comportamental no artigo 155, caput, do CP.

Em autos apartados, o procurador do acusado postula a LIBERDADE PROVISÓRIA do acusado acima nominado, mediante fiança.
O MINISTÉRIO PÚBLICO opinou pelo indeferimento da LIBERDADE PROVISÓRIA e pela DEECRETAÇÃO da PRISÃO PREVENTIVA do acusado.
Vieram-me os autos conclusos para deliberar.
Devo, antes de expender considerações acerca do pleito do procurador do acusado, anotar que a mim de me tem causado estranheza o pedido de DECRETAÇÃO de PRISÃO PREVENTIVA por diversos representantes ministeriais, estando o acusado PRESO em FLAGRANTE.
A mim me causa estupefação esse tipo de pleito, tendo em vista que a PRISÃO em FLAGRANTE é uma espécie do gênero PRISÃO PROVISÓRIA, como o é a PRISÃO PREVENTIVA e outras – a PRISÃO decorrente de PRONÚNCIA, a PRISÃO TEMPORÁRIA, verbi gratia.
Convenhamos, se o acusado já está preso provisoriamente, como, sem causar estupor, mais uma vez DECRETAR uma PRISÃO, sobrepondo uma PROVISÓRIA (preventiva) dobre outra PROVISÓRIA (em flagrante).
Poder-se-ia, sim, agitar a possibilidade de uma PRISAO PREVENTIVA, espécie do gênero PRISÃO PROVISÓRIA, se a prisão em flagrante se apresentasse ao arrepio da lei. Não é o caso, entrementes, posto a prisão em flagrante não foi questionada – nem pelo magistrado que a homologou, nem pelo postulante do pleito sob retina, nem pela representante do MINISTÉRIO PÚBLICO que postula a PRISÃO PREVENTIVA do acusado.
É o próprio CPP, devo dizer, que estabelece que não se concede fiança – pleito decorrente, claro, da prisão em flagrante -, se presentes os pressupostos da PRISÃO PREVENTIVA. O mesmo CPP prescreve, ademais, que o juiz concederá ao acusado, PRESO EM FLAGRANTE, a sua LIBERDADE PROVISÓRIA, se não vislumbrar razões para mantença de sua prisão – id. est., desde que não assomem as razões a legitimar a mantença da PRISÃO PROVISÓRIA já aperfeiçoada em face do estado de flagrância.
Do exposto resulta a constatação de que o caminho, ante a periculosidade do acusado preso em flagrante, não é a DECRETAÇÃO DE SUA PRISÃO PREVENTIVA, como postula a representane ministerial, pois que preso provisoriamente já está. O que deve decorrer da perigosodidade do acusado é não ter deferido o pedido de LIBERDADE PROVISÓRIA – com ou sem FIANÇA; nunca, entrementes, a DECRETAÇÃO DE SUA PRISAO PREVENTIVA, porque, nessa hipótese, seria trocar seis por meia dúzia. Seria soprepor uma PRISÃO PROVISÓRIA sobre outra PRISÃO PROVISÓRIA.. Seria admitir que a PRISÃO EM FLAGRANTE não tem eficácia, que o acusado só permaneceria preso se fosse substituída a PRISÃO EM FLAGRANTE por um DECRETO DE PRISÃO PREVENTIVA.
Com essas notas introdutórias, passo, a seguir, estupefato com o pleito ministerial, ao exame do pleito formulado pelo procurador do acusado, ou seja, a sua LIBERDADE PROVISÓRIA, com fiança.
Examinei o pleito sob retina, para, sem muito esforço, concluir que o acusado, respondendo a processo em várias varas desta Comarca, não faz por merecer a sua LIBERDADE PROVISÓRIA, mediante fiança, pois que a sua LIBERDADE colocará em risco a ORDEM PÚBLICA, mesma ORDEM PÚBLICA que, ao que tudo está a indicar, já vilipendiou outras vezes.
A folha penal do acusado, acostada aos autos em comento, dispensa maiores considerações.
Ademais porque consta do banco de dados desta Comarca que o acusado foi, inclusive, condenado na 4ª Vara Criminal, além de responder a outro processo-crime nesta mesma 7ª Vara Criminal.
Com as considerações supra e sem mais delongas, indefero o pleito sub examine, para, de conseqüência, determinar que o acusado, preso, aguarde o seu processamento.
Oficie-se à 4ª Vara Criminal, dando notícia da prisão do acusado, para os devidos fins.
São Luís, 29 de maio de 2006.

Juiz Jose Luiz Oliveira de Almeida
Titular da 7ª Vara Criminal

Artigo 324, IV, do CPP.
Artigo 310, parágrafo único, do CPP


Autor: Jose Luiz Oliveira de Almeida

José Luiz Oliveira de Almeida é membro do Tribunal de Justiça do Estado do Maranhão. Foi promotor de justiça, advogado, professor de Direito Penal e Direito Processual Penal da Escola da Magistratura do Estado do Maranhão (ESMAM) e da Universidade Federal do Maranhão (UFMA).

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