STJ decide

São válidas audiências simultâneas em locais distintos quando não há prejuízo para a defesa

A Quinta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) manteve a validade de audiências para oitiva de testemunhas marcadas para o mesmo dia e horário, mas em comarcas distintas. Por maioria de votos, os ministros entenderam que não houve prejuízo para a defesa e, por isso, negaram o pedido – feito em habeas corpus – para que uma das audiências fosse declarada nula.

O ministro Napoleão Nunes Maia Filho, relator do caso, afirmou que o processo penal deve ser conduzido de forma a garantir o mais amplo direito de defesa. Contudo, ele defende que o processo não pode ser usado como mero artifício ou manobra de defesa para impedir a atuação jurisdicional.

A decisão ocorreu no julgamento de habeas corpus impetrado pela defesa de um homem denunciado por latrocínio. Segundo o processo, em novembro de 2007, ele teria assassinado outro homem na zona rural de Itambé (PE), após roubar da vítima R$ 60 mil em espécie, dinheiro da venda de imóvel celebrada com o próprio acusado.

Duas audiências para depoimento de testemunhas foram marcadas para 8 de fevereiro de 2010, às 14h30. Porém, uma era em João Pessoa (PB) e a outra na comarca de Ferreiros (PE). O único advogado do acusado alegou cerceamento de defesa, argumentando que só ele era capaz de avaliar o prejuízo sofrido pelo seu cliente.

O relator afirmou que as audiências deveriam ter sido marcadas em dias diferentes para permitir o comparecimento do advogado. “Ocorre que, no caso, o ato já foi praticado e, nesse contexto, é indispensável verificar se a sua realização, como foi, causou efetivo prejuízo ao réu”, ponderou.

O ministro verificou no processo que, na audiência realizada sem a participação do advogado de defesa, a testemunha não prestou nenhuma informação sobre a autoria do crime. Ela não conhecia a vítima nem o acusado, e foi ouvida apenas por ter encontrado o corpo.

O relator aplicou o artigo 563 do Código de Processo Penal, que determina que não deve ser declarada nulidade de ato processual quando não resultar prejuízo comprovado para a parte que a alega. Já a Súmula 523 do Supremo Tribunal Federal estabelece que, no processo penal, a falta da defesa constitui nulidade absoluta, mas que o ato só será anulado se houver prova de prejuízo para o réu.

O caso tinha algumas particularidades que também foram consideradas. O advogado do acusado foi informado sobre as datas e horários das audiências com três dias de antecedência, tempo considerado suficiente para requerer adiamento, o que não foi feito.

Além disso, devido ao expediente da comarca de Ferreiros ser pela manhã, a segunda audiência acabou sendo realizada no dia seguinte, às 9h30. Os magistrados consideraram que as cidades são próximas, de forma que o advogado poderia ter comparecido às duas audiências.

Concurso público

O Tribunal Regional Federal da 3ª Região abrirá inscrições para o XVI Concurso Público para Provimento de Cargos de Juiz Federal Substituto, no âmbito de sua jurisdição, que compreende os estados de São Paulo e Mato Grosso do Sul. O Edital de Abertura foi publicado nesta terça-feira (26/7) no Diário Eletrônico da Justiça Federal da 3ª Região, no caderno de publicações administrativas.

Os candidatos interessados concorrerão a 19 vagas existentes, havendo reserva de 5% do total de vagas aos candidatos deficientes. Antes de efetuar a inscrição preliminar, o candidato deverá conhecer o edital e certificar-se de que preenche todos os requisitos exigidos. No momento da inscrição preliminar, o candidato deverá optar pela cidade onde deseja realizar as provas. Uma vez efetivado o pedido de inscrição, não será permitida, em hipótese alguma, a sua alteração.

Será admitido o pedido de inscrição preliminar somente via internet, solicitada no período entre 10h do dia 1º de agosto de 2011 e 23h59 do dia 30 de agosto de 2011, observado o horário oficial de Brasília (DF). A inscrição preliminar deferida habilita o candidato à prestação da prova objetiva seletiva.

Jose Antonio Dias Toffoli

Toffoli na ilha de Capri: dúvidas que persistem

Eram previsíveis as reações à notícia de que o ministro José Antônio Dias Toffoli, do STF, faltou a um julgamento para ir ao casamento do advogado Roberto Podval na ilha de Capri, na Itália, sem esclarecer quem pagou as despesas, segundo a Folha revelou na última sexta-feira.

O site “Migalhas”, patrocinado por escritórios de advocacia, considerou a reportagem leviana, fruto da estiagem de notícias no recesso do Judiciário.

“Falando com o conhecimento de causa de quem esteve presente”, afirmou o editor do site, “os noivos ofereceram a todos os convidados, indistintamente, duas diárias no hotel onde se realizou a cerimônia, fato que parece lógico porque, não fosse assim, praticamente não seria possível ir ao casamento, uma vez que a referida ilha tem seus alberghi lotados meses antes do verão chegar ao Velho Continente”.

“Mesmo que a meritíssima presença fosse por conta do afamado criminalista, é normal que magistrados tenham relação de amizade com advogados, com promotores, com defensores, com procuradores e com todos aqueles que labutam no meio jurídico”, opinou o editor do “Migalhas”.

Sob o título “Juízes repelem suspeição invocada por jornal”, o site “Consultor Jurídico” informou que processualistas, criminalistas e dirigentes de entidades de classe rechaçaram a tese do jornal de que a presença de Toffoli na festa teria provocado situação de impedimento judicial.

“As hipóteses de suspeição previstas em lei referem-se apenas à relação de amizade íntima ou inimizade capital entre o magistrado e a parte [autor ou réu da ação], jamais em relação ao advogado”, esclareceu o presidente da Associação dos Juízes Federais (Ajufe), Gabriel Wedy.

O presidente da Associação dos Magistrados Brasileiros, Nelson Calandra, não viu interesse público na notícia, segundo o “Conjur”. Para Calandra, a “notícia só serviu para lançar suspeita sobre episódio em que nada há de errado”.

Para o criminalista Arnaldo Malheiros Filho, também ouvido pelo “Conjur”, a visão de que o juiz deve ser um recluso é irreal e ingênua. O presidente da Associação Paulista dos Magistrados (Apamagis), Paulo Dimas De Bellis Mascaretti, afirmou ao site que “a Justiça não seria melhor se os juízes fossem encastelados e isolados como jurados em véspera de julgamento”.

Wedy e Calandra também foram ouvidos, no dia seguinte, pela Folha.

Em editorial, o jornal sustentou que o episódio é “uma ilustração constrangedora da promiscuidade entre interesses públicos e privados que dá o tom da vida republicana no Brasil”.

O Blog entende que a questão é, sim, de interesse público. Desde que paguem integralmente as suas despesas, magistrados podem ir a casamentos de amigos na ilha de Capri, na ilha de Comandatuba ou nas ilhas Aleutas.

Magistrados não vivem enclausurados, mas os mais cuidadosos, em respeito à instituição e ao interesse público, só recebem advogados com as portas abertas ou na presença de assessores, o que foi admitido por vários juízes numa das primeiras enquetes publicadas por este Blog.

Não surpreende também a reação de advogados quando ministros do STF são questionados sobre os limites entre o público e o privado. Lá atrás, quando o Ministério Público Federal levantou suspeitas sobre negócios entre órgãos públicos e o instituto privado de ensino do qual Gilmar Mendes é sócio, advogados renomados revezaram-se para defender o ministro.

A própria Ajufe, na gestão anterior, não viu impropriedade em pedir dinheiro à Caixa Econômica Federal, um banco oficial, para bancar parte das despesas no jantar que a associação –uma entidade privada– organizou em homenagem à Toffoli por sua posse no Supremo.

Aparentemente, há pontos importantes ainda não esclarecidos pelo ministro sobre a viagem a Capri.

No dia 28 de junho, o jornalista Lauro Jardim, da “Veja”, informou, em sua coluna: “Toffoli aproveita a viagem particular à Europa para se reunir com autoridades do governo alemão envolvidos em uma recente reforma eleitoral no país. Toffoli, que é presidente da Comissão de Reforma Eleitoral do Senado, apresentará em agosto um texto com sugestões de mudança dos sistemas político e eleitoral brasileiro”.

A informação admite as seguintes dúvidas: Qual o motivo alegado pelo ministro ao STF para faltar à sessão de julgamento? Ao comparecer ao casamento do amigo, estava em viagem particular ou esticando eventual missão oficial?

Segundo o jornal “O Estado de S. Paulo”, “o ministro estava na ocasião ‘ausente justificadamente’”. “A assessoria de Toffoli disse que ele comunicou a ausência num ofício encaminhado ao presidente do Supremo, Cezar Peluso”. A assessoria também confirmou ao jornal paulista que o ministro “saiu antecipadamente de férias e prestigiou o enlace ocorrido em 21 de junho‘.

Finalmente, ainda no mesmo jornal: “Toffoli informou por meio de sua assessoria que pagou pelos deslocamentos aéreos. Mas não disse se arcou com as despesas hoteleiras”.

É do interesse público que essas questões sejam esclarecidas. E deveria ser do interesse do ministro que as dúvidas fossem eliminadas por ele mesmo, para não permitir que outros, por bajulação ou para ficar bem na foto, se antecipem ao que deveria ser sua obrigação.

Do Blog do Frederico Vasconcelos

Escrito por Fred às 07h15

Capturada no blog do Itevaldo

AMMA DESISTE DE PROCESSO NO CNJ CONTRA A CORREGEDORIA

A Associação dos Magistrados do Maranhão (Amma) requereu ao Conselho Nacional de Justiça (CNJ) ontem (dia 25) a desistência do Procedimento de Controle Administrativo (PCA), no qual questionava ato da Corregedoria Geral da Justiça para que os juízes de Direito comprovassem residir nas comarcas de trabalho e também informassem as audiências que realizam às segundas e sextas-feiras.

A entidade deu entrada no procedimento na semana passada, através do seu presidente, juiz José Brígido da Silva Lages (foto). O processo tem o nº 0003910-79.2011.2.00.0000. (leia aqui)

No PCA ao CNJ a associação requereu, ainda, que a “Corregedoria Geral da Justiça se abstenha de efetuar gastos desnecessários com visitas inoperosas às comarcas, descaracterizadas do império legal da correição, para averiguar o que já está devidamente comprovado, ou seja, que os juízes realmente se encontram residindo nas suas respectivas comarcas“.

Segundo a direção da entidade “não se pode permitir que a Corregedoria viole, de forma drástica e inconseqüente, a autonomia dos magistrados no gerenciamento de suas unidades, com atitudes incontestavelmente invasivas e ilegais“.

O que levou a Amma a tão rápida desistência?

Violência doméstica

PRIMEIRA CÂMARA CRIMINAL

Sessão do dia 07 de junho de 2011.

Nº Único 0011134-78.2008.8.10.0005

Apelação Criminal Nº 003234/2011 – São Luís

Apelante : A. H.de S.S.
Advogado : A. G. de S. F.
Apelado : Ministério Público Estadual
Incidência Penal : Art. 129, § 9º, do CPB
Relator : Desembargador José Luiz Oliveira de Almeida

Acórdão Nº 102666/2011


Ementa. PROCESSUAL PENAL. LESÃO CORPORAL. INCOMPETÊNCIA DO JUÍZO. INOCORRÊNCIA. VIOLÊNCIA DOMÉSTICA EVIDENCIADA. ARGUIÇÃO DE NULIDADE. CERCEAMENTO DE DEFESA. NÃO CONSTATAÇÃO. AUSÊNCIA DE EFETIVO PREJUÍZO. ABSOLVIÇÃO. INVIABILIDADE. CONJUNTO PROBATÓRIO HARMÔNICO E COERENTE ACERCA DA AUTORIA E DA MATERIALIDADE DO CRIME DE LESÃO CORPORAL NO ÂMBITO FAMILIAR. IMPROVIMENTO DO APELO.

1. Inobstante a inexistência de coabitação entre autor e vítima, resta configurada a violência doméstica, com a configuracão de qualquer das hipóteses previstas no art. 5º, da Lei 11.340/2006.

2. Consoante o enunciado 523, da Súmula do STF, “no processo penal, a falta de defesa constitui nulidade absoluta, mas a sua deficiência só o anulará se houver prova de prejuízo para o réu”, de modo que, não se evidenciando, no caso concreto, efetivo prejuízo, não há que se falar em nulidade.

3. É inviável o pleito absolutório, se as provas consolidadas nos autos evidenciam, o quanto baste, a ocorrência do ilícito e de sua autoria.

4. Caracterizada a violência doméstica na conduta do réu, não há como desclassificar o crime imputado para lesão corporal simples, permanecendo a figura típica na forma disposta pelo § 9º, do art. 129, do Código Penal.

5. Apelação desprovida.

Acórdão – Vistos, relatados e discutidos os presentes autos em que são partes as acima indicadas, ACORDAM os Senhores Desembargadores da Primeira Câmara Criminal do Tribunal de Justiça do Estado do Maranhão, por unanimidade e de acordo com o parecer da Procuradoria Geral de Justiça, em rejeitar as preliminares e, no mérito, negar provimento ao recurso, nos termos do voto do Desembargador Relator.

Participaram do julgamento os Excelentíssimos Senhores Desembargadores Raimundo Nonato Magalhães Melo (Presidente), José Luiz Oliveira de Almeida e Benedito de Jesus Guimarães Belo. Presente pela Procuradoria Geral de Justiça a Dra. Rita de Cássia Maia Baptista.

São Luís(MA), 07 de junho de 2011.


DESEMBARGADOR Raimundo Nonato Magalhães Melo

PRESIDENTE

DESEMBARGADOR José Luiz Oliveira de Almeida

RELATOR

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Tempo de estudar

Depois de mais de 20 anos lidando apenas com matéria criminal, senti necessidade, depois de chegar à segunda instância, de uma reciclagem. Tenho,  por isso, dedicado todo o tempo que tenho disponível para estudar. E como sempre fui um autodidata, vez que foram poucas as contribuições que recebi dos  meus professores – com exceções, claro –   não tenho tido dificuldades de estudar sozinho.

Esse registro tem apenas o propósito de justificar por que não tenho respondido aos vários e-mails que tenho recebido, bem assim aos comentários – poucos, mas qualificados –  postados neste blog.

Enquanto não encontro tempo para elaboração de artigos e crônicas, vou alimentando este espaço com as minhas decisões, as quais, decerto, interessam aos que militam na área criminal.

Drogas. Aplicação retroativa do §4º, do artigo 33, da Lei 11343/06

PRIMEIRA CÂMARA CRIMINAL

Sessão do dia 14 de junho de 2011.

Nº Único: 0000790-70.2003.8.10.0051

Apelação Criminal Nº 008720/2011 – Pedreiras

Apelantes : M. da P. R. C.
Advogado : J. L. de L. S.
Apelado : Ministério Público Estadual
Incidência Penal : Art. 12, caput, da Lei n. 6.368/76
Relator : Desembargador José Luiz Oliveira de Almeida

Acórdão nº103035/2011

Ementa. PENAL E PROCESSUAL PENAL. APELAÇÃO CRIMINAL. TRÁFICO ILÍCITO DE ENTORPECENTES. PRELIMINAR DE CERCEAMENTO DE DEFESA. INOCORRÊNCIA. DESCLASSIFICAÇÃO PARA USO DE ENTOPERCENTE. INVIABILIDADE. CONJUNTO PROBATÓRIO. FRAGILIDADE. INOCORRÊNCIA. APLICAÇÃO RETROATIVA DO ART. 33, CAPUT, E SEU § 4º, DA LEI N. 11.343/2006, AOS FATOS OCORRIDOS SOB VIGÊNCIA DA LEI N. 6.368/76. POSSIBILIDADE, DE ACORDO COM AS CIRCUNSTÂNCIAS DO CASO CONCRETO, EM ATENÇÃO AO PRINCÍPIO DA RETROATIVIDADE DA LEI MAIS BENIGNA. APELO CONHECIDO E PARCIALMENTE PROVIDO.

1. O magistrado, como destinatário das provas, não está obrigado a deferir toda e qualquer produção de prova requerida pelas partes, mas apenas, aquelas que se mostrem necessárias à elucidação de fatos ou circunstâncias relevantes ao processo.

2. A existência de contradições entre os depoimentos prestados na fase inquisitorial e em juízo, da mesma testemunha, não dá ensejo à realização de acareação, que pressupõe, logicamente, a contradição entre depoimentos de pessoas distintas. Inteligência do art. 229, do CPP.

3. A realização de exame de dependência toxicológica é absolutamente irrelevante à apuração de crime de tráfico de entorpecente.

4. Se o conjunto probatório é harmônico e coeso, a indicar a autoria delitiva, não há que se falar em absolvição.

5. Evidenciado nos autos que a droga encontrada era destinada a uma terceira pessoa, não há como sustentar a tese desclassificatória para o crime de uso.

6. Embora o atual art. 33, caput, da Lei n. 11.343/2006, comine pena mínima mais gravosa (cinco anos de reclusão) ao crime de tráfico ilícito de entorpecente, é possível a sua aplicação retroativa aos fatos ocorridos na vigência da Lei n. 6.368/76, considerando-se a causa de diminuição de pena prevista em seu § 4º (de 1/6 a 2/3), inexistente na antiga legislação.

7. Não se admite, contudo, a aplicação de normas híbridas, isto é, a incidência isolada da causa de diminuição de pena do § 4º, do art. 33, da atual Lei de Tóxicos, à pena prevista no revogado art. 12, da Lei n. 6.368/76, sob pena do julgador, nesta hipótese, estar legislando.

8. Se, da aplicação integral do art. 33, da Lei n. 11.343/06, aos fatos praticados antes de sua vigência, resultar, concretamente, em pena corporal mais branda, sua retroação é de rigor, posto que mais benéfica ao réu, situação verificada no caso vertente.

9. Inobstante o crime de tráfico de drogas seja equiparado ao hediondo, o atual posicionamento dos Pretórios Superiores admite a substituição de pena privativa de liberdade por restritivas de direito, caso preenchidos os requisitos legais, em homenagem ao postulado constitucional da individualização da pena.

10. Precedentes do STJ e do STF.

11. Apelo conhecido e parcialmente provido, para redimensionar a pena.

Acórdão – Vistos, relatados e discutidos estes autos, ACORDAM os Senhores Desembargadores da Primeira Câmara Criminal, por unanimidade e de acordo com o parecer da Procuradoria Geral de Justiça, adequado em banca, em rejeitar as preliminares e, no mérito, dar parcial provimento ao recurso para que seja reformada a sentença condenatória, aplicando, retroativamente, o art. 33, caput, com a causa de diminuição de pena do seu § 4º, em 2/3 (dois terços), ambos da Lei nº 11.343/2006, e, reconhecendo que a pena resultante é mais benéfica, condenou o apelante à pena de 1(um) ano e 8 (oito) meses de reclusão, substituída por 2 (duas) restritivas de direitos, consistentes em prestação de serviços à comunidade e limitação de fim de semana, nos termos do voto do Desembargador Relator.

Participaram do julgamento os Excelentíssimos Senhores Desembargadores Antônio Fernando Bayma Araujo (Presidente), Raimundo Nonato Magalhães Melo e José Luiz Oliveira de Almeida. Presente pela Procuradoria Geral de Justiça a Dra. Domingas de Jesus Froz Gomes.

São Luís, 14 de junho de 2011.


DESEMBARGADOR Antônio Fernando Bayma Araujo

PRESIDENTE

DESEMBARGADOR José Luiz Oliveira de Almeida

RELATOR


Apelação Criminal Nº. 008720/2118 – Pedreiras

RelatórioO Sr. Desembargador José Luiz Oliveira de Almeida (relator): Trata-se de recurso de apelação criminal interposto por M. da P. R. C., contra sentença oriunda da 1ª Vara da Comarca de Pedreiras, que o condenou por incidência comportamental no art. 12, da Lei n. 6.368/76, à pena de 03 (três) anos de reclusão, e ao pagamento de 50 (cinquenta) dias-multa.

Da peça de acusação, colho o seguinte relato:

I – que, no dia 22 de agosto de 2003, por volta das 19:00 horas, a apelante dirigiu-se à carceragem da Delegacia de Polícia Civil de Trizidela do Vale, ocasião em que forneceu à presa de justiça de nome E. uma porção de maconha, envolta em um saco plástico, escondida em uma marmita de comida; e

II – que o carcereiro não autorizou sua entrada, tendo em vista que o horário de visitas já havia encerrado, mas prontificou-se a entregar a comida, e quando revistou a marmita, encontrou o saco plástico azul com a droga, comunicando o fato à autoridade policial, sendo efetuado a prisão em flagrante da apelante, no dia seguinte.

A denúncia foi instruída com os autos do inquérito policial n. 014/2003, notadamente com o termo de apreensão e apresentação, às fls. 10, e laudo prévio de constatação de substância entorpecente, às fls. 20/21.

Recebimento da denúncia às fls. 48.

A apelante foi qualificada e interrogada às fls. 32/34, ocasião em que negou a imputação delitiva formulada na denúncia.

Defesa preliminar às fls. 36/42, ocasião em que postulou a liberdade provisória da apelante.

Instado a se manifestar, o Ministério Público manifestou-se, às fls. 44/47, pelo recebimento da denúncia e pelo indeferimento do pedido de liberdade provisória.

No curso da instrução, foram ouvidas as testemunhas F. G. D. S. (fls. 55), A. A. da S. (fls. 56), J. F. de M. (fls. 56) e E.A. de S. (fls. 56/56v.), todas arroladas pelo Ministério Público. Pela defesa, foram inquiridas A. R. de L. (fls. 57), J. H. M. Costa (fls. 57) e R. N. de S. A. (fls. 57/57v.).

A defesa reiterou o pedido de liberdade provisória às fls. 62/64; após manifestação favorável do Parquet às fls. 65/66, a prisão da apelante foi relaxada, conforme decisão acostada às fls. 68/69.

Laudo de exame químico em substância vegetal às fls. 71/72.

Nas alegações finais de fls. 77/79, o Ministério Público pugnou pela condenação da apelante nas sanções do art. 12, caput, da Lei n. 6.368/76, reputando estarem suficientemente comprovadas a autoria e a materialidade do crime.

As derradeiras alegações da apelante foram apresentadas às fls. 83/87, postulando a sua absolvição, argumentando, em síntese, fragilidade do suporte probatório para uma condenação, afirmando, em suma, que a droga não foi colocada na marmita pela apelante.

Sobreveio a sentença de fls. 88/89, na qual o juízo a quo condenou a apelante por incidência comportamental no art. 12, caput, da Lei n. 6.368/76, à pena de 03 (três) anos de reclusão, a ser cumprida, inicialmente, em regime aberto, e ao pagamento de 50 (cinquenta) dias-multa, na razão de 1/30 do salário mínimo.

Irresignada, a apelante interpôs o presente recurso às fls. 93/94, com o arrazoado de fls. 95/101, no qual alega, preliminarmente, cerceamento de defesa, por não ter o juízo apreciado seus pedidos de acareação, entre a apelante e a testemunha E., e de realização de exame de dependência física ou psíquica na referida testemunha.

No mérito, assevera a defesa em seu apelo:

I – que não há provas suficientes para a condenação, requerendo a absolvição da apelante;

II – que a apelante é usuária de entopercente, postulando a desclassificação para a conduta descrita no art. 14, da Lei n. 6.368/76; e

III – que deve ser aplicada a causa de diminuição de pena prevista no rt. 33, § 4º, da Lei n. 11.343/2006, em seu patamar máximo, asseverando que se trata de lei penal mais benéfica, cuja retroação é de rigor.

Em suas contrarrazões às fls. 106/108, o Ministério Público pugna pelo improvimento do apelo, mantendo-se, in totum, a sentença ora fustigada.

O Procurador de Justiça Suvamy Vivekananda Meireles, em parecer lançado às fls. 118/123, opinou pelo conhecimento do apelo, afastando-se a preliminar de cerceamento de defesa; no mérito, manifestou-se pelo improvimento do recurso, asseverando que as provas são suficientes para condenação, e que o pleito de redução da pena é inviável, posto que fixada no mínimo legal.

Os autos vieram-me conclusos.

É o relatório.


Voto O Sr. Desembargador José Luiz Oliveira de Almeida (relator): Presentes os pressupostos de admissibilidade do recurso de apelação sob análise, dele conheço.

Antes de incursionarmos na matéria de fundo, mister o enfrentamento da preliminar de cerceamento de defesa suscitada nas razões do apelo.

Nesse ponto, alega a apelante que o magistrado de base sequer pronunciou-se sobre seus pedidos de acareação e realização de exame de dependência de entorpecente na testemunha E., para quem a apelante, em tese, teria levado a droga encontrada na marmita.

Após analisar, atentamente, as alegações da defesa, em contraponto com o conjunto probatório coligido, devo dizer que não prospera a preliminar suscitada.

Primeiramente, vejamos as questões relativas à acareação, sendo oportuno transcrever o art. 229, do CPP:

Art. 229.  A acareação será admitida entre acusados, entre acusado e testemunha, entre testemunhas, entre acusado ou testemunha e a pessoa ofendida, e entre as pessoas ofendidas, sempre que divergirem, em suas declarações, sobre fatos ou circunstâncias relevantes.

Parágrafo único.  Os acareados serão reperguntados, para que expliquem os pontos de divergências, reduzindo-se a termo o ato de acareação.

(sem destaques no original)

Com efeito, a dicção legal é clara, ao estatuir que a acareação só será admitida na hipótese de divergência entre declarações acerca de fatos ou circunstâncias relevantes.

Ao detido exame dos depoimentos acostados aos autos, tanto na fase inquisitorial como em juízo, não observo, em nenhuma delas, contradições entre os depoimentos da apelante e da testemunha E. A. de S..

O que houve, em verdade, foi uma contradição entre os depoimentos prestados pela testemunha E. A. de S., na fase administrativa (fls. 19), e em juízo (fls. 56/56v.).

Na primeira ocasião (fase inquisitorial), a testemunha, de fato, havia solicitado à apelante que lhe trouxesse um pouco de maconha, mas neste mesmo depoimento, ela advertiu que havia feito esse pedido em tom de “brincadeira”, não esperando que a apelante fosse lhe atender. Em juízo, ela realmente infirmou essas declarações, ressaltando que havia prestado aquelas declarações na fase investigativa por suposta sugestão do Delegado de Polícia, as quais iriam “ajudar” a apelante.

A despeito das declarações divergentes da testemunha E., a apelante, em nenhum momento, afirma, categoricamente, que ela havia lhe pedido para levar a droga, limitando-se a dizer, em sua defesa, na fase inquisitorial, que “[…] suspeita que alguém que não gosta dela tenha colocada maconha dentro daquela marmita, pois houve um momento em que a conduzida deixou a marmita em cima de um muro e fora pedir uma bicicleta emprestada para poder levar aquela comida para E.; […]”. Tal afirmação foi corroborada em juízo, às fls. 33.

O que se vê, portanto, são contradições nas palavras da própria testemunha E., algo que, obviamente, não admite acareação, pois é exigência lógica a contradição entre depoimentos de pessoas diversas, o que, repito, não ocorreu na espécie.

Afasto, portanto, a preliminar.

Em relação ao pedido de realização de exame toxicológico na aludida testemunha E., ao que vejo, trata-se de providência dispensável, porquanto a constatação de eventual dependência de entorpecente é absolutamente irrelevante ao deslinde da controvérsia nos autos.

O transporte, venda, entrega, guarda ou qualquer outra conduta descrita no caput do art. 16, da antiga Lei de Drogas, não exige comprovação de dependência daquele que está adquirindo a droga. Se o traficante pratica uma daquelas condutas, é indiferente que o adquirente da droga seja viciado de longa data, ou que seja sua primeira incursão no odioso e lamentável mundo das drogas.

Ademais, verifico que a defesa do apelante, em nenhum momento, declinou as razões daquele exame outrora requerido, ou seja, não explicitou a relevância desse exame para elucidar o caso sob análise.

É sabido que o magistrado, destinatário das provas, não está obrigado a deferir toda e qualquer produção de prova requerida pelas partes, devendo indeferir aquelas que reputar desnecessárias ou irrelevantes, conforme art. 156, do CPP, exatamente o que visualizo no caso sob testilha.

Ademais, a não realização dessas provas então requeridas pela defesa não acarretaram prejuízo[1] à apelante, posto que tais provas, repito, não teriam o condão de influir, substancialmente, na busca da verdade real[2].

O afastamento das preliminares é de rigor, em atenção ao princípio pas de nulité sans grief, que condiciona a decretação de nulidade de determinado ato processual à efetiva demonstração de prejuízo, o que não ocorreu na espécie.

Gizadas tais considerações, examinemos o mérito do apelo.

Primeiramente, vejamos a tese de fragilidade do acervo probatório para a condenação, cujos argumentos, desde já adianto, não restaram-me suficientemente seguros para o fim precípuo colimado no apelo, qual seja, a absolvição da apelante.

A materialidade delitiva, muito embora não censurada no presente apelo, é absolutamente estreme de dúvida, conforme se depreende pelo termo de apreensão e apresentação, às fls. 10, laudo prévio de constatação de substância entorpecente, às fls. 20/21, e laudo de exame químico em substância vegetal, às fls. 71/72, nos quais atestam que a substância apreendida em poder da apelante era canabis sativa linneu, cujo princípio psicoativo é o THC – tetrahidrocanabinol, proscrito na Portaria n. 344/98, da Anvisa.

A autoria delitiva, por seu turno, também restou devidamente comprovada nos autos, pois, ao contrário do que alegou a defesa, a narrativa fática dos policiais, ouvidos no curso da instrução é firme e coerente.

Nesse contexto, rechaço, de plano, a argumentação tendente a desqualificar o depoimento de agentes vinculados ao sistema de segurança pública, posto que são tão válidos é idôneos quanto qualquer outro depoimento testemunhal, só não o sendo quando efetivamente demonstrada alguma circunstância que afaste a imparcialidade do agente público, algo que não visualizo na espécie.

Nesse norte, a jurisprudência já assentou:

[…] 3. O depoimento de policiais pode servir de referência ao juiz na verificação da materialidade e autoria delitivas, podendo funcionar como meio probatório válido para fundamentar a condenação, mormente quando colhido em juízo, com a observância do contraditório, e em harmonia com os demais elementos de prova.[3] […]

Com efeito, de inegável importância para o descortinamento da autoria delitiva, são as declarações do carcereiro J. F. de M., testemunha que detectou a droga escondida em meio à comida que estava na marmita, levada pela apelante para a detenta E..

Relatou a testemunha na fase inquisitorial (fls. 18):

“[…] que às 19:00hs de sexta-feira 22/08, chegou na porta desta Delegacia uma mulher identificada pelo declarando como BONECA, que esta pediu para entrar para levar uma marmita com comida para a presa “ELISA”, que o declarando disse que esta não poderia entrar pois não era mais hora de visitas, que então a mesma entregou a marmita pedindo que entregasse a “E.” e fora embora, que o declarando antes de entregar a tal marmita para a presa como é de prache fizera uma revista na alimentação contida na mesma, que era arroz e dois peixinhos fritos, que na verificação o declarante em meio ao arroz, um papel de plástico azul em forma de um trouxinha, que ao abrir dentro havia “maconha”, que imediatamente veio até a porta da rua para ver se prendia a mulher conhecida por “BONECA”, mas esta já tido ido embora; […]”

(sic – sem destaques no original).

Em juízo, corroborou o relato, dizendo (fls. 56):

“[…] que no dia do fato delituoso o depoente se encontrava na Delegacia de Polícia, em Trizidela do Vale, exercendo sua função de carcereiro, quando por volta das oito horas da noite chegou a acusada aqui presente pedindo para entrar e levava comida para a presa de Justiça de nome E.; que o depoente não permitiu pois já havia passado do horário de visitas, mas se prontificou em entregar a marmita com a comida; que a acusada saiu e o depoente antes de entregar a marmita foi verificar o seu conteúdo e ao mexer na comida encontrou um pacotinho, enrolado em um plástico azul e ao examinar o conteúdo do pacote, verificou que se tratava de maconha; […]”

(sic – sem destaques no original).

A própria Elisa Alves de Sousa, testemunha que estava detida na Delegacia de Trizidela do Vale, para quem a apelante teria levado a droga, admitiu que havia solicitado a comida àquela, dizendo: “[…] que no dia do fato delituoso à acusada M. da P. esteve na Delegacia fazendo uma visita a outro preso, quando a depoente pediu uma comida e que a noite M. da P. foi levar; […]” (sic – fls. 56).

Embora tenha negado em juízo, a referida testemunha afirmou na fase inquisitorial que havia solicitado a droga para a apelante, mas que o fez, segundo alegou, em tom de “brincadeira”, não acreditando que aquela fosse atender seu pedido.

A testemunha de defesa, Albertina Rodrigues de Lima, embora afirme, às fls. 57, que “[…] viu quando M. da P. pôs comida na marmita, e neste momento não há viu colocar nenhum pacote dentro da mesma[…]” (sic), é de se ressaltar que esta cena ocorreu no interior da residência que ambas moravam, tendo em vista que a testemunha afirmou “[…] a acusada morava atualmente com a depoente e que esta a conhece há mais de quatro anos […].

Em sua autodefesa, a apelante afirmou em juízo que deixou a marmita em cima do muro da casa da Sra. Al., por cinco minutos, enquanto pedia emprestada uma bicicleta para se dirigir à delegacia, e que durante este tempo, uma terceira pessoa poderia ter colocado a droga no interior da marmita.

Este fato é confirmado pela própria A., conforme seu depoimento assentado às fls. 57, citando, inclusive, pessoas que sabiam que a apelante iria à Delegacia naquele dia, e que, portanto, poderiam, em tese, ter colocado a droga na marmita sem a apelante ter tomado conhecimento.

Nada obstante, tal circunstância não tem o condão de afastar a autoria do delito atribuída à apelante, pois são alegações circunstanciais, e a defesa, em momento algum, postulou pela oitiva dessas pessoas em juízo, de modo a desconstituir as alegações e provas produzidas pelo órgão acusatório.

O que a mim assoma dos autos, portanto, é um conjunto probatório harmônico, que me conduz à necessária certeza que a apelante M. da P. R. C., é, sim, autora do delito em questão, incorrendo nas condutas “transportar” e “entregar”, descritas no art. 16, da antiga Lei de Drogas.

Assim, absolutamente inviável o pleito absolutório.

Em sequência, afirmo, de plano, que o pleito desclassificatório não merece prosperar.

A substância entorpecente encontrada na marmita era destinada à detenta E. A. de S., fato que restou demonstrado, à exaustão, linhas acima, o que mostra a desnecessidade de tecer outras considerações a respeito.

Ora, se a droga foi colocada em uma marmita que seria entregue a outra pessoa, como sustentar a alegação de que essa mesma droga seria para uso próprio da apelante?

O que observo, na verdade, é que a droga era, provavelmente, destinada ao consumo de E. A. de S., circunstância que não afasta a conduta delituosa da apelante, que, efetivamente, transportou a droga até a Delegacia, para entregá-la à sua destinatária, a Sra. E. A. de S..

Assim, o conjunto probatório coligido nos autos demonstra, à toda evidência, inobstante a singela quantidade de droga, que a apelante praticou uma conduta que se subsume à traficância, na modalidade “transportar” e “entregar”.

Por derradeiro, analiso a tese defensiva que pretende reduzir a pena da apelante, mediante a aplicação da causa de diminuição de pena prevista no § 4º, do art. 33, da atual Lei de Drogas, que a seguir transcrevo.

Para um melhor e mais detido exame da matéria, salutar a transcrição do art. 12, da antiga Lei n. 6.368/76:

Art. 12. Importar ou exportar, remeter, preparar, produzir, fabricar, adquirir, vender, expor à venda ou oferecer, fornecer ainda que gratuitamente, ter em depósito, transportar, trazer consigo, guardar, prescrever, ministrar ou entregar, de qualquer forma, a consumo substância entorpecente ou que determine dependência física ou psíquica, sem autorização ou em desacordo com determinação legal ou regulamentar;

Pena – Reclusão, de 3 (três) a 15 (quinze) anos, e pagamento de 50 (cinqüenta) a 360 (trezentos e sessenta) dias-multa.

(sem destaques no original)

A atual previsão legal do crime de tráfico ilícito de entorpecentes, na Lei n. 11.343/2006, nos diz:

Art. 33.  Importar, exportar, remeter, preparar, produzir, fabricar, adquirir, vender, expor à venda, oferecer, ter em depósito, transportar, trazer consigo, guardar, prescrever, ministrar, entregar a consumo ou fornecer drogas, ainda que gratuitamente, sem autorização ou em desacordo com determinação legal ou regulamentar:

Pena – reclusão de 5 (cinco) a 15 (quinze) anos e pagamento de 500 (quinhentos) a 1.500 (mil e quinhentos) dias-multa;

Omissis

§ 4o Nos delitos definidos no caput e no § 1o deste artigo, as penas poderão ser reduzidas de um sexto a dois terços, vedada a conversão em penas restritivas de direitos, desde que o agente seja primário, de bons antecedentes, não se dedique às atividades criminosas nem integre organização criminosa.

(sem destaques no original)

Num primeiro olhar, os preceitos secundários das normas apontam para aplicação da Lei n. 6.368/76, aos fatos ocorridos em sua vigência, tendo em vista que a pena mínima ali cominada é mais branda (três anos), quando comparada àquela infligida à conduta descrita na atual Lei n. 11.343/2006 (cinco anos). A irretroatividade, em linha de princípio, seria de rigor, posto que, caso contrário, prejudicaria o réu.

Todavia, à despeito da maneira como a questão foi exposta no apelo, não se resolve pela simples aplicação do preceptivo em causa, demandado uma análise mais aprofundada.

O aludido § 4º do art. 33, da Lei n. 11.343/2006, estabelece um percentual de redução de 1/6 a 2/3, o que inexistia na antiga legislação. Todavia, silenciou o legislador a respeito dos critérios que o julgador deverá considerar para determinar o quantum de redução.

No entanto, a exegese sistemática da aludida lei nos remete ao art. 42, que estabelece, verbis:

Art. 42.  O juiz, na fixação das penas, considerará, com preponderância sobre o previsto no art. 59 do Código Penal, a natureza e a quantidade da substância ou do produto, a personalidade e a conduta social do agente.

(sem destaques no original)

Ao tratar de tais critérios para a diminuição de pena, as preclaras lições de Guilherme de Souza Nucci nos ensinam:

[…] É lógico que há de existir o cuidado de evitar o bis in idem, ou seja, levar em conta duas vezes a mesma circunstância. Como temos defendido em outros trabalhos, as causas de diminuição de pena são mais relevantes que as circunstâncias judiciais do art. 59 do Código Penal, de caráter nitidamente residual. Portanto, se o juiz notar um fator de destaque no crime cometido pelo traficante primário, de bons antecedentes, sem ligações criminosas, como a pequena quantidade de droga, deve utilizar esse critério para operar a maior diminuição da pena (ex.: dois terços), deixando de considerá-la para a fixação da pena-base (a primeira etapa da aplicação da pena, conforme art. 68 do Código Penal). O contrário também se dá. Percebendo enorme quantidade de drogas, ainda que em poder de traficante primário, de bons antecedentes, sem outras ligações com o crime organizado, pode reservar tal circunstância para utilização na diminuição da pena (ex.: um sexto). Se assim o fizer, não se valerá da mesma circunstância por ocasião da eleição da pena-base, com fundamento no art. 59 do CP.[4]

(sem destaques no original)

Portanto, diante dessas premissas, deve o juiz considerar, sobretudo, a quantidade de droga apreendida com o acusado, e, em seguida, os critérios estabelecidos no art. 59, do CPB, para determinar o quantum de redução a ser aplicado ao caso concreto, sobre a pena prevista no art. 33, da Lei n. 11.343/2006.

Se dessa operação resultar uma pena menor que aquela aplicada de acordo com o art. 12, da Lei n. 6.368/76, deve o julgador aplicá-la, porque evidentemente mais benéfica ao réu. Caso contrário, deve manter a condenação de acordo com a lei vigente à época dos fatos.

Nesse rumo, o STJ já assentou:

HABEAS CORPUS. PACIENTE CONDENADA POR TRÁFICO DE DROGAS. PENA CONCRETIZADA EM 3 ANOS E 6 MESES DE RECLUSÃO, EM REGIME INICIAL FECHADO. CRIME DE TRÁFICO COMETIDO NA VIGÊNCIA DA LEI 6.368?76. REDUÇÃO DE 1?6 ATÉ 2?3 DA PENA. RETROATIVIDADE DO § 4o. DO ART. 33 DA LEI 11.343?06 (NOVA LEI DE DROGAS). INADMISSIBILIDADE. COMBINAÇÃO DE LEIS. APLICAÇÃO DE UMA OU OUTRA LEGISLAÇÃO, EM SUA INTEGRALIDADE, CONFORME FOR MELHOR PARA A ACUSADA OU SENTENCIADA. VEDAÇÃO À SUBSTITUIÇÃO DA PENA PRIVATIVA DE LIBERDADE POR RESTRITIVA DE DIREITO, POR SE TRATAR DE CRIME DE TRÁFICO. CONSTRANGIMENTO ILEGAL. CRIME HEDIONDO COMETIDO ANTES DA LEI 11.464?07. PROGRESSÃO DE REGIME. EXIGÊNCIA DE CUMPRIMENTO DE 2?5 DA PENA PELO TRIBUNAL DE ORIGEM. ULTRATIVIDADE DA LEX MITIOR. CONSTRANGIMENTO ILEGAL. PRECEDENTES DO STJ. RESSALVA DO PONTO DE VISTA DO RELATOR. ORDEM CONCEDIDA.

1. A redução da pena de 1?6 até 2?3, prevista no art. 33, § 4o. da Lei 11.343?06, objetivou suavizar a situação do acusado primário, de bons antecedentes, que não se dedica a atividades criminosas nem integra organização criminosa, proibida, de qualquer forma, a conversão em restritiva de direito.

2. Embora o referido parágrafo tenha a natureza de direito material, porquanto cuida de regra de aplicação da pena, tema regulado no Código Penal Brasileiro, mostra-se indevida e inadequada a sua aplicação retroativa à aquelas situações consumadas ainda na vigência da Lei 6.368?76, pois o Magistrado que assim procede está, em verdade, cindindo leis para criar uma terceira norma – uma lei de drogas que prevê pena mínima para o crime de tráfico de 3 anos, passível de redução de 1?6 até 2?3, para agentes primários e de bons antecedentes, possibilitando, em tese, a fixação da sanção em apenas 1 ano de reclusão; contudo, essa norma jamais existiu no ordenamento jurídico brasileiro, não podendo ser instituída por via de interpretação.

3. Na hipótese, o § 4o. faz referência expressa ao caput do art. 33 da nova Lei de Drogas, sendo parte integrante deste, que aumentou a pena mínima para o crime de tráfico de 3 para 5 anos. Sua razão de ser está nesse aumento, para afastar qualquer possível ofensa ao princípio da proporcionalidade, permitindo ao Magistrado que, diante da situação concreta, mitigue a sanção penal do traficante ocasional ou do réu primário, de bons antecedentes e não integrante de organização criminosa; assim, não há como interpretá-lo isoladamente do contexto da novel legislação.

4. A solução que atende ao princípio da retroatividade da lei mais benéfica (art. 2o. do CPB e 5o., XL da CF?88), sem todavia, quebrar a unidade lógica do sistema jurídico, vedando que o intérprete da Lei possa extrair apenas os conteúdos das normas que julgue conveniente, é aquela que permite a aplicação, em sua integralidade, de uma ou de outra Lei, competindo ao Magistrado singular, ao Juiz da VEC ou ao Tribunal Estadual decidir, diante do caso concreto, aquilo que for melhor à acusada ou sentenciada.

[…]

9. Ordem concedida, em consonância com o parecer ministerial, para que o Juiz da VEC analise a possibilidade de redução da pena com fulcro no art. 33, § 4o. da Lei 11.343?06, aplicando, se for o caso, em sua integralidade, a legislação que melhor favorecer a paciente, bem como para reconhecer a possibilidade de substituição da pena privativa de liberdade por restritivas de direitos, após verificar o preenchimento dos requisitos exigidos, notadamente, a satisfação das condições subjetivas para a fruição do benefício (art. 44, III do CPB ) e, ainda, para que o Juiz da Vara de Execuções Penais aprecie o requerimento de progressão de regime do paciente, decidindo-o como entender de direito, atentando para a satisfação dos requisitos objetivos e subjetivos, na forma como disciplinados pelo art. 112 da LEP.[5]

(sem destaques no original)

A propósito, é de se ressaltar que o entendimento assente no STJ não admite a fusão de leis, criando-se uma terceira norma híbrida, conforme se depreende do v. acórdão supra transcrito.

Vale dizer, não é possível a aplicação da aludida causa de diminuição de pena prevista no § 4º, do art. 33, da atual Lei de Drogas, isoladamente, à pena cominada na antiga previsão do art. 12, da Lei n. 6.368/76. Ou o atual preceito normativo do art. 33, retroage em sua inteireza (juntamente com o § 4º), caso seja mais benéfico ao réu, ou não retroage, conforme já acentuei, sob pena de o julgador estar se arvorando em função legiferante, criando uma terceira norma híbrida, em clara ofensa ao postulado constitucional da separação das funções estatais.

Pois bem.

No caso sob testilha, observo que a apelante foi condenada à pena de 03 (três) anos de reclusão e 50 (cinquenta) dias-multa, ou seja, no mínimo legal, à despeito do magistrado sentenciante ter valorado negativamente algumas circunstâncias judiciais, dentre elas, a culpabilidade.

Diante dessas premissas, a questão fundamental que se põe é a seguinte: considerando a pena concretamente imposta ao embargante, de 03 (três) anos de reclusão, e 50 (cinquenta) dias-multa, lhe seria mais vantajosa a aplicação da pena prevista no art. 33, caput, da Lei n. 11.343/2006, com a causa de diminuição de pena do § 4º, do referido preceito?

A resposta, a mim, parece positiva, conforme demonstrarei a seguir.

A pena-base cominada no preceito secundário do art. 33, da Lei n. 11.343/2006 é de 05 (cinco) anos de reclusão, e este deve ser o parâmetro a ser seguido.

Isso porque, conforme orientação do art. 42, da Lei de Tóxicos, a análise acerca da natureza e a quantidade do entorpecente são preponderantes em relação aos critérios previstos no art. 59, do CPB; daí porque a quantidade de droga, in casu, será levada em conta para fins de aplicação do § 4º, do art. 33, da Lei n. 11.343/2006 (terceira fase da dosimetria), sendo desconsiderado na fase das circunstâncias judiciais.

No caso sob testilha, a quantidade do entorpecente apreendida foi mínima (massa líquida de 2,018g, conforme laudo de exame químico de fls. 71), e sua natureza (maconha), revela um entorpecente que, lamentavelmente, é de uso comum, mas dentre os existentes, de efeito menos nocivo.

Com efeito, me parece que esta especificidade leva a aplicação da causa de diminuição prevista no multicitado § 4º, do art. 33, da Lei de Tóxicos, em seu patamar máximo, ou seja, 2/3 (dois terços).

Aplicando-se a aludida causa de diminuição de 2/3 (dois terços) à pena-base de 05 (cinco) anos, prevista no art. 33, atento à inexistência de majorantes ou minorantes, a pena definitiva resulta 01 (um) ano e 08 (oito) meses de reclusão, menos gravosa, portanto que, a reprimenda de 03 (três) anos outrora irrogada à apelante.

Quanto à pena de multa, afigura-se inviável a aplicação de todo o preceito secundário do citado art. 33, da Lei de Tóxicos, que comina pena mínima em 500 (quinhentos) dias-multa, vez que se trata de recurso exclusivo da defesa, devendo ser observado, in casu, a vedação da reformatio in pejus indireta, que consistiria na aplicação de pena de multa muito mais gravosa ao réu, diante de novo recurso exclusivo da defesa. Assim, mantenho a pena de multa já fixada, em 50 (cinquenta) dias-multa.

Assim, considerando que a análise concreta do caso recomenda a aplicação integral do art. 33, caput, e seu § 4º, retroativamente, por ser mais benéfica, fica a apelante definitivamente condenada à pena de um 01 (um) ano e 08 (oito) meses de reclusão, e ao pagamento de 50 (cinquenta) dias-multa, esta, à razão de 1/30 do salário mínimo, em razão de não incidirem, na espécie, agravantes e atenuantes, nem tampouco causas de aumento ou diminuição de pena.

Observo, ainda, ser cabível a substituição da pena privativa de liberdade por restritivas de direito, pois atendidos os critério objetivos (pena inferior a quatro anos), e subjetivos (circunstâncias judiciais favoráveis), previstos no art. 44, do CPB[6].

Ressalto, como reiteradamente venho fazendo, que tal substituição afigura-se cabível, mesmos nos crimes de tráfico de entorpecentes, conforme já me pronunciei nos autos da Apelação Criminal n. 004723/2011, de minha relatoria, cuja ementa transcrevo abaixo:

EMENTA. PROCESSUAL PENAL. APELAÇÃO CRIMINAL. TRÁFICO DE ENTORPECENTES. PROVA NOS AUTOS QUE DEMONSTRA A MATERIALIDADE DO CRIME E SUA AUTORIA. CONDENAÇÃO. CAUSA DE DIMINUIÇÃO DA PENA PREVISTA NO ART. 33, § 4º, DA LEI 11.343/06, APLICADA EM 1º GRAU. SUBSTITUIÇÃO DE PENA PRIVATIVA DE LIBERDADE POR RESTRITIVA DE DIREITOS. POSSIBILIDADE. APELO PROVIDO PARCIALMENTE.

[…]

3. O entendimento doutrinário e jurisprudencial atual é no sentido de que, embora o crime de tráfico seja equiparado ao hediondo, em havendo merecimento ao apenado, há possibilidade de substituição da pena privativa de liberdade por restritiva de direitos, em homenagem ao postulado constitucional da individualização da pena.

4. Apelação conhecida e provida parcialmente.

(sem destaques no original)

Assim, substituo a pena privativa de liberdade por duas restritivas de direitos, consistentes em prestação de serviços à comunidade e limitação de fim de semana, o que faço com base no art. 43, IV e VI, do CPB.

Com essas considerações, conheço do presente recurso de apelação, para, em desacordo com a Procuradoria Geral de Justiça, dar-lhe parcial provimento, e reformar a sentença condenatória, aplicando, retroativamente, o art. 33, caput, com a causa de diminuição de pena do seu § 4º, em 2/3 (dois terços), ambos da Lei n. 11.343/2006, e, reconhecendo que a pena resultante é mais benéfica, condeno a apelante à pena de 01 (um) ano e 08 (oito) meses de reclusão, substituída por duas restritivas de direitos, consistentes em prestação de serviços à comunidade e limitação de fim de semana.

É como voto.

Sala das Sessões da Primeira Câmara Criminal do Tribunal de Justiça do Estado do Maranhão, em São Luís, 14 de junho de 2011.

DESEMBARGADOR José Luiz Oliveira de Almeida

RELATOR



[1] Art. 563 do CPP: “nenhum ato será declarado nulo, se da nulidade não resultar prejuízo para a acusação ou para a defesa.”

[2] Art. 566 do CPP: ”não será declarada a nulidade de ato processual que não houver influído na apuração da verdade substancial ou na decisão da causa.”

[3] HC 110.869/SP, Rel. Ministro ARNALDO ESTEVES LIMA, QUINTA TURMA, julgado em 19/11/2009, DJe 14/12/2009.

[4] NUCCI, Guilherme de Souza. Leis Penais e Processuais Penais Comentadas. 4. ed. RT, 2009. pp. 361-362.

[5] HC 96242/SP, Rel. Ministro NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO, QUINTA TURMA, julgado em 20/05/2008, DJe 09/06/2008.

[6] Art. 44. As penas restritivas de direitos são autônomas e substituem as privativas de liberdade, quando:

I – aplicada pena privativa de liberdade não superior a quatro anos e o crime não for cometido com violência ou grave ameaça à pessoa ou, qualquer que seja a pena aplicada, se o crime for culposo;

II – o réu não for reincidente em crime doloso;

III – a culpabilidade, os antecedentes, a conduta social e a personalidade do condenado, bem como os motivos e as circunstâncias indicarem que essa substituição seja suficiente.

Habeas corpus. Excesso de prazo

PRIMEIRA CÂMARA CRIMINALSessão do dia 19 de abril de 2011.

Nº Único: 0001564-78.2011.8.10.0000

Habeas Corpus Nº 007269/2011- São Luís

Paciente : J. C. L. e outro
Impetrante : Defensoria Pública do Estado
Impetrado : Juíza de Direito da 5ª Vara Criminal de São Luís
Incidência Penal : Art. 157, § 2º, I e II, do CPB
Relator : Desembargador José Luiz Oliveira de Almeida

Acórdão nº 101147/2011

Ementa. PROCESSUAL PENAL. HABEAS CORPUS. ROUBO CIRCUNSTANCIADO. EXCESSO DE PRAZO. INOCORRÊNCIA. EXPEDIÇÃO DE CARTA PRECATÓRIA. RAZOABILIDADE. CONDIÇÕES SUBJETIVAS. IRRELEVÂNCIA. INEXISTÊNCIA DE CONSTRANGIMENTO ILEGAL. ORDEM DENEGADA.

1. Inexiste excesso de prazo se o feito segue seu trâmite regular, justificando-se eventual demora na entrega do provimento jurisdicional pela necessidade de expedição de carta precatória para oitiva da vítima.

2. A questão do excesso de prazo deve ser analisada sob o prisma do princípio da razoabilidade, restando afastada quando não se verifica qualquer desídia por parte da autoridade processante na condução do feito.

3. Condições pessoais, mesmo que realmente favoráveis, em princípio, não têm o condão de, por si sós, impedir a manutenção da custódia cautelar.

4. Ordem denegada.

Acórdão – Vistos, relatados e discutidos os presentes autos em que são partes as acima indicadas, acordam os Senhores Desembargadores da Primeira Câmara Criminal do Tribunal de Justiça do Estado do Maranhão, por unanimidade e de acordo com o parecer ministerial, em denegar a ordem impetrada, nos termos do voto do Desembargador Relator.

Participaram do julgamento Excelentíssimos Senhores Desembargadores José Luiz Oliveira de Almeida (Presidente), Raimundo Nonato de Souza e José Bernardo Silva Rodrigues. Presente pela Procuradoria Geral de Justiça a Dra. Domingas de Jesus Froz Gomes.

São Luís, 19 de abril de 2011.

DESEMBARGADOR José Luiz Oliveira de Almeida

PRESIDENTE / RELATOR


Habeas Corpus Nº 7269/2011 – São Luís

 

 

Relatório – O Sr. Desembargador José Luiz Oliveira de Almeida (relator): Trata-se de habeas corpus impetrado pela Defensoria Pública do Estado, em favor de J. C. L. e A. F. S., contra ato da lavra da MM.ª Juíza de Direito da 5ª Vara Criminal de São Luís.

 

Segundo consta na inicial do mandamus, J. C. L. e A. F. S. foram denunciados pela prática do delito tipificado no art. 157, § 2º, I e II, do Código Penal, e presos, em flagrante delito, no dia 5 de julho de 2010.

 

De acordo com o impetrante, inexiste, no caso em apreço, observância ao princípio da razoável duração do processo, visto que os pacientes aguardam, presos, há cinco meses, o início da instrução processual.

 

Narra, ainda, que a prolongação injustificada da prisão cautelar afronta diversos princípios constitucionais, como a dignidade da pessoa humana, a presunção de inocência e o devido processo legal, além de demonstrar, por parte do Estado, desvalor pela liberdade do cidadão.

 

Ressalta, ademais, que o paciente A. F. S. é pessoa íntegra, não possui qualquer antecedente criminal, tem ocupação lícita e residência fixa, inexistindo, pois, motivos para que a sua prisão cautelar seja mantida.

 

Requer, assim, a concessão da ordem de habeas corpus, para relaxar a prisão dos pacientes, diante do excesso de prazo para a formação da culpa, com a expedição dos correspondentes alvarás de soltura.

 

Instruiu o writ com os documentos de fls. 11/16.

 

A liminar foi indeferida, conforme decisão de fls. 24/26.

 

Solicitadas as informações, foram prestadas pela autoridade impetrada e juntadas às fls. 28.

 

Com vista dos autos, a Procuradoria Geral de Justiça, em parecer da lavra da Procuradora Domingas de Jesus Froz Gomes, opinou pela denegação da ordem (fls. 32/35).

 

É o relatório.

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

Voto – O Sr. Desembargador José Luiz Oliveira de Almeida (relator): Presentes os pressupostos de admissibilidade, conheço do habeas corpus impetrado.

 

Colhe-se dos autos em apreço que J. C. L. e A. F. S. foram presos em flagrante delito, no dia 05 de julho de 2010, após a suposta prática do crime de roubo contra dois turistas que visitavam a cidade.

 

Sustenta o impetrante, em síntese, que os pacientes encontram-se presos, de forma injustificada, por tempo superior ao razoável, o que ofende diversos princípios constitucionais.

 

Da análise detida dos autos em apreço, não pude constatar o alegado constrangimento exercido sobre o jus libertatis dos pacientes.

 

De acordo com as informações prestadas pela autoridade apontada como coatora, bem como da verificação do relatório processual através do sistema informatizado deste Tribunal, observo que a audiência de instrução fora realizada no dia 12 de abril do corrente ano.

 

Verifico, ademais, que, para o julgamento do feito, o juízo aguarda apenas o retorno de carta precatória remetida para outra comarca a fim de colher o depoimento de uma das vítimas.

 

Vê-se, portanto, que a ação criminal ajuizada contra os pacientes segue seu curso normal, sendo certo que eventual atraso não pode ser atribuído ao magistrado condutor do feito, mas, sim, à necessidade de colher o depoimento da vítima residente em outra localidade.

 

De relevo que se diga que a questão acerca do excesso de prazo para a formação da culpa não pode ser analisada utilizando-se de simples critérios matemáticos, devendo-se ponderar outras circunstâncias, tais como a complexidade do caso, o número de pessoas envolvidas, além das dificuldades técnicas na produção das provas, que terminam por impedir que a instrução seja concluída no lapso temporal que se deseja.

 

No caso em tela, ao contrário do que alega o impetrante, não há atraso na instrução processual de forma a autorizar o relaxamento da prisão dos pacientes. Ao contrário, constata-se que a instrução criminal vem se desenvolvendo dentro do limite da razoabilidade.

 

É evidente que a ação penal não pode prolongar-se indefinidamente, o que representaria uma afronta a princípios fundamentais insculpidos na Carta Magna. Os autos evidenciam, porém, que os atos necessários ao prosseguimento do feito estão sendo realizados, motivo pelo qual não restou configurado o excesso de prazo alegado pelo impetrante.

 

Quanto ao argumento de que o paciente A. F. S. não possui antecedentes criminais, tem endereço fixo e atividade lícita, devo dizer que tais atributos não bastam, por si sós, para autorizar a liberdade do paciente.

 

A propósito, trago à colação o entendimento predominante dos Tribunais Superiores:

 

HABEAS CORPUS. DIREITO PROCESSUAL PENAL. DEMORA NA FORMAÇÃO DA CULPA. COMPLEXIDADE DO FEITO. RAZOABILIDADE. PRISÃO PREVENTIVA. DECISÃO FUNDAMENTADA. INEXISTÊNCIA DE CONSTRANGIMENTO ILEGAL. ORDEM DENEGADA. 1. Há elementos nos autos que apontam para a complexidade do processo, com a existência de vários réus, com defensores distintos. 2. A razoável duração do processo (CF, art. 5°, LXXVIII), logicamente, deve ser harmonizada com outros princípios e valores constitucionalmente adotados no Direito brasileiro, não podendo ser considerada de maneira isolada e descontextualizada do caso relacionado à lide penal que se instaurou a partir da prática dos ilícitos. 3. Esta Suprema Corte vem entendendo que a complexidade do processo pode justificar eventual dilatação no prazo da instrução criminal. Precedentes. 4. A prisão preventiva do paciente foi devidamente fundamentada, apoiada em elementos concretos. 5. Primariedade, bons antecedentes e residência fixa, por si sós, não são elementos aptos a afastar a prisão provisória. Precedentes. 6. Não há constrangimento ilegal a ser sanado. 7. Writ denegado.[1]

 

No mesmo sentido:

 

[…] A existência de atributos pessoais, como primariedade e bons antecedentes, residência fixa e trabalho lícito, não constituem óbice à manutenção da segregação antecipada do paciente, quando presente condição autorizativa para a decretação da prisão preventiva.[2]

 

Ante o exposto, não configurado o constrangimento ilegal suscitado no mandamus, denego a ordem, em conformidade com o parecer ministerial.

 

É como voto.

 

Sala das Sessões da Primeira Câmara Criminal do Tribunal de Justiça do Estado do Maranhão, em São Luís, 19 de abril de 2011.

 

 

DESEMBARGADOR José Luiz Oliveira de Almeida

 

RELATOR



[1] STF, HC 101364, Relator(a):  Min. ELLEN GRACIE, Segunda Turma, julgado em 08/06/2010, DJe-116 DIVULG 24-06-2010 PUBLIC 25-06-2010 EMENT VOL-02407-03 PP-00616.

 

[2] STJ, HC 172.611/PE, Rel. Ministro NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO, QUINTA TURMA, julgado em 02/09/2010, DJe 04/10/2010.