Previsões para 2014

Sócrates ensinou que uma vida irrefletida não vale a pena ser vivida. Em Fédon ele diz que uma vida irrefletida leva a alma a ficar “confusa e aturdida, como se estivesse bêbada”, enquanto uma alma sábia alcança a estabilidade e seu vagar chega ao fim. Nessa linha de compreensão, teimo em levar uma vida reflexiva, mesmo diante da óbvia constatação de que, não raro, o resultado das minhas reflexões não sejam muito palatáveis.

Nessas reflexões, incursiono, ousadamente, no mundo da premonição, o fazendo com a perspectiva de acertar a maioria das previsões aqui encartadas, pela óbvia constatação de que todos que tenham o mínimo de lucidez concluiriam pela sua inevitabilidade.

Vejamos as previsões, não exaustivamente. No ano vindouro haverá mais rebeliões e mortes na Penitenciária de Pedrinhas; serão denunciados, mais uma vez, a superpopulação carcerária e o tratamento degradante e desumano aos presos, cujo quadro permanecerá inalterado; um congressista muito conhecido vai se deslocar num avião da FAB para cuidar de assuntos pessoais, para, depois de flagrado, assumir o erro e prometer ressarcir os cofres públicos; os assaltos se multiplicarão e muitos sucumbirão sob as armas dos meliantes, mas só uma parcela mínima de transgressores será punida; cadeias serão interditadas, por falta de condições para receber presos provisórios; presos cavarão túneis e fugirão de cadeias, com a complacência e cumplicidade de algum agente do próprio Estado; os líderes de facções criminosas continuarão comandando as suas ações de dentro das prisões; as praias de São Luís continuarão impróprias para o banho; brasileiros morrerão nas filas dos hospitais e serão “depositados” pelos corredores dos mesmos, por falta de leitos; balas perdidas continuarão matando inocentes; a polícia será acusada da prática de violência e o porta-voz da caserna dirá que tudo será rigorosamente apurado e que os culpados serão punidos; muitos serão mortos pela própria polícia, que alegará, em sua defesa, que agiu no estrito cumprimento do dever legal; muitos, incontáveis crimes continuarão impunes, porque as instâncias de controle teimarão em tratar os processos criminais como feitos de segunda categoria; em face de desvios éticos, muitos prefeitos serão afastados por juízes singulares, todavia voltarão aos cargos, no dia seguinte, em face de uma liminar concedida por um membro da segunda instância; os precatórios não serão pagos, disso resultando que, mais uma vez, haverá quem se aventure pensar, delirando, em intervenção federal no Maranhão, mas ninguém que tenha juízo acreditará nessa possibilidade; muitas falcatruas serão noticiadas, a maioria delas imputadas aos homens públicos, que se limitarão a dizer que é intriga da oposição ou que se trata de uma campanha difamatória deflagrada por um inimigo político; o noticiário chapa branca dirá que vivemos no paraíso, e a oposição dirá que vivemos no inferno; haverá sempre quem, na oposição, torça pelo insucesso do adversário que está no poder, e tudo fará para que não obtenha êxito em suas ações, pouco se importando com as conseqüências para população; na campanha eleitoral que se aproxima, para variar, os candidatos prometerão o que sabem que não poderão cumprir; mais uma vez o poder econômico influenciará, decisivamente, no resultado das eleições, tanto majoritárias quanto proporcionais; os candidatos a reeleição continuarão a fazer propaganda eleitoral fora de época, sob o olhar complacente das instâncias de controle; as empresas aéreas continuarão descumprindo o horário e as malas continuarão a ser extraviadas ou violadas; as pessoas se agastarão nas filas de atendimento dos aeroportos, sem ter a quem reclamar; muitas serão as denúncias de desvios de verbas públicas, mas, como regra, todos ficarão impunes; os prefeitos serão acusados de enriquecimento ilícito,e muitos, efetivamente, enriquecerão nos cargos, confiantes na impunidade; prefeitos flagrados em falcatruas dirão que a culpa é do contador ou de um assessor que traiu a sua confiança; o Judiciário será acusado de moroso, e os juízes dirão que fazem o que é possível e que a estrutura deficiente é a responsável pelo atraso na entrega do provimento judicial; as operadoras de celular continuarão a prestar um serviço de péssima qualidade; Ministério Público será acusado de omisso, mas dirá que exerce com perseverança o seu papel de custos legis e guardião da Constituição; novas leis penais deverão surgir, a pretexto de combater a violência, com a exacerbação das penas privativas de liberdade, mas tudo ficará como dantes; será deflagrada uma campanha pela legalização da maconha, como uma panacéia no combate à traficância; os flanelinhas continuarão dominando os estacionamentos públicos, sob o olhar complacente das autoridades; mais uma vez a Lagoa da Jasen será “despoluída”; o Pleno do Tribunal de Justiça deixará de se reunir, algumas vezes, por falta de quórum; as comarcas, salvo exceção, ficarão acéfalas aos finais de semana; os clubes serão punidos em face de brigas envolvendo torcidas organizadas; o Fluminense não será rebaixado, mais uma vez; haverá manifestações públicas e os Black Blocs voltarão a atacar o patrimônio privado, preferencialmente; haverá manifestações com a interdição de estradas para infernizar a vida dos usuários; a transposição das águas do Rio São Francisco continuará como uma sonho de uma noite de verão; o STF continuará agindo como protagonista, decidindo sobre questões que as instâncias próprias preferem se omitir, por conveniências políticas; os doadores de campanha vão cobrar a conta dos eleitos às suas custas; não haverá reforma política e nem tributária; muitas licitações serão fraudadas; o chefe do Executivo, dissimulando, dirá que não negocia com o legislativo sob pressão; as emendas parlamentares continuarão fazendo a festa de muitos parlamentares; os viadutos da Forquilha, do Calhau e da Av. dos Holandeses não serão construídos; a refinaria continuará sendo um sonho; os engarrafamentos no trânsito minarão a nossa paciência; magistrados serão aposentados compulsoriamente pelo CNJ; as Assembleias Legislativas continuarão a “trabalhar” em “harmonia” com o Poder Executivo; com as chuvas, o asfalto será pulverizado e muitas estradas ficarão intrafegáveis; haverá desabastecimento de pescado na semana santa; os ferry boats continuarão descumprindo os horários; a intolerância marcará as relações pessoais. É isso.

Vítimas da propaganda oficial

Nós somos todos, de certa forma, vítimas da propaganda oficial; aqui e alhures. Nesse sentido o Maranhão não difere muito do resto do país – e do mundo.

Quem assisti a propaganda oficial do Estado, ou as notícias da imprensa chapa branca, tem a sensação de que vivemos no paraíso. Mas que vive aqui sabe em que mundo vivemos: de miséria, de violência, de descaso, de enriquecimento ilícito, de falta de perspectivas, etc.

Mas, como disse acima, isso ocorre aqui e em outros lugares, sobretudo nos países onde não há liberdade de imprensa e onde a história é contada como deve ser, ou seja, de acordo com os interesses de quem está, ou esteve, no poder.

Na China, por exemplo, na cidade de Shaoshan, li ontem, acho que no jornal Folha de S. Paulo, o culto a Mao Tse-tung chega às raias da adoração. Tem até quem o veja como santo milagroso, o que, convenhamos, é um despautério. Esses adoradores, decerto, não conhecem a História como conhecemos. Eles só conhecem a História oficial. Não sabem nada, por exemplo, da Grande Fome (1958-62) e dos horrores da Revolução Cultural ( 1966-76).

Mas a China, como disse acima, não difere muito do que ocorre em outros países e como a própria História Universal, sempre contada a partir dos interesses de quem as conta. Nesse sentido é preciso, sempre que possível, revisitar a História, a partir das informações de autores que não estiveram e nem estão a serviço do Poder, até mesmo para que sejam reparadas algumas injustiças que foram sedimentadas no inconsciente popular.

Exemplo. A minha vida toda ouvi que Nero era um incendiário. Hoje, já se sabe, que as coisas não se deram bem assim. Sabe-se, por exemplo, que Tácito e Suetônio, principais autores clássicos que tratam do grande incêndio em Roma, tinham ressentimentos políticos com Nero, daí que, como dizem alguns autores, cuidaram de construir uma narrativa impregnada de ressentimento.

A verdade é que, contada a história pela metade ou de acordo com interesses inconfessáveis, virou verdade absoluta o mito de que Nero, inclusive, ao tempo em que Roma ardia em chamas, tocava lira, observando de longe a destruição.

O certo é que, sendo verdade ou não, Nero passou para a história como anticristo, violador de virgens e mulheres casadas, mandou incendiar Roma e tocava Lira enquanto a cidade ardia.

Verdade ou mito?

Qualquer um que aprofundar o estudo da questão pode ser tomado de, no mínimo, muitas dúvidas.

O certo e recerto é que, como se faz com a história, nos dias presentes somos instados, pela propaganda oficial, a acreditar em mitos. Para não ser alienado, é preciso muito tempo dedicado à leitura, o que é inviável para a imensa maioria dos brasileiros, aos quais, nesse contexto, só resta mesmo assimilar a propaganda oficial, sem a mínima possibilidade de discernir o que é mito e o que seja realidade.

Fonte sobre Nero: Guia Politicamente Incorreto da História do Mundo, de Leandro Narloch, Leya, 2013.

Tudo como sempre foi

O jornal Folha de S. Paulo de hoje noticia que auditorias realizadas em 60 cidade de todo país, escolhidas por sorteio, constatou que em 98% delas há irregularidades na aplicação dos recursos destinados ao bolsa família, vitrine eleitoral da presidente Dilma. Constatou, ademais, que há irregularidades na construção de creches, de pré-escolas e UBSs (Unidades Básicas de Saúde). As irregularidades condizem, basicamente, com a comprovação de aplicação dos recursos.

Essas notícias já não me surpreendem; elas apenas me deixam indignado, afinal, todos sabemos, os municípios são sorvedores de recursos públicos. Muitos são os que enriquecem à custa do nosso dinheiro numa única administração, ou seja, em quatro anos, que é o tempo dos mandatos dos gestores municipais.

E, o que mais revoltante,  impunemente, afinal, são mais de cinco mil e quinhentos municípios e apenas uma parcela ínfima, insignificante, é rigorosamente fiscalizada. E eles sabem disso, por isso arriscam, pois a possibilidade de vir a ser fiscalizados é uma em cinco mil.

O templo e os oportunistas

Uma leitora da Folha de São Paulo, no Painel do Leitor, dizendo se negar a sair à ruas, para novas manifestações, como propôs Elie Gaspari, a propósito da mais uma presepada de Renan Calheiros, aproveita o ensejo para lembrar ao colunista, que os políticos não são os únicos desonestos, ao tempo em que narra que, estando numa igreja e tendo esquecido o seu aparelho de telefone celular no local onde estava sentada, ao retornar, o mesmo já tinha sido subtraído, provavelmente por um fiel que estava rezando e condenando os que agem como Renan Calheiros.

Não deixa de ter razão a leitora. Aliás, ela tem muita razão. É muito estranho mesmo que as pessoas condenam as ações ilícitas dos políticos, para, na primeira oportunidade, fazerem exatamente a mesma coisa. Aliás, essa tem sido a minha cantilena. Tenho dito, nesse sentido, que só pode se arvorar de honesto quem, tendo a oportunidade de praticar uma ilegalidade ou um desvio de conduta, não o faça.

Eu, confesso, conheço pessoas, sim, que invocam a todo momento a palavra de Deus, que são assíduas nos templos religiosos, as quais, no entanto, levam uma vida dissoluta, não respeitam pai, mãe, filhos, amigos e quem mais possa cruzar o seu caminho, e não perdem a oportunidade de fazer uma bandalheira.

A leitora, nesse sentido, tem razão, sim, de condenar a ação de seu ou sua colega de templo, pois num ambiente desses é onde menos se espera que as pessoas sejam capazes de fazer o mal a alguém ou de dilapidarem o patrimônio alheio, ainda que se possa argumentar que, por se tratar de bem perdido, não restasse tipificado nenhum tipo de crime.

O reverso da medalha

thDizem que o que o Brasil tem de melhor é a sua gente; e não tenho dúvidas. O povo brasileiro é mesmo um povo bom. Nós somos, sim, solidários na dor. Estamos disponíveis para ajudar um amigo, um vizinho ou um parente nas suas dificuldades.

Mas nessa constatação há algo que me inquieta, porque parece contrariar a máxima acima: por que, no mundo da política, preponderam os malfeitores, os crápulas e oportunistas?

Acho que não preciso sequer citar exemplos, nominar pessoas. Está tudo aí, à vista de todos, claro como a luz solar. Todos vemos. Todos testemunhamos. Só não vê quem não quer ver.

Em situações recentes e extremas a diferença abissal entre povo e classe política/dirigente se mostra por inteiro. Agora mesmo, vejo, na Folha de S. Paulo, que a presidente Dilma vai liberar recursos, sem projetos, para que os prefeitos possam enfrentar as consequências das chuvas no Espírito Santo.

Até aí, nada demais! Tudo que puder ser feito para minimizar a dor das vítimas deve ser feito mesmo. E a burocracia emperra mesmo; atrapalha, muitas vezes.

Palmas, pois, para presidente, para sua sensibilidade.

Acontece que a própria presidente admite que o óbvio pode ocorrer, ou seja, os recursos podem ser desviados. Todavia, ainda assim, vai liberá-los, e seja o que Deus quiser. E esse temor não é infundado, devo dizer. Assim é que o que a presidente imagina uma  possibilidade, eu tenho como certeza.

Vai acontecer, sim, o que todos tememos, mas entrevemos: os recursos serão mesmo desviados, afinal, eles não têm consciência, não têm pena do miserável. O que puderem levar para os bolsos, levarão, sem o menor constrangimento. Depois, é só esperar o próximo verão, que tudo se repetirá.

No outro extremo, a reafirmar  que o povo brasileiro é um povo bom, vejo o exemplo da balconista Marineia Rodrigues de Coura Dominici e do seu marido Rui Dominici. Eles perderam tudo que construíram, nos 21 anos de casos,  para as chuvas.

Mas não ficaram chorando pelos cantos, lamentando o revés, o que seria mais que natural e justificado. Mas não! Eles se juntaram aos voluntários e estão ajudando as demais vítimas das chuvas, aqueles que, na compreensão deles, estão pior que eles.

Este é um belo e eloquente exemplo de que o povo brasileiro é mesmo um povo bom; aquele, é o reverso da medalha. É o exemplo do Brasil crápula, bandido, oportunista e insensível. É a prova provada de que os homens públicos brasileiros, de regra, veem o próprio umbigo como o centro do universo.

E o resto? Bem, para eles, o resto é resto, e nada mais.

É isso.

Eleitor sem independência

No início da República, sabemos, várias oligarquias se perpetuaram Brasil. Só para ficar num exemplo mais luminoso, Borges de Medeiros, discípulo de Júlio de Castilhos, ficou no poder, no Rio Grande do Sul, por longos 25 anos. Nesse período, constam dos manuais, a fraude eleitoral permeava, definitivamente, as eleições, cujos resultados, obviamente, não retratavam a vontade dos eleitores. Dizem os experts que isso ocorria em face da falta de independência do eleitor, que terminava por votar de acordo com a vontade do “coronel” de plantão; ademais porque  porque o voto era dado a descoberto.

O tempo passou e, ao que vejo, com os olhos voltados para o longínquo ano de 1889, ano da proclamação da República, e para os dias presentes,  pouco mudou no que se refere à independência do eleitor, conquanto tenhamos evoluído para o voto secreto – que, de rigor, não é tão secreto assim, em determinadas circunstâncias.

A verdade é que onde a miséria e o analfabetismo imperam o eleitor –  nos dias de hoje, como no passado – não tem independência. O eleitor, essa é a triste conclusão,  ainda vota premido pelas circunstâncias, daí a minha a constatação de que o voto não é tão  independente como se deseja fazer crer, até mesmo para legitimar o resultado das eleições.

Tendo dito, sem nenhum receio, que enquanto eleitor viver de pequenos favores de algumas lideranças municipais, muitas delas forjadas em face da omissão do Estado, ele, eleitor, continuará votando sem consciência e sem independência, pois o faz apenas em retribuição à ação de quem, numa hora de dificuldades, soube ser solidário com ele.

Tenho para mim que se ao eleitor fossem dadas as mínimas condições, por exemplo, de acesso a uma educação de qualidade  ou se a ele fosse dado condições de acesso a um serviço público que atendesse às suas mínimas necessidade,  ele, eleitor, teria sim condições de decidir acerca do seu voto.

O eleitor, entrementes, que procura o serviço público e não é atendido normalmente, se vê  obrigado a se submeter aos favores dos detentores do poder, que, em troca, exigem fidelidade; e fidelidade, nesse caso, quer dizer, falta de independência para votar.

Vamos a um exemplo prático. O cidadão procura um centro de saúde, mantido pelo poder público, e não recebe atendimento. Diante dessa situação, é obrigado a procurar o médico da cidade, que, não por acaso, é também um líder político. Esse médico o atende com a devida atenção. Pronto! Esse  eleitor, estou certo,  jamais esquecerá o favor, e ficará grato para o resto da vida; gratidão que, como sói ocorrer, retira a sua independência na hora de votar. Ele, doravante, não mais será dono do seu voto; será, para sempre, grato ao médico que lhe socorreu numa hora de aflição.

Poderia aqui citar incontáveis outras situações proporcionadas pela omissão do  Estado, a retirar a  independência do eleitor. Vou deixar de fazê-lo porque desnecessárias e também porque qualquer uma pessoa que tenha o mínimo de bom senso saberá identificar tais situações.

A conclusão a que se pode chegar é que, como no início da República, a situação do eleitor, no que se refere à sua independência, não mudou muito.

Problema de gestão

“Do ponto de vista prático, o novo CPC não vai alterar nada”

Por Elton Bezerra

Divulgado pelos deputados como uma espécie de acelerador dos processos judiciais, o novo Código de Processo Civil não mudará a marcha da Justiça no país. A afirmação é do advogado e professor titular de Direito Processual Civil da USP José Rogério Cruz e Tucci. “O novo CPC não vai alterar nada. A distribuição de justiça vai continuar como está. O problema da demora do processo não é de legislação, é de gestão”, afirma.

Para Tucci, um exemplo acabado de falta de planejamento está no Processo Judicial Eletrônico. Como o Conselho Nacional de Justiça estuda unificar os sistemas de todos os tribunais, algumas cortes que já têm seus programas desenvolvidos temem ter de dar um “reset” e começar tudo do zero, com mais custos. “Isso é falta de planejamento”, resume.

Em seu escritório, ele afirma que tem de colocar mais pessoas para transmitir um documento do que para confeccionar uma peça processual. “É um verdadeiro drama”, desabafou. Para Tucci, um dos problemas no sistema do Tribunal de Justiça de São Paulo está na pesquisa de precedentes. “É horrível”, diz. “Pesquise, por exemplo, o vocábulo ‘responsabilidade’. Aparecem todos os julgados com palavras assemelhadas, tornando-se absolutamente confuso o resultado.”

Apesar das críticas ao novo CPC, Tucci vê com bons olhos o incidente de demandas repetitivas. “O juiz tem que se curvar àquilo que o tribunal, em causas idênticas, já decidiu”.

Integrante da Comissão de Juristas para a reforma da Lei de Arbitragem, defende ampliar a aplicação do instituto para relações de trabalho, consumo e nos contratos da administração pública. Algumas exigências, contudo, devem ser respeitadas.

No caso das relações de trabalho, apenas em contratos de altos funcionários das empresas, como diretores estatutários ou equivalentes. “Um CEO, ou uma pessoa que tenha condições de se submeter a uma arbitragem, no âmbito dos contratos individuais de trabalho.”

Nas relações de consumo, para compras de bens ou serviços de elevado valor. “Evidente que não é na compra de um liquidificador. Nós estamos falando de um consumidor que comprou um avião”, exemplifica.

Já os contratos da administração pública devem ser transparentes, mesmo a arbitragem sendo caracterizada pela confidencialdiade. “Na esfera da Administração Pública, a transparência é inarredável”.

O professor falou também da carreira docência. Mesmo dando aulas em uma das faculdades mais tradicionais e concorridas do país, diz que os alunos estão chegando com um formação deficiente. “Os alunos de 5º ano, em geral, não têm atingido um grau de dedicação que se espera”, lamenta. Bem-houmorado, defende que o estudante faça estágio apenas quando estiver na metade do curso. “A partir do 3º ano ele já tem condição de saber onde se localiza a Praça da Sé ou o Fórum João Mendes” diz, rindo.

Leia entrevista no Consultor Jurídico

Heróis esquecidos

Há muitas pessoas, algumas até muito próximas, que, até hoje, não engolem o meu discurso de posse. Por causa dele, nunca me perdoaram. Sei disso. Sinto isso.

Desde o discurso – ou mesmo antes deles, por eu ser uma pessoa muito convicta na defesa das minhas ideias – atraí a antipatia de muitos.

Eu sei perfeitamente disso. Eu sinto isso. Eu respiro isso. Sei que não foi fácil assimilar a minha, digamos, ousadia. É que, sem que as pessoas tenham sofrido na carreira os reveses que sofri, elas jamais compreenderão as razões que me levaram a fazer aquele discurso. Todavia, espero que tenham percebido, não ataquei ninguém. Fiz um discurso limpo, me limitando a narrar fatos. Nada mais que isso.

O certo é que, se é verdade que muitos não engolem a minha ousadia, consegui, sem perceber, galvanizar a simpatia de parte da população. Por todos os lugares por onde ando tenho sido bem recebido, e há sempre alguém a dizer que me admira, que gosta do meu trabalho e que sou um cidadão respeitado.

Que bom que seja assim! É bom, sim, ser reconhecido, ser respeitado, considerado…

Mas, atenção!, eu não sou herói. Não nasci pra ser herói.

Digo isso porque, desde que cheguei ao Tribunal, tenho recebido cartas anônimas, denunciando pessoas importantes, e pedindo providências. E muitos são os que dizem que fazem isso porque confiam em mim. Há muitos que, inclusive, fazem menção ao meu discurso de posse, porque a partir dele teria nascido a admiração.

Contudo, repito: não sou herói e não sou inconsequente. Eu jamais adotarei qualquer providência, contra quem quer que seja, sem que a denúncia se apresente com pelo menos indícios da prática de um crime ou de um ilícito administrativo, e com a identificação do seu autor.

Dizem, jocosamente, que o inferno está cheio de bem-intencionados e de heróis. Eu não pretendo me juntar aos heróis inconsequentes.

Por falar em herói, pergunto se algum dos senhores já ouviu falar do Marechal Carlos Machado Bittencourt?

Pois saiba que Carlos Machado Bittencourt, em 1897, evitou que o presidente Prudente de Morais fosse assassinado, se interpondo entre ele e seu algoz, Marcelino Bispo. Resultado, recebeu as facadas que se destinavam a Prudente de Morais, morrendo em seguida.

Carlos Machado Bittencourt, como se vê, é mais um daqueles heróis que sucumbem e sobre o qual a história silencia.

Definitivamente, não tenho vocação suicida.

É isso.