Sentença condenatória com reflexões sobre a pena privativa de liberdade

Cuida-se de sentença condenatória, na qual, em determinada passagem, refleti acerca da prisão, nos termos abaixo:

  1. Consignei acima que, em face da criminalidade violenta e grave, a resposta estatal, concluído ter o acusado praticado o crime, em processo regular, com observância de todas as franquias legais, é a prisão; prisão que, em nosso país, não é exagero dizer, equivale às enxovias e as masmorras de triste memória, de onde os acusados saem aviltados e, quase sempre, piores do quando entraram. É que, como bem afirmou EVANDRO LINS E SILVA, “a prisão não regenera nem ressocializa ninguém; perverte, deforma, avilta, embrutece, é uma fábrica de reincidência, é uma universidade às avessas onde se diploma o profissional do crime.”
  2. HELENO CLÁUDIO FRAGOSO, a propósito, afirmou que “Como instituição total a prisão necessariamente deforma a personalidade, ajustando-se à subcultura prisional(prisonização). O problema da prisão é a própria prisão…Aos efeitos comuns a todas as prisões, somam-se os que são comuns nas nossas: superpopulação, ociosidade e promiscuidade.”
  3. O mesmo autor, na mesma obra, atualizada por FERNANDO FRAGOSO, concluiu que “É praticamente impossível alcançar a ressocialização do delinqüente através da pena privativa de liberdade, que funciona realmente como realimentadora do sistema. Por outro lado, verifica-se que o sistema punitivo do estado visa manter a estrutura sócio-econômica e política vigente, com a qual poucos estão satisfeitos. É inegável que a clientela do sistema é constituída pelos pobres e desfavorecidos.”
  4. O penitenciarista ROBERTO LYRA, a propósito da prisão, afirmou que ” A pedagogia, a medicina, a psicologia, a economia, a política, até a própria moral, já não admitem discussão sobre a monstruosidade antinatural, antiindividual e anti-social, de prender, isolar, segregar. É pior do que eliminar e transportar.”

Noutro fragmento refleti acerca da  condição de  ser humano do julgador:

  1. O Juiz, não se pode olvidar, vive na mesma comunidade onde se deu o conflito que se lhe coloca às mãos para solucionar, com a responsabilidade de, se necessário, infligir pena ao infrator; encarcerando-o, quando não lhe resta outra alternativa.
  2. O Juiz é um cidadão e um ser humano como os muitos que tem que julgar. Muitas vezes cheio de complexos e falível como o réu que se posta à sua frente.
  3. Apesar de tudo que se exige de um juiz, ele não e outra coisa que não um ser humano, sujeito a erros e acertos, com os mesmos sentimentos que afloram nos seus jurisdicionados. Não é melhor e nem pior que ninguém. Daí ter afirmado FRANCESCO CARNELUTTI , com acerto, que ” a justiça humana não pode ser senão uma justiça parcial; a sua humanidade não pode senão resolver-se na sua parcialidade. Tudo aquilo que se pode é buscar diminuir esta parcialidade. O problema do direito e o problema do juiz é uma coisa só. Como pode fazer o juiz ser melhor daquilo que é? A única via que lhe é aberta a tal fim é aquela de sentir sua miséria: precisa sentirem-se pequenos para serem grandes. Precisa forjar-se uma alma de criança para poder entrar no reino dos céus. Precisa a cada dia mais recuperar o dom da maravilha. Precisa, cada manhã, assistir com a mais profunda emoção ao surgir do sol e, a cada tarde, ao seu ocaso. Precisa, cada noite, sentir-se humilhado ante a infinita beleza do céu estrelado. Precisa permanecer atônito ao perfume de um jasmim ou ao conto de um rouxinol. Precisa cair de joelho frente a cada manifestação desse indecifrável prodígio, que é a vida.”

A seguir, a sentença, por inteiro.

Continue lendo “Sentença condenatória com reflexões sobre a pena privativa de liberdade”

Desprezando promoção a qualquer custo

Muitos pensam que juiz vive em função de ser promovido para a segunda instância. Muitos não sabem, no entanto, que há magistrados que não vivem em função de promoção.

Para desmistificar essa falsa impressão,  em 13 de agosto de 2006 publiquei um artigo no qual deixei claro que não trabalho com os olhos voltados para uma promoção.

Em determinado excerto, a propósito, assim me manifestei, verbis:

 

  1. “…Voltando ao tema promoção, devo grafar que não sou dos tais que viva em função dela. Ser ou não ser Desembargador, para mim, não muda nada. Não sou dos tais capazes de qualquer sacrifício pela ascensão. O que almejo mesmo é desempenhar, com honradez, a parcela de poder que já está colocada sobre os meus ombros. Eu tenho a exata dimensão da minha responsabilidade.
  2. O que me afligi não é a perspectiva de não ser promovido. O que me agasta é, por exemplo, não realizar uma audiência, porque não há estrutura para cumprirem-se os mandados. Nesse sentido, alcançasse, amanhã ou depois, uma promoção, uma das minhas frentes de luta seria dar condições de trabalho aos magistrados do primeiro grau, ainda que, para isso, tivesse que renunciar a quaisquer dos privilégios que existem hoje no segundo grau. Entendo, por exemplo, que os carros de representação serviriam muito mais à coletividade se fossem destinados ao cumprimento de mandados judiciais. Não acho justo que se destine um carro para cada juiz de segundo grau, com motorista e combustível, e se negue ao juiz de primeiro grau o direito de realizar as audiências que designou, por falta de transporte para cumprirem-se os mandados. O interesse pessoal não pode se sobrepor ao interesse público.
  3. Decerto essas colocações, que foram feitas apenas a guisa de esclarecimento, inicialmente, e, depois, à guisa de reflexão, ensejarão novos questionamentos acerca de minha promoção. Mas não se preocupem com ela mais do que eu me preocupo. E a minha preocupação é nenhuma.


Noutro fragmento  anotei, litteris:

 

  1. O que me afligi não é a perspectiva de não ser promovido. O que me agasta é, por exemplo, não realizar uma audiência, porque não há estrutura para cumprirem-se os mandados. Nesse sentido, alcançasse, amanhã ou depois, uma promoção, uma das minhas frentes de luta seria dar condições de trabalho aos magistrados do primeiro grau, ainda que, para isso, tivesse que renunciar a quaisquer dos privilégios que existem hoje no segundo grau. Entendo, por exemplo, que os carros de representação serviriam muito mais à coletividade se fossem destinados ao cumprimento de mandados judiciais. Não acho justo que se destine um carro para cada juiz de segundo grau, com motorista e combustível, e se negue ao juiz de primeiro grau o direito de realizar as audiências que designou, por falta de transporte para cumprirem-se os mandados. O interesse pessoal não pode se sobrepor ao interesse público.

 

A seguir, o artigo, com a supressão de passagens entendidas, agora, como irrelevantes. Continue lendo “Desprezando promoção a qualquer custo”

Liberdade provisória. Indeferimento. Abominando o desprezo pela vítima

Cuida-se de pedido de liberdade provisória.

Em determinado excerto, consignei a minha indignação com a concessão indiscriminada de liberdade provisória, como se fosse direito absoluto.

  1. O que tenho visto, ao longo dos meus mais de vinte anos de carreira, é uma excessiva, odiosa passividade, lassidão e acomodação diante dos criminosos mais audaciosos. O que tenho visto – lamentando, estarrecido, estupefato – é que, ao que parece, todos perderam a sensibilidade. Diante do quadro de quase guerra civil que se descortina diante dos nossos olhos, o que tenho assistido é o apego excessivo, obstinado à letra da lei, sem a mais mínima preocupação com os mais lídimos interesses da sociedade. Mata-se, estupra-se, rouba-se, lesiona-se, atenta-se contra o pudor, contra o meio-ambiente, contra a família, contra as instituições, contra a honra, contra a integridade física, contra os costumes, iterativamente, reiteradamente, repetidamente, às escâncaras, às claras, na frente de todos, de cara limpa, sem pudor para – ufa! – , no outro dia, o meliante ser colocado em liberdade, agora de posse de um passaporte, chancelado pelo PODER JUDUCIÁRIO, para matar, roubar, furtar, lesionar, atentar contra o pudor, estuprar, etc, etc, etc. 
  2. Nesses casos, a meu sentir, não se trata de cumprir a lei. É puro descaso, é puro desprezo pela vítima, pela sociedade. Nós não podemos continuar de cócoras diante do criminoso violento e contumaz. Já passamos da hora de endurecer. A vida está aí para ensinar que, muitas vezes, por causa de uma palmada, tem-se desvirtuado o caminho dos filhos. Da mesma sorte, devo dizer, por causa de nossa odiosa passividade, muitos são os meliantes recalcitrantes.
  3. A LIBERDADE PROVISÓRIA não foi pensada para favorecer a quem tem conduta deletéria em sociedade. Já me deparei, muitas vezes, com a concessão, sem compromisso, de LIBERDADE PROVISÓRIA a réus recalcitrantes infratores. Não levo esse pecado para o túmulo, no entanto.

Noutro excerto, refletindo  sobre  a liberdade como direito relativo, observei:

  1. O cerne da liberdade jurídica reside na possibilidade de fazer tudo aquilo que não é proibido pelo próprio ordenamento. A liberdade, por isso, e uma regra que, por ser regra, admite exceção. A liberdade pessoal só se garante se a sua restrição não for necessária ao convívio pacífico e harmonioso entre os indivíduos. O homem tem que ter preservada sua vocação natural para decidir sobre seus rumos e sobre si mesmo, afirmando-se na sociedade em que vive. Mas não pode se sobrepor às regras, não pode ter uma convivência nociva, não pode afrontar a ordem pública, sob pena de se submeter às exceções previstas no próprio ordenamento jurídico. 
  2. A liberdade pessoal stricto sensu, que é o que nos interessa, aqui e agora, consiste propriamente na liberdade física, ou seja, no direito de ir, vir e ficar. O direito à liberdade de locomoção é sagrado e mereceu, por isso, previsão Constitucional( artigo 5º, XV) A Carta Magna garante, pois, a liberdade de locomoção no território nacional, em tempo de paz, estabelecendo, igualmente a previsão, do remédio constitucional do habeas corpus para quem sofrer ou se achar ameaçado de sofrer violência ou coação em sua liberdade de locomoção(artigo 5º, LXVIII) . Nada obstante o regime de liberdades em que vivemos e conquanto a liberdade de locomoção seja direito sagrado e garantido na CF, quem se afasta do imperativos legais, fica submetido à coação do Estado pelo descumprimento dos seus deveres, já que seriam inócuas todas as regras se não se estabelecessem sanções para aqueles que as desrespeitam, lesando direito alheio e colocando em perigo a sociedade.

A seguir, a decisão, integralmente.

Continue lendo “Liberdade provisória. Indeferimento. Abominando o desprezo pela vítima”

Liberdade provisória. Concessão

Incontáveis vezes fui atacado, agredido com palavras, injustificadamente, deselegantemente, por advogados e defensores públicos, à alegação de que não concedo liberdade provisória a roubadores, com o que, segundo eles, estaria afrontando o princípio da presunção de inocência.

A decisão que publico a seguir é uma das muitas provas que tenho de que as acusações são injustas e desequilibradas, pois que, em verdade, cada caso tem merecido de mim tratamento conforme as suas peculiaridades. Não fosse assim, não teria condições de julgar o semelhante.

De se observar na decisão sob retina, com efeito, que, conquanto tenha sido o indiciado preso sob a acusação de ter praticado um assalto, ainda assim, por não vislumbrar no mesmo nenhuma periculosidade, à luz dos dados albergados no caderno administrativo, concedi ao mesmo liberdade provisória.

Em determinado excerto da decisão anotei, verbis:

  1. Pese tudo que já expendi acerca do crime de roubo, malgrado tenha sido o requerente indiciado em crime de roubo duplamente qualificado, creio que, ainda assim, me parece que esteja a merecer a sua LIBERDADE PROVISÓRIA, pois que, a considerar o consolidado em sede administrativa, não se constitui em um perigo iminente à ordem pública – não estava armado ( nem ele, nem seus comparsas), não fez nenhuma ameaça à vítima, nem tampouco praticou contra ela qualquer violência. A considerar, ainda, as provas extrajudiciais, a indiciado, solto, não frustrará a instrução criminal. Não despontam dos autos, enfim, as razões que autorizam a custódia ante tempus, razão pela qual concedo ao indiciado HLLS, excepcionalmente, o favor legis que postula, para que, em liberdade, aguarde o seu processamento e julgamento, sob as cominações legais, tudo de conformidade com o que estabelece o artigo 310, parágrafo único, do Digesto de Processo Penal.

A seguir, a decisão, integralmente.

Continue lendo “Liberdade provisória. Concessão”

Liberdade provisória.Concessão

Na decisão que publico a seguir, busquei como fundamento para decidir, uma decisão exarada em face de um caso similar.
Em determinado excerto da decisão em comento anotei, verbis:

  1. No caso sub examine não há, desde o meu olhar, necessidade de que se submeta o indiciado ao sacrifício de sua liberdade, pois que, ao que dimana da documentação acostada ao pleito, não tem uma vida voltada para prática de crime. A mim me parece, a par das provas documentais ao pleito recostadas, o fato pelo qual se acha o indiciado preso é episódico; não consta que tenha uma vida prenhe de deslizes. Não entrevejo, por isso, como possa o indiciado, em liberdade, colocar em risco a ordem pública.

A seguir, a decisão, integralmente.

Continue lendo “Liberdade provisória.Concessão”

Princípio da insignificância não se aplica aos atos de improbidade administrativa

Li no site direito do estado que o princípio da insignificância não pode ser aplicado para afastar as condutas judicialmente reconhecidas como ímprobas. O entendimento unânime da Segunda Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) restabelece a condenação de um agente público municipal que utilizou carros e funcionários públicos para fins particulares.

O fato ocorreu em município gaúcho. O Ministério Público do Estado do Rio Grande do Sul (MPRS) entrou com ação civil pública contra o chefe de gabinete do município, que usou carro oficial e o trabalho de três membros da Guarda Municipal para transportar utensílios e bens particulares.

Se a moda pega, muitos “vestais” da moralidade que usam carros oficiais para levar madames ao supermercado ou filhos aos colégios teriam que prestar contas de suas ações junto aos tribunais.

Leia matéria completa aqui http://www.direitodoestado.com/noticias/noticias_detail.asp?cod=7251

Se há consentimento, sexo aos 12 anos não é estupro

Comments(0) Editar

Li no consultor jurídico (http://www.conjur.com.br/2009-fev-04/menina-12-anos-mantinha-relacao-sexual-nao-alegar-estupro):

Se as relações sexuais foram constantes e consentidas, adolescente de 12 anos não pode alegar estupro. Além do mais, a norma que prevê este crime, artigo 224 do Código Penal, é do século passado e não é mais adequada para o atual contexto da sociedade. As conclusões são da 6ª Câmara Criminal do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul, que manteve o entendimento da primeira instância e absolveu o namorado de 20 anos acusado pelo crime.
O desembargador relator, Mario Rocha Lopes Filho, entendeu que as provas são incontestáveis, pois houve diversas relações sexuais entre os jovens. A própria menina admitiu que eram namorados, e havia conhecimento dos pais. Em depoimento, ela não falou sobre coação física ou psicológica.
No TJ-RS, o Ministério Público tentava recorrer da sentença, alegando que houve crime cometido por violência presumida, uma vez que a vítima não possuía condições de “autodeteminação de seu comportamento sexual”. Fato descartado pelo desembargador.
O artigo 224 do Código Penal, que define como violência presumida a relação sexual é uma “norma forjada na década de 40 do século 20; porém não mais adequada à hodierna realidade social”, justificou o relator.
E completou: “entendo que o mesmo paradigma se encontra aplicável ao caso, como perspicazmente entendeu o juízo a quo, porquanto incontroverso que o relacionamento entre o acusado e a vítima era uma relação de namoro e, inclusive, com o assentimento da mãe da vítima e do padrasto.”
A decisão é contrário ao entendimento da 3ª Seção do Superior Tribunal de Justiça. Para os ministros, nos casos de relação sexual com menores de 14 anos, mesmo que não sejam virgens, deve ser aplicada a presunção de violência. De acordo com o relator do Eresp 666.474, ministro Napoleão Nunes Maia Filho, nessa faixa etária ainda não há maturidade, nem discernimento necessário para responder por atos dessa natureza, sendo, portanto, irrelevante a anuência da menor.

Uma praga chamada espírito de corpo

Li na folha de São Paulo de hoje (http://www1.folha.uol.com.br/fsp/brasil/fc0402200902.htm):

  1. Um dia após assumir o cargo, o novo corregedor-geral da Câmara, deputado Edmar Moreira (DEM-MG), defendeu ontem o fim do julgamento de parlamentares pela própria Casa da forma como é feito hoje. Moreira, que vai acumular a função de corregedor com a de segundo-vice-presidente, alega que os deputados não têm ‘poder de polícia’ e que o ‘espírito de corpo’ e a ‘fraternidade entre os colegas’ tiram a condição dos deputados de fazerem julgamentos de quebra de decoro”.

Sejamos sinceros, no Poder Judiciário não é diferente. Quando se trata de punir  os seus membros, o que prepondera mesmo – cá como lá –  é o espírito de corpo, a fraternidade, o coleguismo.

Tenho 22 anos de magistratura e nunca testemunhei, no Maranhão, nenhuma punição a qualquer magistrado, por mais graves que sejam as denúncias e por mais graves que sejam as conclusões de uma sindicância.

É em face da ineficiência dos órgãos de controle internos (corregedorias) do Poder Judiciário, a meu sentir, que muitos, aqui e algures, só fazem o que dá na telha. Ninguém tem a mais mínima preocupação com as consequências de uma conduta desviante. E quem ousar agir e pensar de forma diversa, vai apenas criar inimizades dentro da corporação, as quais, decerto, virão, dentre outras conseqüências, em detrimento de sua ascensão profissional.

Quando fui juiz corregedor, ousei propor, por exemplo, o não vitaliciamento de quatro magistrados em estágio probatório. Só eu sei o que sofri – e sofro, até hoje -, em face dessa ousadia. Os magistrados foram vitaliciados e eu constitui quatro inimigos figadais.