D. Pedro I e o Marquês de Paranaguá

 

A historia registra que em 1831, quando foi obrigado a abdicar da Coroa brasileira, D. Pedro I, antes de embarcar no Warspite, navio inglês que o acolheu, recebeu a visita de um ex-ministro, Francisco Vilela, marquês de Paranaguá, que lhe pedia socorro, em face de sua situação financeira precária.

D. Pedro I, com aspereza, disse ao ex-ministro que não podia dele cuidar, que nada podia fazer, porque já estava ajudando muita gente.

Diante dessa inesperada manifestação de D.Pedro, o marquês disse, então, que seria obrigado a voltar a Portugal, onde teria direito a uma pequena aposentadoria, no que foi, mais uma vez, rechaçado por D. Pedro I.

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A falta que o estado faz

Passei os dias de carnaval, como faça há vários anos, em Cururupu. Aproveitei as folias de momo para ler e relaxar – e refletir, ademais. 

O mais significativo, no entanto, não foi ler, relaxar e refletir. O mais importante mesmo foi ter desfrutado, durante sete dias – estou de férias, lembram? – da companhia de minha família, de parentes e amigos.

Estar com a minha família é meu maior prazer. Nada, mas nada mesmo, se compara ao convívio familiar. Viver – e conviver – em família é um bálsamo, uma dádiva, um prazer imensurável.

 

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As autoridades não podem agir como agem os marginais

Tenho dito, iterativamente, que nós, autoridades, não podemos, nunca, sob qualquer pretexto, nos nivelar aos meliantes. Os meliantes, por óbvias razões, não têm compromisso com a lei, com a ordem pública, com a moral, com a ética, com os bons costumes. Nós, diferente deles, assumimos o compromisso de fazer valer a lei. 

Nós, magistrados – sobretudo – temos compromisso com o garantismo penal.Nessa linha de argumentação, devo dizer que extrapola os limites do aceitável o magistrado que, ad exempli, trata o acusado com arrogância, que o intimida na sala de audiências, que o trata com descortesia, que arranca a fórceps uma confissão, que o trata como se marginal fosse – ainda que o seja, ainda que o fosse.

 

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As mentiras que eles contam – III

Vocês ainda se recordam da saia justa que eu colocava os acusados – e os seus advogados – com a indagação acerca do tratamento recebido por eles em sede administrativa. 

Vocês ainda recordam que o meu objetivo era rechaçar a tentativa dos acusados de, em sede judicial, desvalorizar a confissão havida em sede extrajudicial, sabido que ela, de rigor, pode ser buscada para compor o quadro probatório, dependendo, claro, das provas produzidas em juízo, sob o pálio do contraditório e da ampla defesa.

Pois bem. Depois que alguns advogados perceberam as razões que motivavam as minhas indagações acerca do interrogatório extrajudicial, passaram a orientar os acusados a, de logo, no primeiro momento do interrogatório, dizerem que foram torturados e que, por isso, confessaram o crime na sede periférica da persecução.

 

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Apenas um retrato na parede

 

Todos assistimos, estarrecidos, a luta que se trava quando se aproxima – ou mesmo antes – a sucessão nos três Poderes. A luta levada a efeito é renhida e não dispensa expedientes questionáveis, escusos, abomináveis. Pelo Poder (stricto sensu) e em face do poder (lato sensu), mesmo os que posam de vestal saem do prumo – se excedem, não raro. 

A história está prenhe de fatos que corroboram as afirmações supra. Não preciso, pois, citá-los. Muitos são os que descem ao chão, fazem qualquer acordo, negociam a honra, em nome do poder . Isso é fato.

Estou a cavaleiro na análise dessa questão, porque nunca fui de lutar pelo poder a qualquer custo, sob quaisquer condições, encilhando qualquer tipo de arma. 

 

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Uma viagem fantástica

Todos dizem – e, por isso, não devo duvidar – que eu deveria ser mais simpático nas minhas relações. Há quem diga que a minha maneira ermitão de ser me apresenta arrogante aos olhos dos desavisados. 

Diante dessa avaliação que fazem de mim eu peço apenas um pouco de tolerância. Acho que não sou exageradamente assim. Tudo depende do lugar em que me encontra e das pessoas com as quais convivo.

Vou narrar um fato que, decerto, demonstrará que sou vítima de uma análise exacerbada da minha maneira de ser, muito embora admita que não sou mesmo muito simpático.

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A necessidade de ser e parecer correto

Sou dos tais que, sem temer parecer pretensioso, faz apologia da retidão. Não sei ser irresoluto quando o assunto é correção profissional. Quem convive comigo sabe que só sei reto. Erro aqui e acolá, peço outras vezes, saio da linha, porque isso é próprio da condição de ser humano. Contudo, sem demora, retomo o curso, procuro redefinir meus conceitos, para voltar ao caminho da retitude. Reconheço que nos dias de hoje ser correto e ter bom caráter parece um pecado, sobretudo em uma corporação. O que, outrora, era apanágio de qualquer homem de bem, nos dias de hoje, imperando a esperteza, é, às vezes, um pecado. Por ser – e parecer – correto é que, não raro, o detentor de tal predicado é visto como um perigo a ser evitado, um estropício a ser defenestrado. É arrogante e prepotente. Por ser – e parecer – correto tenho enfrentado, não raro, a ira dos que não suportam a inteireza e odeiam a probidade. Hodiernamente, ser reto, incitar e estimular a franqueza e a lealdade no trato com o semelhante, no desempenho do seu mister, passou a ser um equívoco.

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A clientela do direito penal e o princípio da isonomia

É do conhecimento de quem milita na área criminal – Delegados, Promotores, Juizes, Agentes de Polícia, Policial Militar, etc – que o sistema penal seleciona os setores que deva alcançar. O Direito Penal, com efeito, fez uma flagrante e discriminatória opção pelos pobres, a quem se destina, prioritariamente, a persecução criminal, conquanto a lei penal, em tese, tenha como destinatários todos os súditos, desde que não sejam inimputáveis. A lei penal, ensina a melhor doutrina, “ se destina a todas as pessoas que vivem sob a jurisdição do estado brasileiro, estejam no território nacional ou estrangeiro” 1, mas, na prática, alcança somente os desvalidos, os desprotegidos, os pobres.A norma penal tem valor absoluto e se dirige a todos, o que não significa, reafirmo, que a todos alcance. Esse aspecto, é de relevo que se diga, refoge, muitas vezes, do âmbito de atribuição de um magistrado. Ao magistrado – aquele que só tem compromisso com a sua consciência – se impõe o dever de aplicar a sanção penal ao infrator, indistintamente, seja ele pobre ou rico e ainda que se argumente que esse ou aquele criminoso do colarinho branco permaneça impune, malgrado contumaz agressor da ordem pública.

 

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