Carta do colega Alexandre Lopes

Caro amigo José Luís,

“Ao ler alguns de seus textos veio-me a satisfação de saber que mais alguém comunga com meu incorformismo em relação à situação de inércia que se fixa à imagem do Judiciário.
Creio que, inspirado em magistrados de seu quilate, muitos de nós estejamos tentando modificar uma imagem que não se afigura a real justiça buscada.
Tenho tido a oportunidade de dizer por aí que, assim como comida para fortificar o organismo; remédios para combater as doenças;o respeito à dignidade, as garantidas dos direitos das pessoas e o alcance da justiça que se busca, é alimento que faz bem ao ser humano, à sua alma, dando-lhe forças para a vida.
Continue com seu trabalho e tenha sempre a certeza de minha admiração.
Alexandre Abreu
Juiz da 1ª Vara de Coroatá”

Fique certo, colega, que vou continuar lutando. Não sou de desistir. Tenho esperança de poder, com juízes do seu nível, ajudar a construir um Poder Judiciário que atenda aos anseios da coletividade.
Por mais que queiram, fique certo, não vão conseguir descontruir a sua imagem como magistrado e homem.
No mundo em que vivemos, em que preponderam a esperteza e falcatrua, somos vistos como obstáculo a ser defenestrado. Mas nem você e nem eu somos de sucumbir diante do primeiro embate.
Vamos em frente, porque se nossas ações não forem capazes de molificar o coração emperdenido dos homens públicos do nosso Estado, que se só defendem os seus próprios interesses, servirão, não tenho dúvidas, para pavimentar o caminho da honradez aos nossos filhos.

 

O dia-a-dia de um magistrado

CAPÍTULO VI

Por diversas vezes, estou cansado de dizer, tenho buscado, junto à Corregedoria, solução para a falta de oficial de justiça nesta 7ª Vara Criminal. De lá não consigo nenhuma manifestação. A mim de tem sido dado o silêncio como resposta.
Pese o exposto, vou prosseguir, pois que não sei ficar inerte, ainda que saiba que nada farão para solucionar o problema.
Mais uma semana se vai, sem que eu produza o que estava acostumado a fazer. Os réus continuam sendo libertados, por excesso de prazo.
Ainda recentemente encaminhei mais um ofício à Corregedoria, onde demonstro minha indignação com a falta de providências.
Leia, a seguir, o ofício em comento e tire as suas conclusões.

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O lixo do passado

O autor de “A Cura de Shopenhauer”, Irvin Yalon – mesmo autor de “Quando Nietsche Chorou”, ambos de leitura agradabilíssima – em determinado excerto do best-seller, citando Nietsche , diz que a maior diferença entre o homem e a vaca é que a vaca sabia como existir, como viver sem angústia (isto é, sem medo) no bendito presente, sem o peso do passado e a preocupação com os horrores do futuro. Mas nós, humanos infelizes – prossegue o autor, na esteira do pensamento de Nietsche – , somos tão perseguidos pelo passado e pelo futuro que só podemos passar rapidamente pelo presente. Continue lendo “O lixo do passado”

O dia-a-dia de um magistrado

CAPITULO V
Esta semana, a exemplo das anteriores, parece que, mais uma vez, não se realizarão as audiências; só que, agora, em face da greve dos policiais civis.

Ontem e hoje me limitei a fazer duas sentenças – uma em face de crime de homicídio; a outra em face de um peculato – e a indeferir um pedido de liberdade provisória.

Ontem fui informado da concessão de dois habeas corpus pela 2ª Câmara Criminal. Hoje, já recebi mais dois pedidos de informação em face de mais dois habeas corpus. Provavelmente mais solturas haverá, em face de não ter sido possível concluir várias instruções.

Mas, retornando às duas sentenças, devo fazer algumas observações em face da condenação por crime de peculato.

Pois bem, o acusado foi denunciado em face de ter se apropriado e usado, em proveito próprio, cerca de 18 mil reais do erário público. Finda a instrução, entendi devê-lo condenar, máxime porque ele confessou o crime nas duas fases da persecução. Como fixei a pena no mínimo legal e como o crime não foi praticado com violência contra a pessoa e o acusado é primário e possuidor de bons antecedentes, promovi a substituição da pena privativa de liberdade por prestação de serviços à comunidade.

O que, certamente, causará estranheza, em face dessa decisão, é o fato de o acusado ser condenado pela apropriação de menos de vinte mil reais, quando se sabe que há milhares de pessoas que se apoderaram de valores astronômicos do erário público e permanecem impunes.

Devo dizer, em face desse questionamento, que essa situação me causa revolta. Nada posso fazer, no entanto, pois que, ao que se sabe, a persecução criminal só funciona mesmo em relação aos menos favorecidos. Os órgãos responsáveis pela persecução criminal, no Brasil, só servem para legitimar a ação deletéria de nossa elite, que muito mal tem feito ao país. Mas não posso, por isso, cruzar os braços. O que espero é que, doravante, a persecução criminal não seja discriminatória e a todos, finalmente, alcance.

Não tenho muitas esperanças de que o quadro atual mude a médio prazo. Tenho a esperança, no entanto, que meus bisnetos vivam em um novo país, onde o princípio da igualdade não seja uma quimera, uma fantasia, mera previsão legal.


O magistrado e o transnepotismo

Em artigo publicado neste blog, intitulado A NECESSIDADE DE SER E PARECER CORRETO, consignei que ao magistrado não basta ser honesto; faz-se mister que, também, pareça honesto.O artigo em comento está vazado nos seguintes termos:

  1. “Sou dos tais que faz apologia da retidão. Não sei ser irresoluto quando o assunto é correção profissional. Quem convive comigo sabe que só sei reto. Erro aqui e acolá, peco outras vezes, saio da linha, porque isso é próprio da condição de ser humano. Contudo, sem demora, retomo o curso, procuro redefinir meus conceitos, para voltar ao caminho da retitude. Reconheço que nos dias de hoje ser correto e ter bom caráter parece um pecado, sobretudo em uma corporação. O que, outrora, era apanágio de qualquer homem de bem, nos dias de hoje, imperando a esperteza, é, às vezes, um pecado. Por ser e parecer correto é que, não raro, o detentor de tal predicado é visto como um perigo a ser evitado, um estropício a ser defenestrado. É arrogante e prepotente.Por ser e parecer correto tenho enfrentado, não raro, a ira dos que não suportam a inteireza e odeiam a probidade. Hodiernamente, ser reto, incitar e estimular a franqueza e a lealdade no trato com o semelhante, no desempenho do seu mister, passou a ser um pecado.Apesar de tudo, apesar das incompreensões, entendo que ao magistrado importa ser e parecer honesto. É dever do magistrado seguir a trilha dos inconcussos e briosos, sendo e parecendo probo, pouco importando se será, ou não, recompensado com uma promoção. O juiz que trabalha com os olhos numa eventual promoção é carreirista e não merece o respeito dos seus pares. O carreirista não tem escrúpulo. Tudo é capaz de fazer se a condição for a sua promoção.Ao magistrado não basta ser. É preciso, repito, parecer honesto. A meu aviso, não parece pundonoroso o magistrado que ostenta vida social além de suas poses. Não parece decoroso o magistrado que ostenta padrão de vida superior ao que lhe podem proporcionar os seus ganhos mensais. Não parece honrado quem, tendo assumido o cargo pobre, exibi patrimônio incompatível com a sua renda mensal, sem ter como explicar a origem de sua fortuna. Não faz bem à magistratura quem é alvo de comentários maliciosos nos quatro cantos da Comarca onde trabalha. Esse pode ser honesto, mas não parece. Não honra o cargo e nem parece reto o magistrado que não cumpre horário, que só despacha quando instado pelas partes, que só impulsiona o processo diante do queixume dos advogados, que precisa de estímulo material para decidir. Não é e nem parece honesto o magistrado que pouco ou nada produz. Não é e nem parece probo o magistrado que recebe do Estado sem a necessária contra-partida. Não parece honesto o magistrado que só permanece dois dias da semana em sua comarca.Do magistrado se exigi muito mais. O magistrado tem que ser e parecer honesto”

Pois bem. Ouço falar, nos quatro cantos da cidade, que há magistrados – segundo os comentários, do segundo grau – que estão fazendo troca de parentes com outros poderes, para burlar a regra antinepotismo. Os jornais nominaram essa troca com o neologismo “transnepotismo”.
Custo a crer que isso possa ser verdade. Mas, admitindo sê-lo, resta indagar: é correta essa atitude? A considerar a verossimilhança da informação, o magistrado que assim age é digno do cargo que exerce? Qual a independência que tem o magistrado que se submete a essa ignomínia? Que moral tem o magistrado que assim procede para julgar um jurisdicionadoO magistrado que usa esse expediente é correto? Parece ser correto? É honesto? Parece ser honesto?
Incentivo a quem tiver ciência dessa excrescência, que a denuncie ao Conselho Nacional de Justiça.

O dia-a-dia de um magistrado

CAPÍTULO IV

Não tem sido fácil trabalhar no Poder Judiciário do Maranhão. Cada dia me impressiona mais a falta de espírito público dos homens que dirigem o nosso Tribunal. As mínimas pendências não são resolvidas; as mínimas providências não são tomadas. Os banheiros do Fórum , por exemplo, estão todos podres, por faltar zelador. O anexo do Fórum foi iniciado e parou, por falta de regularização do terreno. Estou háa três dias precisando tirar umas fotocópias e as máquinas não funcionam. Os oficiais de justiça estão se sentindo no direito de boicotar o meu trabalho, porque me insurgi contra a Central de Mandados. Os oficiais de justiça não têm carros pra cumprir diligências. Enquanto isso, inexplicavelmente, os Desembargadores têm carros e combustíveis. Já sugeri que comprassem pelo menos motos para facilitar o trabalho dos oficiais de justiça. Não deram bolas para a sugestão. Os processos estão se avolumando e não consigo concluir uma instrução. É uma pena que muitos só se sensibilizam quando, precisando da Justiça, se dão conta de que ela não funciona. Hoje não fiz audiências. Ontem, com os novos juizes para assistirem audiência, também não houve audiências. E assim vamos levando – na marra. Fingindo que estamos sendo úteis.
No dia de hoje recebi uma senhora, encaminhada por uma amiga, para ajudá-la a resolver uma pendência que a Defensoria Pública não podia resolver antes de setembro. Essa é apenas mais uma pessoa da comunidade que, ao precisar do Poder Judiciário e das instituições essenciais, constata que as coisas não funcionam. É uma pena!
As pessoas, descrentes, começam a fazer justiça com as próprias mãos. Incontáveis têm sido os episódios em que a própria comunidade prende o ladrão e ainda lhe espanca. É que as pessoas cansaram de esperar. Já não confiam em nossas instituições.
Gastamos papel, energia, cafezinho, água, tempo e outras coisas mais e nada produzimos. A máquina judiciária está emperrada, sobrecarregada de processos e os magistrados sem condições de trabalhar.
Até quando vai durar esse quadro? Será que estão esperando que o povo vá às ruas para reivindicar os seus direitos?
Não se iluda, cara leitor, o Poder Judiciário, como está, não passa de uma ilusão. Já coloquei em liberdade vários acusados nos últimos dias, por excesso de prazo. E continuo sem condições de trabalho. E ninguém ouve as minhas reclamações.
Seria uma boa providência uma manifestação de todos os juizes, no sentido de que o Tribunal abdicasse dos carros de representação e os destinassem aos oficiais de justiça. Sem a ação eficaz dos oficiais de justiça, que são os que cumprem as determinações judiciais, qualquer esforço será em vão.
Vou aproveitar esse espaço para relatar um episódio ocorrido hoje e que traduz, com todas as letras, o que representa , para todos nós, a negligência das autoridades.
Pois bem. Hoje, pela manhã, tive uma conversa séria com o oficial de justiça da vara, em face de sua negligência no cumprimento dos mandados. Dele ouvi, estupefato, que os seus colegas o incentivam a não cumprir os mandados, para que eu não trabalhe. Sabem por que eles pretendem boicotar o meu trabalho? Tão somente porque eu fui a primeira voz que se levantou contra a Central de Mandados, que era um sonho deles, mas que não funcionava a contento.
Veja, caro leitor, a que nível de intolerância chegamos. Tudo isso, a meu sentir, decorre da falta de postura dos nossos dirigentes. Ou se adota uma medida de força, ou, logo, logo, o boicote que hoje se destina a mim, se estenderá a outros juízes.
O mais escabroso em tudo isso é que os oficiais de justiça pensam que estão prejudicando a mim, quando, em verdade, estão prejudicando a toda uma coletividade. Cadê os espírito público desses homens?
Esquecem os senhores oficiais de justiça que a próxima vítima de uma violência pode ser um deles ou um parente seu. Nesse dia eles saberão o mal que têm feito à coletividade.
Do mesmo oficial de justiça ouvi que nenhum dos atuais oficiais de justiça aceita trabalhar na sétima vara criminal, porque me tem como inimigo deles, apenas porque, repito, me insurgi contra a Central de Mandados. Esquecem eles que, depois de mim, todos os juízes se insurgiram, também, contra a mesma Central, por concluírem que, como estava, não funcionava.
Hoje, pela manhã, noticiei esse fato gravíssimo ao Diretor do Fórum. Ele me pediu para fazê-lo por escrito. O farei, na segunda-feira.
Essa é a vida de um juiz que só quer trabalhar. Nada mais que isso.

O momento da consumação do crime de roubo-visão doutrinária e jurisprudencial.

Sumário – I.Crime, no plano material – II. O crime de roubo – III.A conduta, o objeto material e o sujeito ativo do crime de roubo- IV.O elemento subjetivo do crime de roubo – V.O ato humano e a violação da norma jurídica- VI.A conduta criminosa e a repercussão externa da vontade – VII. O preceito sancionador – VIII. O crime tentado e consumado – IX. A consumação do crime de roubo – X. A consumação do crime de roubo, segundo os exegetas – XI. A consumação do crime de roubo, segundo os Tribunais – XII.Conclusão.

I-CRIME NO PLANO MATERIAL

Crime, no plano material, se define como a violação de bem jurídico penalmente tutelado; violação que se dá através da conduta de um homem que vem definida e configurada no preceito primário da norma penal. Definição necessária em face do princípio da legalidade dos crimes e das penas que impede que existam ações ou comportamentos do homem, relevantes para o Direito Penal, sem prévia descrição legal. Continue lendo “O momento da consumação do crime de roubo-visão doutrinária e jurisprudencial.”