Juízes do Maranhão são investigados por liberar multas

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Reportagem da Folha de S.Paulo informa que a Corregedoria do Tribunal de Justiça do Maranhão ordenou a abertura de processos administrativos disciplinares contra sete juízes que atuam em 4 das 9 varas cíveis de São Luís (MA). Na maioria dos casos investigados, os juízes aplicaram multas contra bancos e fundos de pensão por supostas decisões não cumpridas, bloquearam o dinheiro nas contas dos réus e, em seguida, liberaram os recursos sem que o beneficiado pela decisão apresentasse “caução idônea” — garantia de que, caso perdesse o processo, pudesse restituir os valores.

Levantamento do jornal, a partir das 134 páginas do relatório final da correição feita pela Corregedoria entre janeiro e fevereiro últimos, apontou o pagamento de R$ 38,4 milhões em 27 ações judiciais do gênero. Ao liberar o dinheiro, os juízes costumam exigir, como caução, notas promissórias (documentos pelos quais a pessoa se compromete a pagar determinado valor). Entre os casos considerados suspeitos há seis pessoas que obtiveram tais indenizações milionárias e atuavam por meio da justiça gratuita, o que, para os corregedores, configura “estado legal de pobreza”, ou seja, não teriam condições financeiras de dar nenhuma garantia.

Treze juízes coordenados pelo corregedor Jamil de Miranda Gedeon Neto investigaram, por amostragem, cerca de 12 mil processos que tramitavam nas 2ª, 3ª, 5ª, 6ª, 7ª e 8ª varas. Não foram apontados problemas na 3ª e na 8ª varas. A maioria das irregularidades foi detectada em processos que envolviam altas somas, penhoras online e saques em espécie.

De acordo com a Corregedoria, foram abertos oito processos disciplinares, sendo um para cada juiz e um para apurar indícios de fraudes na distribuição de ações — em vez de passarem pelo sorteio eletrônico, 14 processos foram enviados indevidamente aos juízes.


Aposentadoria


Um dos casos investigados envolve o pagamento de R$ 2,99 milhões na 6ª vara cível. Em um período de seis dias em dezembro passado, o juiz Abrahão Lincoln Sauáia bloqueou R$ 2,99 milhões da conta da Funcef, o fundo de previdência dos funcionários da Caixa Econômica, transferiu o dinheiro para a conta bancária da vara e autorizou o saque, em espécie, pelo advogado do bancário José Antônio Ibiapina Mendonça, que alegava perdas no cálculo de sua aposentadoria.

O dinheiro foi retirado pelo advogado Gilliano Nascimento Cutrim, sobrinho do presidente do Tribunal de Justiça do Maranhão, Raimundo Cutrim, e filho do vice-presidente do TCE (Tribunal de Contas do Estado), Edmar Cutrim.

A ordem foi depois revista, após a Funcef ter entrado com recurso no TJ. Em fevereiro, o juiz que então respondia pela vara, Vicente de Paula Gomes de Castro, exigiu de Mendonça a devolução do dinheiro, num prazo de 24 horas, sob pena de prisão. A ordem, até agora, foi inócua.

Cutrim disse ao TJ ter entregue cerca de R$ 2,39 milhões a Mendonça e ter ficado com o resto a título de honorários advocatícios, enquanto Mendonça disse que nada recebeu.

O advogado obteve no TJ uma liminar que cassou multa diária de R$ 5 mil imposta por atraso na devolução, mas permanece a ordem judicial para que devolva o que sacou. O dinheiro nunca voltou à conta da 6ª vara, e advogados da Funcef ainda tentam a restituição.

A Justiça chegou a ordenar uma varredura nas agências bancárias, atrás de contas abertas em nome de Cutrim e de Mendonça. No relatório, a Corregedoria afirma que “merece apuração a conduta do titular, dr. Abrahão [Sauáia], que, depois de declarar findo o processo, com manifestação expressa do autor concordando com a extinção e arquivamento (25/4/2007), em 28/11/2008 “ressuscita” o processo sem maiores justificativas e em prazo recorde, apesar dos anos de existência do processo e centenas de outros aguardando despachos”.

O juiz autorizou o saque sem caução e assim justificou a decisão que ele próprio chamou de “interpretação reversa”: “Exigir-se a prestação de caução para levantamento de valor decorrente de execução definitiva de decisão judicial constitui imposição odiosa e discriminatória, inadmissível no Estado democrático de Direito”.

Outro lado
A Folha também publica que os juízes que foram alvo da Corregedoria do Tribunal de Justiça do Maranhão contestaram as conclusões da correição. O juiz da 6ª vara, Abrahão Lincoln Sauáia, atacou os resultados, mas disse que passou a rever a prática de acolher nota promissória como garantia para a liberação de recursos bloqueados.

“Acho que na medida em que o procedimento que o magistrado adota, mesmo sendo legal, é questionado dessa forma que foi questionado, acho que é hora de, talvez, rever esse posicionamento. (…) Embora esse procedimento seja legal, ele é questionado tão veementemente pelo órgão correicional daqui… Eu até já tenho adotado uma postura diferente, desde essa correição que só tenho aceitado cauções reais”, disse Sauáia, que é juiz há 29 anos.

O juiz defendeu a promissória como caução: “O Código de Processo Civil autoriza. (…) A concessão da justiça gratuita informa que o sujeito não tem condições de pagar as custas, então o próprio Judiciário sustenta, mas não quer dizer que ele não tenha patrimônio para suportar eventual ressarcimento”.

O advogado Gilliano Fred Nascimento Cutrim disse, a respeito do processo pelo qual obteve R$ 2,99 milhões para seu cliente [Antônio Ibiapina Mendonça], que não pode “especificar o que aconteceu com os mesmos [recursos], visto que, após o desconto dos honorários advocatícios, os valores foram repassados ao sr. Ibiapina”.

Cutrim disse que sua família, que possui “vários parentes graduados em direito, magistrados e membros do Ministério Público”, tem “origem humilde, venceu na vida pelo estudo e trabalho” e que ele “jamais se beneficiou de qualquer tipo de parentesco”.

O advogado afirmou que os recursos não foram ainda devolvidos porque a questão está sendo discutida no TJ do Maranhão, onde ele obteve decisão favorável.

O juiz Nemias Nunes Carvalho, da 2ª vara, disse que a questão das cauções já “foi objeto de representação e ficou constatado que não há qualquer ato ilícito de minha parte”. “Isso foi ressuscitado por essa malfadada correição, em boa hora avocada pelo Conselho Nacional de Justiça, pois eu sabia que lá haveria total isenção de ânimo para ser efetuado o julgamento”, afirmou Carvalho.

O juiz disse que não responde mais a procedimento no CNJ. Procurado, o CNJ não confirmou nem contradisse a informação, sob alegação de sigilo nos autos. “Felizmente o conselho não afastou ninguém, o que foi uma frustração para muita gente que tinha esse interesse, e quando mandou instaurar [processo], não mandou contra a minha pessoa”, disse Carvalho.

O juiz Sérgio Antonio Barros Batista, há 20 anos na magistratura, disse que está “tranquilo” sobre as decisões que tomou. “Não tenho nenhum constrangimento. Jamais prejudiquei alguém intencionalmente e as decisões foram tomadas com base em critérios técnicos e jurídicos.” Para ele, a correição cometeu equívocos. “Os homens são capazes de se equivocar, em algum momento, naquele contexto de fazer correição açodada, apressada.” Disse que já esclareceu as acusações.

Procurados, os juízes Douglas Amorim, José de Arimatéia Correia Silva, Luís Carlos Nunes Freire e José Raimundo Sampaio Silva não foram localizados para comentar o assunto, segundo a Folha.

Por que nós, magistrados, somos tão odiados?

Antes do tema para reflexão, uma observação e um apelo.

Meu blog tem sido acessado, mensalmente, por cerca de oito mil internautas. Os internautas, inobstante, quase não deixam comentários. Muitos preferem enviar as suas opiniões para os meus e-mails.

Em face das reflexões que faço a seguir, eu preciso que respondam algumas das indagações que faço, até mesmo para que se possa diagnosticar as razões pelas quais somos tão detestados.

Saber o que pensa o internauto sobre a magistratura do nosso Estado é muito importante, para que possamos reavaliar os nossos conceitos.

Leia, pois, a matéria a seguir publicada e deixe sua opinião.

IMAGEM - JUSTIÇA

Confesso que me preocupa, a quase doer, o ódio, o desprezo que a população parece nutrir pelos magistrados, especialmente pelos desembargadores.

Todas as vezes que se noticia um deslize, uma má conduta, desse ou daquele magistrado, o povo se manifesta, nos mais diversos veículos de comunicação, de forma desrespeitosa, afrontosa, como se fôssemos todos bandidos, gentalha da pior espécie.

Por que será que isso acontece? Afinal, se somos tão relevantes para sociedade, se prestamos um serviço tão singular para a sobrevivência da sociedade, por que nos tratam com tanto desprezo?

Onde erramos? Onde está a nossa omissão? O que podemos fazer para reverter esse quadro?

Acho, sinceramente, que está na hora de nos reunirmos para avaliar essas questões.

Parece-me que precisamos, urgentemente, mudar a nossa imagem junto aos jurisdicionados. Todavia, para mudar o rumo, é preciso perscrutar, ouvir, refletir, reavaliar os nossos conceitos. É necessário, enfim, detetar onde está a nossa falha, qual o nosso pecado.

Precisamos nos reunir, sob a coordenação da Associação dos Magistrados, urgentemente, pra ontem, pra já, agora, sem mais tardança , para lavar a roupa suja, assumir os nossos erros, admitir as nossas omissões, para que voltemos a ser respeitados pela sociedade.

É preciso perquirir, avaliar, com a necessária humildade, por que somos tão pisoteados pela sociedade, para, a partir de um diagnóstico sério, repensar a nossa postura.

Não dá mais para esperar.Precisamos rever as nossas posições, com a necessária humildade.

O que há em nós – volto a indagar, preocupado – que tanto afronta a sociedade,?

Por que, sobretudo os desembargadores, são tão mal falados, são tão odiados?

Por que se diz, com tanta frequencia, com tanto deboche e escárnio, que os desembargadores são privilegiados e, no mesmo passo, despreparados intelectualmente?

Por que se argumenta, com tanta veemência – e maldade – que os desembargadores – assim mesmo, genericamente, sem exceção, o que é um despautério – não sobreviveriam não fosse o seu séquito de assessores?

Isso, para mim, é pura tentativa de diminui-los, exatamente porque são vistos com muita reserva. Agora, por que são vistos com tanta restrição é que são elas.

Volto a indagar: Por que se diz, com tanta sofreguidão, que somos parasitas do estado? Por que não nos respeitam? O que fizemos para merecer esse tratamento, tanta descortesia? Por que nos desprezam? Isso decorreria da ostentação de uns poucos? Será que já não é hora de o carro preto, por exemplo, símbolo de uma ostentação démodé, sair da ribalta?

Por que tantos reclamam, pelos corredores do Forum, da descortesia de determinados magistrados?

Por que se comenta, com tanta sofreguidão, que juiz gosta de humilhar as pessoas, sobretudo os funcionários? Isso é fato ou é ficção?

Nós temos que encontrar respostas, urgentemente, para essas questões.

Nós não podemos mais nos mostrar indiferentes em face do desprezo e do desrespeito com que nos tratam.

A sociedade nos cobra, a nossa consciência exige uma tomada de posição.

Para não ser respeitado, para ser pisoteado, para ser apontado como um marginal togado – ou um togado despreparado -, em face da ação descomprometida de alguns, prefiro sair de cena; antes,porém, concito os colegas a uma profunda reflexão sobre o que acabo de expor – preocupado, muito preocupado.

O perigo de expor o que pensamos

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“Sou duro na queda e vou continuar dizendo o que penso, com responsabilidade e com respeito, para não ferir suscetibilidade, para não macular a honra de ningém. Numa democracia todos têm o direito de pensar e, se for capaz, de traduzir em palavras o que pensa”

Juiz José Luiz Oliveira de Almeida

Titular da 7ª Vara Criminal da Comarca de São Luis, Estado do Maranhão

E fato que nem sempre as pessoas recebem as mensagens que mandamos com o sentido que almejamos. Tenho tido o cuidado, por isso, de, vez por outro, consignar, nas minhas crônicas e nas minhas decisões, que nunca me dirijo a ninguém especificamente, o que não quer dizer que não exista quem, ao lê-las, se imagine sendo retratado nas mesmas.

Na crônica que enviei, hoje, para o Jornal Pequeno, para ser publicada na edição do próximo domingo, dia 25, em determinados excertos refleti:

É mais comum do que se imagina, encontrar um ser humano fantasiado de autoridade, mostrando-se, no mesmo passo, aos olhos dos circunstantes, como apenas mais um bobalhão.

Não é incomum encontrar, encarapitados no poder, tolos que sublimam as virtudes que não têm, para chamar a atenção para suas idiossincrasias, para as suas abomináveis, execráveis fanfarronices.

O mais grave nessa questão é que, por serem tolos, não são capazes de perceber o que todos percebem, ou seja, que não passam de uns babacas, que pensam que têm o talento que não têm.

Conforme tenho constatado, os tolos esquecem que só o cargo, que o poder apenas, a vaidade e a prepotência, jejunas de sensatez e inteligência, não fazem milagres.


Vejam que falo de uma maneira geral, o que não impedirá, no entanto, que existam pessoas que suponham que me dirige a elas, especificamente.

Há algum tempo atrás, numa informação requisitada a mim em face de um habeas corpus, consignei, apenas a guisa de ilustração, que entendia ser condenável que alguém exercesse um cargo público para servir aos parentes e amigos. Pronto! Quase o mundo desabava! Houve que visse nessa minha afirmação uma provocação. Fui representado. Tive que dar explicações.

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Confúcio

Confúcio disse, certa feita:

Quando a ordem perfeita prevalece, o mundo passa a ser como um lar compartilhado por todos. Homens corajosos, valorosos e capazes são eleitos para cargos públicos e conquistam empregos bem remunerados na sociedade. Paz e confiança entre os homens são as máximas da vida. Todos amam e respeitam seus pais e seus filhos, bem como os pais e os filhos alheios. Os velhos são bem cuidados e há empregos para todos. As crianaças recebem alimento e educação. Viúvos, viúvas, deficientes e os que estão sozinhos recebem apoio. Todos têm um papel a cumprir na família e na sociedade. A participação substitui os efeitos do egoísmo e do materialismo, e a devoção ao interesse público não deixa espaço para a inércia. Não se conhecem a desonestidade nem a conivência com a ganância. Não existem vilões, como ladrões e assaltantes. Não é preciso trancar portas, seja dia ou noite. São essas as características de um mundo ideal, o mundo dividido igualmente por todos.

O que disse Confúcio, a primeira vista, é o que todos – a maioria, pelo menos – sonhamos.

Mas os acólitos de Mao, para confundir, deturparam o texto de Confúcio, dando a ele a interpretação que lhes convinham. Diziam, por exemplo, que quando se referia a sociedade perfeita, pretendia mesmo era que as pessoas se comportassem de acordo com certas regras em benefício próprio. Nada mais vago. Mas, ainda assim, interpretação maldosa.

Os críticos argumentavam, ademais, que Confúcio se referia, no texto em comento, prevalentemente, aos homens, esquecendo-se que, segundo a doutrina de Mao, as mulheres eram metade do céu. Mais outra maldade.

Outra crítica: Confúcio, ao falar em ladrões e vilões, não se referia aos governantes, mas aos camponeses e trabalhadores, que mal tinham o que comer e vestir.

Vejam como, com maldade, se pode corromper as idéias das pessoas.

Diante dessa realidade inescapável, sei que, ao escrever – e ao publicar o que escrevo – corro o risco de ser mal interpretado e, quiçá por isso – também – , tenha amealhado tantos desafetos.

Mas não desisto. Sou duro na queda e vou continuar dizendo o que penso, com responsabilidade e com respeito, para não ferir suscetibilidade, para não macular a honra de ninguém.

Numa democracia todos têm o direito de pensa e, se for capaz, de traduzir em palavras o que pensa.

Por que mentem tanto os homens públicos?

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Tem sido recorrente, nas minhas crônicas, manifestações de repúdio aos homens públicos que exercem o poder para dele tirar proveito. É que, todos devem convir, é revoltante alguém assumir o poder e enriquecer com o teu dinheiro, em detrimento da saúde, da educação, da segurança pública, dentre outros serviços essenciais.

Ainda recentemente, no dia 13 de setembro próximo passado, escrevi uma crônica com reflexões, agora, sobre a mentira, para, nela, manifestar, com veemência, todo o meu repúdio em face das mentiras que os homens públicos contam.

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As coisas acontecem, mais ou menos, assim: antes de assumir o poder, muitos são os que dizem abominar a mentira, a desfaçatez, a bandalha. Todavia, no fundo, no fundo, o que estão esperando mesmo é uma oportunidade para, estando no poder, dele tirar proveito. Para alcançar essa finalidade, eles começam por mentir,tripudiar, falsear, enrolar, fingir, etc; depois, é roubar, roubar, roubar.

Quantos homens públicos seriam capazes de provar que o seu patrimônio é compatível com o que ganham?

E por que, sabendo-se de tudo isso, nada acontece?

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A história registra incontáveis episódio nos quais os homens públicos mentem, pelas mais diversas razões.

Lembro, por exemplo, que Nikita Khrushchov, líder da antiga União Soviética, denunciava, em público, os terríveis expurgos que Stalin havia realizado em nome do comunismo. O que se soube, depois, no entanto, é que essa indignação era apenas aparente, pois o próprio Nikita havia tomado parte em muitos desses expurgos.

É, o pequeno camponês, útimo sucessor de Stalin, afável e risonho, não passava mesmo de um grande mentiroso. O consolo, para sua memória, é que ele era apenas mais um homem público mendaz.

Anchova com recheio de camarão

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Não há um só dia que não ocorra um fato inusitado durante a instrução de um determinado processo.

No dia de hoje, acabo de prolatar uma sentença, nos autos do processo nº 63642009, no qual o inusitado ficou por conta do álibi da defesa, articulado pelo advogado de defesa.

O acusado, com efeito, , disse que, no dia e hora do fato, estava em sua residência, assistindo a novela das 08, da rede globo; novela que, sabe-se, termina depois das 22 horas.

Ora, se o crime ocorreu às vinte e uma horas, é cediço que, estando o acusado em sua residência ao tempo do fato, não poderia ter praticado o crime, por lhe faltar o dom da ubiqüidade.

Mas o acusado, para dar sustentação ao álibi, tinha que se valer de uma prova testemunhal.

Para esse fim o acusado arrolou a testemunha Geiza de tal.

A testemunha em comento, no dia designado para o seu depoimento, indagada acerca do paradeiro do acusado, ao tempo do fato, disse, sem titubeio:

– Ele estava em minha casa, pois nesse dia preparei uma janta especial para ele e sua esposa: anchova, com recheio de camarão.

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Mais adiante, indaguei da testemunha a razão da homenagem feita ao acusado e sua esposa, porque antevi que se tratava de uma armação.

A testemunha, em face dessa indagação, respondeu, sem hesitar:

– Não havia nada de especial, Excelência. Eles gostam da minha comida e eu, quando posso, os convido para jantar.

Perceberam a trama?

A afirmação da testemunha não bate com a afirmação do acusado – este, porque disse que, ao tempo do fato, estava em sua residência; aquela por que disse que, ao tempo do fato, o acusado estava na sua casa, degustando uma anchova recheada de camarão.

O que se deu, efetivamente, é que a defesa esqueceu de combinar com a testemunha, que, descuidada, trouxe ao autos um álibi insustentável,

É assim que funciona a Justiça Criminal no dia a dia.

CNJ promove cerco à toga e investigações crescem 653%

Li no Estadão

IMAGEM - JUIZ

O Judiciário brasileiro está em transformação. Criado em 2004, o Conselho Nacional de Justiça começa a vencer a resistência da toga e, neste ano, abriu 113 sindicâncias contra magistrados, ante as 15 de 2008.
Para o aumento de 653%, o órgão adotou até expedientes de polícia, como a análise de patrimônio e movimentação financeira. “Foi proclamada a República no Judiciário”, declara o corregedor nacional, Gilson Dipp, mentor desse novo modus operandi do CNJ.
Há, porém, reações. “Não podemos presumir que todos são salafrários”, reage o ministro do STF Marco Aurélio Mello. Alvo da ofensiva, associações de classe e juízes se unem para resgatar vantagens. E o próprio CNJ é tentado a instituir suas mordomias.
O órgão mergulhou nos presídios e viu, no Espírito Santo, o que há de pior – superlotação, ratos e até jovens em contêineres, os “micro-ondas”. No País, após cumprir pena, 11.337 ainda estavam presos.

    A memória do brasileiro

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    Ivan Lessa (1) disse, certa feita, otimista, que de 15 em 15 anos o brasileiro esquece tudo que aconteceu nos últimos 15 anos.

    Sou menos otimista que ele. Aliás, às vezes tenho sido mesmo é pessimista; pessimista , mas não conformista, registre-se. Acho que o brasileiro não precisa de quinze para esquecer tudo. Aqui no Brasil esquece-se o malfeito dos nossos representantes, por exemplo, em menos de 24(vinte e quatro) horas.

    O brasileiro, como a memória RAM dos computadores, tem a memória volátil, por força das circunstâncias. É só olhar e ver. Com a sucessão de escândalos envolvendo os homens públicos do nosso país, por exemplo, o que se viu – e ouviu – hoje será, inexoravelmente, sobrepujado, esquecido, volatilizado, deletado, para usar uma linguagem moderna, pelo que se verá amanhã. É só esperar. Os escândalos se sucederão, as falcatruas assomarão, e a memória do brasileiro, nesse contexto, se esvai.

    O brasileiro, com tantas noticias veiculadas acerca de bandalheiras dos nossos homens públicos, com tantas notícias sobre violência e tragédias naturais, não tem espaço na memória para armazenar tanta informação negativa.Assim é que umas vão surgindo e, automaticamente, deletamos as armazenadas antes. É por isso que se diz que o brasileiro tem memória curta. Eu diria, condescente, que o brasileiro não tem memória curta. O que o brasileiro tem a memória sobrecarregada de tantas notícias acerca de baandalhas protagonizadas, muitas vezes, por que, tem o dever de combatê-las.


    (1) Ivan Pinheiro Themudo Lessa (São Paulo, 9 de maio de 1935) é um jornalista e escritor brasileiro.Filho da jornalista e cronista Elsie Lessa e do escritor Orígenes Lessa. É bisneto do escritor e gramático Julio Cézar Ribeiro Vaugham, autor, entre outros, do romance naturalista A Carne, além de criador da Bandeira Paulista. Ivan foi editor e um dos principais colaboradores do jornal O Pasquim, onde assinava as seções Gip-Gip-Nheco-Nheco, Fotonovelas e “Os Diários de Londres”, escritos em ‘parceria’ com seu heterônimo Edélsio Tavares. Lessa publicou três livros: Garotos da Fuzarca (contos, 1986), Ivan Vê o Mundo (crônicas, 1999) e O Luar e a Rainha (crônicas, 2005). Ivan Lessa mora em Londres, onde escreve crônicas três vezes por semana para a BBC Brasil.

    Para não esquecer

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    Publico, a seguir, excertos do envolvente – e deprimente – livro Adeus, China – O Último bailarino de Mao (Editora Fundamento,, páginas 73 e 74, 2007), de memórias de Li Cunxin, que saiu da pobreza e da miséria na China de Mao para ser um dos maiores bailarinos do mundo.

    Li Cunxin nasceu em 1961, em Vila Nova, na Comuna de Li, perto da cidade de Qingdao, costa nordeste da China. O sexto de sete filhos em uma família pobre da área rural, Li viu sua vida de camponês na China Comunista de Mao mudar drasticamente quando, aos 11 anos de idade, foi escolhido pelos conselheiros culturais de madame Mao para estudar na Academia de Dança de Pequim. Depois de um curso de verão nos Estados Unidos, para o qual foi um dos dois únicos selecionados, desertou para o Ocidente, tornando-se o primeiro bailarino do Houston Ballet.

    Abaixo o excerto, do qual se extrai quão nefasta pode ser uma ditadura – de direito, de esquerda ou de centro. Pouco importa. Ditadura é ditadura.

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    • “[…]Até o respeitável chefe da vila foi acusado de contra-revolucionário .Eu e meus irmãos vimos quando um grupo de acusados teve de percorrer a vila com pesados quadro-negros pendurados no pescoço e chapéus de papel branco na cabeça. Cada um tinha os crimes anotados a giz no quadro e o nome escrito no chapéu. Deviam ficar de pé sobre uma plataforma armada no centro da praça da comuna e confessar seus crimes à multidão reunida em volta. Fomos lá para olhar. Os oficiais e guardas vermelhos distribuíram folhetos de propaganda. O barulho feito pela multidão era terrível. Usando um megafone, um homem gritava slogans incessantemente. As pessoas riam e zombavam. Durante a confissão, o acusado tinha de baixar a cabeça e se desviar dos objetos contra ele. Cabeça erguida sinal de arrogância, teimosia ou definitiva contaminação pela corrupção capitalista. O acusado nunca estava certo: se falava baixo, era agredido e acusado de esconder alguma coisa; se falava alto, era agredido do mesmo jeito e acusado de “atitude ostensiva típica de latifundiários”. Suas confissões eram quase sempre interrompidas pelo homem do megafone, que gritava slogans revolucionários, como “Derrubem e matem os capitalistas!”, ou “Não permitam a volta de Chiang Kaishek e dos latifundiários”, ou ainda “Não se esqueçam da vida cruel de antigamente e lembrem-se da doce vida da nova China!” E, é claro, havia os intermináveis brados de “Vida longa ao chefe Mao! Vida longa ao chefe Mao!”. Os revolucionários puxavam constantemente a cabeça dos contra-revolucionários para trás, humilhando-os ainda mais. Com isso, às vezes, o chapéu caía, deixando à mostra a cabeça raspada – o que faziam para evitar que fossem puxados pelos cabelos[…]”

    Outro excerto, com a mesma finalidade:

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    • “[…]Durante a Revolução Cultural, assisti a muitos desfiles e reuniões. Os guardas vermelhos diziam estar eliminando os inimigos da classe, o que incluía donos de terras, proprietários de fábricas, homens de negócios bem-sucedidos, membros do Partido Guomindang e oficiais do exército, intelectuais e qualquer um que pudesse representar uma ameaça ao governo comunista. Mas houve uma situação cuja simples lembrança até hoje faz meu coração sangrar. Era um grupo grande. Como sempre, eu e os colegas fomos atrás. Ouvimos o líder comunista ler as sentenças de cerca de quinze donos de terras, proprietários de fábricas e contra-revolucionários. Em seguida, foram todos embarcados em um caminhão. De longe, viam-se os chapéus brancos pontudos com os nomes escritos em tinta preta e riscados por uma grande cruz vermelha. Foram todos levados para um campo nas proximidades. Apesar das recomendações dos adultos, eu e meus colegas seguimos o caminhão, correndo o mais depressa que conseguíamos. Quando chegamos ao local, já encontramos uma multidão alvoroçada, disposta em semicírculo diante dos acusados. Era tanta gente que ninguém nos percebeu agachados, espiando entre as centenas de pernas.Vi homens de pé junto de um barranco. Alguém iniciou um contagem. Dois homens caíram de joelhos. Um deles começou a gritar; Sou inocente! Sou inocenete! Não fiz nada de errada!. Deixem-me viver!Outro gritava; – Tenho filhos pequenos! Vão morrer de fome sem mim! Tenham piedade de minha família!Então, ouvi alguém contar; Yi, er, san! ( Um, dois, três…) Armas dispararam. O ruído me cortou o coração. Espirrou sangue para todo lado. Os corpos caíram. Gritei e corri para casa o mais rápido que pude[…]”