O poder, os tolos e a decepção de um E.T.

Só um tolo se ilude com o poder. O que se vive e vivencia no poder é absolutamente efêmero. Tudo passa com uma rapidez de impressionar.

A verdade é que, depois do exercício do poder, vêm, necessariamente, o ostracismo, o andar sozinho, a solidão, a tristeza, enfim ( para os que não se preparam para essa realidade), ante a constatação de que os “amigos” de ocasião, de conveniência, debandaram, foram cantar em outra freguesia; quiçá, já podem estar, convenientemente, exercendo a sabujice em torno de outras figuras circunstancialmente poderosas.

Pena que muitos não se dão conta de que a vaidade e a prepotência, no exercício do poder, lhes remeterão, mais intensamente, mais rapidamente, enfim, à solidão, quando,  desse mesmo poder,  forem apeados – pelo tempo ou pelas circunstâncias.

Dirão: Fora do poder não há salvação! Direi: Fora do poder há, sim, salvação!

Mas salvação só haverá se, ao invés do poder, sublimares, valorizares, enalteceres, sem enleio, a família e os verdadeiros amigos, que são aqueles que não estão ao teu lado em razão do cargo que eventualmente exerças. São essas as pessoas que te querem bem e que, na adversidade, não se afastarão de ti.

Mas é possível  sedimentar amizades estando no Poder?

Decerto que sim. Tenho convicção de que as pessoas que trabalham comigo já se tornaram minhas amigas e que essa amizade pode perdurar por muitos e muitos anos. Eu tenho essa sensação! Eu não me relacionaria tão bem com os meus assessores se não tivesse a convicção que tenho de que nos gostamos e nos respeitamos.

Quem tem família e amigos verdadeiros, nunca estará – nem se sentirá – sozinho; não sofrerá em face do poder que já não tem.

Fico esperando, avidamente, pelo dia em que saberei quais são os meus verdadeiros amigos, muitos dos quais até já ousei identificar.

Quero deixar claro que não desejo ser lembrado apenas em face de um retrato fixado na parede da Corregedoria ou do Tribunal de Justiça, mesmo porque, todos sabem, as probabilidades de eu vir a ser corregedor e/ou presidente do Tribunal de Justiça é tão remota quanto a possibilidade que temos de nos  deparar, num dia qualquer de verão,  com um E.T. na Praça Gonçalves Dias, em busca de espaço para sua sobrevivência na terra,  mesmo porque, se ousar aparecer por aqui, é muito provável, quase certo,  que será assaltado ou antecipará a sua volta diante das informações que terá acerca da má conduta dos nossos homens públicos, que, decerto, não deve ser a mesma conduta dos seus iguais.

Essas reflexões me levam, mais uma vez, a uma óbvia conclusão: é preciso sublimar a família e os amigos verdadeiros, pois que somente por eles jamais seremos esquecidos, tendo em vista que por eles – amigos e família – não somos gostados – e, até, amados – pelo estar, mas pelo ser que somos.

Tenho dito, nessa linha de pensar, que os que se embriagaram com o poder, que não se preparam para o porvir, e que não foram capazes de preservar as amizades verdadeiras, viverão, até os dias finais, uma amarga solidão, exatamente quando mais precisam do conforto e de assistência.

É assim mesmo, sem tirar nem pôr. Triste dos que não vislumbram esse porvir.

Essas reflexões me fazem lembrar, outra vez, de Sébastian Roch Nicolas Chamfort, que viveu no século XIX e que foi um dos mais brilhantes satíricos de sua época.

As máximas de Sébastian, publicadas depois da sua morte, revelaram-no um mestre do aforisma e um crítico voraz e impiedoso.

Nicolas Chamfort tinha intensa aversão aos tolos, sobre os quais definia, depois de indagar:

– O que é um tolo?

Para, impiedosamente, responder:

– Alguém que confunde seu cargo com sua pessoa, seu status com seu talento e sua posição com uma virtude.

Depois, diagnosticava, com a mesma acidez:

– Um tolo, ansiando com orgulho por alguma condecoração, parece-me inferior a esse homem ridículo que, para se estimular, fazia com que suas amantes pusessem penas de pavão em seu traseiro.

O que nos enlouquecem são as nossas certezas

Nós, muitas vezes, pensamos de nós, concluímos sobre nós o que nem sempre é a percepção dos outros. Ao constar essa realidade, nos flagramos, de regra,  decepcionados e tristes – quando não deprimidos.

Nesse sentido, lembro que, certa feita, estando com a minha família em viagem de férias, procurei, como sempre acho que faço, agradar, de todas as formas, aos meus filhos e à minha mulher, mesmo porque se um deles não está bem, eu, naturalmente, também não estarei bem.

Isso é próprio da minha personalidade. Não sei e não gosto de infelicitar  as pessoas; se eu não tiver condições de dar prazer aos que estão em volta de mim, seja no trabalho, seja na minha família, eu não fico bem comigo mesmo.

Pois bem. Eu dizia que, nessa viagem de férias, procurei fazer de tudo que estivesse ao meu alcance para que todos ficassem numa boa, para que as férias fossem prazerosas e, se possível, inesquecíveis,  pelo que de bom fosse desfrutado por nós.

Determinado dia, depois de muitas concessões a todos,  e quase nenhuma a mim, sem nada reclamar em face do brusco rompimento da minha rotina, resolvi bater o martelo e decidi, sem apelo, que, em determinado dia, eu voltaria para o hotel para almoçar no meu horário ( meio-dia) e para tirar uma sesta, já que estava com saudade da minha rotina.

Pronto! Foi o que bastou para que eu fosse escolhido como o mais chato da viagem – e por unanimidade, sem nenhuma concessão, sem apelo, sem direito a reexame da decisão.

O grave é que, na minha (falsa) percepção, imaginava exatamente o contrário.

Não preciso dizer da minha inquietação, da minha frustração.

Fiquei tão decepcionado que ainda insisti tentando convencê-los que eu já tinha feito tudo que um pai podia fazer para que eles não tivessem dissabores.

Mas que nada! Quanto mais eu tentava argumentar, mais eles reafirmavam que eu tinha sido um chato, cheio de mania, cheio de rotinas e que as rotinas, em viagem,  eram para ser quebradas, o que, de rigor, estou de acordo, tanto que só pedi um dia de concessão, que me foi negado.

Não teve jeito! Fui  confirmado, em segundo turno de votação, depois de tentativas vãs de me defender,   o mais chato, com o registro, de ofício, da minha  candidatura para as próximas férias, com enorme possibilidade de ser reeleito.

É por isso que se diz que os loucos, com muita convicção, narram os seus delírios, porque crêem neles. É por isso que se diz, ademais, que o que enlouquecem não são as nossas dúvidas; o que  nos enlouquecem são as nossas certezas.

A certeza que eu tinha de ter me doado ao máximo aos meus filhos para lhes proporcionar as férias dos sonhos, quase me enlouquece ao constatar que, diferente do que eu pensava, eu tinha sido o que de mais chato ocorreu na viagem.

Tivesse eu a mais remota dúvida acerca do meu desempenho como parceiro de férias, de pai e companheiro de viagem, eu não teria ficado tão magoado e tão próximo de enlouquecer, em face da minha já proverbial  – agora confirmada pelos insuspeitos filhos – incapacidade de ser boa companhia.

Resumindo, para ficar bem sedimentada a minha tese: são as nossas certezas,  e não as nossas dúvidas , o que nos enlouquecem.

De minha autoria

Breves reflexões sobre o papel do juiz no Estado Constitucional de Direito

Em outros artigos, publicados no meu blog (www.joseluizalmeida.com), na imprensa local  e em votos que apresentei no Tribunal de Justiça do Maranhão, já tive a oportunidade de consignar que, nos dias presentes, a função do magistrado vai muito além da  de mero espectador,  agente passivo ou figura inanimada e ascética  que se limita – como ocorria no Estado Liberal Clássico –  a pronunciar as palavras da lei ( visão montesquieuniana)

Tendo assumido a segunda instância, onde  me deparei  com questões constitucionais candentes,  confesso que, inicialmente, senti um certo acanhamento, em face da preponderante formação jurídico-cultural ( própria dos países de tradição positivista) da maioria dos magistrados brasileiros,  de assumir o papel de protagonista  no enfrentamento de certas questões e na consequente criação judicial do direito,  com receio de deixar transparecer, num juízo de valor precipitado,  que, com essa atitude, pudesse pretender atentar contra o princípio da separação dos poderes.

É forçoso concluir, no entanto, que, no exame de determinadas questões, ainda que  corramos o risco de ser incompreendidos,  não se pode perder de vista que,  lamentavelmente, em face da falta de sensibilidade    e da  omissão do legislador ordinário  (que, de regra, legisla para uma minoria,  e que, noutro giro, por falta de vontade política,  não elabora as leis necessárias para  que a Constituição cumpra, na sua inteireza, a sua finalidade),   a nós, magistrados, muitas vezes , não nos resta outra alternativa que não criar o direito – ou, se for o caso, até, partir, sem receio, para o ativismo judicial -, sobretudo em face da estrutura normativo-material da Constituição de 1988, impregnada, como sabemos, de princípios e regras  de grande plasticidade e abertura semântica, a permitir  ao intérprete um singular espaço de conformação.

É de Mauro Cappelletti, a ensinança segundo a qual, “Nos países de tradição positivista, a doutrina, durante muito tempo, resistiu à idéia de criação do Direito pelo juiz. A atividade do juiz estava confinada à vontade clara da lei. Todavia, com a complexidade das relações na sociedade moderna e a multiplicidade das demandas judiciais, a própria vontade da lei não mais se mostrava clara. Ao contrário, vaga e ambígua, a lei passa a suscitar variadas interpretações”(Juízes Legisladores?, p. 24-25)

Nesse ambiente,  é forçoso reafirmar  que é o  próprio ordenamento jurídico,  de regras obscuras e imprecisas, fruto da falta de desvelo do legislador,  quem  oferece  as condições para a criação judicial do direito,  e, até,  para o ativismo judicial, pois que, nesse cenário, desde a minha percepção,  o juiz não   pode se  limitar   apenas a declarar o direito existente,  sendo, muitas vezes, compelido a,  também,   criar direito novo,  sem que isso o autorize, assim posso entender, a ir além dos limites impostos pelo ordenamento jurídico,  ou seja, dos limites normativos substanciais do papel que deve desempenhar  num sistema de separação de poderes.

Nos últimos anos, no Brasil, temos  assistido – inicialmente, surpresos, mas, agora, com naturalidade –, sobretudo depois da Carta Política de 1988,  a expansão do Poder Judiciário, que  tem promovido uma  verdadeira revolução, em detrimento do  formalismo de inspiração liberal, época que,  como sabido, a atividade do juiz era o de declarar, mecanicamente, o direito, valendo-se, tão somente, da lógica dedutiva de interpretação, convindo anotar, só para ilustrar, que, até a Segunda Guerra Mundial, prevalecia uma cultura jurídica essencialmente legicêntrica, segundo a qual a lei editada pelo parlamento era a fonte principal – quase exclusiva – do Direito, desconsiderando, no mesmo passo,  a força normativa das constituições.

No Estado  Democrático e Constitucional , todos sabemos, o direito já não se aperfeiçoa, não evolui e nem alcança a sua real finalidade que não seja em face da ação criativa dos membros do Poder  Judiciário, que, todos testemunhamos,  rompeu, definitivamente – pese a timidez de   alguns dos seus agentes, em face, sobretudo do ( leviatânico)  Poder Executivo – , com o monopólio legislativo na formulação do Direito, assumindo, de vez, a sua condição de corresponsável pela transformação do Estado, enfrentando, sem acanhamento, o grande desafio de controlar os outros Poderes, trazendo para o centro do debate político a força axiológica dos textos constitucionais.

Sobreleva anotar, na linha de pensamento mais consentânea com o Estado Constitucional,  que, seja qual for a inspiração do legislador (pense ele nas minorias ou legisle para uma maioria, atitude cada vez mais rara, vez que, de regra, em face das ações dos lobistas, decide, quase sempre, para atender aos interesses de uma minoria, exatamente aquela  minoria que contribui com o caixa de campanha ), toda lei precisa de consistência judicial,  pois que, na minha visão – e de muitos que pensam como eu – ,  os juízes são, sim, os  únicos criadores do direito, embora deles se exija a  demonstração de que o direito por eles criado não provenha do nada, mas que resulte “extraído do texto constitucional, onde estão latentes e insinuantes à espera do momento de se mostrarem às claras” (Inocêncio Martíres Coelho , in Ativismo Judicial: o caso brasileiro, palestra proferida no Ministério Público do Estado do Pará).

A criação judicial do direito, afirmo, ainda, a guisa de reforço, inspirado nas  lições de Inocêncio Mártires Coelho,  “decorre do exercício regular do poder-dever que incumbe aos juízes, de transformar o direito legislado em direito interpretado/aplicado, caminhando do geral e abstrato da lei ao singular e concreto da prestação jurisdicional, a fim de realizar a justiça em sentido material,  que nisto consiste o dar a cada um o que é seu”. (ibidem).

Registro, ademais, inspirado, agora,  em Dirley  da Cunha Júnior,  Juiz Federal da Seção Judiciária da Bahia, a propósito da atuação das casas legislativas, a justificar a necessidade de validação do enunciado normativo pelo Poder Judiciário,  que, efetivamente, “ longe de representar  a sociedade, a ‘vontade geral’, a ‘vontade do povo’, o Legislativo e o Executivo são fiéis a interesses espúrios de lobistas e organizações que contribuíram para os ‘caixas de campanha’.” ( Interpretação Constitucional e Criação Judicial do Direito: Contributo para a Construção de uma Doutrina da Efetividade dos Direitos Fundamentais)

Mais adiante,  complementando o pensamento, pondera o ilustrado magistrado: “Assim, é manifestamente ingênua a crença que ainda persiste no caráter representativo das corporações legislativas e dos órgãos executivos. O foro atual das deliberações políticas não são mais as sessões plenárias, e sim, as secretas reuniões realizadas nos gabinetes parlamentares. Tudo isso revela, atualmente, uma crise da representação política e, com ela, a crise da democracia representativa, de tal sorte que aquela lei concebida como ‘expressão da vontade geral do povo’ é hoje mera ficção, pois a lei há muito não representa o povo, ao revés, contraria a sua vontade, desrespeitando, com não rara frequência, as normas imperativamente alçadas a preceito constitucional e os direitos fundamentais, com o fim de favorecer a grupos poderosos” (ibidem)

Consigno, nada obstante,   que o magistrado, nessa função criadora, na interpretação e validação dos enunciados normativos, como adverte o eminente magistrado, não pode agir por capricho  ou  por conta de suas idiossincrasias, sob pena de se igualar  aos que, nos demais poderes, agem  sem idealismo, mas impulsionados pelos seus interesses pessoais,  ou de grupos  de lobistas,  sem compromisso com a comunidade.

O magistrado deve ter presente, como, aliás, bem pontuou o eminente professor Luis Roberto Barroso, por ocasião do julgamento, pelo Supremo Tribunal Federal, da questão envolvendo as uniões homoafetivas,  que certas minorias, certos grupos sociais, religiosos ou econômicos, só encontram nos tribunais, e em nenhum outro lugar, a proteção que estão a merecer, sem a qual permaneceriam marginalizados da vida do  Estado  ao qual  pertencem.

O triunfo do direito substantivo

Eu era acadêmico de direito quando pontificam como expoentes do direito no Maranhão os chamados processualistas. Havia muitos nesse meio que se destacavam em face das pregações que faziam enaltecendo o instrumento em detrimento do direito material. Cresci intelectualmente nesse meio acadêmico, cujas aulas mais concorridas eram exatamente dos chamados processualistas.

As aulas mais concorridas, portanto,  eram as aulas de direito instrumental. Tanto que as   principais obras doutrinárias que compunham a minha pequena biblioteca eram dos expoentes do processualismo. Eu tinha, por exemplo, paixão pelas obras de Humberto Theodoro Júnior,  José Carlos  Barbosa Moreira e José Frederico Marques, para ficar apenas em três exemplos que me ocorrem agora.

Tendo ingressado no Ministério Público, em 1984, continuei, nos meus pareceres, privilegiando as formas em detrimento dos fins. Muitos, nesse sentido, foram os pareceres que lancei, a quase totalidade fulcrada numa busca incessante por alguma ilegalidade    que resultasse da inobservância das regras de direito processual.

E o direito substancial? Bem, o direito material não me importava. O que me excitava era poder mostrar ao condutor do feito que ele, por um descuido qualquer, se descurara de cumprir uma  formalidade legal, razão pela qual deveria chamar o feito à ordem, pouco importando a celeridade e a economia processuais.

Confesso que,  nessa ânsia, sentia-me vencedor sempre que, debruçado sobre os processos –  muitos deles conduzidos com certo descuido, muito mais em face da grande demanda que por ignorância ou má-fé –  me deparava com a inobservância de uma formalidade legal, para, a partir dela, formular um pleito anulatório. Era, por assim dizer, um sentimento de vitória que se apossava de mim, máxime diante da situação desconfortável em que eu deixava o condutor do processo, ao fazê-lo admitir não ter se esmerado o quanto devia na condução do processo.

Ingressando na magistratura, dei-me conta, muito cedo, que as minhas posições, excessivamente formalistas, fruto do que  fui induzido a crer, me fizeram não perceber que o processo é simplesmente um instrumento para realização do direito material, e que, algumas vezes, diante de um alternativa,  é melhor “sacrificar” uma regra de processo a desobedecer um regra de direito material.

Que fique claro que o “sacrifício” a que me refiro,  –  para que não se imagino que, nos dias atuais, prego a anarquia processual – tem limites. É dizer, a declaração de nulidade dependerá, por óbvio, das circunstâncias, pois que existem situações, seja de direito material,  seja de direito instrumental, que, para realização de ambos, não se pode desobedecer, pura e simplesmente, as regras de direito instrumental e/ou  de direito material.

Na minha compreensão, o que  se deva exigir do aplicador da lei é que, diante de um caso concreto, atente  menos  para as construções  genéricas que a doutrina  elabora, em face de uma questão puramente formal, e se detenha, com muito mais vagar,  para as particularidades, a singularidade do caso que está a exigir o seu esforço intelectivo. É em face do caso concreto, pois, que deve o operador do direito decidir-se por essa ou por aquela nulidade, sob pena, repito, de privilegiar a forma em detrimento dos fins, do real objetivo do processo,  enfim.

Reafirmo o que todos sabem: o processo é um instrumento a serviço do direito material, razão pela qual, conquanto não se possa deixar de reconhecer a sua importância, não pode ser sublimado, a ponto de ser alçado à condição de mais relevante que o direito material que se discute.

É nesse sentido a ensinança de Ada Pellegrini Grinover, segundo a qual deve ser combatido o excessivo rigor formal, que, muitas vezes, “sacrifica o objetivo maior de realização da justiça em favor de solenidade estérieis e sem nenhum sentido”.

Para encerrar essas brevíssimas reflexões, diretas e objetivos, como se exige no mundo atual, o que não se pode desconsiderar é que todas as vezes que houver ofensa a princípio ou norma constitucional-processual, cuja função precípua seja o de garantia, a ineficácia do ato pode ser  uma consequência natural, mas que, ainda assim,  estará condicionada à verificação do interesse de ordem pública.

Constatado, pois, que o ato processual foi praticado em confronto com uma norma ou princípio constitucional de garantia, poderá ser considerado pelo guardião da Constituição, no caso o juiz condutor do feito, inexistente ou nulo, cumprindo reafirmar que, nesse sentido, o espaço para convalidação e para nulidades relativas é praticamente nenhum.

De mais a mais, o que não pode perder de vista o magistrado é que, malgrado reconhecido que a atividade processual deve ser realizada segundo os modelos legais, eles sofrem temperamentos, sobretudo em face dos  princípios da economia processual e da razoável duração do processo, pois que, como sabido, é sempre desejável a obtenção do máximo de resultado com o mínimo de esforço.

Belo exemplo

Tenho dito que a vida é a nossa melhor escola. Quando assumimos  o papel de aprendiz, a vida nos ensina a superar as nossas fraquezas e a ponderar as nossas forças, para delas não fazer mau uso.

Com a vida só não aprende quem não quer. Eu mesmo, a cada dia, a cada hora, a cada erro ou acerto vou colhendo informações que são úteis para a minha relação com as pessoas. É dizer: sou aluno dileto da escola da vida.

Complicado? Sou, sim, afinal, todos somos. Mas a culpa é minha e não da vida.

Irascível? Depende, afinal, todos nós, dependendo das circunstâncias, somos irascíveis.

Vaidoso? Menos do que imaginam e comentam, mesmo porque, de rigor,  um pouco vaidoso todos somos.

Prepotente?  Muita fama e quase nada de prepotência. Não é do meu feitio. Mas é uma fama que conquistei e que dela não  consigo me libertar. Bem que eu gostaria de ter a fama de uma pessoa dócil, fraterna e amiga.  Todavia, não a tenho.  Fazer o quê?

O certo e recerto é que, com a vida e com os exemplos que captamos no dia a dia, muito aprendem e outros, nem tanto.

Me aventurei fazer essas reflexões, que não são nenhuma novidade, em face de  um episódio que testemunhei numa emissora de rádio; a rádio Bandeirantes de São Paulo, para ser preciso.

Explico. Estava eu, por volta da meia-noite e meia, ouvindo a Rádido Bandeirantes, depois da conquista da Copa América pelo Corinthians ( não sou corintiano mas torci a favor) ,  quando o âncora, Milton Neves, cumprimentou Dudu Braga, filho de Roberto Carlos, que estava no estádio Pacaembu, assistindo ao jogo Corinthians e Boca Junior. Dizia Dudua Braga estar afônico só de tanto gritar. Nessa hora, Milton Neves indagou sobre a sua visão e como é que ele, cego, praticamente, ia ao estádio e ainda vibrava com os gols que ele não via. Ele respondeu, então, que via pelo coração e que, sendo o seu coração corintiano, restava claro que ele tinha visto os gols, mesmo porque estava envolvido pelo clima proporcionado pela fanática torcida corintiana.

É assim, a toda evidência, uma extraordinária lição de vida.  Dudu Braga bem que podia se recolher e amaldiçoar o mundo, por ter ficado cego, tendo todas as condições materiais para enfrentar o problema. Mas não. Ele, mesmo vendo apenas um clarão, como disse ao âncora, saiu de casa e foi assistir, com o coração, o jogo do seu time de futebol.

Que belo exemplo, heim?

Decisão compartilhada

Câmara aprova colegiado para julgar crime organizado

O plenário da Câmara dos Deputados aprovou, nesta quarta-feira (4/7), o substitutivo do Senado para o Projeto de Lei 2057/07, que permite à Justiça formar um colegiado de juízes para decidir sobre qualquer ato processual relativo a crimes praticados por organizações criminosas.

A matéria será enviada para sanção presidencial.

O projeto foi sugerido pela Associação dos Juízes Federais do Brasil (Ajufe) e encampado pela Comissão de Legislação Participativa. A ideia é evitar que as principais decisões — como decretar prisão, transferência de preso ou inclusão em regime disciplinar diferenciado — recaiam sobre um único juiz. Uma das novidades do texto do Senado é a divulgação das decisões do colegiado sem qualquer referência a um possível voto divergente. A proposta aprovada prevê, ainda, proteção ampliada para juízes ameaçados de morte no exercício da função.

O texto aprovado define como organização criminosa a associação de três ou mais pessoas, estruturada e com divisão de tarefas, para obter vantagem pela prática de crimes cuja pena máxima seja igual ou superior a quatro anos ou que sejam de caráter transnacional.

O colegiado previsto será formado pelo juiz do processo e por outros dois escolhidos em sorteio eletrônico entre aqueles de competência criminal no primeiro grau de jurisdição. As reuniões do grupo de juízes poderão ser sigilosas se a publicidade puder dificultar o cumprimento da decisão.

Proteção pessoal
No caso de situação de risco decorrente do exercício da função, o juiz ou o membro do Ministério Público poderá comunicar o fato à polícia judiciária, que avaliará a necessidade de proteção para a autoridade e seus familiares.

Essa proteção será exercida pela própria polícia judiciária ou pelos órgãos de segurança institucional, podendo contar também com efetivos de outras forças policiais. A prestação de proteção pessoal será comunicada ao Conselho Nacional de Justiça ou ao Conselho Nacional do Ministério Público, conforme o caso. Com informações da Agência Câmara.

Revista Consultor Jurídico, 5 de julho de 2012

Negando a jurisdição

É dever do estado criar mecanismos que possibilitam a todos o acesso ao Poder Judiciário. Pode passar ilusório, mas é isso mesmo que preconiza a nossa Constituição.

Possibilitado o acesso, é necessário, agora, que as instâncias funcionem a contento, para que a prestação jurisdicional seja entregue sem mais tardança, como, aliás, também preconiza a nossa Carta Política.

Os empecilhos ao acesso e a demora na entrega da pestação jurisdicional, que a Constituição diz que deva ser em tempo razoável,  equivalem, a um só tempo, a negar a própria jurisdição e a afrontar, na mesma balada a Constituição Federal, que preconiza ser direito de todos buscar a reparação de dano  ou ameaça a direito junto ao Poder Judiciário, a quem cabe a resolução dos conflitos.

Essas reflexões, que apenas reafirmam o óbvio, decorrem do que testemunhei, hoje, pela manhã, no gabinete do Dr. Alexandre Lopes, responsável, nos dias presentes, pela 7ª Vara Cível;  é que, lá,  fiquei estupefato com a quantidade de processos em curso naquela unidade, muitos dos quais – diria a maioria – sem nenhuma possibilidade de solução a médio prazo.

Em face da  quantidade de processos em curso naquela vara, reafirmo ser   humanamente impossível a solução dos conflitos neles formalizados, a tempo e hora, o que equivale, no mesmo passo, à negativa de jurisdição.

Uma das solução que entrevejo, para uma infinidade de demandas –  em curso e a serem formalizadas – é a solução amigável dos conflitos, o que será possível com os  Centros  Judiciários de Solução dos Conflitos e Cidadania, previstos na Resolução  125, do CNJ.

Nos próximos dois meses espero inauguar pelos menos mais quatro Centro de Solução de Conflitos, sendo três em São Luis e mais um em Imperatriz.

A mão pesada do CNJ

Compulsória

Desembargador acusado de assédio é aposentado pelo CNJ

Por unanimidade, o CNJ condenou nesta terça-feira, 3, o desembargador Hélio Maurício de Amorim, do TJ/GO, à aposentadoria compulsória com vencimentos proporcionais, por irregularidades no exercício da magistratura e conduta incompatível com a que se espera de membros do Poder Judiciário. O magistrado foi acusado de assédio por uma das partes de um processo que tramitava na 1ª vara de Família, Sucessões e Cível de Goiânia, em que era titular.

O magistrado e a parte, Junia de Freitas Ataídes, se conheceram em seu gabinete, por indicação de uma amiga de Junia, que trabalhava como assistente do magistrado. Na época, Junia passava por um processo de separação do pai de seus filhos. A amiga de Junia sugeriu a ela que procurasse o magistrado para obter orientação. Na ida ao gabinete, Junia conversou com o magistrado e também obteve dele promessa de emprego no gabinete para sua filha, Ana Paula Ataídes Leão.

Junia movia uma ação de dissolução da união estável contra o ex-companheiro, que, por sua vez, ajuizou contra ela processo de guarda de seus dois filhos. A ação de guarda tramitava na 1ª Vara de Família de Goiânia, presidida pelo então juiz Hélio Maurício de Amorim.

Segundo o magistrado, a visita à casa de Junia teve como finalidade discutir “tratativas relacionadas à possível contratação” da filha da parte. Segundo Junia, o magistrado tentou abraçá-la na cozinha. Para o relator do processo administrativo disciplinar, o conselheiro Jorge Hélio Chaves de Oliveira, ao ir até a casa de Junia em horário fora de seu expediente, o magistrado descumpriu seu dever funcional de zelar pela moralidade da magistratura e pela isenção na prestação jurisdicional.

“Essa visita indevida e o que foi conversado são absolutamente intoleráveis para a magistratura”, disse o conselheiro. “Moralidade é do que se cuida aqui, e não de moralismo. Ainda que sua atitude fosse idônea, não se coaduna com a postura e o decoro das funções do magistrado”, afirmou o conselheiro Jorge Hélio.