STF em ação

STF deve retomar casos “represados”

POR FREDERICO VASCONCELOS

03/02/14  08:59

Barbosa e Janot

O Supremo Tribunal Federal retoma suas atividades nesta semana, acumulando questões relevantes “represadas” em 2013 pelo longo julgamento do mensalão, revela reportagem publicada nesta segunda-feira (3/1) naFolha.

Hoje será realizada a  solenidade de abertura do ano judiciário, conduzida pelo ministro Joaquim Barbosa. A sessão deverá contar com as presenças dos presidentes da República, da Câmara e do Senado ou seus representantes, que deverão proferir discursos.

Em seu pronunciamento, o procurador-geral da República, Rodrigo Janot, deverá enfatizar o combate à corrupção, a grave situação do sistema prisional do país e a necessidade de desafogar a pauta do Supremo.

A expectativa é que sejam retomados no STF processos na área da economia cuja decisão final orientará os tribunais sobre milhares de ações ajuizadas nas instâncias inferiores.

É o caso, por exemplo, das alegadas perdas nas cadernetas de poupança com os planos econômicos nas décadas de 80 e 90. A Corte deverá decidir se os bancos terão que indenizar poupadores que se sentiram prejudicados.

Aguarda-se também a definição sobre os prazos para pagamento de precatórios [determinação da Justiça para que um órgão público pague indenização devida].

Outros processos relevantes que deverão voltar ao plenário:

– a constitucionalidade das doações de empresas e pessoas jurídicas para campanhas eleitorais e partidos;

– o julgamento de embargos infringentes na ação penal do mensalão;

– a ação sobre os supostos desvios de dinheiro público na campanha de reeleição do então governador de Minas, Eduardo Azeredo (PSDB);

– a ação que questiona a proibição da publicação de biografias não autorizadas.

 

Nossas excentricidades

O Brasil é, definitivamente, um país, digamos, excêntrico. Aqui ocorre, por exemplo, de o eleitor trocar o voto por uma garrafa de cachaça ou por uma dentadura. Mas isso tem explicação na miséria do povo, na falta de cultura e de educação. Pode ser inusitado. Pode alimentar o folclore. Poder alimentar a inspiração de um cronista. Mas é uma excentricidade que encontra justificativa  na miséria, no estado de necessidade de um povo.

A verdade é que a necessidade, como a falta de educação, compele. Não há cidadania com a barriga vazia. O eleitor carente é suscetível de se submeter a essa, digamos, troca bizarra, a solapar a própria cidadania. Cidadania, para essas pessoas, não representa nada.

Imagino que o eleitor faça a seguinte reflexão: “tu me ajudas a mastigar com a dentadura ou a me entorpecer com álcool e eu, em troca, te dou meu voto. O que farás depois de eleito a mim não me importa, afinal, todos roubam, e a minha vida não vai mudar mesmo; tu pelo menos me destes alguma coisa em troca do meu voto.”

Essa a cultura. Por enquanto, nada se pode fazer. Educação ainda é preocupação de uma minoria.

Vê-se, assim, que não surpreende, de rigor, essa troca entre o eleitor e o candidato, sobretudo porque há algo muito mais relevante e subjacente que condiz  a nossa falta de educação; educação que, afinal, é o que pode libertar as pessoas, dar a elas a dignidade que a ignorância lhes nega.

Até aí não tá tudo bem, mas é assim mesmo que as coisas funcionam. E quando é um ex-presidente que diz a um ex-ministro, acusado de corrupção, para que não se preocupe, pois a acusação sai na urina (Jornal Folha de S. Paulo de hoje, na matéria ‘Lula me falou: esquece, isso sai na urina, diz Lupi sobre denúncia)*? Aí, meu amigo, é de estarrecer. É estupefaciente mesmo. É desanimador, sobretudo se a afirmação é feita por um dos mais festejados líderes políticos que o Brasil já teve em qualquer época, e que construiu a sua carreira pregando moralidade e retidão. É como se dissesse: “fui presidente deste país e sei que isso é natural, pois no Brasil grassa a impunidade. Fica na tua, não se desespera, que, nesses casos, as instância persecutórias não funcionam.”

A gente pensa que já viu de tudo, mas cada dia mais os políticos no nosso país nos conduzem à conclusão de que eles não merecem a nossa confiança. É uma pena, pois ainda há os que pensam de forma diferente. Mas esses são poucos… De tão poucos, a sua ação não é sequer notada. Não passam de uns radicais, na visão dos oportunistas e inescrupulosos.

*Carlos Lupi, ex-ministro do Trabalho do governo Lula e presidente do PDT, um dos partidos da base de sustentação do governo, foi acusado pela empresária Ana Cristina Aquino de ter recebido R$ 200.000,00 (duzentos mil reais) em propina.

Versão para o jornal

Abaixo, artigo da minha autoria, publicado neste blog, na sua versão, revisada, para o Jornal Pequeno

Naturalmente bom

José Luiz Oliveira de Almeida*

Principio essas reflexões partindo da afirmação de Jean-Jacques Rousseau de que o homem é um ser naturalmente bom, cuja bondade restaria corrompida pela sociedade. É claro que, até onde vai a minha percepção, não dá pra dizer que todo homem é naturalmente bom, como não dá pra dizer que a sociedade necessariamente o torne mal. A experiência mostra, a contrariar a tese, que há pessoas que parecem ter nascido para fazer o mal; há outras tantas que, a despeito dos reveses da vida e das injustiças a que são submetidas, só disseminam o bem.

Dia desses, saí para dar as minhas habituais – e necessárias – pedaladas na Av. Litorânea, mantendo distância da Lagoa da Jansen, onde recentemente fui assaltado. A certa altura,  o pedal da bicicleta caiu. Fiquei desarmado com o inusitado do ocorrido.Tentei, em vão, colocar o pedal no lugar. Constatei logo a minha incompetência para resolver um problema que, desde a minha visão, parecia muito simples.

De repente, ao tempo em que eu insistia em recolocar o pedal, apareceu um rapaz  que, ao se aproximar, de súbito, me assustou. Pensei: meu Deus, outro assalto! O coração, claro, disparou. Apreensivo, cuidei de analisar o desconhecido por inteiro, como se essa análise boba – e precipitada, claro –, feita por conta apenas da aparência, me levasse a alguma conclusão sobre o desconhecido.

Muito simpático e solícito, o rapaz colocou o depósito de queijo que trazia consigo  (todos cortados em cubos, para venda) no chão, ao lado de um fogareiro já apagado, e passou a tentar colocar o pedal da bicicleta, me deixando em posição de absoluta reflexão. Nas primeiras tentativas, como não alcançasse êxito, tratou logo de, despojadamente, sentar no chão – absolutamente desprendido e à vontade.  Muito tranquilo, muito simpático, risonho, do tipo que não metia medo. Fui, nesse cenário, me acostumando com a situação, passando a dialogar com ele sobre o problema.

Fiquei a pensar com meus botões: de onde vem essa que me parece uma boa alma? Quem são os pais desse bom rapaz?  Seus amigos, quem são? Onde mora? De onde vem? Por que está me ajudando? Exigirá ele, depois, algo em troca? E o queijo? Pelo visto, ele se desinteressou de vendê-lo, certamente porque espera ser bem recompensado, pensava eu.

Um dado curioso. O desconhecido, muito à vontade, viu a tampa do depósito voar para longe, mas não largou o que estava fazendo. Continuou tentando colocar o pedal no lugar, com inaudita boa vontade. Um transeunte viu a tampa voando, correu atrás, trazendo-a de volta. A partir daí, eu próprio cuidei do depósito do desconhecido, atento para que a tampa não voasse mais. Ele, enquanto isso, lutava, embalde, para repor o pedal.

A certa altura, levantou-se e saiu correndo. Pediu que eu o aguardasse, pois iria procurar uma chave. Fiquei, ao lado da bicicleta, olhando para um lado e outro, enquanto aguardava o desconhecido, e persistia fazendo  questionamentos sobre a sua atitude e a pensar onde ele encontraria uma chave. Mas pensava positivamente: trata-se de uma boa alma, dessas que os reveses da vida não corrompem.

Em dado momento me dei conta dele saindo de um bar, com um alicate na mão, saltitante, alegre vislumbrando a possibilidade de resolver o meu problema. Ao se aproximar de mim, deu um sorriso, para, otimista, sentenciar:

– Agora vai!

Não foi! Mais uma tentativa debalde. A rosca estava estragada. Não havia mais o que fazer. Desanimado, olhei para um lado e para o outro, perdido. Ele percebeu o meu desânimo, e lamentou a minha frustração. Parecia que já me conhecia há muito tempo. Não! Ele não me conhecia! Não sabia de onde eu vinha, e nem para onde eu ia. Mas, ainda assim, procurou me ajudar, sem pedir nada em troca – por bondade.  Pelo desejo de servir ao próximo.

Decidido que não resolveríamos o problema, deixei a bicicleta em um bar e saí andando, desnorteado, pela Litorânea, apenas com as luvas nas mãos, decidido a voltar para casa a pé. No trajeto inicial, Chagas me acompanhou, lamentando o insucesso da empreitada. Ele seguia com o queijo no depósito, e o fogareiro,  apagado. Mas nada disso parecia preocupá-lo. O que ele lamentava mesmo era não ter podido me ajudar. Eu disse a ele, então:

– Amigo, não tenho nenhum trocado para te dar. Todavia, passo amanhã e deixo um dinheiro para você, no bar do Deusimar – onde a minha bicicleta ficou guardada, ao que ele objetou:

– Não se preocupe com isso. O que eu desejo mesmo, se fosse possível, é um emprego. Se o senhor puder me arranjar um, eu fico agradecido. Tá tudo muito difícil, doutor. O mais fácil seria roubar, como faz a galera, mas eu não quero isso pra mim. Eu quero mesmo é trabalhar.

Eu, lamentando, disse a ele que não tinha como lhe arrumar um emprego, ao que ele respondeu, sem mudar o tom e sem perder o sorriso, que não tinha problema, e que eu não me preocupasse com dinheiro, pois sabia que um dia a gente se encontraria e, nessa ocasião, eu daria a ele o que entendesse devesse dar. Não pediu mais nada. Seguiu o seu caminho e eu, segui o meu.

Ele partiu quando o fim de tarde ia chegando, para tentar vender  queijo assado na brasa. Seguiu com o depósito sob o braço esquerdo, e o fogareiro rodando com a mão direita, para atiçar o fogo. E sumiu da minha vista.

Chagas, para mim, é um ser naturalmente bom. As dificuldades da vida, o mundo, enfim, não o corrompeu, e quiçá não o corromperá jamais. Pena que eu não possa ajudar Chagas a conseguir um emprego. Fico te devendo essa, Chagas! Mas o mundo dá muitas voltas. Nós vamos nos encontrar novamente, em outra situação. E quando isso acontecer, quero, mais uma vez, agradecer-te e dizer-te que, mesmo as pessoas naturalmente boas como você, nesse mundo de pura competição e de ambição desmedida, podem ter que levar a vida desempenhando uma atividade menor, por falta de oportunidades. Mas o importante mesmo, em tudo aquilo que fazemos, é ter dignidade, fazer com dignidade; e dignidade você tem de sobra, pouco importando o tipo de trabalho que faça.

É desembargador do Tribunal de Justiça do Estado do Maranhão

e-mail: jose.luiz.almeida@globo.com

blog: www.joseluizalmeida.com

Juiz critica périplo de Barbosa

POR FREDERICO VASCONCELOS

30/01/14  07:39

Sob o título “Por trás dos holofotes“, o artigo a seguir é de autoria do juiz Fernando Ganem, que exerce a presidência da Associação dos Magistrados do Paraná até sexta-feira (31/1), quando haverá troca de comando na entidade.

A imprensa destacou nesta última semana o fato de o Presidente do Supremo Tribunal Federal ter saído de férias sem ter assinado o mandado de prisão de João Paulo Cunha, condenado do mensalão.

Não fosse esse fato, ainda ele teria suspendido as férias para viajar a Paris e Londres, aonde proferiria palestras, recebendo diárias de aproximadamente catorze mil reais.

Evidentemente que isso aborreceu outros ministros da Corte, os quais afirmaram que o seu Presidente também poderia ter interrompido as férias para assinar o mandado que lhe competia.

O mandado de prisão é uma simples folha de papel, digitada por funcionário do Judiciário, onde o magistrado lança a sua assinatura, determinando seja ele cumprido.

Não é um instrumento de difícil confecção, nem de complexidade tal a demandar tanto tempo a impedir o gozo das férias de quem assina.

Juízes de primeiro grau, em sua grande maioria, estão obrigados a cumprir plantão cível e criminal em sua jurisdição, e, em casos de repercussão, estão sempre alertas, saindo efetivamente de férias após vencidas as pendências existentes em sua vara ou juízo.

O Presidente do Supremo deveria fazer o mesmo: férias somente depois de assinados os mandados de prisão e iniciada a execução do julgado.

Mas não o fez. Preferiu tirar uns dias de descanso e, depois, viajou ao exterior para proferir palestras, ganhando diárias, sem contar o valor que teria cobrado por cada palestra, como é de praxe acontecer.

Nada contra a percepção de diárias, nem de cachê em palestras, aliás, entendo seja direito de qualquer pessoa que trabalha.

Porém, causa estranheza as circunstâncias em que isso ocorre, sendo o protagonista o Presidente do STF e do CNJ, justamente aquele que sob os holofotes defende a ética e a moralidade, formulando nervosos discursos contra benefícios (inclusive alguns que ele próprio recebeu como ex-integrante do Ministério Público) e vantagens específicas de magistrados, como no caso do direito a sessenta dias de férias, da percepção de auxílios alimentação e saúde.

Se fosse um juiz de primeiro grau que tivesse ido ao exterior proferir palestras mediante paga, e recebendo diárias, esquecendo-se de assinar um mandado de prisão em processo clamoroso sob seu jugo, com certeza o tratamento seria outro, principalmente se isso fosse comunicado ao CNJ, quando então o colega correria o risco de, sob o beneplácito do próprio Presidente do Supremo, ser exposto à mídia, e, com o pescoço à prova, passar toda espécie de dissabores e constrangimentos perante a sua família, seus pares, seus subordinados, e o que é pior, seus jurisdicionados; isso sem contar na desestabilização de sua autoridade e credibilidade, algo que só um tempo muito grande é capaz de apagar.

Justa é a polêmica gerada sobre o ministro Presidente da Suprema Corte e do Conselho Nacional de Justiça, este último o maior órgão censor da justiça brasileira, guardião da ética, da moralidade e da respeitabilidade do Poder Judiciário.

Afinal de contas, ninguém está acima da lei, nem de qualquer suspeita, mas é preciso que a pessoa pública, vitrine que é, seja atrás dos holofotes justamente aquilo que prega sob eles.

Ainda a Lei Anticorrupção

Como todo brasileiro, estou todo prosa com a vigência da Lei Anticorrupção. Todos esperamos que, sobretudo em face da multa dissuasória, que chega a 60 milhões de reais, e da inserção da responsabilidade objetiva, consigamos das um basta nessa promiscuidade entre o público e o privado.

Importa anotar, nessa expectativa, que esta é a primeira lei brasileira direcionada à punição de empresas, muitas das quais são exatamente aquelas que fazem doações de campanhas, onde está a gênese da promiscuidade que fiz referência acima, afinal, tenho dito, ninguém faz doação pelos belos olhos do candidato ou em face de uma ideologia; há sempre, por trás, o claro objetivo de, de alguma forma, tirar proveito da res publica, que, no Brasil, tem servido muito mais aos interesses privados, como é da sabença geral.

A lei foi inspirada em congêneres do mundo civilizado, onde o combate à corrupção é um objetivo a ser alcançado, daí, ademais, as alvíssaras que decorrem do estabelecimento da chamada responsabilidade objetiva, a que me reportei acima, da qual dimana inegável reforço no combate a essa chaga chamada corrupção.

A responsabilidade objetiva decerto que estimulará a que os mecanismos de controles internos das empresas se esmerem ainda mais no sentido de evitar o seu envolvimento com a prática de atos de corrupção, vez que, pela novel legislação, pouco importa, por exemplo, se os diretores de determinada empresa  tenham ou não autorizado o comportamento ilícito, bastando, tão somente, que resulte provado que a pessoa jurídica tirou proveito da ilicitude.

Outro aspecto que deve ser registrado, a desestimular a prática de ilicitudes, é que a empresa envolvida em ilicitudes, além de ser compelida a ressarcir os cofres públicos, deverá ser incluída no Cadastro Nacional de Empresas Punidas.

O bicho vai pegar mesmo é quando as empresas punidas resolverem – e decerto o farão –  recorrer ao Judiciário para rediscutir eventuais punições e os efeitos dela, como, por exemplo, o registro do seu nome no chamado Cadastro Nacional de Empresas Punidas. Aí, meu amigo, tudo pode ficar como dantes. Vai ser um guerra de liminares e uma demora tão grande, que, não tenho dúvidas, as punições poderão se tornar letra morta.

De qualquer sorte, já não era sem tempo. O Brasil precisava de uma lei como essa. Só a perspectiva de punição pode ter o efeito desestimular a prática de ilicitudes.

O que se espera, agora, que as instâncias persecutórias, quando provocadas, ajam com eficiência no combate a essas práticas que tanto mal têm feito a todos.

Vamos ver!

É, sem dúvidas, um avanço.

Lei de combate à Corrupção

ACORDO DE LENIÊNCIA

Inicio essas reflexões narrando um fato pitoresco, a propósito de sigilo.

Pois bem. Eu era juiz em Presidente Dutra, quando recebi, vindo do Tribunal de Justiça,  uma pasta, com as fotografias e o histórico de vários candidatos ao concurso para ingresso na magistratura, com o carimbo de confidencial.

A pasta vinha acompanhada de um ofício, onde o Tribunal pedia que eu informasse se, dentre os candidatos, havia algum cuja conduta não fosse compatível com o exercício do cargo de Juiz de Direito.

Sonhador, vi naquele pleito uma mudança de direção. Resolvi, por isso, prestar as informações solicitadas, cuidando, pois, de denunciar alguns candidatos que conhecia e que sabia não ter condições morais de ingressar nos nossos quadros.

Resultado: poucas dias depois todos os que denunciei foram informados da minha denúncia; e as informações saíram de dentro do Tribunal. Ganhei vários inimigos, alguns dos quais até hoje não me perdoaram.

Prometi a mim mesmo que jamais entraria numa canoa furada dessas.

Conto essa história apenas para dizer que nós não temos o hábito do sigilo nas instâncias públicas. Tudo vaza; nada se mantém no anonimato, daí o receio que tenho de que o chamado Acordo de Leniência, previsto na Lei de Combate à Corrupção não pegue, anda que seja um dos aspectos mais relevantes da nova lei, em face das dificuldades que se tem para esclarecer crimes desse jaez.

Ainda assim, estou, como todos estamos,  ávido para ver os efeitos da Lei de Combate à Corrupção (Lei 12.846/2013), para moralizar as práticas deletérias de promiscuidade entre o público e o privado.

A corrupção, definitivamente, é uma doença contagiosa, de efeitos danosos para o conjunto da sociedade, pois com ela se esvai o dinheiro da saúde e da educação, para ficar apenas em dois exemplos.

Sistema penitenciário

Regime semiaberto praticamente não existe no Brasil

quarta-feira, 29/1/2014

Casas do albergado deveriam ser estabelecimentos destinados ao cumprimento de pena em regime aberto, assim como penitenciárias deveriam ser estabelecimentos destinados ao cumprimento de pena em regime fechado. Na prática, porém, esses estabelecimentos também abrigam detentos condenados ao regime semiaberto.

Pesquisa realizada por Migalhas evidencia que o regime semiaberto descrito no CP está longe de ser realidade em muitos Estados brasileiros. Veja a tabela abaixo.

Em 11 capitais, os apenados ficam reclusos exclusivamente em colônias agrícolas, industriais ou similares (institutos penais ou albergues), conforme prevê o CP e a lei de execução penal (7.210/84). São elas: Rio Branco/AC, Salvador/BA, Goiânia/GO, Campo Grande/MS, Recife/PE, Teresina/PI, Curitiba/PR, Rio de Janeiro/RJ, Natal/RN, Porto velho/RO, Porto Alegre/RS e Palmas/TO.

Nas demais, a ausência de estabelecimentos prisionais desse tipo ou a falta de vagas nesses lugares fazem com que os detentos cumpram suas penas em penitenciárias comuns, casas do albergado, em prisão domiciliar ou até mesmo livres, com uso de tornozeleira eletrônica ou mediante comprovação de trabalho.

UF

Capital

Dorme e passa o dia em colônia agrícola, industrial ou similar

Trabalha durante o dia e dorme em colônia agrícola, industrial ou similar

Dorme e passa o dia em penitenciária

Dorme em penitenciária e sai para trabalhar durante o dia

Fica em prisão domiciliar

Fica livre, mas com tornozeleira eletrônica

Fica livre mediante comprovação de emprego

AC

Rio Branco

X

X

AL

Maceió

X

AM

Manaus

X

X

AP

Macapá

X

X

X

X

BA

Salvador

X

X

CE

Fortaleza

X

X

DF

Brasília

X

X

ES

Vitória*

GO

Goiânia

X

X

MA

São Luís

X

X

X

X

MG

Belo Horizonte

X

X

MS

Campo Grande

X

X

MT

Cuiabá

X

PA

Belém

X

X

X

X

X

PB

João Pessoa

X

X

PE

Recife

X

X

PI

Teresina

X

X

PR

Curitiba

X

X

RJ

Rio de Janeiro

X

X

RN

Natal

X

X

RO

Porto Velho

X

X

X

RR

Boa Vista

X

X

RS

Porto Alegre

X

X

SE

Aracaju

X

X

X

SC

Florianópolis

X

X

SP

São Paulo

X

X

TO

Palmas

X

X

 

Informações válidas para detentos homens.

*Dados não informados.

Penitenciárias

Manaus/AM, Fortaleza/CE, Brasília/DF, Belo Horizonte/MG, João Pessoa/PB, Boa Vista/RR, Florianópolis/SC e São Paulo/SP abrigam seus detentos do semiaberto em alas específicas para esse tipo de regime em penitenciárias comuns.

Na capital paulista, os Centros de Ressocialização são unidades mistas para presos em regime fechado e semiaberto de baixa periculosidade e os Centros de Progressão Penitenciárias “amparam” presos em regime semiaberto. A população carcerária do Estado de SP triplicou em 16 anos, alcançando 180 mil detentos em 2011. Isso equivale a 40% da população do sistema penitenciário do país.

Algumas penitenciárias possuem estrutura para que os presos trabalhem intramuros, como o Instituto Presídio Professor Olavo Oliveira II, em Itaitinga, na região metropolitana de Fortaleza, e o Centro de Internamento e Reeducação, no DF.

No caso daquelas que não têm áreas destinadas ao trabalho, os apenados que não trabalham fora acabam cumprindo sua pena em regime fechado, uma vez que o que diferencia o semiaberto do fechado é o “trabalho em comum durante o período diurno em colônia agrícola, industrial ou estabelecimento similar” ou o “trabalho externo” ou ainda a “frequência a cursos supletivos profissionalizantes, de instrução de segundo grau ou superior”, nos termos do CP.

Prisão domiciliar

Em Maceió/AL, Belém/PA e Aracaju/SE, a prisão domiciliar pode substituir o cumprimento da pena em colônia agrícola, industrial ou similar.

No AL, não existe unidade prisional de semiaberto, por isso, os juízes deferem prisão domiciliar aos condenados em semiaberto.

Já na região metropolitana de Belém existe uma colônia agrícola no município de Santa Isabel para os detentos que não trabalham fora. Por sua vez, os apenados que trabalham ou estudam fora se recolhem à noite e nos finais de semana no Centro de Progressão Penitenciária de Belém. Não havendo vagas em ambos os lugares, os juízes tendem a concluir que o sentenciado não pode ser onerado pelo Estado, motivo pelo qual deve cumprir a pena em casa.

Na região metropolitana de Aracaju também existe um estabelecimento prisional em Areia Branca para cumprimento de pena em regime semiaberto, mas o juiz de Direito Helio de Figueiredo Mesquita Neto, da 7ª vara Criminal de Aracaju/SE, interditou parcialmente o local em 30/8/13 devido às condições degradantes a que os presos são submetidos.

Em ruína, o prédio, a toda evidência, não possui condição sanitária mínima para o acolhimento de seres humanos e por lá são sonegadas dos internos correta assistência material, à saúde, educacional e social“, afirmou o magistrado na decisão. E acrescentou: “nunca identifiquei no estabelecimento penal algo que lhe aproxime de uma colônia agrícola, industrial ou similar“. (Processo: 201220700338)

Tornozeleira e “liberdade”

Apenas Porto Velho/RO “libera” o preso e determina o uso de tornozeleira eletrônica no caso de falta de vagas na colônia agrícola da cidade.

Quanto à possibilidade de o detento ficar livre mediante comprovação de trabalho, essa situação é observada somente em Cuiabá/MT. O apenado tem o prazo de sete dias para conseguir um emprego e, dessa maneira, recolher-se em sua residência para o repouso das 19h às 6h do dia seguinte. Expirado o prazo, o condenado deve se dirigir à casa do albergado, também das 19h às 6h.

Para se recolher em casa no período da noite, o apenado não pode frequentar lugares inapropriados (casa de prostituição, casa de jogos, bocas de fumo ou lugares similares; portar armas, nem brancas (faca, canivete, estilete etc.) nem de fogo (revólver, espingarda, explosivos etc.); ingerir bebida alcoólica ou fazer uso de qualquer espécie de substancia entorpecente; e se ausentar da comarca por mais de três dias sem autorização do juízo da vara de Execução Penal.

O apenado tem a obrigação de comprovar sua ocupação no prazo de 30 dias e comparecer mensalmente no juízo para assinar termo, justificar suas atividades e comprovar o seu endereço.

Violência

As torturas mais bestiais de que tive notícia não foram praticadas por carcereiros, mas pelos próprios presos contra os que caíram em desgraça, na maioria das vezes por motivos fúteis, vingança ou mera disputa de poder. A perversidade no mundo do crime não conhece limites“. A frase é do médico Drauzio Varella, autor dos livros “Estação Carandiru” e “Carcereiros”. Ele, que foi voluntário na Casa de Detenção de São Paulo (Carandiru) por 13 anos e hoje atende na Penitenciária Feminina da Capital, já constatava a violência nos presídios brasileiros desde antes de 2002, quando o Carandiru foi implodido.

Drauzio Varella tem outras frases como “o vírus da violência contamina o ambiente prisional” e “cadeia é um lugar povoado de maldade“, ambas refletindo que o sistema prisional brasileiro é um sistema falido.

Nada que os brasileiros não saibam. Em dezembro do ano passado, o juiz auxiliar da presidência do CNJ Douglas de Melo Martins elaborou relatório sobre a situação desumana do Complexo Penitenciário de Pedrinhas, em São Luís/MA. O juiz apontou que, pelo menos, 60 presos morreram no estabelecimento prisional em 2013. A principal causa da violência é a disputa de poder entre presos oriundos do interior e os da capital, divididos em facções.

Martins também destacou a ocorrência de abuso sexual contra mulheres que visitam presidiários no local e apontou indícios de atos de tortura que teriam sido praticados por agentes públicos contra presos.

Neste mês, o jornal Folha de S.Paulo publicou vídeo gravado por presidiários mostrando três homens que foram decapitados dentro do complexo.

O juiz Roberto de Paula, da 1ª vara de Execuções Penais de São Luís, relata que os presídios no Maranhão são “depósitos de presos” e que a política de ressocialização é praticamente nula. Segundo ele, “os presos são tratados como objetos” no Estado.

O magistrado conta que, em São Luís, tanto a Unidade Prisional de Ressocialização do Monte Castelo quanto o Complexo Penitenciário de Pedrinhas amparam detentos do semiaberto. Em Monte Castelo ficam os apenados com trabalho externo e, em Pedrinhas, os que não trabalham fora. Mas os dois estabelecimentos estão superlotados, informa Roberto de Paula.

Mensalão

No julgamento da AP 470, o processo do mensalão, José Genoino, Delúbio Soares, Valdemar Costa Neto, Pedro Henry, Bispo Rodrigues, Romeu Queiroz, Roberto Jefferson, João Cláudio Genu, Breno Fischberg, Enivaldo Quadrado e Jacinto Lamas foram condenados ao regime semiaberto.

O ex-tesoureiro do PT Delúbio Soares está trabalhando na CUT – Central Única dos Trabalhadores; o ex-deputado Pedro Henry foi autorizado a trabalhar no Hospital Santa Rosa, em Cuiabá/MT; o ex-tesoureiro do PL Jacinto Lamas foi admitido como assistente administrativo em uma empresa de engenharia em Brasília; o ex-deputado Romeu Queiroz já começou a trabalhar em sua própria empresa, a RQ Participações; e o ex-deputado Bispo Rodrigues também vai trabalhar fora, mas ainda não se sabe onde.

O ex-deputado Valdemar Costa Neto ainda não apresentou pedido de trabalho externo e o ex-presidente do PT José Genoino está em prisão domiciliar em razão de problemas de saúde.

O presidente do PDT, Roberto Jefferson, e o ex-assessor do PP João Cláudio Genu ainda não estão cumprindo suas penas.

Em relação aos sócios da corretora Bônus Banval Breno Fischberg e Enivaldo Quadrado, eles terão que prestar serviços à comunidade.

Tribunais suntuosos, varas sucateadas

POR FREDERICO VASCONCELOS

29/01/14  10:54

O Conselho Nacional de Justiça realizará audiência pública nos dias 17 e 18 de fevereiro para debater medidas que reduzam o desequilíbrio entre o primeiro e o segundo grau do Judiciário. Um dos temas será a necessidade de distribuição equânime do orçamento.

Grupo de Trabalho criado pelo CNJ propõe que a divisão do orçamento dos tribunais corresponda à demanda que recai sobre os órgãos, magistrados e servidores, o que, no primeiro grau, chega a 90% dos processos no país.

Segundo informa a assessoria de imprensa do CNJ, o grupo entregou minuta de resolução ao presidente do órgão, ministro Joaquim Barbosa.

O corregedor nacional de Justiça, ministro Francisco Falcão, identificou o contraste entre Cortes bem estruturadas e varas que atuam com graves deficiências.

“Notamos que em alguns tribunais há investimentos altíssimos nas sedes dos tribunais, com a construção de verdadeiros palácios e, às vezes, mordomia exacerbada, em detrimento de uma primeira instância sucateada”, diz Falcão.

Os tribunais de Justiça contam com um orçamento único, a ser administrado pela Corte em favor dos diferentes graus de jurisdição.

“Precisamos de boas instalações para tribunais de Justiça e Cortes Superiores, mas precisamos muito mais de aparelhamento e de instalações condignas para os juízes de primeiro grau”, afirmou o corregedor.

O evento terá transmissão ao vivo.