Sem limites

O homem de Cachoeira na Justiça
Como a organização de Carlinhos Cachoeira aproveitou-se do prestígio do senador Demóstenes Torres para tentar influenciar decisões judiciais

ANDREI MEIRELES, MURILO RAMOS E MARCELO ROCHA

A organização criminosa comandada pelo bicheiro Carlos Augusto de Almeida Ramos, o Carlinhos Cachoeira, ficou conhecida até agora por sua atuação em jogos ilegais, corrupção de agentes públicos e políticos e contrabando. A intensa atividade fica clara no extenso material obtido pela polícia na investigação que resultou na Operação Monte Carlo, em 29 de fevereiro. Gravações obtidas por ÉPOCA mostram, agora, uma nova faceta da atuação da turma. Para isso, a organização aproveitou-se da projeção e da boa imagem sustentada até então por seu integrante mais conhecido, o senador Demóstenes Torres (sem partido-GO). O objetivo era tentar influenciar decisões do Sistema Judiciário.

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UTI judicial

Flávio Dino propõe ao CNJ criação de varas de saúde

Por Rodrigo Haidar

O Conselho Nacional de Justiça irá discutir em breve a criação de varas especializadas para processar e julgar ações que tenham como matéria de fundo o direito à saúde. A proposta foi feita pelo presidente da Embratur, Flávio Dino, ao presidente do Supremo Tribunal Federal e do CNJ, ministro Ayres Britto, na última quinta-feira (26/4). Dino entrou com Pedido de Providências no CNJ para que a possibilidade de criar as varas seja discutida.

A proposta foi bem recebida pelo ministro Ayres Britto. “Sou totalmente receptivo. Precisamos de varas especializadas na apreciação de reclamações contra atendimentos médicos desqualificados”, afirmou o presidente do CNJ. A ideia de Dino é chamar a atenção para o sucateamento não só da rede pública de saúde, mas do sistema privado. E fazer com que cidadãos lesados por maus atendimentos médicos tenham um fórum adequado para discutir seus casos.

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A polêmica continua

OAB contesta regra que posiciona membro do MP ao lado do juiz

O Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) ajuizou Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI 4768) no Supremo Tribunal Federal (STF) contra dispositivos do estatuto do Ministério Público da União e da Lei Orgânica Nacional do Ministério Público que garantem a membros do órgão a prerrogativa de se sentarem do lado direito de juízes durante julgamentos.

Segundo a OAB, os dispositivos legais “estabelecem ampla e irrestrita prerrogativa ao Ministério Público de sentar-se lado a lado com o magistrado em detrimento do advogado” quando representantes do órgão atuam como parte no processo. “Respeitosamente, não se trata, puramente, de discussão secundária e pequena, vez que a posição de desigualdade dos assentos é mais do que simbólica e pode sim influir no andamento do processo”, afirma a autora.

A entidade ressalva, entretanto, que não ocorre nenhuma inconstitucionalidade quando o membro do MP, na condição de fiscal da lei, o chamado custos legis, se senta ao lado do juiz. No entanto, argumenta a OAB, quando atua como parte acusadora, o fato de o representante do MP sentar-se estar ao lado do juiz representaria uma “disparidade de tratamento entre acusação e defesa”.

A Ordem dos Advogados alega que a situação “agride o princípio da igualdade de todos perante a lei” e, em consequência, viola a “isonomia processual”. E concluiu: “(A regra institui uma) arquitetura/modelo que gera constrangimento funcional, pois ela dissimula a real posição que devem ostentar as partes em um processo conduzido pelos princípios e regras do Estado democrático de direito”.

“Ou seja, perante a testemunha, o perito, o acusado e qualquer outro participante da relação processual, o mobiliário compõe a imagem de duas autoridades de igual hierarquia”, concluiu a OAB, que pede a concessão de liminar para que os dispositivos legais fiquem suspensos até o julgamento final da ADI.

No mérito, a entidade pede para o STF dar interpretação conforme a Constituição à alínea ´a` do inciso I do artigo 18 do Estatuto do MPU (Lei Complementar 75/93) e ao inciso XI do artigo 40 da Lei Orgânica do MP (Lei 8.625/93), para que a prerrogativa prevista nos dispositivos seja aplicada somente quando o MP oficia como fiscal da lei.

STJ decide

DECISÃO
Negado salvo-conduto a motorista para se eximir de punições da Lei Seca
O Superior Tribunal de Justiça (STJ) negou habeas corpus a um motorista de Minas Gerais que pretendia se eximir de exigências e punições administrativas introduzidas pela Lei Seca (Lei 11.705/08). A Quinta Turma, baseada em voto do desembargador convocado Adilson Macabu, negou o salvo-conduto.

Inicialmente, o motorista teve o pedido de habeas corpus negado pelo Tribunal de Justiça de Minas Gerais. Recorreu, então, ao STJ, sustentando que estaria sofrendo constrangimento ilegal. Disse que o objetivo do pedido era evitar o cumprimento das medidas administrativas determinadas pela Lei Seca.

O motorista afirmou que estaria com a liberdade ameaçada porque, ante a recusa à realização de teste de alcoolemia em blitz nas estradas, ele teria o direito de dirigir suspenso pelo prazo de 12 meses, “sem o devido processo legal”. Protestou ainda contra a possibilidade de ser “coercitivamente conduzido para delegacias de polícia civil” e de “receber voz de prisão em fragrante” por recusar-se a fazer o teste do bafômetro.

O relator observou que “o habeas corpus preventivo tem cabimento quando, de fato, houver ameaça à liberdade de locomoção”, isto é, sempre que for fundado o receio de prisão ilegal. “E tal receio haverá de resultar de ato concreto, de ameaça iminente de prisão”, disse o magistrado.

Macabu constatou que, no caso, não se verifica a efetiva ameaça, atual ou iminente, capaz de autorizar a expedição de salvo-conduto. O magistrado concluiu que o que se pede, na verdade, é eximir o impetrante do âmbito da vigência da Lei Seca.

Tempos modernos

Juiz comenta em sentença as novas leis de mercado dos namoros

 Uma mulher ajuizou ação de indenização por danos morais pela surra que levou da outra namorada do homem com quem estava, com direito a puxão de cabelo e unhada.

Ao julgar o caso, o juiz de Direito Carlos Roberto Loiola, do JECiv de Divinópolis/MG, dá uma verdadeira lição sobre as novas leis de mercado no que se refere aos namoros. Ponderou: “Ele nem prá dizer que estava numa pescaria com os amigos! Foi logo entregando que estava com a rival. Êta sujeito despreocupado! Também, tão disputado que é pelas duas moças, que nem se lembrou de contar uma mentirinha dessas que a gente sabe que os outros contam nessas horas só prá enganar as namoradas. Talvez porque hoje isso nem mais seja preciso, como era no meu tempo de pescarias. Novas Leis de mercado.”

Na audiência, o homem que fazia parte do triângulo amoroso estava tranquilo, se sentindo o “rei da cocada, mais desejado que bombom de brigadeiro em festa de criança”, de acordo com a decisão. “Seu juiz, eu sou solteiro, gosto das duas, tenho um caso com as duas, mas não quero compromisso com nenhuma delas não senhor”, desabafou. E o juiz Carlos Loiola concluiu: “Estava tão soltinho na audiência, com a disputa das duas, que só faltou perguntar: ‘-tô certo ou errado?’.”

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Vício de origem

Justiça precisa superar cultura de atraso, diz Calmon

Por Rafael Baliardo

Em conferência ocorrida na manhã desta quarta-feira (25/4) como parte integrante do II Congresso Internacional de Direito Administrativo e Administração Pública, em Brasília, os ministros do Superior Tribunal de Justiça Gilson Dipp e Eliana Calmon e o senador Pedro Taques (PDT-MT) participaram de um prestigiado debate sobre a busca de um modelo para a administração do Poder Judiciário no Brasil.

O encontro dos três foi um dos mais aguardados entre as atividades do congresso. No dia anterior, o senador Pedro Taques havia declarado sobre a troca de farpas entre os ministros do STF Cezar Peluso e Joaquim Barbosa que, em um país sério, o episódio incorreria em crime de responsabilidade nos termos da lei. Taques, que irá integrar a CPI que investiga as relações do empresário Carlinhos Cachoeira com autoridades políticas, teve que deixar a conferência antes do seu término por conta da ocorrência da primeira reunião da Comissão Parlamentar de Inquérito na manhã desta quarta feira. O senador era aguardado no encontro que definiu os nomes do presidente e do relator do colegiado que vai investigar o tráfico de influência operado pelo bicheiro.

Taques, durante sua fala, fez diversas referências ao Caso Cachoeira, a maior parte delas em tom de anedota. “O Brasil é o único lugar em que cachoeiras possuem deltas”, disse o senador, conseguindo gargalhadas da plateia em palestra que debatia o papel do STF como legislador positivo.

Primeiro a falar, o ministro Gilson Dipp, que preside o grupo de trabalho que formula o anteprojeto do novo Código Penal, expôs um panorama dos imensos problemas na Justiça penal brasileira que o novo Código terá de contemplar. A previsão é que o anteprojeto seja apresentado ao Congresso em maio.

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A luta contra a impunidade não pode ser pontual

O filme eu já conheço.  Basta que um crime tenha repercussão, em face da expressão da vítima,  e volta-se a falar de impunidade, sentimento que parece adormecido, quando as vítimas são pessoas não destacadas da comunidade. Mas é compreensível – e até bom –  que assim o seja, para despertar, pelo menos eventualmente, esse sentimento que é, para mim, um dos mais relevantes estímulos à criminalidade, vez que,  sentimento inverso, todos sabem, é fator de reconhecida inibição das ações criminosas.

Mata-se todos os dias, assalta-se a toda hora,  dilapidam-se o patrimônio público a olhos vistos, enriquece-se ilicitamente, mas não se vê nenhuma manifestação, de quem quer que seja, acerca desses crimes, cujas vítimas – parentes das vítimas e a sociedade como um todo -, descrentes, já não esboçam a mais mínima reação.

Nesse sentido, importa consignar que, muitas vezes, em face dos crimes contra o patrimônio, por exemplo, as vítimas sequer denunciam a sua ocorrência, pois não acreditam mais na ação dos órgãos persecutórios. O mesmo se verifica em face dos desvios de dinheiro público, que, infelizmente, são uma praga que se dissemina à vista de todos, com efeitos mais do que deletérios para o conjunto da sociedade, sem que se veja, no entanto,   essa mesma sociedade se mobilizando em  face dessa questão.; quando o faz, o faz acanhadamente,  timidamente, como se viu recentemente nas   tímidas manifestações  em face da corrupção  que  permeia a vida pública no nosso país.

Como disse acima,  somente quando o crime atinge, diretamente, uma pessoa destacada, volta-se a falar de impunidade, em insegurança e em fragilidade das nossas instituições, quando o recomendável, o desejável seria que, todos os dias, cada um de nós cobrasse dos agentes públicos uma postura prospectiva no sentido de punir os criminosos, sejam quais forem a sua origem e sejam quais forem as vítimas de sua ação.

Em verdade, a sensação de impunidade é um péssimo sentimento, pois, além de estimular os que têm propensão para o ilícito, ainda estimula o exercício da autotutela dos que não têm essa mesma propensão, mas que se vêem obrigados a  (re) agir em sua defesa e de seu patrimônio, em face da omissão do Estado.

Compreendo que todo dia é dia de combater a violência, de combater a corrupção e outros crimes que infernizam a vida das pessoas de bem. Esse deve ser um objetivo permanente de todos e especialmente dos que representam as instituições responsáveis pela persecução criminal.

A sociedade, cansada de impunidade, clama por justiça. Nós, magistrados, da mesma forma, também sofremos as consequências da impunidade, e, da mesma forma, também clamamos por justiça. Só que, diferente de muitos, essa é uma preocupação constante.

Todos os crimes, sejam quais forem as vítimas, deveriam merecer do Estado a mesma pertinácia que se vê quando o crime atinge pessoas destacadas.

Muito provavelmente os mandantes do crime que ceifou a vida do jornalista Décia Sá serão identificados – e punidos. E  é bom mesmo que sejam, para desestimular esse tipo de prática. Mas esse obstinação das instâncias formais responsáveis pela persecução criminal não pode ser pontual, casuística, condicionada ao destaque da vítima ou à gravidade e repercussão do ilícito.

O que acontecerá com os responsáveis pela morte de Décio Sá será  o mesmo que ocorreu com os  que assassinaram  a juíza Patrícia Aciole no Rio de Janeiro: não ficarão impunes, tendo em vista que, num caso e noutro, o Estado envidará todos os esforços para identificar e punir os responsáveis pelos crimes. Não é isso, inobstante, que ocorre de regra. Como regra o que preponderá mesmo é a impunidade, em face da omissão das instâncias de persecução, as quais, repito, não podem agir ao sabor das circunstâncias, como se os outros viventes não merecessem do Estado qualquer consideração.

Vamos  botar o “bloco” não! Vamos unir nossas forças! Vamos, juntos, combater a criminalidade! Vamos dar um basta nesse grave sensação de impunidade. Mas vamos fazer sempre, independentemente de quem tenha sido a vítima.

Que se prenda e puna, sim, os assassinos de Décio Sá. Mas que se prenda e puna, também, os assassinos de José,  de Pedro, de Manuel, de Maria e de João.

Tudo fica como antes

FERNANDO RODRIGUES

Supremo abafa

BRASÍLIA – Ficará por isso mesmo a recente troca de ofensas entre ministros do Supremo Tribunal Federal. Cezar Peluso chamou Joaquim Barbosa de inseguro. Barbosa revidou com vários adjetivos derrogatórios e foi além -acusou o colega de manipular ou tentar manipular julgamentos e de agir de maneira inconstitucional e ilegal.

Diante de palavras tão pesadas, o presidente recém-empossado do STF, Ayres Britto, deu uma breve entrevista na sexta-feira. Sua concisa explicação: “Os julgamentos do STF têm uma dinâmica, uma dialética e uma lógica próprias. Proferido o resultado, não é possível manipulá-lo, pois manipular o resultado é alterar o conteúdo da decisão”.

Liberal e interessado em modernizar o STF, Ayres Britto dessa vez agiu para jogar água na fervura.

Optou pela saída brasileira de sempre nessas ocasiões: se o problema é de difícil solução, atue como se a encrenca fosse menor do que parece.

Como alegoria, vale imaginar o episódio Peluso-Barbosa sendo protagonizado na Esplanada dos Ministérios. Um dos personagens acabaria punido: o acusado ou o outro por atacar sem provas. No Congresso, deputados ou senadores poderiam até se salvar, mas certamente seriam submetidos ao calor de algum procedimento de esclarecimento -com a devida cobertura da mídia- no Conselho de Ética.

Já no STF “corporativo”, para ficar com a descrição de Joaquim Barbosa, nada ocorre. O presidente da corte dá uma entrevista, afirma que nada de errado aconteceu. Segue-se em frente. Uma pena.

Sem uma resposta convincente, o STF depaupera sua imagem. Abre um flanco perigoso. Réus condenados pela corte estão agora legitimados a perguntar no ato da leitura das sentenças: o julgamento foi manipulado, inconstitucional e ilegal?

É compreensível a opção pelo abafamento do caso. Só é triste que tal caminho seja o escolhido.