Li na Folha de São Paulo, edição desta data
http://www1.folha.uol.com.br/fsp/opiniao/fz2609200901.htm
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O papel do Senado
Falta empenho para transformar sabatinas de aspirantes ao STF em sessões de rigorosa vigilância institucional
A INDICAÇÃO do advogado José Antonio Dias Toffoli para o Supremo Tribunal Federal gera controvérsia que vai além das impressões de ordem pessoal.
É um equívoco imaginar que o pressuposto do notável saber jurídico decorre automaticamente de cursos de especialização ou de teses de doutorado. Outro equívoco é o de supor que a circunstância de o candidato ao STF ocupar funções de relevo no governo comprometeria, por si só, sua independência depois.
Celso de Mello é exemplo concreto de jurista sem doutorados e ligado por laços funcionais ao presidente que o indicou -José Sarney. Ao assumir a condição de ministro do STF, revelou-se juiz independente, culto e sensível. Leitão de Abreu, nomeado pela ditadura, foi responsável por generosa jurisprudência liberal. Na história não faltam exemplos de ministros aparentemente distantes dos governos e com currículos alentados que, no entanto, deixam as marcas da mediocridade e da tibieza.
Notável saber jurídico se aquilata pela capacidade política e técnica de fazer prevalecer os valores protegidos pela Carta.
A incerteza causada pelo nome de Toffoli está no fato de ter-se notabilizado profissionalmente, apenas, como advogado do PT na Justiça Eleitoral e, no governo, como homem de confiança do partido. Reduzir a polêmica a critérios supostamente ideológicos, como se existisse uma resistência “conservadora” à sua nomeação, não é verossímil, até porque há tempos o PT deixou de lado seus pruridos “progressistas”…
O Brasil dispõe de mecanismos institucionais para controlar as nomeações e a atuação dos ministros do Supremo. O que falta é empenho de seus protagonistas para que o sistema funcione.
Indicação pelo presidente da República e aprovação pelo Senado é modelo que funciona e bem nos EUA. Lá os candidatos são submetidos a rigorosa investigação e a sabatinas que envolvem o exame dos seus atos pretéritos e do seu pensamento sobre assuntos na ordem do dia.
Seria Toffoli um bom juiz no Supremo Tribunal Federal? Ou apenas mais um agente do aparelhamento do Estado?
Participaria de julgamentos que envolvessem os interesses do PT e do próprio governo, como nos casos do “mensalão” e da extradição de Cesare Battisti? Seria, na área penal, garantista? Qual sua posição em relação ao funcionamento das polícias e do Ministério Público e à intervenção estatal na economia? Cabe ao Senado mostrar ao país quem é, de fato, o postulante indicado por Lula e se tem preparo para ocupar cargo de tal relevo.
A lei que define crimes de responsabilidade prevê o impeachment para ministros do STF. Participar de julgamentos em relação aos quais é suspeito de parcialidade, exercer atividade político-partidária, ainda que sorrateira, ser desidioso ou proceder de modo incompatível com a honra e o decoro são atos intoleráveis na mais alta corte do país.
O importante em relação a José Antonio Toffoli ou a qualquer ministro do STF em atividade é a vigilância institucional -antes e depois de assumir o cargo. Que o Senado cumpra seu papel.