Estar alegre

É bom estar alegre; faz bem a alma o estado de alegria.

A alegria contamina, deixa o ambiente leve.

A pessoa alegre galvaniza as atenções; o mundo em torno dela é mais colorido.

Mas a alegria, sabemos, não é uma constante.

A alegria, muitas vezes, se manifesta como um espasmo.

Não se deve, por isso, deixar de afagá-la quando ela cai no colo da gente.

Como constata Rubem Alves,  ninguém sabe produzir alegria. A alegria acontece, simplesmente.

Todavia, para que ela se manifeste, temos que preparar-lhe o ambiente, aconchegá-la nos braços, emprestar-lhe o colo, dar-lhe calor, dar-lhe as boas-vindas.

Nós podemos, sim,  contribuir para estar alegres. Para esse fim, pode ser suficiente  estar em paz com a vida, de bem com o universo.

Para estar em paz com a vida, no entanto, é preciso descomplicar, deixar a vida fluir sem interromper o curso dos acontecimentos, sem querer mais do que é possível, sem pretender ser mais realista que o rei.

Em quase permanente estado de alegria – e, por consequência, de felicidade –   uma dúvida que sempre me afligiu é saber se é possível ser  feliz quando se abriga no peito uma grande saudade.

É que a saudade, muitas vezes, dói. Se  dói, então, em tese,  seria  inviável ser feliz quando se sente saudade.

Bem, mas o importante mesmo é a constatação de que a alegria dá brilho e sentido à vida.

A pessoa alegre e esfuziante,  contamina, contagia as pessoas que estão em seu entorno.

Ao reverso, uma pessoa sorumbática, soturna, cara de poucos amigos,  torna a relação complicada, sobretudo quando não há razão para se estar taciturna  ou melancólica.

O importante para essas reflexões é a constatação definitiva de que a pessoa alegre deixa transparecer estar em paz com o universo, sente que a vida faz sentido (Rubem Alves).

Se é assim, então a minha vida tem sentido, afinal, estou bem, estou alegre, estou  feliz.

Desídia e punição

Plenário aplica punição a juiz da Comarca de Parnaíba (PI)

12/12/2012 – 16h48

Gil Ferreira/Agência CNJ

Plenário aplica punição a juiz da Comarca de Parnaíba (PI)

O Conselho Nacional de Justiça (CNJ) determinou, na 161ª. sessão ordinária, realizada na terça-feira (11/12), a aplicação da pena de censura ao titular da 1ª Vara Criminal da Comarca de Parnaíba, juiz José Ribamar de Oliveira Silva. O magistrado havia sido punido com uma advertência pelo Tribunal de Justiça do Piauí (TJPI) por ter proferido decisões reiteradas de soltura de presos provisórios sem a devida intimação ao Ministério Público.

Correição realizada nas Promotorias Criminais da Comarca de Parnaíba pela Corregedoria Geral do MP constatou também a existência de 739 processos conclusos para o juiz. Destes, 180 estavam completamente parados há mais de um ano. Foram verificados ainda processos relativos a presos provisórios parados há mais de três anos.

Diante dos problemas verificados, o Ministério Público do Estado representou o magistrado à Corregedoria do TJPI, que encaminhou ofício ao magistrado determinando que o MP fosse intimado das decisões. A medida, no entanto, não foi cumprida.

A Corregedoria do TJPI sugeriu então ao pleno do Tribunal a abertura de processo administrativo disciplinar contra o magistrado, que resultou em pena de advertência. Considerando branda a penalidade aplicada e “contrária às provas dos autos”, o Ministério Público do Estado do Piauí pediu ao CNJ a revisão da decisão.

Em seu voto, o relator do pedido de revisão, conselheiro Jefferson Kravchychyn, entendeu que a penalidade aplicada pelo TJPI está “em desacordo com a evidência dos autos”, devido à reiteração das condutas e procedimentos incorretos adotados pelo magistrado, como o não recebimento de recursos do Ministério Público e a ausência de intimação prévia do MP em decisão de liberdade provisória concedida a um réu acusado de crime inafiançável.

“No presente caso, o magistrado foi negligente ao não remeter o processo ao Ministério Público, porquanto não lhe permitiu o conhecimento da decisão, ficando, pois, impedido de tomar as medidas judiciais cabíveis, caso querendo, para a revisão do provimento judicial”, afirma o conselheiro. O voto do conselheiro Kravchychyn foi seguido pelos demais conselheiros presentes.

Tatiane Freire
Agência CNJ de Notícias


Espaço livre

Janio de Freitas

No lugar dos direitos

O SUPREMO Tribunal Federal distancia-se da condição de exemplo de instituição democrática. Não por questionamento, aqui incabível, ao seu nível jurídico. Mas, dito de uma vez, a liberdade de pensamento e de expressão da divergência já não são direitos com reconhecimento imediato, pleno e ininterrupto no tribunal incumbido de protegê-los.

A relutância em admitir a divergência e a pressão para confrontá-la tornam-se práticas aceitas ali.

Um momento particularmente ilustrativo na sessão de ontem, entre vários possíveis, foi a abrupta interrupção sofrida pela ministra Cármen Lúcia no instante em que, concluída sua argumentação, expressaria o voto.

Foi cortada por cobrança rude do ministro Joaquim Barbosa, que desejava dela -“antes do seu voto!”- respostas a “duas perguntas” dele. (A primeira, ao lhe dar determinado apoio até então no mínimo incerto, levou à dispensa da segunda).

Ato arbitrário e injustificável. Mas não inovador no que se passa com os ritos próprios do tribunal.

As interrupções não mais se dão só pelas exigências do debate jurídico, das complementações argumentativas e dos questionamentos enriquecedores.

É sempre esperável uma interrupção áspera do relator, quando se insinua uma discordância com sua posição.

Ou o oposto, quando a interrupção viria de um ministro para provável discordância com o relator. Caso assim ilustrativo: em sessão da semana passada, o ministro Ricardo Lewandowski pede um aparte ao ministro Joaquim Barbosa, que fazia uma de suas argumentações.

O pedido foi negado e despachado para depois de concluída a exposição.

Logo em seguida o ministro Luiz Fux interrompeu-a -com assentimento e aprovação de Joaquim Barbosa, que receberia mais um argumento de apoio do colega.

A aspereza está incorporada à linguagem do tribunal há tempos. É uma decorrência de maneiras e relações pessoais. O novo problema vai além, e não adianta fingir-se que inexiste.

O autoritarismo se mostra no Supremo que deve ser o mais sólido baluarte a impedi-lo.

E, em lugar de refutação, o que transparece diante dele é pior do que acomodação: o que a aparência sugere são situações de intimidação da discordância”.

Do sítio os constitucionalistas

Israel Nonato
10.12.12

Barroso 3.0: vida, audácia e dois novos livros

 

DOIS NOVOS LIVROS

Luís Roberto Barroso lança hoje, em Brasília, dois novos livros: O Novo Direito Constitucional BrasileiroA Dignidade da Pessoa Humana no Direito Constitucional Contemporâneo. A noite de autógrafos é aberta a todos e começa às 19 horas no restaurante Le Jardin du Golf, que fica no Clube de Golfe, localizado no Setor de Clubes Sul, Trecho 2, próximo ao CCBB.

Barroso, que celebra 30 anos de vida acadêmica, conversou com Os Constitucionalistas sobre os livros. Leia a entrevista. E confira os trechos em pdf cedidos gentilmente pelo autor.

Os Constitucionalistas: Dois livros de uma vez? O que há de inovador neles?

Luís Roberto Barroso: O primeiro livro intitula-se A Dignidade da Pessoa Humana no Direito Constitucional Contemporâneo: A construção de um conceito jurídico à luz da jurisprudência mundial. É o produto da pesquisa que fiz ao longo do primeiro semestre de 2011, quando estive na Universidade de Harvard como visiting scholar. O projeto inicial de pesquisa, inclusive, foi publicado no Os Constitucionalistas. Durante a minha estada em Harvard, ampliei minha investigação sobre o tema e publiquei, nos Estados Unidos, a versão em inglês sob o título Here, There, and Everywhere: Human Dignity in Contemporary Law and in the Transnational Discourse (clique aqui para ler a versão resumida do texto em inglês). Publico agora a versão em português. A tradução foi feita por um mestrando da UERJ, Humberto Laport de Mello, e revista por mim. Acrescentei ao final um capítulo sobre o uso da dignidade pela jurisprudência brasileira. É um livro curto, de 120 páginas, que procura dar à vaga ideia de dignidade humana uma dimensão objetiva e operacional. Proponho três conteúdos essenciais para a dignidade. Três conteúdos que, a meu ver, servem de roteiro para a solução de casos difíceis.

Os Constitucionalistas: E o segundo livro?

Luís Roberto Barroso: O segundo livro chama-se O Novo Direito Constitucional Brasileiro: Contribuições para a construção teórica e prática da jurisdição constitucional no Brasil. O livro é dividido em duas partes. A primeira contém as minhas contribuições teóricas. Textos sobre efetividade das normas constitucionais, interpretação constitucional, pós-positivismo, neoconstitucionalismo, judicialização e dignidade, de novo. Antes de cada um desses trabalhos, que foram publicados ao longo dos anos, eu apresentei uma nota introdutória, contextualizando o momento em que foi escrito e os propósitos visados. A segunda parte é totalmente inédita e diz respeito a cinco dos casos mais rumorosos em que atuei como advogado: anencefalia, uniões homoafetivas, pesquisas com células-tronco embrionárias, nepotismo e Cesare Battisti. Eu narro os antecedentes do caso, as teses jurídicas, os bastidores e alguns episódios pitorescos. Concluo cada capítulo dos cinco casos com um tópico intitulado “O que ninguém ficou sabendo”. Alguns são divertidos. Outros dramáticos.

Imperdíveis:

Leia aqui um trecho do livro A Dignidade da Pessoa Humana no Direito Constitucional Contemporâneo.

Leia aqui um trecho do livro O Novo Direito Constitucional Brasileiro.

VIDA E AUDÁCIA

É verdade. Pensar pede audácia. E ninguém hoje é mais audacioso, no Direito Constitucional brasileiro, que Luís Roberto Barroso. Você pode discordar. Pode. Até ler os dois novos livros que ele lança em Brasília nesta segunda, 10 de dezembro. Barroso é um cara que pensa e faz. Teoria e prática indissociáveis. Professor na UERJ. Visiting Scholar em Harvard. Advogado no Supremo Tribunal Federal. Tudo ao mesmo tempo. Claro, não é infalível. Nenhuma vida é feita só de vitórias. Mas Luís Roberto Barroso sabe que a vida é feita das circunstâncias e do possível, não do ideal. E esse conhecimento, aliado aos 30 anos de academia e à humildade que o caracterizam, é fundamental para ir além, reinventar a jurisdição constitucional. Poderia citar algumas ideias para comprovar minhas palavras. Como, por exemplo: “O problema brasileiro atual não é excesso de judicialização, mas escassez de boa política” (O Novo Direito Constitucional Brasileiro, p. 42). Ou: “(…) sempre que uma questão moral significativa estiver presente, a melhor atitude que o Estado pode tomar é estabelecer um regime jurídico que permita aos indivíduos dos dois lados em disputa exercerem a sua autonomia pessoal” (A Dignidade da Pessoa Humana no Direito Constitucional Contemporâneo, p. 98). Poderia… Mas não o farei. Não sou estraga-surpresas (spoiler). E nem tenho a pretensão de resenhar o que quer que seja. Prefiro que você, sozinho no quarto, leia e descubra o que toca você profundamente. É no silêncio que se dá a revolução do Direito Constitucional. A revolução que é descortinada e (re)interpretada por Barroso nos dois novos livros. Mas advirto: depois de ler Luís Roberto Barroso, versão 3.0, você não será mais o mesmo. Tornar-se-á um “barrosiano”. Se já não o é, sem saber. Afinal, pensar pede audácia.

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Israel Nonato é editor do blog Os Constitucionalistas.

Práticas reiteradas e disseminadas

Eu nunca espero alguma coisa boa da nossa classe política. A experiência me ensinou a não confiar, conquanto admita que há uma minoria, bem minoria mesmo, bem-intencionada. Mas essa minoria quase nunca consegue realizar; se não está engajada com a maioria sem compromisso, não faz, não realiza, não edifica; e, quando se alia, perde o rumo e a identidade.

Para dar sustentação a essa linha de argumentação, vejo, no jornal O Globo, de ontem,  matéria da jornalista Letícia Lins, na qual destaca a omissão dos prefeitos de Pernambuco, os quais abandonaram serviços essenciais, pelo simples fato de não terem sido reeleitos ou de não terem feitos os seus sucessores.

O promotor de justiça coordenador do Centro de Apoio Operacional às Promotorias de Defesa do Patrimônio Público, Maviael de Souza Silva, citado na matéria, resume a situação nesses termos:

“O que se observa é que os prefeitos se voltaram contra a população porque não foram reeleitos ou não conseguiram fazer os sucessores. Por perversidade, suspendem serviços básicos ou essenciais que vinham sendo normalmente prestados até o dia da eleição. Relaxaram na limpeza pública, exoneraram professores, atrapalhando o calendário escolar, suspendem o transporte de alunos da rede municipal, e até chegam a propor que os servidores  trabalhem como voluntários, na esperança de serem recontratados pelo próximo prefeito. Alguns, quando saem, destroem toda a documentação e zeram os computadores para o sucessor”

Pode ter certeza que aqui no Maranhão não é diferente.

O grave é que, no próximo pleito, esses irresponsáveis voltam a se candidatar, com potencial possibilidade de vir a ser eleitos novamente, para, no futuro, sem nenhuma dúvida, no exercício do mandato, voltarem às mesmas práticas.

O que o ilustrado promotor de justiça denuncia é apenas a face mais visível do que ocorre em todo Brasil.

Se os promotores de justiça do Maranhão assim o desejarem, vão encontrar coisas mais graves que as qui noticiadas.

Mas não adianta só a ação do Ministério Público; o Poder Judiciário, quando provocado, deve dar uma resposta pronta e eficaz, no sentido de coibir esses abusos e punir eventuais transgressores.

O bom profissional

O bom profissional deve fazer do estudo uma prática corriqueira, do dia a dia, como se fosse uma necessidade – para o corpo e para a alma.

O profissional que quer se fazer respeitar não pode se limitar a fingir que sabe. Não deve enfrentar teses das quais eventualmente discorde com falácias e frases de efeito, que servem apenas, quando muito, para ludibriar, para afrontar a realidade.

Não é bom fingir que sabe; o profissional tem que saber mesmo – ou, pelo menos, se esforçar para saber -, para discutir teses colocadas em tablado com o mínimo de base intelectual.

O bom profissional deve ser humilde. Não deve discorrer sobre o que não sabe, fingindo que sabe.

O bom profissional deve ser verdadeiro. Não deve admitir que sabe, sobretudo quando a sua ignorância salta aos olhos de todos.

O bom profissional deve ser altaneiro o suficiente para, diante de um embate, admitir não ter argumento para enfrentar as teses antípodas às suas.

É preciso levar em linha de conta que pensar e não dar sustentação intelectual ao pensamento, é o mesmo que não pensar, que agir como um autômato.

Para se fazer respeitar, o bom profissional não deve se limitar a repetir conceitos vagos e muitas vezes descontextualizados, desatualizados, numa embalde tentativa de transparecer que sabe o que efetivamente não sabe. Esse tipo de profissional serve de galhofa, pensa que engana, pois não tem consciência – ou finge não ter – de sua própria ignorância.

Eu, cá do meu canto, ciente e consciente das minhas limitações intelectuais – mas não me falta boa vontade e dedicação, registro – tenho procurado emitir opiniões apenas em face das matérias que tenha o mínimo de conhecimento; e, ainda assim, o faço com o espírito aberto, ciente de que, convencido da relevância dos argumentos contrários aos meus, devo, com humildade, acolher a tese que transpareça mais consentânea.

Eu não confio, eu não acredito no profissional que não estuda, que não se atualiza, que vive desplugado do pensamento contemporâneo, que não aprendeu as lições ministradas no passado, que vive no mundo da lua, com os pés fincados na terra, da qual retira apenas o fruto que lhe sacia a vaidade.

Eu não confio – ninguém confia, todos desconfiamos – no profissional que, no enfrentamento de uma tese, sem estar credenciado para esse fim, faz mero jogo de palavras, brada e reage, sem respeitar o ponto de vista do congênere, exatamente para obliterar a sua própria deficiência, sua indigência intelectual, numa tentativa malsã de mascarar a realidade.

Com a experiência que todos acumulamos, não raro flagramos esse tipo de profissional nas mais diversas oportunidades que a vida nos oferecesse.

No caso específico do magistrado, registro, ademais, não basta, tão somente, estudar, se preparar intelectualmente para o (saudável) embate de ideias. O magistrado deve, de mais a mais, colocar-se acima de qualquer suspeita; não deve aceitar pressão ou manipulação de quem quer que seja, não deve decidir aos sabor das circunstâncias, apenas para agradar, para fazer valer o poder que tem.

O magistrado, como lembra Aury Lopes, não tem que ser um sujeito representativo, posto que nenhum interesse ou vontade que não seja a tutela dos direitos subjetivos lesados deve condicionar o seu juízo.

É preciso ter em mira que a atuação do juiz não é política, mas constitucional, consolidada na função precípua de proteção dos direitos fundamentais, ainda que para esse fim tenha que adotar posição que se contraponha à maioria.

Sentença não dá em árvore

José Luiz Munhoz

A cada ano os juízes brasileiros proferem 22 milhões de novas sentenças, solucionando litígios, aplicando o direito, resolvendo processos, salvando vidas. Tal marca é impressionante, pois significa que a cada dia útil são publicadas no Brasil 100.000 sentenças. No chamado horário comercial são 12.500 (doze mil e quinhentos) julgamentos por hora, 208 (duzentos oito) por minuto, conforme dados do Conselho Nacional de Justiça.

Atrás dos 22 milhões de sentenças proferidas a cada ano, portanto, outros milhões de atividades são praticadas pelos magistrados.

A produtividade do juiz brasileiro é muito grande, e não por acaso milhares de presos são encaminhados ao sistema prisional a cada ano (obviamente por conta das decisões judiciais!). Justamente pela atuação extraordinária da magistratura brasileira ingressam nos cofres públicos dos Estados e da União quase 22 bilhões arrecadados anualmente pelos tribunais (dados de 2011), dentre tributos, custas, emolumentos; quase R$ 10 bilhões são pagos anualmente aos trabalhadores pela Justiça do Trabalho, R$ 700 mil são destinados aos aposentados e pensionistas pela Justiça Federal, bilhões de reais são repassados por ano às pessoas em razão das sentenças condenatórias ou decorrentes da conciliação na Justiça Estadual.

Além disso, guarda de menores e adoções são decididas, ações declaratórias (sem valor monetário) são julgadas e as eleições são magnificamente conduzidas (as melhores e mais céleres do planeta!).

Desnecessário referir, portanto, a importância da atuação do Judiciário para a sociedade brasileira. Ocorre, todavia, que na outra ponta da linha temos profissionais sobrecarregados de atribuições e responsabilidades, com 26 milhões de novos processos aguardando por eles a cada ano (muitos deles em razão das tantas falhas estruturais do próprio Estado), tendo de cuidar, enfim, dos tantos interesses da cidadania em todo o país.

Diante disso, é inconcebível que alguns ainda façam ironias sobre a quantidade de trabalho dos juízes, insinuando que pouco trabalham ou que só o fazem em certos dias da semana.

Como se vê, sentença não dá em árvore, muito menos na base de 22 milhões por ano! A mídia, de modo geral, enaltece a liberdade de suas próprias atividades, mas em muitos casos se es- quece de sua obrigação de dar voz ou demonstrar o “outro lado da moeda” pois só com isso se pode garantir uma real e verdadeira formação crítica da opinião pública.

Lembramos que a imprensa, para ser livre e independente, também se socorre dos princípios que o Judiciário tanto defende. A crítica construtiva sobre as instituições deve ser feita também de colaborações e reconhecimento. Esperamos, um dia, que o princípio do contraditório — valor tão caro aos juízes para a formação de sua opinião sobre os casos sob sua condução — venha a ser devidamente observado pelos meios de comunicação e, com isso, se possam afastar os preconceitos, injustiças e as distorcidas visões sobre a atuação dos juízes brasileiros.

Juiz do Trabalho e integrante do CNJ

Como um ônibus sem freio

Nas relações que travamos com o ser humano somos, com muita frequência, surpreendidos em face de suas atitudes: umas inesperadamente liberais; outras, inusitadamente radicais.

De qualquer sorte, o certo mesmo é que o ser humano é surpreendente nas suas mais diversas manifestações.

O homem comum pode surpreender nas suas relações interpessoais. Nada que possa ser reparado ou condenado.

Compreendo, inobstante, que o magistrado, no exercício do seu mister, não pode surpreender a cada momento, não pode, ao sabor das circunstâncias, mudar de posição, porque isso causa insegurança jurídica, essas atitudes desprestigiam o Poder Judiciario.

O grave, nesse sentido, é que não só o magistrado volúvel cai em descrédito; ele leva consigo a própria instituição.

A verdade, gostemos ou não da constatação, é que há magistrados, tal qual o homem comum, que muda de posição de acordo com as suas conveniências ou dos seus amigos.

É impressionante como o homem, sobretudo o que tem poder, pensa que tudo pode. Se é magistrado e é mal-intencionado, aí, meu amigo, sai de baixo! Ele quase sempre pensa que tudo pode! Confia na impunidade! Trata mal os colegas, afronta os advogados, faz interpretações equivocadas – e, às vezes, até maldosas.

Tudo depende do seu humor – os dos interesses que eventualmente defenda.

Eu tenho medo, pavor do ser humano mal- intencionado. Se esse ser humano tiver uma toga sobre os ombros, aí é que tenho medo mesmo.

Aquele que tiver a infelicidade de ter como desafeto um togado, está perdido. Ao reverso, aquele a quem o togado assume o compromisso de defender, pode levantar a mão para o céu.

Tenho pavor desse tipo de magistrado! E eles existem, não tenha dúvidas.

Mas é claro que não são todos os togados que são capazes de fazer o que acabo de descrever acima. A maioria, a absoluta maioria pensa e age de outro modo. A quase totalidade, diria.

O diabo é que a minoria mal-intencionada é barulhenta – e nada teme. Age às escâncaras! Desafia! E, pior, é arrogante. Age como um ônibus sem freio! Nada é capaz de lhe conter o ímpeto.

Na defesa dos seus interesses e dos seus amigos, esse tipo de togado é capaz de ir ao inferno e levar consigo quem se atrever tentar impedi-lo. Isso ocorrendo, ele vira fera! Fala alto, gesticula, cria factóite, finge saber o que não sabe, fala como se o fizesse com propriedade, no afã de enganar, de iludir, de levar adiante o seu projeto.

É uma pena que ainda exista magistrado dessa estirpe. É uma pena que ainda exista quem aplauda esse tipo de magistrado, muitos dos quais não consegue enganar, de rigor, nem a si próprio.

Esse tipo de togado não tem convicção! Age ao sabor das circunstâncias! Tem o céu como limite! Julga-se o mais sagaz, o mais atilado, o mais mais – um ser superior, enfim.

Esse tipo de togado é daqueles que vê o mundo por um espelho. Só tem os olhos voltados para seu próprio ser. Não tem compromisso! Vive de arroubos, de enganação, de falácia. Pensa que o poder é uma patuscada, que para ser magistrado basta jogar uma toga sobre os ombros.

Esse tipo de magistrado age por impulso, por conveniência. Não tem controle sobre o seu inconsciente.

Pobre do jurisdicionado que tenha que conviver com esse tipo magistrado.

Felizmente, repito, esse tipo de magistrado é minoria. Mas é uma minoria barulhenta e perigosa, repito. O CNJ já nos livrou de alguns. De outros nos livraremos mais dias menos dias.

Atenção: o magistrado que não se encaixa nesse perfil, não tem o que se agastar: nem com as minhas reflexões, nem com as ações do CNJ.