“…É necessário, pois, no exame dessas questões, que o magistrado aja com sensatez e equilíbrio; sensatez e equilíbrio que, por razões óbvias, não se pode, muitas vezes, esperar dos contendores…”
Juiz José Luiz Oliveira de Almeida
Titular da 7ª Vara Criminal.
É lugar comum: todo meliante, máxime o escolado, quando é preso, sem ter, no momento, a quem apelar, confessa o crime, nos mínimos detalhes. Depois, quando está diante do juiz, por óbvias razões,diz que foi torturado e que, só por isso, confessou o crime. Com o terreno preparado, a defesa técnica, de sua parte, passa, em sede judicial, a desqualificar, a confissão feita em sede administrativa.
O meliante, com pós-graduação em criminalidade, vai além: se recusa, pura e simplesmente, a falar em sede administrativa, deixando para fazê-lo somente em juízo; assim o faz por já ter sido orientado em face de outros ilícitos praticados.
O meliante com mestrado em criminalidade, vai mais além: simplesmente nega a autoria do crime. Nada, ainda que seja torturado, o estimula a confessar o crime. Ele sabe que é a única chance que tem de escapar de uma punição. Ele confia que a vítima – e qualquer outra testemunha -, temerosa, não vai lhe imputar a prática do crime. E é o que ocorre, de fato. A vítima, sem ter a quem apelar, sabendo que o Estado não lhe dará nenhuma proteção, reconhece o acusado, mas prefere tergiversar.
O certo é que, com essas condutas, o que pretendem mesmo os acusados, devidamente orientados, é desprestigiar, a qualquer custo, a prova administrativa.
Para mim, eis, aí, uma das razões – a principal delas – pela quais à autoridade policial não recebe da população – nem dos poderes constituidos – o reconhecimento que devia receber.
Por conhecer essa prática marginal é que nunca deixo de prestigiar a autoridade policial. Eu não aceito que joguem todos na vala comum. O justo – belo clichê – não pode pagar pelos pecadores.
Há, sim, quem cometa desatino. Há, sim, que pratique violência contra os acusados. Há, sim, quem arranque confissões a fórceps. Mas não são todos. É a minoria. Não se pode, em face da conduta de uns poucos, generalizar e despretigiar, simplesmente, a prova administrativa.
Eu, de minha parte, continuo prestigiando a prova extrajudicial, na medida em que ela possa ser chamada para compor o quadro probatório. Não se pode, sem mais nem menos, desmerecer a prova extrajudicial, como se fosse produzida por um marginal. Se há provas produzidas em sede judicial, eu não me acanho em buscar as administrativas, máxime a confissão – e as periciais, claro – para compor o quadro de provas. Com isso sei que não faço nenhuma injustiça aos acusados; prestigio, apenas e sem fazer nenhum favor, o trabalho da Polícia Judiciária, que não é produtora de marginais, como se tenta fazer crer.
A propósito, ainda recentemente decidi um pedido de liberdade provisória, em cuja decisão fiz questão de consignar que os Delegados de Polícia, assim como os magistrados, como consignei acima, não são produtores de marginais.
A seguir antecipo excertos da decisão.
- Basta examinar o caderno administrativo, desapaixonadamente, para se ver que há, sim, indícios de autoria, muito embora se possa supor que a vitima, ao reconhecer o acusado ALTEREDO PEREIRA RODRIGUES, o tenha confundido com seu irmão e co-réu MAURO CÉSAR PEREIRA RODRIGUES.
- É cediço que a autoridade policial pode ter sido açodada, pode ter cometido uma injustiça ao prender o acusado ALTEREDO PEREIRA RODRIGUES; mas é de boa cepa que se compreenda que nem o signatário e nem a autoridade policial são produtoras de marginais, a considerar que não agimos de má-fé.
- Até que se prove que ela – a autoridade policial – não agiu nos estreitos limites de sua responsabilidade e conforme ius, não se pode afirmar que tenha armado contra o acusado ALTEREDO PEREIRA RODRIGUES o qual, ipso facto, seria inocente.
- É necessário, pois, no exame dessas questões, que o magistrado aja com sensatez e equilíbrio; sensatez e equilíbrio que, por razões óbvias, não se pode, muitas vezes, esperar dos contendores.
- Nessa linha de raciocínio, é sempre bom sublinhar, o juiz não pode agir em face da emoção das partes envolvidas no conflito; tem que ser – ou, pelo menos, tentar ser – superior às querelas pessoais, as quais, muitas vezes, aí sim, podem determinar a produção de decisões injustas.
- O magistrado tem que ter a capacidade, ainda que seja muito difícil, de decidir sem sofrer influência exógena, e, tão-somente, com esteio nos dados fornecidos pelo processo que se põe a examinar, para não flexionar a sua decisão, perigosamente, para o caminho que o leve a cometer uma injustiça.
Agora, a decisão, por inteiro.
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