Etiquetado! Estereotipado!

“O homem etiquetado, sobretudo em uma instituição, nunca mais se libertará do estereótipo. Daí em diante a sua personalidade, o seu nome, a sua história passará a se confundir com a etiqueta”. 

Juiz José Luiz Oliveira de Almeida

Titular da 7ª Vara Criminal

 

Uma das mais encenadas peças de Nelson Rodrigues é, seguramente, Beijo no Asfalto. Na peça um pedestre é atropelado por um ônibus e fica agonizando na rua. Nessa hora passa um transeunte, o segura nos braços e o beija nos lábios. O beijo, a maldade humana não percebeu, era apenas um beijo de despedida, de solidariedade. 

Ocorreu, entrementes, que um repórter, inescrupuloso e mal intencionado, sedento por um escândalo, noticia que os homens eram amantes. 

Pronto! Estava feito o estrago. Nem mesmo a mulher do solidário acreditou mais nele. Passou a duvidar de sua masculinidade. O homem, casado, pai de filhos, passou, de repente, a ser homossexual. Estava feito o estrago na vida dele -e da família.

É assim mesmo que se estigmatizam as pessoas. Etiquetam-nas, maldosamente, a partir de uma inverdade; e essa inverdade, fruto da maldade do ser humano, fica grudada na testa como uma etiqueta.

Estereotipado, carimbado pela maldade humana, o homem jamais se livrará da pecha, do apodo. É com se fosse uma daquelas marcas que são produzidas nos semoventes para identificar o proprietário. 

O homem etiquetado, sobretudo em uma instituição, nunca mais se libertará do estereótipo. Daí em diante a sua personalidade, o seu nome, a sua história passarão a se confundir com a etiqueta. 

É como ocorre com os bens de consumo, quando a marca se confunde com o produto. Todos lembram que, outrora, quando se pretendia comprar uma lâmina de barbear se procurava no comércio por gilete, que todos sabem, é a marca de uma lâmina de barbear. 

Não é de hoje, não é de ontem que, à falta de argumento para me diminuir enquanto pai de família e magistrado, alegam, sem nenhum dado concreto, que sou arrogante e criador de caso. Há até os que dizem que, quando chegar ao Tribunal, vou incendiá-lo. 

Não bastava me etiquetarem de arrogante. Agora, desde olhar dos maldosos, passei à condição de incendiário. 

Mas eu encaro tudo isso com equilíbrio. O homem é maldoso mesmo. Eu sou muito exibido. Eu gosto de ler, de escrever e de pensar. E, pra completar, me entrego totalmente ao trabalho. 

Numa corporação, ter independência, ter lucidez, decidir com retidão é muito mais que arrogância, é puro exercício de pirotecnia, daí, quiçá,  a etiqueta de incendiário.

Quando se quer diminuir, desmerecer, desacreditar uma pessoa, é assim que se faz: gruda-se nela uma etiqueta na testa, para que nunca ninguém esqueça que ela pode até ter virtudes, mas também tem graves defeitos que as tornam desinteressantes, desprezíveis, desimportantes. 

Espero poder mostrar, um dia, que estão equivocados e que, no Tribunal, pretendo apenas somar esforços para valorizar a instituição.

Vão-se os anéis – e os dedos, também

Vivendo como somos obrigados a viver nos dias atuais, sem paz de espírito, atormentados pela violência, pela corrupção, pelas injustiças sociais e por tantas coisas mais que nos infelicitam, sou remetido, inapelavelmente, a Confúcio que, mesmo pobre, tinha tanta alegria de viver que chegou a pensar que a vida bem vivida era mais importante do que qualquer vida após a morte. Confúcio, importa lembrar, vivendo num mundo de ambição e traição, exaltava a cortesia e a lealdade, a humildade e a delicadeza. Só podia mesmo ser muito feliz. Quantos de nós precisamos lembrar das lições de humildade de Confúcio?

Juiz José Luiz Oliveira de Almeida
Titular da 7ª Vara Criminal

Vou publicar, a seguir,  mais uma das muitas crônicas que fiz – e faço – em face da quase insuportável violência que permeia a  vida em sociedade.

Antecipo abaixo um fragmento da crônica em comento:


 

  1. Vejo agora que, conforme parece, não basta entregar os anéis para preservarem-se os dedos. Vejam o que aconteceu no Rio de Janeiro com o empresário Marcelo Viana e com a publicitária Paula Barreto. Foram assaltados, ainda conversaram civilizadamente com os autores do crime, entregaram tudo que tinham aos quatro assaltantes, sem reagir. Todavia, ainda assim, foram jogados num abismo, na Av. Niemeyer. Não morreram por sorte. Contudo, arrasados psicologicamente – para sempre, não tenho dúvidas.
  2. Será que não bastava assaltar? Não bastava a violência? Não era suficiente o abalo psicológico? Não foi suficiente a subtração dos bens e da paz? Não bastava infernizar a vida das vítimas? Não bastava lhes tirar o sossego? Não foram suficientes os anéis? Querem também os dedos?

 

 

A seguir, a crônica, por inteiro.

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Liberdade provisória. Indeferimento. Réu recalcitrante. Necessidade de preservação da ordem pública.

Temos todos que, diante de situações desse matiz, lutar com as armas que dispomos para combater a criminalidade.
A ação sinuosa, claudicante das instâncias formais de combate à criminalidade tem fomentado, não tenho dúvidas, a criminalidade, sobretudo a miúda, aquela que inferniza a nossa vida.
O assaltante em liberdade hoje, não tenho dúvidas, voltará a, outra vez, hostilizar a ordem pública. Essa tem sido a regra. Esse tem sido o lugar comum.
Entendo, por isso, que o acusado não pode voltar ao convívio social, máxime porque, colho dos autos, é recalcitrante.
Juiz José Luiz Oliveira de Almeida
Titular da 7ª Vara Criminal 

No pedido de liberdade provisória que publico a seguir, enumerei, em determinado excerto, 12 (doze) razões pelas quais entendi devesse manter a prisão do acusado , as quais antecipo a seguir:

  1. “(…)
    1. A uma, porque se lhe imputa o MINISTÉRIO PÚBLICO a prática de crime grave.
    2. O roubador, tenho dito e redito, afirmado e reafirmado, não pode ser agraciado com a sua liberdade provisória, que, para mim, nada mais que é que um passaporte para a criminalidade, com a chancela do Poder Judiciário.
    3. A duas, porque o crime imputado ao requerente é de especial gravidade.
    4. A três, porque, ao que assoma dos autos principais, o requerente age sem peias e sem controle de suas ações, tanto que tentou assaltar as vítimas plena luz do dia, à vista de todos, sem a mais mínima timidez.
    5. A quatro, porque, ao que dimana dos mesmos autos, tem domicílio em outro Estado, tudo fazendo entrever que, em liberdade, a considerar a sua propensão para prática de crimes, se furtará da aplicação da lei penal.
    6. A cinco, porque, como antecipei acima, tem uma vida prenhe de deslizes, reveladoras de sua periculosidade e de sua insensibilidade moral.
    7. Assim é que, ao que vejo às fls.25/28, dos autos principais, responde a outros processos-crime no Estado do Pará, onde tem domicílio.
    8. A seis, porque a liberdade provisória não é direito absoluto.
    9. Como todos os direitos, a liberdade provisória de um acusado deve ceder ao interesse público.
    10. A sete, porque, desde minha visão, em similares, o interesse público deve sublimar o interesse do particular.
    11. A oito, porque a só primariedade e os bons antecedentes, com a abstração de outros dados, não garante o favor legis postulado e
    12. A nove, porque a prisão do requerente, à luz do acima expendido, é uma necessidade para que se preserve a ordem pública, a instrução criminal e a aplicação da lei penal.
  2. (…)”

 

A seguir, o despacho, integralmente.

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Reflexões sobre a vida e a obra de um otário.

“…E o tempo vai passando. O corpo, agora, lhe pesa, literalmente. O tempo é implacável. Não tem mais agilidade. Doem-lhe as juntas. Andar, já é um sacrifício. Mas ele insista! Não muda! Chega cedo ao trabalho, cumpre o pactuado e quase nunca se atrasa. É do tipo ranheta. Continua acreditando que vale à pena ser honesto, pontual, trabalhador. Sabe que, nos dias atuais, esses predicados são uma caretice, estão desuso. Mas… fazer o quê?
Juiz José Luiz Oliveira de Almeida
Titular da 7 Vara Criminal

Antecipo os seguintes excertos:

  1. Ele estava sempre absorto; parecia contemplativo, enlevado, extasiado. Era do tipo que parecia viver voando, desligado dos pecados da terra. Deixava transparecer que, fora do seu ambiente de trabalho, nada mais existia.
  2. O andar, antes frenético, agora é trôpego, vacilante; o olhar, antes fugidio, arredio, agora já não vislumbra, com a nitidez de antanho, o horizonte. Mas ele é duro como pedra; inflexível, não muda nunca – vai adiante com as suas fortíssimas e inabaláveis convicções.

A seguir, a crônica, por inteiro.

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O cuidado que se deve ter com as palavras . Releitura.

 

Nas relações interpessoais os interlocutores devem ter muito cuidado com as palavras. É que, no calor de uma discussão, as palavras podem atingir de forma tão profunda um dos dois contendores, que impossibilita, depois, qualquer reaproximação.
José Luiz Oliveira de Almeida
Titular da 7ª Vara Criminal

Cuida-se crônica que acabo de enviar ao Jornal Pequeno para publicação.

Antecipo, aqui e agora, um excerto relevante da crônica.

    Em face da experiência de vida e do testemunho desses embates é que, sempre que travo uma discussão mais acerba, tenho o cuidado de medir as palavras. Não podemos, no calor de um entrevero, dizer tudo que queremos, tudo que pensamos, por maior que seja a nossa indignação. É preciso, pois, sopesar, refletir antes de falar, para que as portas da reconciliação permaneçam abertas.

A seguir, a crônica, por inteiro.

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Sentença absolutória. Insuficiência de provas.

 

Tenho dito – e vou repetir  –  que não se faz cortesia com o direito alheio. Não se pode brincar de fazer justiça. Se Ministério Público não foi capaz de provar o que alegou, que, então, suporte o desfecho absolutório. É o mínimo que se espera de o juiz garantista, num sistema da mesma forma garantista.
Juiz José Luiz Oliveira de Almeida
Titular da 7ª Vara Criminal

 

Cuida-se de sentença absolutória, em face da inexistência de provas suficientes de que o acusado tenha sido o autor do crime.

Antecipo, a seguir, excertos relevantes da decisão.

    1. Não se condena por condenar, não se decide com espeque em suposições, em conjecturas. Condenação exige prova plena, escorreita, induvidosa – do fato e da autoria – na dúvida, em relação a esta ou em relação àquele, tem aplicação, às inteiras, o brocardo in dúbio pro reo.
    2. O acusado cometeu o crime? Pode ser que sim, pode ser que não.
    3. Todas as vezes que, ao término do exame das provas, o espírito de quem julga for assaltado por dúvidas, por incerteza, o caminho a ser trilhado é, sempre, o que conduz a absolvição.
    4. O  fato, não se tem dúvidas, ocorreu, efetivamente. Todavia, convenhamos, a prova da autoria não é inquestionável.
    5. Nem mesmo os policiais que prenderam o acusado –  os quais, muitas vezes, são implacáveis  nessas questões –  foram capazes de afirmar, com convicção, tenha sido o acusado o autor do crime. Melhor dizendo: não tiveram dúvidas de que não tinha sido ele o autor do crime.

 

Agora, a decisão por inteiro. 

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As ações violentas sobre o psiquismo humano

Tenho dito e vou repetir, hic et nunc, que do magistrado se pode e se deve exigir que seja imparcial. Do magistrado, no entanto, não se pode exigir parcimônia, insensibilidade, indiferença, pusilanimidade. O magistrado deve estar plugado nas aspirações da sociedade. A sociedade, as pessoas de bem, já não suportam tanta licenciosidade, tanta relaxação. Ninguém, em sã consciência, aceita que um assaltante perigoso seja mantido em liberdade, inculcando nas pessoas o sentimento nefasto da impunidade.
Juiz José Luiz Oliveira de Almeida
Titular da 7ª Vara Criminal

 

Cuida-se de pedido de liberdade provisória formulado por I.R.A, acusado da prática de roubo duplamente qualificado, o qual foi indeferido.

Ao indeferir o pleito, fiz algumas anotações acerca da quase insuportabilidade da vida em sociedade, em face da violência.

No mesmo despacho fiz menção à nossa qualidade de vida, em face da absorção dos hormônios do estresse, decorrente da violência urbana.

A seguir, antecipo alguns excertos da decisão, sempre no mesmo diapasão das decisões anteriores.

 

    1. Vivemos sob uma verdadeira guerra urbana. Os meliantes infernizam a vida das pessoas de bem. Assalta-se, mata-se, estupra-se, atenta-se contra o pudor, furta-se, lesiona-se, mata-se, sem controle, sem peias. Não se pode, pois, em face desse quadro, fazer concessões a quem sai por aí matando, roubando, estuprando, afrontando a ordem pública. Nem a condição de primário, nem o fato de ser possuidor de bons antecedentes, nem a eventual definição de uma profissão, de um endereço e outras coisas que tais autorizam a mantença da liberdade de quem tem uma vida perniciosa em sociedade.
      Tenho dito e vou repetir, hic et nunc, que do magistrado se pode e se deve exigir que seja imparcial. Do magistrado, no entanto, não se pode exigir parcimônia, insensibilidade, indiferença, pusilanimidade. O magistrado deve estar plugado nas aspirações da sociedade. A sociedade, as pessoas de bem, já não suportam tanta licenciosidade, tanta relaxação. Ninguém, em sã consciência, aceita que um assaltante perigoso seja mantido em liberdade, inculcando nas pessoas o sentimento nefasto da impunidade.
    2. O medo e a insegurança minam, acabam com o nosso bem estar, com a nossa qualidade de vida. Todos sabemos disso. As vítimas da violência jamais recuperam o seu estado anterior, diferente dos réus, os quais, insensíveis, não se martirizam em face de uma prisão. Quando eles se definem por um crime, por exemplo, já perscrutaram todas as possibilidades, inclusive a de ser preso. Não há mais espaço pra esse tipo de gente em nossa sociedade. Esse tipo de pessoa tem que ser afastado do nosso convívio, pouco importando que seja primário, tenha bons antecedentes – strictu sensu – ou coisas que tais.
      A violência urbana nos desgasta fisicamente, pois que absorvemos, constantemente, os hormônios do stress. A violência, porque mexe com a nossa psique, também muda a forma como vemos o mundo. Todo mundo que se posta à nossa frente passa, por isso, a ser uma ameaça, um inimigo em potencial. Por tudo isso, não é justo, não é razoável que se deixe em liberdade quem agride a ordem pública, o fazendo de forma acerba, como o fizeram os acusados.

 

Agora, a decisão, por inteiro. Continue lendo “As ações violentas sobre o psiquismo humano”

Os togas sujas

Para mim, o magistrado que se vale do cargo para auferir vantagem financeira é, acima de tudo, um covarde, porque não se limita a amealhar bens materiais. Para consecução do seu intento, precisa negociar o direito de terceiros, precisa fazer chacota das pretensões deduzidas em juízo, tripudiando, zombando do direito dos jurisdicionados.
É por isso que tenho dito que a corrupção praticada por um magistrado é mais do que um crime abjeto – é uma covardia.
Juiz José Luiz Oliveira de Almeida
Titular da 7ª Vara Criminal

 

Este artigo/desabafo foi gestado em face das inúmeras noticias veiculadas na impresa nacional, dando conta da ação dadinha de determinados magistrados, nas esferas estadual e federal, que usam o poder para enriquecer. O artigo é contundente, mas é exatamente o que penso.

Registro que este  artigo  não foi inspirado em face de nenhuma denúncia contra os juizes do Maranhão,  mesmo porque, pelo que sei, sequer foram abertos processos administrativos contra os mesmos. 

Que fique muito claro, pois, que, com o artigo, exerço apenas o meu inalienável direito de expressão. Não sou do tipo que julga sem provas, com base em especulações, conjecturas.  

Quando reflito sobre essas questões, parto sempre do princípio de que todos os magistrados concordam comigo, pois que o que queremos mesmo, o que todos almejamos – pelo menos a absoluta maioria –  é uma magistratura respeitável, cujos membros não sejam capazes de, na calada da noite ou subrepticiamente, negociar as suas deciões.

Pensando assim, em determinado fragmento do artigo , ponderei:

  1.  
    1. “…E o que dizer, o que pensar, o que fazer, como escapar, para onde apelar, se o corrupto é um magistrado? Qual a esperança que tem uma sociedade, se aquele que tem o dever de combater a criminalidade é um dos seus protagonistas?Para mim, o magistrado que se vale do cargo para auferir vantagem financeira é, acima de tudo, um covarde, porque não se limita a amealhar bens materiais.
    2. Para consecução do seu intento, precisa negociar o direito de terceiros, precisa fazer chacota das pretensões deduzidas em juízo, tripudiando, zombando do direito dos jurisdicionados.
    3. É por isso que tenho dito que a corrupção praticada por um magistrado é mais do que um crime abjeto – é uma covardia.Convenhamos, o magistrado que usa o poder que tem para achacar, para enriquecer ilicitamente, para negociar o direito de um jurisdicionado, é um ser imundo, desprezível, digno de repúdio…”

Mais adiante, no mesmo passo, no mesmo rumo,  condenei uso do poder para enriquecer, nos seguintes termos:

  1.  
    1. “…Para mim, quem usa a magistratura para enriquecer ilicitamente, é, além de covarde, um ser peçonhento e asqueroso, um bandido maquiado, travestido de magistrado.
    2. Felizmente, não se há de negar, a maioria, a grande maioria, a quase totalidade dos magistrados, não participa dessa e de outras bandalhas de igual matiz; antes, abomina essas práticas, que deslustram e enodoam toda uma classe.
    3. Apesar disso, todos nós [magistrados], corruptos ou não, somos, de certa forma, vistos com reservas, como se fôssemos todos usuários de togas sujas…”

 

A seguir, o artigo, integralmente. Continue lendo “Os togas sujas”