O Estado, por efeito, só deve intervir quando a conduta do acusado foi socialmente relevante e significativo o grau de lesividade, como ocorre, ad exempli, com o homicídio culposo, praticado na direção de veículo automotor.
Juiz José Luiz Oliveira de Almeida
Titular da 7ª Vara Criminal
No Direito Penal, sabe-se, o conceito de tipicidade (subsunção da conduta aos elementos do tipo) representa importante avanço, pois que concretiza, definitivamente, o princípio da reserva legal (artigo 5º, XXXIX e artigo 1º, do Codex Penal).
O tipo penal, nada obstante, não pode ter um significado puramente formal, devendo, por isso, ser aferido a partir de um necessário juízo de valor sobre o comportamento humano.
É bem de ver-se, com efeito, que só é típica a conduta que difere da normalidade social,ou seja, se penalmente relevante, abstraindo-se, portanto, as condutas socialmente aceitas e insignificantes, afinal minima non curat praetor.
Em decorrência da fragmentariedade e subsidiariedade, para ser típica, a conduta deve ser relevante, porque o Direito Penal só deve atuar até onde for necessário para a proteção do bem jurídico.
Cediço, assim, que se a ofensa ao bem jurídico tutelado for insignificante, o fato não é típico, razão pela qual o Estado não está autorizado a intervir penalmente.
A relevância da lesão deve, por isso, ser examinada a partir de cada caso concreto, sempre levando-se em conta a nocividade social da conduta, o desvalor da ação e do resultado, além do grau de lesividade ao bem jurídico tutelado, cumulados com a efetiva necessidade de aplicação da pena.
O Estado, por efeito, só deve intervir quando a conduta do acusado foi socialmente relevante e significativo o grau de lesividade, como ocorre, ad exempli, com o homicídio culposo, praticado na direção de veículo automotor.
No artigo 302 do CÓDIGO DE TRÂNSITO BRASILEIRO está definido o crime de homicídio culposo (preceptum iuris) e as penass previstas, in abstracto, para os seus transgressores (sanctio iuris), nos seguintes termos, verbis:
Art. 302. Praticar homicídio culposo na direção de veículo automotor:
Penas – detenção, de dois a quatro anos, e suspensão ou proibição de se obter a permissão ou a habilitação para dirigir veículo automotor.
É consabido que a primeira figura penal que passou a ser regulada pelo CÓDIGO DE TRÂNSITO foi o homicídio culposo, que consiste na eliminação da vida de uma pessoa por ato de outra, através de uma causa gerada por culpa, nas espécies imprudência, negligência ou imperícia.
As modalidades de culpa podem ser traduzidas assim: a) na imprudência há a prática de ato perigoso; b) na negligência há falta de precaução ou cuidados; c) na imperícia, há uma omissão em aptidão técnica, teórica ou prática.
Aduzo que a imprudência é a prática de uma conduta arriscada ou perigosa e tem caráter comissivo. É a imprevisão ativa( culpa in faciendo ou in committendo). Conduta imprudente é aquela que se caracteriza pela intempestividade, precipitação, insensatez ou imoderação.
Negligência é a displicência no agir, a falta de precaução, a indiferença do agente, que, podendo adotar as cautelas necessária, não o faz. É a imprecisão passiva, o desleixo, a inação (culpa in ommittendo). É não fazer o que deveria ter feito.
Imperícia é a falta de capacidade, despreparo ou insuficiência de conhecimentos técnicos para o exercício da arte, profissão ou ofício. Imperícia não se confunde com erro profissional. O erro profissional é um acidente escusável.
Os limites da norma imperativa encontram-se no poder de seu cumprimento pelo sujeito. Por isso, o dever de cuidado não pode ir além desses limites. A inevitabilidade do resultado exclui a própria tipicidade. Em outros termos, é indispensável que a inobservância do cuidado devido seja a causa do resultado tipificado como crime culposo.
A forma culposa de homicídio só restará tipificada se presentes estiverem os seguintes requisitos: a) comportamento humano voluntário; b)descumprimento de dever de cuidado objetivo;c) previsibilidade objetiva do resultado; d) morte involuntária.
Anoto, a guisa de ilustração e reforço, que, no tráfego viário tem vigência o princípio da confiança, a ser observado pelos condutores de veículos automotores, para a adequada aplicação das normas de direção, em homenagem à segurança na circulação de veículos. Confia-se, pois, que o condutor segue as regulamentações e regras de trânsito, a fim de delimitar a esfera do previsível.
Se, ao longo da instrução criminal, não forem produzidas provas que demonstrem, quantum satis, que o condutor do veículo automotor envolvido no acidente de trânsito tenha sido tenha sido, ao tempo do evento, imprudente, negligente ou imperito, restará desautorizada a inflição de penas, em face da atipicidade da conduta.Processo nº 72602003
A partir dessas diretrizes foi que absolvi Aldo de Jesus Aguiar Correa, nos autos da ação penal proposta pelo Ministério Público (processo nº 72602003), em face do acidente de que resultou a morte de Bernardo Rocha da Costa.
Os fundamentos ( em alguns fragmentos) da absolvição do acusado estão vazados nos termos a seguir. Continue lendo “Artigo 302 do CTB – brevíssimas considerações.”