O mal que eles nos fazem

ELIANE CANTANHÊDE

Quem perde, quem ganha

BRASÍLIA – O deputado estadual Marcelo Freixo (PSOL) foi obrigado a deixar o Brasil depois de presidir a CPI das Milícias na Assembleia Legislativa do Rio de Janeiro, que incriminou mais de 200 pessoas, entre elas policiais e ex-policiais que se organizam à margem da lei e da civilidade para, sob o pretexto de “combater o crime”, cometer as maiores atrocidades.
Ele recebeu sete ameaças de morte no último mês, jogou a toalha e saiu do país por pressão da família, sugestão da Anistia Internacional e temor do precedente da juíza Patrícia Acioli, assassinada por criminosos fardados, pagos com dinheiro público justamente para defender a lei, a ordem e a vida dos cidadãos.
A decisão de Freixo de buscar segurança no exterior nos deixa duas lições. A primeira é que as milícias estão mais perigosas do que os próprios criminosos. E estão ganhando a guerra. Devem ter soltado rojões depois da morte da juíza e do anúncio do autoexílio do deputado.
A segunda é que há, sim, políticos honestos, bem-intencionados, que disputam eleições diretas e assumem funções públicas para transformar suas cidades, seus Estados e seu país em lugares melhores para todos.
Há tipos como Freixo em Câmaras Municipais, Assembleias e no Congresso, apesar de o foco recair nos outros que não são tão honestos nem tão bem-intencionados e que só disputam eleições e assumem funções públicas para tirar proveito próprio.
O problema é quem fica e quem sai. Dos cinco ministros que caíram sob suspeitas, por exemplo, dois voltaram tranquilamente para seus gabinetes no Congresso, e os demais, às suas atividades profissionais ou empresariais, enquanto Freixo tem de se esconder e fugir para sobreviver.
Ok. Os políticos não são todos iguais, mas há algo de estranho num reino em que os maus se dão bem e os bons é que têm medo e precisam sair correndo. A fuga de Marcelo Freixo é uma vergonha nacional.

elianec@uol.com.br

Direito não é filho dos céus

Conquanto admita que muitas das minhas posições no Poder Judiciário do Maranhão não sejam simpáticas para alguns, eu quero, sim, ter uma convivência pacífica com os meus pares, dos quais só espero que respeitem as minhas posições e as minhas crenças.

O que mais desejo nos dias presentes é me relacionar civilizadamente com os meus colegas, muito embora, democraticamente, discrepe de suas posições, convindo anotar que   não o faço por  arrogância, mas, sim,  por convicção.

Quero deixar claro, mais uma vez, que não faço nenhuma intervenção – nas sessões de julgamento  – que não seja voltada para o interesse do jurisdicionado.

Como a esmagadora maioria dos magistrados brasileiros, eu nunca decido pensando em mim ou na obtenção de aplausos; aliás, eu sou até muito avesso a esse tipo de manifestação, que, muitas vezes, são apenas oportunistas.

Não me apraz o confronto, importa reafirmar.

Eu não gosto da pugna, sobretudo quando ela descamba para a deselegância!

Em todas as corporações é assim mesmo que as coisas funcionam, ou seja, não somos obrigados a concordar com os pontos de vista de um colega.

Somos julgadores, tenho dito, mas não somos máquimas; por isso que, algumas vezes, nos incomodam as posições de alguns colegas.

Mas as coisas devem funcionar assim mesmo.

Nenhum magistrado, por mais que sua arrogância lhe perturbe a visão, pode se imaginar liberto de suas memórias, dos seus desejos, do seu próprio inconsciente, de sua ideologia, enfim.

Disso resulta que, nas  nossas relações e nos nossos julgamentos,  haverá sempre uma dose relevante da nossa subjetividade, a, muitas vezes, confrontar com a subjetividade e idissincrasia  de outro colega.

Todavia, deve-se compreender que não se trata de uma questão pessoal-pelo menos da minha parte.

O que o juiz não pode, desde a minha visão,  é ser populista; e populista não sou, conquanto tenha  convicção que as minhas posições, nas diversas crônicas por mim publicadas, encontrem ressonância na população, sobretudo junto aos mais descrentes com  as nossas instituições.

O  julgador deve estar consciente que, assim como ele, há colegas que decidem, por vezes – ou quase sempre -,  contramajoritariamente; e, assim decidindo, por certo que desagradarão a muitos, mas não à sua consciência.

Tobias Barreto dizia que o Direito não é um filho dos céus, mas produto cultural da humanidade, ou seja, é algo socialmente construído.

Aury Lopes lembra, com a costumeira propriedade, que o juiz não tem que ser um sujeito representativo, posto que nenhum interesse ou vontade que não seja a tutela dos direitos subjetivos lesados deve condicionar seu juízo, nem sequer o interesse da maioria, ou, inclusive, à totalidade dos lesados.

Encerro dizendo, forte na melhor doutrina, que a atuação do juiz não é política, mas constitucional, consubstanciada na fução de proteção dos direitos fundamentais, ainda que para isso tenha qie adotar posição contráriaà opinião da maiora.

Sobre medalhas e contradições

Eu tenho refletido acerca das nossas contradições; claro que, sendo tantas , não é possível exaurir o tema.

Aqui e acolá, portanto, na medida em que elas se apresentam, eu vou refletindo.

Muitas vezes, para preservar a fonte, eu descrevo o episódio, mas não declino o nome dos protagonistas; outras vezes, conquanto conheça o fato, não sou capaz de lembrar sequer o nome do seu protagonista.

O fato que vou narrar a seguir, conquanto não recorde o nome do protagonista, merece reflexão, pelo que ele contém de expressivo.

Pois bem. Determinado soldado americano, condecorado  em face de sua bravura na guerra do Vietinã,  foi expulso do exército quando revelou as suas preferências sexuais.

Indignado com a expulsão, cunhou uma frase que entendo lapidar:

Por matar dois homens fui condecorado; por amar um homem, fui expulso das forças armadas

Somos ou não somos contraditórios?

Eu tenho vivido essas contradições no Poder Judiciário do meu Estado.

Hoje, para mim, é um dia típico das contradições do Poder Judiciário do Maranhão.

Aliás, contradições que vêm ocorrendo há muitos e muitos anos: dentre os agraciados com a medalha do mérito judiciário, decerto haverá os que não têm um dia sequer de ação em benefício do Poder Judiciário do Maranhão.

STJ decide

Conduta e dano à coletividade afastam insignificância penal de furto de canos avaliados em R$ 100
A Sexta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) manteve condenação à pena de dois anos de reclusão, em regime aberto, mais multa, a réu que furtou 14 canos de ferro. O material compunha alambrado do Parque Ecológico do Riacho Fundo (DF) e foi estimado em R$ 100. A defesa pedia a absolvição, por aplicação do princípio da insignificância. Mas os ministros divergiram.

Para o desembargador convocado Haroldo Rodrigues, o princípio só pode ser aplicado quando presentes quatro requisitos: mínima ofensividade, nenhuma periculosidade social, reduzidíssimo grau de reprovabilidade do comportamento e lesão jurídica inexpressiva.

No caso, porém, não se verificaram o reduzido grau de reprovabilidade da conduta ou sua mínima ofensividade, nem a inexpressividade da lesão. “Não obstante o valor atribuído à coisa subtraída, o modus operandi da conduta e o dano causado à coletividade e ao poder público evidenciam a inequívoca necessidade de repressão penal”, afirmou.

Conforme a denúncia, às 13h do dia 9 de janeiro de 2004 o réu e outros dois indivíduos não identificados serraram as barras de suporte do alambrado, de 1,8 metro de comprimento e uma polegada de diâmetro, e fugiram do local carregando o material em carrinho de mão.

O fato foi presenciado por duas testemunhas e o administrador do parque acionou a polícia. Depois de vasculhar alguns ferros-velhos, os agentes localizaram os objetos em empresa situada em Taguatinga. O réu teria acabado de vendê-los. Perseguido, o réu foi preso em flagrante na posse do carrinho, ferramentas e recibo de venda dos bens à empresa.

Coordenadoria de Editoria e Imprensa

Habeas corpus. Concessão

P.P.N.P. foi citado por edital, a cujo chamamento não atendeu, tendo o juiz do feito, por isso, entendido devesse decretar a sua prisão.

A citação em comento foi, ao depois, anulada, tendo em vista a comprovação de que os meios de citação pessoal  do paciente não tinham sido exauridos.

A despeito da nulidade da citação ficta, pelas razões antes anotadas, a prisão do paciente foi mantida.

O paciente, em sede de habeas corpus, argumentou que, por isso, estava submetido a constrangimento ilegal, já que a sua prisão tinha sido decretada em face de uma informação irreal, ou seja, a sua não localização.

Do voto que apresentei, em face do HC em comento, em determinado excerto anotei que “… a nulidade da citação implica em reconhecer, definitivamente, a falta de substracto fático-jurídico da prisão preventiva…”.

Noutro fragmento, consignei, na linha de pensardo STJ,  que a nulidade da citação implica na contaminação de todos os demais atos processuais subsequentes, sendo inviável confinar os efeitos da nulidade para determinados atos, em virtude do princípio da causalidade.

Não deixei de anotar, por entender relevante, que a prisão cautelar do paciente havia sido decretada, unicamente, com base na impossibilidade de sua localização, que também serviu de fundamento para a citação editalicia, razão pela qual entendia que, agora, em face da nulidade suso apontada, não havia motivos para manutenção da prisão do paciente.

Publico, a seguir, o voto que apresentei, em face do HC sob retina: Continue lendo “Habeas corpus. Concessão”

Decisão contrária à prova dos autos

A decisão que publico a seguir pode, em princípio, parecer desimportante; todavia, desimportante não é, em face das reflexões que se podem fazer em face dela – e de outras de igual matiz.

Pois bem. É consabido que as decisões do Conselho de Sentença são soberanas, por definição constitucional, razão pela qual só podem ser cassadas excepcionalmente.

Noutros termos, o decisum do Tribunal popular pode ser anulado apenas se for manifestamente contrária ao quadro probatório emoldurado nos autos, ex vi do artigo 593, III, d, do Código de Processo Penal.

Constatada, pois, que a decisão se divorcia do acervo probatório, é lícito ao órgãos ad quem cassar a decisão do Conselho de Sentença, sem que, com isso, se atente contra a soberania dos veredictos, como, aliás, é da sabença comum.

Na decisão que publico a seguir enfrentei essa questão, em face de uma apelação do Ministério Público, tendo a C. 1ª Câmara Criminal,  filiando-se a minha linha de entendimento, anulado o julgamento, para que a outro fosse submetido o acusado, vez que a decisão mostrou-se, a mais não poder, dissonante  das provas consolidadas nos autos.

O voto em comento não traz nenhuma grande novidade, mas serve, todavia,  para deixar claro que, na segunda instância, estamos vigilantes para rever decisões que possam, sim, ter sido tomadas em face de ações externas ilegítimas, muitas das quais, não se há de negar, têm desvirtuado o verdadeiro sentido dos julgamentos populares nos locais onde se deram as ocorrências.

Eu próprio, ao tempo em que presidi sessões do Tribunal do Júri, fui supreendido com deciões absolutórias que, só depois fiquei sabendo, decorreram de pressões externas exercidas contra os membros do Conselho de Sentença.

Abaixo, o voto, por inteiro, o qual reputo importante muito mais em face das reflexões que se pode fazer em face da decisão anulada, à luz das colocações supra, que em face do seu teor.

Continue lendo “Decisão contrária à prova dos autos”

Durma em paz, anjinho

Os crimes  contra a liberdade sexual, definitivamente, são crimes cuja autoria é difícil de provar.

Não raro, por isso, ocorre, muitas vezes, de, conquanto intimamente convicto, o magistrado não tem condições de proferir uma decisão condenatória, por absoluta falta de provas ou, noutro  giro, em  face da insuficiência de provas.

Disso resulta que, muitas vezes, os autores desse tipo de crime, quase sempre praticados à sescondidas, ficam impunes.

Em várias oportunidades, mesmo sabendo da autoria, tive que absolver, em tributo ao princípio do in dubio pro reo.

No dia de hoje, no entanto, tive a oportunidade de apresentar um voto (voto-vista), com a mais absoluta e extremada convicção acerca da autoria; autoria de um crime, consigno, que causa revolta e estupor, pois o acusado praticou sexo anal com uma criança  – um anjinho – de um ano e quatro meses, e, além, do mais, entendeu devesse matá-la asfixiada.

As fotografias que dos autos constam, com a exibição do anus da vítima, são de cortar o coração.

Infelizmente, apesar de todas as provas, quer acerca da autoria, quer acerca da materialidade delitiva, o acusado continua em liberdade, conquanto o fato criminoso tenha ocorrido há mais de dez anos.

Apesar da minha indignação com a – até agora – impunidade do acusado, sinto-me lisonjeado por ter logrado convencer um colega de Câmara da minha tese.

É possível, sim, que o acusado agora venha a pagar pelo que fez.

Se a mim me fosse dada a possibilidade de dizer alguma coisa à vítima, eu diria, como tantas vezes disse para minha filha: durma em paz, meu anjo.