Exame da OAB

Barroso diz que Exame da Ordem é constitucional

O constitucionalista Luís Roberto Barroso afirmou, em parecer que seguirá aos ministros do Supremo Tribunal Federal, que o Exame da Ordem é adequado e necessário. Para ele, a prova aplicada pelo Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil é constitucional e está justificada diante da relevância dos interesses da sociedade. O Supremo decidirá, em breve, sobre a obrigatoriedade do Exame quando discutir o Recurso Extraordinário sobre a questão. O parecer foi entregue ao presidente da OAB nacional,Ophir Cavalcante.

Para Barroso, o Exame da OAB é a maneira adequada de verificar a qualificação profissional, além de ser necessário para proteger os cidadãos contra os riscos da atuação de profissionais despreparados. Barroso diz que o Exame é ainda compatível com a proporcionalidade, pois é uma exigência “objetiva” e “impessoal” que não impede o exercício da profissão. “A advocacia é função essencial à justiça e seu exercício inadequado envolve riscos inerentes para terceiros e para a própria coletividade, os quais justificam a imposição de um regime legal específico”, afirma.

Contra as alegações de que a obrigatoriedade do exame afronta a Constituição, ele afirma que a liberdade profissional ali assegurada trata de uma escolha livre da profissão. No entanto, ele destaca a necessidade de atender às qualificações e condições exigidas pela lei para esse exercício. Além disso, ele defende que não se pode atribuir ao Exame os problemas da qualidade do ensino jurídico no país. “Mesmo que, o que se espera, em um futuro próximo o ensino jurídico no Brasil tenha alcançado um patamar de excelência, o Exame de Ordem continuaria a ser plenamente justificado”.

No parecer, Barroso apresenta um estudo comparado da aplicação do Exame em vários países, como Estados Unidos, Canadá, França e Alemanha, onde a realização das provas é de responsabilidade da Ordem nacional dos advogados ou instituição similar. “Os países referidos exigem, para o exercício da advocacia, a aprovação prévia em processos de avaliação comparáveis ao exame de ordem brasileiro, em alguns casos acompanhados de exigências adicionais”, finaliza Barroso.

Clique aqui para ler o parecer.

Matéria do Consultor Jurídico

O bom juiz Magnaud

Todos sabemos que não é possível agradar a todo mundo, durante todo tempo. Aqui e acolá, deve-se compreender,  adotamos posições – ou decidimos –  sobre algo que termina por desagradar.

Numa corporação as dificuldades são ainda maiores. Não raro a gente se depara com um olhar atravessado, com uma descortesia ou falta de atenção, a nos induzir à reflexão sobre algo que fizemos ou deixamos de fazer.

É claro que o ideal mesmo é que vivêssemos em permanente harmonia e que os colegas não cobrassem da gente posições que não podemos assumir.

Tal não acontece, todavia.

Fazer o quê?

Paul Magnaud, magistrado francês, que viveu de 1848 a 1926,  foi presidente do Tribunal de Cahtêau-Thierry, tendo se tornado mundialmente conhecido como “o bom juiz Magnaud’, em face das suas decisões, nas quais privilegiava a equidade, ainda que tivesse que decidir contra legem.

Todavia, ainda assim – ou até mesmo por isso – ,  tinha desafetos e críticos inclementes.

Os seus admiradores sublinhavam a sua honra e vocação para Justiça; os desafetos, por outro lado, diziam que ele decidia contra lei, que era panfletário e excedia os limites da função jurisdicional.

Como se pode ver, ninguém consegue agradar a todos.

Longe de mim comparar-me a Paul Magnaud. Não posso deixar, todavia, de consignar que as incompreensões em face das minhas posições me deixam agastado, como, decerto, agastavam o “bom juiz”.

Ninguém é obrigado a seguir a minha linha de pensamento. Mas compreendo que todos têm a obrigação de respeitar as minhas posições. É o mínimo que espero de pessoas tidas por civilizadas.

Do site do TJ/MA

Convênio garante qualificação profissional de apenados

O desembargador Fróz Sobrinho assinou o convênio pelo TJMA

 

Convênio celebrado nesta segunda-feira (17) entre o Tribunal de Justiça (TJMA), a Defensoria Pública, Secretaria de Justiça Administração Penitenciária e o Departamento Regional do Serviço Nacional da Indústria (Senai) vai garantir a qualificação profissional daqueles que cumprem penas em todo o Estado do Maranhão, ajudando na reinserção dos mesmos no mercado de trabalho e na sociedade.

“Esta é uma das etapas que estão sendo cumpridas, conforme planejamento elaborado pela equipe formada pelo TJMA, por intermédio do Grupo de Monitoramento, Fiscalização e Acompanhamento do Sistema Carcerário e pela Sejap. O Judiciário vem fazendo sua parte para ajudar a mudar a realidade da execução penal no país”, ressaltou o desembargador Fróz Sobrinho, coordenador regional do Grupo de Monitoramento e coordenador nacional do programa Começar de Novo, idealizado pelo Conselho Nacional de Justiça.

Sobrinho afirmou que “receber o apoio da Federação das Indústrias e da Defensoria Pública representa um grande ganho para a causa dos presos que precisam ter melhores perspectivas de vida prisional e de dignidade humana. Segundo ele, isso influenciará na redução de gastos com o sistema prisional, contribuindo ainda para a redução da prática de crimes.

Para o defensor público geral Aldy Mello, fazer parte deste novo momento é mostrar para a sociedade que a Defensoria não apenas presta assistência jurídica gratuita aos que dela necessitam, atuando também de forma ampla no acompanhamento de reformas de unidades prisionais, propondo alternativas, com o intuito de reduzir a criminalidade. “O nosso desafio é transformar a justiça criminal em uma justiça social”, concluiu.

Reincidência – No Maranhão, o índice de reincidência é preocupante. Enquanto a média nacional apresenta um percentual de 70%, o índice de reincidência no Estado atinge a marca de 80%, sendo este o principal ponto que deve servir de referência para o estabelecimento da política de reinserção social, com o oferecimento de cursos de qualificação profissional.

Assinatura – Assinaram o convênio o secretário estadual de Administração Penitenciária, Sergio Tamer, o desembargador Fróz Sobrinho, os defensores públicos Aldy Mello (geral), Alberto Bastos e João Alberto, o vice-presidente da Fiema, José Ribamar Fernandes, e o diretor do SENAI, José Alberto.

Participaram ainda da solenidade as defensoras públicas Mariana Albano (sub-defensora) e Fabíola Barros (corregedora), o frei Ribamar Cardoso e a secretária Lícia Dias (Programa Começar de Novo).

Amanda Mouzinho
Assessoria de Comunicação do TJMA
asscom@tjma.jus.br
(98) 2106 9023 / 9024

Ouvidoria

O desembargador José Bernardo Rodrigues (foto) tem tido uma atuação exemplar junto à Ouvidoria do Poder Judiciário.

Sem estardalhaço, com altivez e equilíbrio, que são  marcas  de sua personalidade, recebe as denúncias e as encaminha a quem de direito, quando não é possível de logo  resolvê-las,  até onde é possível fazê-lo.

Esse, a meu sentir, é, em linhas gerais,  o papel  do Ouvidor.

Confesso que gostaria de enfrentar esse desafio, impregnado do mais escorreito sentimento, qual seja, o de servir à comunidade, como tem sido, de resto, a minha obsessão profissional, a minha história de vida.

É que, diferente de muitos, eu não penso o poder como um fim em si mesmo; penso o poder, sim, para servir, para ser útil, para bem e fielmente desempenhar as minhas atribuições, com os olhos voltados para o interesse público.

Confesso, todavia, que, ao que vejo e sinto, não há a mais mínima possibilidade de eu vir a ser escolhido, mesmo porque persistem, nos dias atuais, a equivocada “sensação” , na corporação, de que eu não sou “confiável”.

É que, até hoje, há os que me vêem como incendiário e desagregador, numa simbiose mal construída e maledicente entre a minha  independência  e a minha forma de agir.

Tenho notícias, até, de que causei mal estar na sessão que elegeu a nova mesa diretora, somente porque exortei os candidatos a darem sequência aos projetos em curso na Corregedoria e na Presidência do Tribunal de Justiça, o que, convenhamos, é uma insensatez lamentável.

De uma coisa o leitor do meu blog pode ter certeza: não moverei uma pedra para ser Ouvidor, pois acho, sem me preocupar em parecer modesto, que o Poder Judiciário teria mais a ganhar do que eu.

Sei, para meu deleite pessoal,  que não sou – e nunca serei  – uma unanimidade no Tribunal de Justiça do meu estado.

Sei que algumas das minha posições – todas movidas pela boa-fé e pelo compromisso ético que tenho com a magistratura -não são palatáveis, o que, inobstante, não me preocupa, pois, afinal, não sou magistrado carreirista e não sou remunerado para ser simpático.

Que fique claro, portanto, que não sou candidato a nada, mesmo porque seria uma arrogância sem par me lançar candidato, sem o aval do presidente do TJ/MA, a quem cabe, ao que sei, fazer a indicação do Ouvidor, para ser referendada pelo Pleno.

Encerro essas reflexões com Kant, segundo o qual  as coisas têm preço e as pessoas, dignidade.

Viciados em trapaças. Releitura

O ser humano tem vícios para o bem ou para o mal.

Se é viciado em trabalho, não sabe viver sem laborar.

E se, por alguma razão, fica impossibilitado de desenvolver o seu mister profissional, adoece.

O viciado em trabalho não sabe ser diferente.

É por isso que muitas pessoas, ao se aposentarem, caem em depressão, perdem a qualidade de vida e abreviam a morte. Para essas pessoas, viver sem trabalhar é um calvário.

Noutra vertente, há pessoas que só sabem viver na folgança.

Para essas pessoas o trabalho é sua via-crúcis. O trabalho, para elas, se traduz em sofrimento, irritação, angústia.

Essas pessoas gostam mesmo é da pachorra, da lassidão, do folguedo.

Assim como entre os humanos há, num extremo, os indolentes e, noutro extremo, os desvelados e diligentes, há, também, os viciados em retidão e os viciados em falcatrua, em bandalheira.

Se o ser humano recebe, diariamente, doses de retidão e probidade, tende a, em adulto, ser, também, reto e probo; se, ao reverso, assiti imperar em sua volta a falcatrua, a bandalheira, a corrupção, tende a, também, seguir velejando nas mesmas águas.

Me parece que é a ordem natural das coisas.

Claro que haverá, sim, exceções. Mas essas só servem para confirmar a regra.

Nessa linha de pensar, não deveria surpreender que as pessoas de personalidade mal formada vivessem à margem da lei.

É que essas pessoas são viciadas em improbidade, em falcatrua.

Para essas pessoas, a retidão, o desvelo no trato da coisa pública não importa, é irrelevante.

Essas pessoas são viciadas e formaram a sua personalidade transgredindo, profanando a ordem, sem remorso, sem dor na consciência.

Aquele que recebe doses diárias de retidão, tende a refutar o mal proceder, a farsa o embuste.

Mas aquele que durante toda a sua formação moral acostumou-se à pantomima, ao ardil e à fraude, navega nessas mesmas águas, sem remorso, sem padecimento.  As vezes, de tão viciado na impostura, sequer se dá conta de que vive à margem da moralidade e da lei.

Para essas pessoas a trapaça e a velhacaria são uma rotina, estão sedimentadas em sua formação moral.

Para exemplificar, anoto que aquele que, todos os anos, frauda o fisco, de tanto repetir a pantomina, já procede com naturalidade.

Para esses, fraudar ou não fraudar é irrelevante.

É que elas são viciados na prática d empulhação e supõeM que jamais cairõ na malha fina, até que, um dia… bem, um dia a casa cai.

Da mesma forma, quem se acostumou, deste de cedo, a usar o cargo que ocupa em benefício pessoal e dos amigos, vai agir sempre assim, pois que não tem a dimensão da importância do cargo que exerce.

Para um profissional da saúde, uma morte a mais ou a menos, uma fratura exposta aqui e acolá, não mexe, significativamente, nas suas emoções, porque está acostumado a conviver com esse tipo de tragédia. É que ele, de tanto conviver com essas excrescências, acostumou-se e age, até, com indiferença.

Da mesma forma que o autor de uma maracutaia, se viciado nessa prática, não tem receio de praticar outras ilicitudes, os cidadãos, de tanto verem prosperar a impunidade, a roubalheira de agentes do poder público, a violência e a corrupção, tendem a não mais se indignarem.

Não é por outra razão que no mundo da política há quem faça apologia do apotegma “rouba,  mas faz”.

No mundo em que vivemos, acostumados com a falta de probidade de agentes públicos, às vezes – ou quase sempre – não nos indignamos quando se  noticia  um enriquecimento ilícito.

O agente público, vê-se no dia a dia, ascende ao poder, para, pouco tempo depois, ostentar uma vida de gastos desregrados, sem que as pessoas, anestesiadas, manifestem qualquer inconformação diante dessa profusão de iniquidades. 

Tenho dito, nas minhas pregações diárias, que nós, vítimas dessas tapeações, não podemos perder a capacidade de indignação.

Se ficarmos apenas estupefatos diante de tantas ilicitudes, de tantas imoralidades que se praticam no exercício do poder, não tenho dúvidas de que não evoluiremos.

Nós, cidadãos, não podemos nos quedar inertes diante de tanta roubalheira, de tanta lassidão, de tanta esnobação com o dinheiro público.

Nós precisamos dizer aos assaltantes do erário, que não aceitamos essa prática e que estamos atentos e vigilantes.

Nós temos que demonstrar que, se eles viciaram em falcatrua e nada mais temem, nós, do lado oposto da trapaça, do ludibrio, não nos comprazemos com a impunidade.

Nós não podemos assistir impassíveis a tanta licenciosidade, a tanta falta de escrúpulo de alguns – quiçá, a maioria – dos nossos representantes.

É preciso sair desse estado de letargia.

Os cargos públicos não foram concebidos para atender os interesses pessoais de quem eventualmente o exerça.

Nós não devemos sentir vergonha de ser honesto.

Mas, para isso, é necessário, também, que, demonstremos que não somos viciados em pantomima, que somos capazes de, no exercício do nosso mister, agir com retidão.

Não se pode apontar os erros do semelhante com o dedo envolto em sacanagem.

Reafirmo que, nas nossas relações diárias, até mesmo em face da nossa condição de seres humanos, cometemos erros – alguns mais; outros menos graves.

Mas há gritante diferença entre os que cometem erros no seu labor diário e aqueles fazem apologia do embuste.

É que os primeiros agem de boa-fé e quando se dão conta do erro cometido, reavaliam os seus conceitos e mudam o curso de suas ações; o que fazem apologia do embuste, do ardil e da maquinação, viciados que são, não são capazes de mudar a direção.  Esses persistem navegando em águas turvas: roubando, maquinando, empulhando, ulltrajando a ordem, malferindo a lei, traindo, enganando, sem peso na consciência. É que esses, diferente da maioria das pessoas, são viciados em falcatrua. Esses não são de retroceder. Esses, de tanto maquinarem, de tanto embustear e empulhar, perderam, definitivamente, a sensibilidade. Esses ilaqueadores da ordem, muito provavelmente, estão contribuindo para deformação do caráter dos que estão em sua volta. Essas pessoas, vítimas do embuste, abastecidos diariamente com doses cavalares de tapeação, passam a agir da mesma forma que os seus pais, porque não têm outro paradigma.

Igualados pela dor. Releitura

De qualquer tragédia ou catástrofe devem-se tirar lições.

A cada tragédia a lição que se repete, dentre outras tantas, é que, na dor – e no sofrimento – somos todos iguais – rigorosamente iguais.

Na dor e no sofrimento os Quesadas, Suarez Montes, Coquetes, Arrondos, Lenzis, Hochabaeff, Moholts, Sebas, Dubois, Ivanovitch, Giroux e outros são iguais, rigorosamente iguais, aos Silvas, Gomes, Leites, Oliveira, Fonseca, Ferreira, Pereira e outros.

Na dor não se diferencia nacionalidade e posição social.

A dor que dói aqui é a mesma que dói na Suécia e no Senegal, no empresário e no trabalhador braçal.

Pretos, brancos, pobres, ricos, bonitos, feios, altos, baixos, crianças, adultos, todos, enfim, somos rigorosamente iguais na dor e no sofrimento.

A dor e o sofrimento não servem apenas para doer e fazer sofrer, mas também lecionam, mostram o caminho, podem levar o incrédulo a Deus – ou afastá-lo ainda mais, não se há de negar.

A dor que dói – e o sofrimento que corrói – em face de uma tragédia – perda de um ente querido, por exemplo – não só ensinam como nos tornam mais humildes. Afinal, a dor e o sofrimento dela decorrentes não distinguem o rei do súdito, o juiz do jurisdicionado, o macho da fêmea, o bonito do feio, o governante do governado, releva reafirmar.

Diante da dor, não há soberba; também não importa a riqueza quando estamos sofrendo em face de algum infortúnio.

Em ocasiões dessa natureza, pouco importa a nossa origem, o título que ostentamos ou cargo que exercemos, já que a minha dor é rigorosamente igual à do vizinho, do amigo ou do inimigo.

Na dor não nos preocupa o saldo bancário.

Os prazeres da carne, a suntuosidade, a soberba, a inveja, a patranha, tudo isso se revela desprezível, quando se sobrepõem a dor e o sofrimento.

Se é dor, dói – e pronto!

Entretanto, faz pensar, faz refletir, visto que tem o poder de mudar o curso, de nos fazer redirecionar as nossas ações – podendo, até, purificar o pensamento, fazendo com que nos tornemos mais humildes, mais alma e menos matéria.

A dor que lancina, que aflige e que danifica, nos apequena a todos e nos fragiliza, além de poder nos mostrar e conduzir, enfim, a caminhos nunca dantes trilhados.

Pena que muitos só reavaliem os seus conceitos diante da dor e do sofrimento.

Mas há os que, recalcitrantes, nem mesmo a dor e o sofrimento lhes servem de lição.

O ideal seria que não dependêssemos de uma tragédia para dar valor ao semelhante, para reavaliar os nossos conceitos.

Dor é dor; sofrimento é sofrimento.

Não existe mais dor ou menos dor; mais sofrimento ou menos sofrimento.

Se é dor, é dor; se é sofrimento, é sofrimento – e maltrata, faz sofrer, faz pensar, refletir, principalmente quando se é racional.

Dor é sofrimento físico e/ou moral.

A dor que dói em mim é a que dói em ti, ainda que de matizes diferentes.

Mas, igual ou diferente, com uma ou outra coloração, o certo é que a dor dói e maltrata – e vulnera, e fragiliza.

Diante da dor podemos, até, (re) agir de forma diversa.

Mas as nossas (re) ações, díspares ou semelhantes, decorrem do mesmo sofrimento – físico ou da alma – da mesma certeza de que diante de uma borrasca, de uma tragédia somos, sim, todos iguais.

A dor nos remete a Deus – para suplicar, para que nos dê força para tolerá-la, ou mesmo para questioná-lo, em face do sofrimento que julgamos não merecer.

Para a dor física ministram-se os analgésicos; para a dor da alma, em princípio, não há remédio, sobretudo para os incrédulos, para aqueles que diante dos olhos só vêem a matéria.

A dor da alma é dor lenta, corrosiva, dilacerante – daquelas que nos levam ao chão e nos fazem questionar por que comigo e não com outra pessoa.

Para a dor da alma o único remédio a ser ministrado, não raro, é deixar o tempo passar.

Com o tempo a dor da alma corrói menos – nos faz levantar, até que outra tragédia nos abata, nos faça sucumbir, para relembrar, outra vez que, por mais que não queiramos ver, somos mesmo rigorosamente iguais.

A dor da alma é aquela que deixa um nó na garganta, que faz as lágrimas descerem – muitas vezes sem alterar os músculos de nossa face.

As lágrimas são, afinal, a materialização, em gotas, da dor e do sofrimento que nos afligem.

A dor e o sofrimento são partes da nossa vida.

É necessário, pois, que, diante de qualquer um deles – ou de ambos – tenhamos a capacidade de renascer, ainda que a dor nos tenha mutilado a alma.

Competências diferentes

Repercussão geral e insubordinação à lei pelos tribunais

Por Sérgio Niemeyer

Tem havido um equívoco generalizado sobre como aplicar a disciplina da repercussão geral. O ponto de partida deve ser a lei. A questão sobre a repercussão geral está disciplinada nos artigos 543-A e 543-B do Código de Processo Civil.

De acordo com o caput do artigo 543-A, “o Supremo Tribunal Federal, em decisão irrecorrível, não conhecerá do recurso extraordinário, quando a questão constitucional nele versada não oferecer repercussão geral, nos termos deste artigo”. A parte final do artigo, notadamente o adjunto adverbial deslocado remete o intérprete para o exame das demais disposições do próprio artigo 543-A a fim de esclarecer quando um recurso versa sobre matéria com repercussão geral.

A primeira regra, contida no 1º artigo do artigo 543-A, define os limites do que deve ser considerado questão de repercussão geral. Há repercussão geral quando o recurso aborda “a existência, ou não, de questões relevantes do ponto de vista econômico, político, social ou jurídico, que ultrapassem os interesses subjetivos da causa”. Ou seja, a repercussão geral é aquela matéria de conteúdo econômico, político, social ou jurídico que não apenas constitui o fundamento do direito subjetivo da parte, mas o ultrapassa porque a decisão sobre ela repercute no direito subjetivo de todo indivíduo da coletividade.

Assim, a violação dos direitos e das garantias fundamentais do indivíduo, porque constituem o limite da ação do Estado contra o(s) indivíduo(s), aí incluídas as questões sobre violação das cláusulas do devido processo legal e da ampla defesa, do primado do juiz natural etc., a ofensa aos direitos sociais, direitos políticos que conformam o direito de cidadania, o ultraje na consecução das metas sociais fincadas no artigo 3º da CF, entre outras, consubstanciam matérias idôneas com potencial repercussão geral a autorizar a apreciação do recurso em que sejam discutidas.

Há também repercussão geral “sempre que o recurso impugnar decisão contrária a súmula ou jurisprudência dominante do [Supremo] Tribunal [Federal]” (parágrafo 3º do artigo 543-A). Requisito formal necessário para a subida do recurso, que atua ao lado dos demais pressupostos ou requisitos de admissibilidade recursal, é a dedução de preliminar por meio da qual a parte recorrente procure demonstrar a existência da repercussão geral (§ 2º do artigo 543-A).

Ao tribunal de origem cabe somente constatar a existência desta preliminar, exatamente porque requisito de admissibilidade. No entanto, nenhum juízo de valor sobre seu conteúdo poderá ser realizado, sob pena de incorrer em abuso de jurisdição e usurpação da competência do STF. Essa é a única conclusão possível, dado à expressa provisão contida no § 2º do artigo 543-A, o qual, explicitamente, determina que o conteúdo da preliminar do recurso, em que a parte cuida de demonstrar a existência da repercussão geral, deverá ser apreciada exclusivamente pelo STF.

Ao estatuir que a apreciação da preliminar de existência de repercussão geral é exclusiva do STF, a lei, sob o império da qual todos estão submetidos, inclusive e principalmente os magistrados, que apenas a devem aplicar, exclui a apreciação da repercussão geral da jurisdição dos tribunais onde se origina o recurso. Resta a esses tribunais, portanto, um resquício de jurisdição, ou uma jurisdição precária consistente apenas da verificação da dedução ou não da preliminar de repercussão geral. Havendo, satisfeito estará esse requisito para franquear o acesso ao STF, ao qual caberá, com exclusividade, o exame do conteúdo daquela preliminar.

Se o STF, ao apreciar a questão, negar a existência de repercussão geral, a “decisão valerá para todos os recursos sobre matéria idêntica, que serão indeferidos liminarmente, salvo revisão da tese, tudo nos termos do Regimento Interno do STF” (parágrafo 5º do artigo 543-A).

Esse indeferimento liminar, contudo, não pode ser pronunciado pelos tribunais de origem, mas apenas pelo próprio STF, consoante o seu Regimento Interno. É o que se dessume do artigo 327,caput, do RISTF, segundo o qual a Presidência do STF deverá recusar os recursos cuja matéria não ofereça repercussão geral em razão de precedente do STF. Aos tribunais de origem, quando muito, cabe selecionar um ou alguns recursos que versem idêntica matéria para encaminhá-los ao STF, sobrestando os demais até o pronunciamento definitivo do STF sobre a matéria.

Sobrevindo tal pronunciamento, “os recursos sobrestados serão apreciados pelos Tribunais, Turmas de Uniformização ou Turmas Recursais, que poderão declará-los prejudicados ou retratar-se” (parágrafo 3º do artigo 543-B).

Isso significa que, proferido o julgamento de mérito sobre a questão de repercussão geral proferido no(s) recurso(s) que foram encaminhados ao STF, aqueloutros recursos que versavam matéria idêntica e haviam sido sobrestados poderão ter um de dois destinos: ou a) serão declarados prejudicados, na hipótese de a decisão recorrida estar alinhada com a decisão do STF sobre a questão da repercussão geral; ou b) deverão ser devolvidos ao órgão fracionário do tribunal de origem para que se retrate ou não, na hipótese de a decisão recorrida ser dissonante daquela proferida pelo STF sobre a questão de repercussão geral.

Aqui cabe observar que o juízo de prejudicialidade não equivale a indeferimento liminar do recurso, mas à declaração de que está prejudicado porque a decisão recorrida afigura-se em harmonia com o quanto decidiu o STF sobre a matéria de repercussão geral em que o recurso se baseava. E mais, tal juízo de prejudicialidade vale apenas para os recursos que haviam sido sobrestados, e não para aqueles que aflorem depois do julgamento da repercussão geral. E mais, só quando a matéria for idêntica, não para aquelas que são análogas ou semelhantes, porque tanto a analogia quanto a semelhança não guardam relação de sinonímia com a identidade. O que é idêntico, o é em todos os aspectos. Já o que é análogo ou semelhante, o é por identidade de um ou mais elementos, mas não todos. É a lei que exige o requisito da identidade de matéria, não da semelhança ou analogia delas.

Por outro lado, o juízo de admissibilidade de recurso extraordinário pelos tribunais de origem é precário e não faz coisa julgada. Tanto isso é verdade que a última palavra sobre a admissibilidade de recurso extraordinário caberá ao próprio STF, que poderá inadmitir recurso admitido pelo tribunal de origem, bem como admitir recurso não admitido pelo tribunal de origem. No primeiro caso, o recurso subirá sem mais. No segundo, por meio de agravo nos próprios autos.

É nessa segunda hipótese que se tem assistido um enorme desvio e abuso de jurisdição, pois os tribunais de origem têm indeferido liminarmente o recurso de agravo nos próprios autos, usurpando, com isso, a competência do STF, pois tal apreciação incumbe apenas e exclusivamente ao próprio STF. Em outras palavras, a jurisdição dos tribunais de origem a respeito do agravo nos próprios autos é ainda mais reduzida, precaríssima, limitada apenas à formação do recurso. Nenhum, frise-se, nenhum juízo de valor pode o tribunal de origem fazer sobre a admissibilidade ou mérito do recurso de agravo. Falta-lhe autorização legal para tanto. Portanto, faltam-lhe competência e jurisdição sobre a matéria nele vertida.

Isso é o que se infere do processamento do agravo nos próprios autos que está disciplinado no artigo 544 do CPC, com a redação dada pela Lei 12.322/2010, lei que a todos vincula, inclusive aos tribunais de origem, seus principais destinatários. De acordo com o artigo 544, não há nenhuma autorização para o tribunal de origem proferir juízo de admissibilidade, conhecimento ou mérito do agravo nos próprios autos. Sua competência limita-se ao processamento de formação do recurso, atribuindo-lhe a lei as seguintes tarefas: intimar o agravado para, no prazo legal, oferecer resposta; verificar o recolhimento do preparo e do porte de remessa e retorno; regularizar os autos; e remetê-los ao tribunal de instância extraordinária.

Qualquer juízo de admissibilidade que importe conhecimento, ou não, ou de mérito do agravo (como o indeferimento liminar fundando na inexistência de repercussão geral, ou em que o recurso extraordinário fora inadmitido porque a decisão recorrida aplica a decisão do STF sobre a repercussão geral) pelo tribunal de origem representará insubordinação à lei, desvio do artigo 544, e, no caso do agravo nos próprios autos em recurso extraordinário, usurpação da competência do STF a desafiar reclamação.

Só o STF pode apreciar o agravo nos próprios autos. Até porque, em razão do parágrafo 5º do artigo 543-A, o STF está autorizado a revisitar a matéria e rever a tese esposada sobre a questão de repercussão geral que constituiu o fundamento da decisão de inadmissibilidade do extraordinário pronunciada pelo tribunal de origem. Dessa forma, o recurso de agravo, nos próprios autos, serve também a tal propósito, i.e., ao fim de provocar o STF para que possa decidir se aceita ou não rediscutir a questão da repercussão geral caso o agravo inculque haver no recurso extraordinário a que visa liberar fundamentos suficientes que, primo ictu oculi, aconselhem a superação da orientação anteriormente firmada.

Sérgio Niemeyer é advogado, mestre e doutorando em Direito pela USP

Revista Consultor Jurídico, 13 de outubro de 2011

Noticias do STF

Empate adia decisão sobre norma mais branda para crimes de tráfico 

Após empate no julgamento do Recurso Extraordinário (RE 596152), nesta quinta-feira (13), o Supremo Tribunal Federal (SFT) decidiu adiar seu posicionamento quanto à possibilidade de aplicar de forma retroativa a causa especial de diminuição da pena contida no parágrafo 4º do artigo 33 da Lei 11.343/2006 (nova Lei de Drogas) a crimes cometidos na vigência da Lei 6.368/1976 (antiga Lei de Drogas). O Plenário optou por aguardar o voto do ministro que preencherá a vaga da ministra Ellen Gracie, aposentada em agosto último, para se posicionar de forma definitiva sobre a matéria discutida no recurso em questão, por tratar-se de tema com repercussão geral reconhecida.

Apesar disso, em relação ao caso concreto analisado no RE, o Plenário negou provimento ao recurso, mantendo o acórdão do Superior Tribunal de Justiça (STJ), que aplicou o referido dispositivo ao caso de um pequeno traficante condenado sob vigência da antiga lei. A decisão foi tomada com base no artigo 146, parágrafo 1º, do Regimento Interno do STF, segundo o qual, nas situações de empate, prevalecerá a solução mais favorável ao réu. No entanto, como a decisão definitiva sobre a matéria dependerá do voto de novo ministro a compor a Corte, o Supremo ainda não firmou entendimento a ser adotada pelos demais tribunais, conforme prevê o instituto da Repercussão Geral.

No RE 596152, prevaleceu a divergência aberta pelo presidente do STF, ministro Cezar Peluso, e seguida pelos ministros Ayres Britto, Dias Toffoli, Gilmar Mendes e Celso de Mello. Os cinco negaram provimento ao recurso requerido pelo Ministério Público Federal (MPF), mantendo a decisão do STJ que aplicou de forma retroativa a causa de diminuição de pena contida na nova lei de drogas, em respeito ao princípio constitucional que permite a retroatividade da lei penal mais benéfica ao réu. 

Para os ministros, não há obstáculo legal à aplicação retroativa do referido dispositivo, o qual permite que a pena seja reduzida de um sexto a dois terços nos casos em que o condenado seja primário, tenha bons antecedentes, não se dedique às atividades criminosas nem integre organização criminosa. “O propósito claro da lei foi punir de maneira menos severa pessoas nas condições nela disciplinada sem nenhuma correlação, por si, com as novas penas aplicáveis ou aplicadas”, ressaltou Peluso.

O ministro Ayres Britto acrescentou que a aplicação retroativa da referida norma à pena mais branda prevista na antiga Lei de Drogas não se trata da conjugação de duas leis em uma terceira, conforme alegara o MPF. Para ele, o benefício previsto no parágrafo 4º do artigo 33 da nova legislação é inédito, não podendo, portanto, ser comparado com a lei anterior. “Esse tema tem que ser, necessariamente, examinado à luz do princípio constitucional da aplicabilidade da lei penal mais benéfica”, manifestou o ministro Celso de Mello, também favorável à posição defendida pela divergência.

Nesta quinta-feira (13), o ministro Luiz Fux, proferiu seu voto vista (leia a íntegra) pelo provimento do recurso, reiniciando o julgamento do RE suspenso desde 26 de maio deste ano. Fux filiou-se à corrente aberta pelo relator do RE, ministro Ricardo Lewandowski, em 2 de dezembro de 2010 (quando teve início o julgamento do RE), e acompanhada pelos ministros Joaquim Barbosa, Cármen Lúcia e Marco Aurélio. Segundo Fux, o fator redutor da pena, previsto no parágrafo 4º do artigo 33 da Lei 11.343/2006, não pode ser aplicado de forma dissociada da penalidade prevista no caput do mesmo artigo, que prevê um mínimo de cinco anos e máximo de 15 anos de reclusão para o crime de tráfico de drogas.

A retroatividade isolada da norma, e sua possível aplicação à penalidade mínima prevista para o crime de tráfico na antiga legislação (três anos), no entendimento do ministro  Luiz Fux, vai favorecer aqueles que praticaram o delito antes da nova legislação, em detrimento dos que delinquiram após o advento da lei de drogas de 2006, conferindo uma verdadeira afronta ao princípio constitucional da isonomia. Isso fará com que “duas pessoas que praticaram o mesmo fato delituoso, nas mesmas condições, recebam penas distintas, apenas em razão do tempo em que o crime foi levado a cabo”, destacou Fux.

O ministro Marco Aurélio, favorável à mesma tese, acrescentou que reconhecer a aplicação retroativa do dispositivo de forma isolada configuraria uma afronta à opção política normativa feita com a Lei 11.343/06, que buscou conferir maior rigor no combate ao tráfico de drogas, ao exacerbar as sanções aplicadas a quem cometer o delito. 

MC/AD