De qualquer tragédia ou catástrofe devem-se tirar lições.
A cada tragédia a lição que se repete, dentre outras tantas, é que, na dor – e no sofrimento – somos todos iguais – rigorosamente iguais.
Na dor e no sofrimento os Quesadas, Suarez Montes, Coquetes, Arrondos, Lenzis, Hochabaeff, Moholts, Sebas, Dubois, Ivanovitch, Giroux e outros são iguais, rigorosamente iguais, aos Silvas, Gomes, Leites, Oliveira, Fonseca, Ferreira, Pereira e outros.
Na dor não se diferencia nacionalidade e posição social.
A dor que dói aqui é a mesma que dói na Suécia e no Senegal, no empresário e no trabalhador braçal.
Pretos, brancos, pobres, ricos, bonitos, feios, altos, baixos, crianças, adultos, todos, enfim, somos rigorosamente iguais na dor e no sofrimento.
A dor e o sofrimento não servem apenas para doer e fazer sofrer, mas também lecionam, mostram o caminho, podem levar o incrédulo a Deus – ou afastá-lo ainda mais, não se há de negar.
A dor que dói – e o sofrimento que corrói – em face de uma tragédia – perda de um ente querido, por exemplo – não só ensinam como nos tornam mais humildes. Afinal, a dor e o sofrimento dela decorrentes não distinguem o rei do súdito, o juiz do jurisdicionado, o macho da fêmea, o bonito do feio, o governante do governado, releva reafirmar.
Diante da dor, não há soberba; também não importa a riqueza quando estamos sofrendo em face de algum infortúnio.
Em ocasiões dessa natureza, pouco importa a nossa origem, o título que ostentamos ou cargo que exercemos, já que a minha dor é rigorosamente igual à do vizinho, do amigo ou do inimigo.
Na dor não nos preocupa o saldo bancário.
Os prazeres da carne, a suntuosidade, a soberba, a inveja, a patranha, tudo isso se revela desprezível, quando se sobrepõem a dor e o sofrimento.
Se é dor, dói – e pronto!
Entretanto, faz pensar, faz refletir, visto que tem o poder de mudar o curso, de nos fazer redirecionar as nossas ações – podendo, até, purificar o pensamento, fazendo com que nos tornemos mais humildes, mais alma e menos matéria.
A dor que lancina, que aflige e que danifica, nos apequena a todos e nos fragiliza, além de poder nos mostrar e conduzir, enfim, a caminhos nunca dantes trilhados.
Pena que muitos só reavaliem os seus conceitos diante da dor e do sofrimento.
Mas há os que, recalcitrantes, nem mesmo a dor e o sofrimento lhes servem de lição.
O ideal seria que não dependêssemos de uma tragédia para dar valor ao semelhante, para reavaliar os nossos conceitos.
Dor é dor; sofrimento é sofrimento.
Não existe mais dor ou menos dor; mais sofrimento ou menos sofrimento.
Se é dor, é dor; se é sofrimento, é sofrimento – e maltrata, faz sofrer, faz pensar, refletir, principalmente quando se é racional.
Dor é sofrimento físico e/ou moral.
A dor que dói em mim é a que dói em ti, ainda que de matizes diferentes.
Mas, igual ou diferente, com uma ou outra coloração, o certo é que a dor dói e maltrata – e vulnera, e fragiliza.
Diante da dor podemos, até, (re) agir de forma diversa.
Mas as nossas (re) ações, díspares ou semelhantes, decorrem do mesmo sofrimento – físico ou da alma – da mesma certeza de que diante de uma borrasca, de uma tragédia somos, sim, todos iguais.
A dor nos remete a Deus – para suplicar, para que nos dê força para tolerá-la, ou mesmo para questioná-lo, em face do sofrimento que julgamos não merecer.
Para a dor física ministram-se os analgésicos; para a dor da alma, em princípio, não há remédio, sobretudo para os incrédulos, para aqueles que diante dos olhos só vêem a matéria.
A dor da alma é dor lenta, corrosiva, dilacerante – daquelas que nos levam ao chão e nos fazem questionar por que comigo e não com outra pessoa.
Para a dor da alma o único remédio a ser ministrado, não raro, é deixar o tempo passar.
Com o tempo a dor da alma corrói menos – nos faz levantar, até que outra tragédia nos abata, nos faça sucumbir, para relembrar, outra vez que, por mais que não queiramos ver, somos mesmo rigorosamente iguais.
A dor da alma é aquela que deixa um nó na garganta, que faz as lágrimas descerem – muitas vezes sem alterar os músculos de nossa face.
As lágrimas são, afinal, a materialização, em gotas, da dor e do sofrimento que nos afligem.
A dor e o sofrimento são partes da nossa vida.
É necessário, pois, que, diante de qualquer um deles – ou de ambos – tenhamos a capacidade de renascer, ainda que a dor nos tenha mutilado a alma.