Espaço livre

Diretas Já! Por que não? * 

Em tempo de julgamento do Mensalão, precisou o Supremo Tribunal Federal, por seus Ministros, enfrentar horas a fio de sessões diárias para que grande parte da população pudesse perceber um reflexo da realidade da maior parcela da magistratura brasileira, a de que juiz trabalha, e muito, inclusive após o “horário comercial”. 

Enquanto os demais servidores da Nação, cumprida sua jornada diária, se voltam a outras atividades, todas merecidas, diga-se de passagem, muitos togados permanecem despachando e julgando processos que a sua longa pauta de audiências e demais atendimentos o impediram de realizar. 

Essa breve introdução é só para pontuar que felizmente, o Poder Judiciário está como nunca antes acontecera, ocupando os noticiários de todas as mídias, e desta feita, de maneira positiva. 

E é nesse viés de alta, que a Associação dos Magistrados do Brasil – AMB entra em campo com a campanha “Diretas Já nos Tribunais Brasileiros”, retratada em proposta de emenda constitucional que visa instituir a eleição, por voto de todos os juízes, dos presidentes e vice-presidentes dos tribunais (excepcionando-se corretamente e por razões óbvias, a escolha do corregedor-geral). 

Acerca dessa proposição, na qual o atual Presidente da AMB, Nelson Calandra, deposita todas as suas fichas para tentar salvar, se é que isso é possível, sua pífia gestão à frente da Associação de Magistrados nacional, a pergunta que se apresenta é, por que não apoiá-la? 

Na teoria, por óbvio, a alteração constitucional iria ao encontro do intenso processo de democratização das instituições pátrias, inaugurado com a Constituição Federal de 1988. 

Na prática, os defensores do status quo e, portanto, contrários à tese, argumentam principalmente que isso iria elevar, a níveis nada saudáveis, a politização da atuação de desembargadores interessados em granjear a simpatia dos eleitores juízes, o que fomentaria a dissensão na classe e incentivaria, inclusive, a interferência indevida de membros de outros Poderes, interessados na eleição do “candidato mais adequado”. 

Não faço coro a esse entendimento. Juiz que se vende por diária ou outras vantagens é um pulha que não merece a toga que veste e pulhas na magistratura, tenho certeza, são minoria. 

Ressalto que o exemplo das eleições para Procurador-Geral no Ministério Público, muitas vezes criticado em razão das rusgas que impõe à carreira, não se aplica ao caso. Não se pode perder de vista que lá, a eleição é para a composição de uma lista tríplice, competindo ao Chefe do Executivo, a palavra final na definição do escolhido. 

Nem se diga, ademais, que o mais simpático e de maior trânsito na Corte seria naturalmente o eleito. Exemplo significativo aconteceu aqui no Maranhão com o Desembargador Stélio Muniz, que nunca foi um dos mais queridos por seus pares, prova disso foi que, nada obstante sua antiguidade na Corte, não teve e não terá, ante a aposentadoria que se aproxima, a oportunidade de presidir o Tribunal de Justiça.

Todavia, Stélio, por duas vezes, foi o indicado pela classe de juízes para comandar o Tribunal, em eleições simuladas realizadas pela Associação dos Magistrados do Maranhão – AMMA. E foi a sua gestão à frente da Corregedoria, exercida de forma participativa com a magistratura de primeiro grau, aliada à sua personalidade de agente político austero, probo e responsável, que o alçaram à condição de preferido pelos togados da base. 

Ademais, por mais justo que seja o respeito à antiguidade, esse não pode ser o critério preponderante para a escolha de um dirigente de Tribunal. As Cortes de Justiça no Brasil, independentemente do Estado da Federação, consubstanciam atualmente, complexa estrutura administrativa, contratantes e consumidoras de inúmeros bens e serviços, com centenas ou milhares de servidores a elas vinculados, detentoras de orçamento considerável e o que é mais importante, definidoras de políticas locais de administração judiciária. 

Os cargos de presidente e vice-presidente de tribunais devem, portanto, ser ocupados por magistrados que efetivamente demonstrem aptidão para a função de gestor, que gozem de natural respeitabilidade por parte de toda a classe e que não demonstrem tendência a se curvar a ingerência de outros Poderes.

 

Diretas Já! Por que não?

 

*Marcelo Silva Moreira, Juiz de Direito titular do Juizado Especial Cível e Criminal da Comarca de Bacabal, respondendo cumulativamente pela Comarca de Barreirinhas e Juiz Eleitoral da 56ª Zona.

Autor: Jose Luiz Oliveira de Almeida

José Luiz Oliveira de Almeida é membro do Tribunal de Justiça do Estado do Maranhão. Foi promotor de justiça, advogado, professor de Direito Penal e Direito Processual Penal da Escola da Magistratura do Estado do Maranhão (ESMAM) e da Universidade Federal do Maranhão (UFMA).

Um comentário em “Espaço livre”

  1. Caro amigo e colega Marcelo,

    Concordo em gênero, número e grau com as suas colocações. Só quero fazer algumas ressalvas.
    Primeiro, a questão da eleição direta não vem de agora. Na verdade, quando o presidente da AMB era o Cláudio Baldino – que tive a honra e o prazer de conhecer e compartilhar idéias, pois à época fazia parte da diretoria da AMB – é que esta campanha foi lançada.
    Segundo, se o problema – como alguns apontam – é o risco da politização, o que acontece hj, entre poucos, não é escolha política ? Afinal se fosse tecnica, tão somente, Stélio já teria sido presidente.
    Claro que haverá partidarismo, pois eu ou vc podemos nos identificar por propostas diferentes, mas assim funciona a sociedade como um todo. Todos os dias, todas as horas fazemos escolhas, que sempre irão refletir os valores que acredito.
    Desvios, interesses, é possível. Mas estes têm de ser denunciados e combatidos, pois o escolhido tem de ter a melhor proposta para a instituição e não para um grupo.
    Ora, se nós juízes não conseguirmos fazer escolhas pautados por questões republicanas, porque exigimos ao povo, por exemplo, o voto limpo? Se nós juízes, como dizem alguns, vão se pautar por interesses individuais, como é que acontece hj na escolha por meia dúzia? Afinal, atender o interesse menor de poucos é fácil, o difícil será ser escolhido por toda uma classe da mesma forma.Não vai dá, vai ter de ser discussão institucional.
    Um grade abraço,
    Sonia

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