O POVO BRASILEIRO E A SÍNDROME DA AVESTRUZ

“[…]Nunca se viu tanta grana do contribuinte sendo distribuída a parlamentares, à luz do dia, a nos afrontar, a nos agredir a todos, como um ultraje, um escárnio, consequência de ações que são próprias de quem acredita na impunidade, a considerar que muitos são os parlamentares investigados, abrigados, todavia, sob o manto do fórum privilegiado[…]”.

Com o perdão do clichê, devo dizer, beirando a obviedade, que vivemos atualmente uma quadra difícil – afirmação com a qual todos haverão de concordar -, proporcionada, sobretudo, por uma maioria significativa de  homens públicos que só defendem os seus próprios interesses, aproveitando-se, o que é mais grave, de uma outorga popular.

Nunca, em tempo algum, as negociatas no parlamento nacional estiveram tão em voga, tão à luz do dia, tão evidentes, tão claras, a nos indignar a todos nós. A mercancia de votos no Congresso Nacional, com efeito, jamais foi feita com tanta clareza, com tanta pujança, tão desavergonhadamente, sem receio, sem titubeio, sem enleio, às claras, à vista de todos, como se deu recentemente, por exemplo, com a decisão que sustou a persecução criminal em desfavor do atual presidente da República.

Até onde a minha vista alcança, nunca o processo político esteve tão contaminado, tão degradado – no ápice de uma crise econômica grave, anote-se –  pelo uso indiscriminado de verbas públicas, disfarçadas de emendas parlamentares e outras mesuras que, embora com a aparência de legalidade, são contaminadas pela imoralidade, pelos fins escusos a que se destinam, alfim e ao cabo.

Nunca se viu tanta grana do contribuinte sendo distribuída a parlamentares, à luz do dia, a nos afrontar, a nos agredir a todos, como um ultraje, um escárnio, consequência de ações que são próprias de quem acredita na impunidade, a considerar que muitos são os parlamentares investigados, abrigados, todavia, sob o manto do fórum privilegiado.

A ação despudorada de alguns dos nossos representantes beira a obscenidade e nos agride, nos insulta a todos, nos faz descrer da classe política, principal beneficiária das “negociações” que são feitas à luz do dia, sem nenhum recato, discrição ou pundonor, quase sempre em detrimento do interesse público.

O povo, principal vítima das negociações que são feitas para manutenção do status quo, com a distribuição indecorosa de cargos públicos, quase sempre para atender aos interesses pessoais dos parlamentares, a tudo isso assiste sonolento, omisso, inerte, cabisbaixo, conformado, quieto, anestesiado, em total estado de letargia.

A verdade é que, de rigor, diante do quadro de degradação moral que se descortina sob os nossos olhos, ninguém reage, ninguém protesta, as panelas, antes tão ativas, hoje dormitam numa gaveta de armário, como se tudo estivesse na mais perfeita ordem.

Enquanto o povo, acomodado, a tudo assiste, sem esboçar a menor reação, o nosso dinheiro se esvai. São bilhões distribuídos em verbas parlamentares, as quais só Deus sabe o destino final, pois é pouco provável que sejam aplicadas, com o necessário rigor, em obras e serviços de interesse do povo.

O que mais revolta em tudo isso é a desfaçatez dos beneficiados com as verbas, cargos públicos e outras benesses – que não é o povo, registre-se. O que causa indignação é ouvir parlamentares, sem nenhuma cerimônia, depois de devidamente contemplados, candidamente, como se fossem um exército de querubins, como se não tivessem a quem dar satisfação, afirmando, com evidente mofa, que votam de acordo com a sua consciência.

Enquanto isso, repito, o povo permanece inerte, indolente, indiferente diante de tantas traquinices, o que me leva a indagar inquieto, com perplexidade: o que levou o cidadão brasileiro, até há bem pouco tempo tão ativo, altivo e indignado, a se deixar levar pela síndrome da avestruz, a decidir, ao que parece, por enterrar a cabeça na areia para não confrontar a realidade, a não esboçar reação alguma diante das transações em benefícios de uns poucos – que, registre-se, já foram tenebrosas, envoltas em mistérios, disfarçadas, e hoje se mostram à luz do dia – que são realizadas em Brasília?

O que ocorre com o povo brasileiro, nos dias atuais, que resolveu não sair da comodidade de seu lar, como se vivesse no mais honesto dos mundos, como se não testemunhasse o Estado brasileiro ser inventariado, dilapidado, sucateado para atender à ambição de quem quer, a qualquer custo, se manter no poder e/ou dele tirar proveito?

Cá do meu canto, como atento observador da conjuntura, creio que o povo se acomodou porque simplesmente perdeu a esperança, tanto nas instituições quanto nos homens públicos que as representam.

O povo não acredita, com efeito, que saindo às ruas para protestar conseguirá fazer refluir as ações nefandas dos nossos representantes e muito menos conseguirá fazer com que as instâncias persecutórias punam exemplarmente os desvios de conduta, ante a óbvia constatação de que o que testemunhamos na famigerada Operação Lava Jato é apenas a ponta do iceberg, em face de uma sociedade carcomida pela cultura da corrupção.

Desde a minha compreensão, o que ocorre nos dias atuais é, pura e simplesmente, descrença, desalento com tudo o que está aí. O povo já não acredita que haverá mudança de comportamento dos homens públicos se optar por protestar, e nem acredita, ademais, que as instituições, como anotei acima, darão resposta pronta e eficaz para os desvios de conduta, motivos pelos quais se acomodou, perdeu a esperança.

Diante desse quadro de degradação moral e em vista da ineficiência das instâncias punitivas, o povo refluiu, perdeu a fé e preferiu ficar em casa, porque cansou de gritar, de sair às ruas, de bater panelas. Agora, desalentado, não reage, optando por viver a sua vida, horrorizado, escandalizado, anestesiado com tudo que vê.

O povo, lamentável constatar, cansou – e se acomodou, uma vez que não acredita em mais nada. Perdeu a fé nas instituições e nos homens públicos.  Por isso, não reage. O povo sabe, é triste admitir, que indo ou não às ruas, tudo permanecerá como está. Nada mudará. E, o que é mais grave, muitos dos que protagonizam as negociatas que todos nós testemunhamos, valendo-se dos mandatos que lhes foram outorgados, serão reeleitos, para, mais uma vez, procederem da mesma forma, num círculo vicioso que destrói os nossos sonhos, as nossas esperanças.

A verdade é que ninguém acredita que, aderindo às manifestações ou simplesmente batendo panelas nas sacadas dos apartamentos, conseguirá mudar a conduta viciada e deletéria dos nossos representantes, posto que não há meios capazes de mudar a conduta de quem prefere ser contemplado com cargos e verbas públicas a seguir algum ideal, mesmo porque, dez milhões de reais de emendas parlamentares, por exemplo, são muito mais sedutores que o grito das ruas, que qualquer ideologia.

É isso.

AS ELEIÇÕES DO TJ/MA NO MUNDO DA PÓS VERDADE

 

“[…]Essa cautela, lamentável constatar, nem todos têm. Por isso vejo replicar, compreensivelmente, mas no mesmo passo indignado, as notícias de que somos uma Corte sem autonomia, capaz, por isso, de ser manipulada pelo Poder Executivo, o que só pode ser mesmo fruto de uma imaginação fértil e inescrupulosa, uma vez que somos 27 homens e mulheres com discernimento suficiente para saber o que queremos. Além disso, temos autonomia para deliberar acerca dos nossos destinos, sem que o Executivo precise nos dizer como devemos nos comportar[…]”.

 

As ilustrações que faço neste artigo, valendo-me de um romance de Ian McEwan, objetivam, ao fim e ao cabo, refutar uma descabida afirmação, veiculada em alguns blogs locais, a propósito da eleição que escolherá os novos dirigentes do TJ/MA para o biênio 2018/2019, segundo a qual o Poder Executivo local estaria agindo nos bastidores para manipular o sufrágio em favor desse ou daquele candidato.

Pois bem. Em Reparação, um dos mais festejados romances de Ian McEwan, escritor americano, autor, dentre outros, dos romances Enclausurado (o mais recente), Expiação, Sábado, Na Praia, Amsterdam, o Inocente, Amor sem Fim etc, BrionyTallis, protagonista, faz uma acusação mentirosa, leviana e irresponsável contra Robbie Turner, filho de um jardineiro e protegido da família de Briony, que, em face da desajuizada acusação, é processado, condenado e preso.

O que instigou Briony à mentira foi, além da sua mente criativa, um descuido  do próprio Robbie, que lhe entregou uma carta para que ela, Briony, entregasse a Cecilia Tallis, sua irmã, na qual ele falava, explícita e inadvertidamente, de seus desejos sexuais, de uma forma pouco usual.

A partir daí tudo flui de acordo com a mente malsã de BrionyTallis, como ocorre com qualquer um que, valendo-se da rede mundial de computadores, resolva colocar em dúvida a reputação, a dignidade das pessoas, publicando matérias sem base fática verdadeira, como ocorre, por exemplo, com o que se tem veiculado a propósito das eleições vindouras para direção do TJ/MA.

O que o romance em comento deixa patenteado, com certa obviedade, é que uma mentira, ainda que não bem contada, sem base em dados factuais, fruto de uma elucubração, pode sim, como sói ocorrer, destruir a reputação de uma pessoa, ou de pessoas, quando a perfídia é assacada contra todos os membros de uma instituição, indistintamente.

O que pretendo refletir, portanto, tendo como pano de fundo o romance de Ian McEvan, como anotei no início deste artigo, é sobre as inverdades que têm sido veiculadas nas mídias sociais, sem que os veiculadores – e replicadores – se preocupem minimante com o mal que podem estar fazendo às pessoas de bem, a reafirmar, definitivamente, que vivemos, nos dias atuais, como nunca antes, no mundo da pós-verdade.

Os veiculadores e replicadores das matérias postadas na mídia, máxime em alguns blogs, cujos responsáveis não têm a cautela necessária para buscar a confirmação das informações que recebem, esquecem que, uma vez veiculada a notícia inverídica, uma vez desonrada uma pessoa de bem, são remotíssimas as possibilidades de o erro ser reparado, como tentou fazer BrionyTallis, depois que se deu conta da injustiça que cometeu ao acusar injustamente Robbie Turner.

Nunca é demais ressaltar que a vítima de uma acusação sem base fática verdadeira tem poucas chances de recuperar a credibilidade, afinal, vivemos, como disse acima, no mundo da pós-verdade, no qual as redes sociais aceitam, sem resistência, qualquer informação, qualquer agressão moral.

Por tudo isso é que, com redobrada cautela, deve-se ver com reservas o que se veicula na mídia. Por isso, cá do meu canto, custo a acreditar no que leio; sou ressabiado, desconfiado, motivo pelo qual estou sempre com o pé atrás.

Mas isso não ocorre com todo mundo, bastando, para constatar esse fato, observar como – e por quem – essas falsas notícias são replicadas nas redes sociais. Por pensar e agir assim é que qualquer notícia veiculada, mesmo que seja nos veículos de comunicação que gozam de alguma credibilidade, exigem de mim a máxima cautela, cautela que, de resto, todos deveriam ter, para não replicarem notícias falsas.

Essa cautela, lamentável constatar, nem todos têm. Por isso vejo replicar, compreensivelmente, mas no mesmo passo indignado, as notícias de que somos uma Corte sem autonomia, capaz, por isso, de ser manipulada pelo Poder Executivo, o que só pode ser mesmo fruto de uma imaginação fértil e inescrupulosa, uma vez que somos 27 homens e mulheres com discernimento suficiente para saber o que queremos. Além disso, temos autonomia para deliberar acerca dos nossos destinos, sem que o Executivo precise nos dizer como devemos nos comportar.

Os autores de veiculações especulativas parecem(?) não se dar conta de que depois de veiculadas as falsas notícias não há retorno, não há reparação que possa ser feita. Espalha-se como um rastilho de pólvoras. E cada um que ouve ou lê a fake news se encarrega de acrescentar a ela mais um detalhe, mais uma pitada de maldade, de modo a torná-la mais interessante, mais instigante, ao sabor dos iconoclastas.

Nessa senda, vão-se destruindo reputações, vão-se desonrando pessoas, deixando-as em situação desconfortável perante a sociedade, que, decerto, não as absolverá, ainda que, depois, consigam provar serem inverídicas as matérias, pois os que leem as notícias mentirosas, de rigor, não são os que leem a veiculação da verdade.

Apesar disso, muitos são os que não se acautelam, não pensam duas vezes antes de publicar – ou replicar – uma mentira. Divulgam as inverdades sem nenhum escrúpulo, sem nenhum cuidado, sem nenhum desvelo, pouco lhes importando a honra das pessoas. Por isso, costumo repelir com veemência as falsas notícias acerca das eleições para a diretoria do Tribunal de Justiça do Maranhão, sem base em nenhum dado objetivo, fruto da subjetividade de quem resolve, por razões que desconheço, sem inquietação de consciência, sem nenhuma cautela, amesquinhar, desonrar, enfim, a imagem da instituição e de seus membros.

Informações desse jaez nos atingem a todos; eu, particularmente, e, tenho certeza, todos os membros da Corte, os quais, decerto, também se sentem ultrajados com as injustas suspeitas publicada na mídia local.

Os responsáveis por informações desse matiz deveriam, sim, ter o cuidado de declinar os dados objetivos em razão dos quais constataram que o Chefe do Executivo está a manipular as eleições do TJ/MA; se não o fazem, todos nós somos levados a inferir que eles não têm compromisso com a verdade que deve nortear a atividade de todo jornalista. Ademais,é bom que estejam alertas, a credibilidade de um veículo de comunicação não se mede pelo número de acesso ou de leitores, mas pelo conceito que ele desfruta diante da opinião pública; conceito construído por conta da cautela com que apura os fatos que são noticiados.

É isso.