Principio estas reflexões com um pensamento de Alexandre Dumas: “A vida é uma tempestade. Em um momento, você aproveita a luz do sol, no outro, é açoitado pela chuva. O que importa é o que você faz quando a tempestade chega”.
Digo mais, para desenvolver o meu raciocínio, que empatia é a capacidade psicológica para sentir o que sentiria outra pessoa caso estivesse na mesma situação vivenciada por ela; que altruísmo é uma forma desinteressada de amar; e que solidariedade é um ato de bondade e compreensão para com o próximo.
A partir desses conceitos objetivos, importa, agora, indagar: por que, sendo todos filhos do mesmo Deus, seguidores da orientação cristã de quem pregou amor ao próximo acima de tudo, durante as tempestades a muitas pessoas faltam empatia, altruísmo e solidariedade?
Essa indagação inquietante tenho feito, repetidas vezes, a propósito da conduta de muitos que, podendo, não evitam o risco de contaminação pelo Sars-CoV-2, embora cientes de que, contaminados, podem, no mesmo passo e com grande probabilidade, infectar o semelhante, inclusive pessoas de sua própria família, muitas das quais do grupo de risco.
Essa grave falta de empatia, altruísmo e solidariedade, que nos iguala aos seres irracionais, me impõe reafirmar o que tenho dito nas conversas informais: nas adversidades, o homem se revela – para o bem ou para o mal. É dizer: há pessoas que não estão nem aí para o semelhante, ainda que esse semelhante sejam os próprios pais, numa atitude que, para mim, beira à irracionalidade.
Diante desse panorama, importa indagar, ademais: no que essas pessoas são diferentes, na essência, dos que se aproveitaram da pandemia para superfaturar na compra e venda de respiradores, de testes e de máscaras para o enfrentamento do novo coronavírus?
Indago, outrossim: no que diferem essas pessoas de sua Excelência, o Presidente da República, que nunca hesitou em se contaminar e replicar a contaminação, expondo, desnecessariamente, a vida de outras pessoas, inclusive de sua própria família?
No que essas pessoas são diferentes do tenista Novak Djokovic, número um do mundo, que abriu ao público um torneio de exibição em sua cidade natal, Belgrado, na Sérvia, promovendo uma aglomeração de pessoas sem máscaras nas arquibancadas e que, para completar, levou colegas de raquete a uma balada que varou a madrugada, debochando do novo coronavírus que, para se vingar, contaminou tanto ele quanto a esposa, o preparador físico e outros três tenistas que participaram da brincadeira?
E da influenciadora digital, Gabriela Pugliesi, especializada em saúde e bem-estar, que deu uma festa de arromba em plena pandemia e que, por isso, foi execrada/cancelada nas redes sociais? Do que diferem os intrépidos sabotadores dos protocolos sanitários?
Eu, sinceramente, não consigo compreender por que há pessoas que, podendo praticar ações benéficas ao semelhante, preferem, ao reverso, expor o seu desprezo pelo congênere. Nesse panorama, como animais que constroem, abrem veredas perigosas, incessante e perigosamente, sem se importarem aonde podem ser levados em face dos caminhos que escolheram (Dostoiévski. “Notas do Subsolo.” L&PM Editores. 40, Apple Books).
Pessoas insidiosas que agem como tem agido uma parcela da população em face da pandemia que atravessamos, lembram Mersault, protagonista de o Estrangeiro, de Albert Camus (eBook, Editora Record), um ser humano frio, insensível e amoral que, um dia depois do enterro da mãe, cuja data de nascimento e de morte nem sabia ao certo, inicia um caso amoroso e vai ao cinema se distrair, agindo, como sempre agiu, indiferente aos mais comezinhos valores morais.
É isso.