Para espairecer

Nada como uma boa música para espairecer. Gosto, sim, de uma boa música. E se a boa música vem acompanhada de uma boa letra, aí, meu irmão, não tem erro. É só ouvir e curtir. Faz bem a alma e ao coração.

Hoje, pela manhã, quando eu me deslocava para minha residência, ouvi uma das mais belas músicas da autoria de Tom Jobim, com letra do insuperável Chico Buarque.

Ei-la.

Eu Te Amo

Composição: Tom Jobim / Chico Buarque

Ah, se já perdemos a noção da hora

Se juntos já jogamos tudo fora
Me conta agora como hei de partir

Ah, se ao te conhecer
Dei pra sonhar, fiz tantos desvarios
Rompi com o mundo, queimei meus navios
Me diz pra onde é que inda posso ir

Se nós nas travessuras das noites eternas
Já confundimos tanto as nossas pernas
Diz com que pernas eu devo seguir

Se entornaste a nossa sorte pelo chão
Se na bagunça do teu coração
Meu sangue errou de veia e se perdeu

Como, se na desordem do armário embutido
Meu paletó enlaça o teu vestido
E o meu sapato inda pisa no teu

Como, se nos amamos feito dois pagãos
Teus seios ainda estão nas minhas mãos
Me explica com que cara eu vou sair

Não, acho que estás te fazendo de tonta
Te dei meus olhos pra tomares conta
Agora conta como hei de partir.

Superando as expectativas

A minha responsabilidade aumenta a cada comentário, a cada manifestação de apreço e cada novo leitor do meu blog.

Quando decidi-me pela criação deste blog, imaginei que se tivesse 40 (quarenta ) leitores, ou seja, o equivalente a uma sala de aula, já me daria por satisfeito.

Hoje, passados mais de quatro anos desde que fiz a primeira postagem, já são mais de setecentos mil leitores.

Considerando que este é um espaço monotemático – sentenças e despachos na área criminal , conquanto aqui e acolá seja postada uma crônica – compreendo que o número de leitores supera todas as minhas expectativas, máxime porque a maioria dos leitores são da página principal, ou seja, são leitores que direcionam o acesso ao meu blog.

Desde que decidi deixar de ministrar aulas, fiquei imaginando como continuar levando adiante as minhas mensagens. Foi aí, então, que tive a idéia do blog.

Vejo, agora, que não podia ter feito melhor. Tenho um espaço para refletir, para dividir com os leitores, sem ter que sair da minha casa para dar aula. Aliás, devo registrar que a única razão pela qual deixei de ministrar aulas foi a minha incapacidade de sair de casa para essa finalidade.

Chegar em casa e nela permanecer, depois de um dia exaustivo de trabalho, é, para mim, o que de melhor posso fazer, daí porque me afligia chegar e ter que sair novamente para dar aula.

Entre a “vaidade” de ministrar aulas na Universidade e na Escola da Magistratura e ficar em casa lendo um bom livro e desfrutando da companhia da minha família, não tive dúvidas: optei por ficar em casa.

Mentecaptos não somos

Fui juiz eleitoral por mais de dezesseis anos; sou eleitor há quase quarenta anos.

Com a experiência acumulada, posso dizer que já vi de quase tudo no período eleitoral – e mais alguma coisa.

Como eleitor, de ontem e de hoje, posso manifestar a minha mais extremada desafeição, repugnância mesmo, às falsas promessas de alguns candidatos, com o claro objetivo de ludibriar – sem nenhuma convicção, sem idealismo e sem ideologia.

Noutro giro, como magistrado, vivi a desgastante experiência de tentar, quase sempre embalde, expungir as fraudes do processo eleitoral.

A verdade é que a administração de uma peleja eleitoral sem vícios tem sido uma luta inglória de tantos quantos pugnam para que das urnas brote apenas a verdade eleitoral.

É preciso reconhecer, com franqueza, que, sobretudo no que concerne ao abuso do poder econômico – que, por óbvias razões, desvirtua, sim, o resultado das pugnas, sobretudo porque o eleitor tende a ser fiel a quem lhe ajuda materialmente, disse inferindo-se que, entre a razão e a gratidão, esta termina por preponderar – , não tem sido possível fazer a devida assepsia nos pleitos eleitorais, conquanto se reconheça que já houve avanços nesse sentido.

A propósito das fraudes eleitorais, lembro que, certa feita, num programa de entrevistas, na Rádio Educadora, à época localizada num anexo da Igreja da Sé, centro de São Luis, ao tempo em que eu respondia pela 10ª Zona Eleitoral, na década de 1990, à indagação de um ouvinte/eleitor , eu disse da quase inviabilidade de expungirem-se as fraudes das pugnas eleitorais. E sintezei, numa frase, as razões da minha desesperança: enquanto os juízes eleitorais passam o dia inteiro tentando evitar as fraudes, os maus políticos passam a noite acordados procurando meios de nos enganar.

Vejo, agora, depois de tantos anos, a experiência se repetir, pelo menos no que se referem às falsas promessas.

Vejo, com efeito, das propagandas eleitorais, a mesma cantilena de sempre. Os oportunistas tentam, com elas, ludibriar o eleitor, com propostas absurdas – e, por isso mesmo, irrealizáveis -, como se fôssemos um bando de mentecaptos, incapazes de distinguir a mentira da verdade, o bem do mal, o justo do injusto, o certo do errado.

Os candidatos, quase sem exceção, prometem o que, sabem, não vão cumprir. Mas, ainda assim, prometem, mesmo porque nenhum delas se elegeria se resolvesse admitir que o que está em jogo são os seus própiros interesses e não o interesse público.

O objetivo das campanhas eleitorais – de extremo mal gosto, registre-se – é sempre o mesmo: vender ilusão, para colher votos.

Depois de eleitos…Bem, depois de eleitos, objetivo alcançado, às favas as promessas e os escrúpulos.

PS. Essas reflexões não se destinam a todos os canditados, pois que não desconheço que, entre eles, há exceções. Há, sim, os que ainda fazem política por ideal, conquanto admita tratar-se de um minoria.

Voltei

Estou de volta para casa. Amanhã estarei de volta ao trabalho. Que bom! Estou, enfim, de volta a minha rotina: casa/trabalho/casa/trabalho.

Sou homem de rotina. Eu dependo da minha rotina para viver bem. E nem me importo se achem isso anormal.

Tire-me da minha rotina e verás o mal que me fazes.

A São Paulo cosmopolita, para onde fui “degredado” por longos cinco dias, não exerceu sobre mim nenhum fascínio, porque ela me infligiu uma insuportável quebra de rotina. Prefiro a “provinciana” São Luis, onde está tudo o que me é mais relevante.

O certo é que estou de volta. O coração agora descansa, depois da aflição que a ele impus.

O futuro…

Definitivamente, não sabemos, ninguém sabe, afinal, o que o futuro nos reserva.

A ninguém é dado o poder de antecipar o futuro. Muitos já tentaram. Ninguém, de rigor, conseguiu, todavia.

Todos que o têm tentado antever o futuro têm errado fragorosamente, ainda que se reconheça que, aqui e acolá, por pura acaso, alguns têm acertado, pontualmente, algum acontecimento vindouro. Nada, no entanto, capaz de impressionar.

.Apesar da inviabilidade de acertar o porvir, ainda há os que tentam adivinhar o futuro.

Em face da incerteza acerca do futuro, muitos são os que costumam atribuir o futuro a um ser superior, afirmando, às vezes sem nenhum convicção, que o futuro a Deus pertence.

Se somos todos filhos de Deus e se o nosso futuro está nas mãos desse mesmo Deus, confesso que não sei – e ninguém decerto saberá – por que alguns, depois de terem sido favorecidos com dons quase divinos, como se fossem espécies escolhidas, morrem de forma trágica ou depois de intenso sofrimento físico, como ocorreu, por exemplo, com Ella Fitzgerald e Billie Holiday ( A primeira, conhecida como a primeira-dama da canção americana, ficou cega, teve as penas amputadas e morreu de complicações decorrentes do diabetes, depois de intenso sofrimento. A segunda, viciada em álcool e heroína, passou os últimos dias de vida algemada a uma cama, vigiada por um policial, enquanto morria de cirrose hepática, aos quarenta e quatro anos de idade e com apenas 70 cents em sua conta bancária).

Diante dessa constatação, resta a mim indagar, inquieto: teriam esses filhos de Deus exorbitado – e, por isso, “castigados” – dos dons que lhes deu o criador, ou Deus, pura e simplesmente, deles se esqueceu, sem se preocupar com o seu futuro, depois de tê-los favorecidos com virtuoses que, aparentemente, negou a outros mortais?

Essas reflexões não se destinam a estabelecer qualquer polêmica em torno das questões religiosas. Elas são somente reflexões, feitas para instigar. Nada mais que isso.

Com a fé não se brinca; e eu seria a última pessoa do mundo a questionar a fé de alguém. – ou a minha própria fé.

O que pretendo é, tão-somente, induzir à reflexão, repito, sobretudo depois de viver – como ainda estou vivendo – intensa angústia com destino dos mineiros soterrados no Chile.

Como sou, não raro, irracional, fico, muitas vezes, me colocando no lugar deles e dos seus familiares. E, dessa forma, vou sofrendo junto com eles.

Torço para que Deus dê conforto a eles, para que suportem, sem enlouquecer, os três meses que terão que passar aguardando o resgate.

Eles, tenho esperança, não serão esquecidos por Deus, o qual, espero, cuidará do seu futuro.

Eu, sozinho

Minha incapacidade de ser simpático é proverbial. Todos que lidam comigo – ou que tentam fazê-lo –, já no primeiro encontro percebem faltar em mim a virtude (?) da simpatia.

Circunspeto, calado, fechado, com uma aparência que não estimula um novo relacionamento, quase recluso em mim mesmo, escravo do pensamento, fico eu, num congresso ( Seminário Internacional promovido pelo IBCCRIM, em São Paulo), com mais de quatrocentas pessoas, dentre as quais pelo menos umas vinte do Maranhão, sem conseguir estabelecer um novo relacionamento, uma nova amizade.

A propósito, ontem à tarde, entre uma palestra e outra, estando circulando nas imediações dos locais destinados às palestras, distante da muvuca, absorto, andando em círculos, refletindo exatamente acerca da minha incapacidade de fazer novos amigos, uma advogada de São Luis, muito simpática, aproximou-se de mim, com cuidado, com o zelo de quem quer ajudar um ermitão a sair do isolamento, com cuidado para que ele ( o ermitão) não se sentisse encurralado, e indagou, por que eu estava tão sozinho. Respondi a ela que nem eu mesmo sabia.

Ela ensaiou uma tentativa de diálogo mais profícuo, mas deu-se conta, sem demora, que eu era (sou) um caso perdido – e tratou de afastar-se de mim. Acompanhei os passos dela até perde-la de vista, no meio de uma quase multidão que se aglomerava em torno das mesas de lanche.

Depois desse brevíssimo encontro fiquei, mais uma vez, sozinho.

Mas não pude deixar de refletir acerca da pergunta a mim formulada pela simpática advogada.

Por que eu estava sozinho? Qual seria a verdadeira razão do meu quase isolamento?

Seria em face da saudade que já tomou conta de mim? Claro que não. Afinal todos sentem saudade.

Seria em face de uma decepção amorosa? Óbvio que não. Afinal, depois de muitos anos de intensa paixão, com o coração empedernido, calejado, experimentado, já não me permito mais viver fortes emoções, conquanto admita que estou sendo irracional, porque nunca é tarde para se viver um grande amor, uma intensa paixão.

Saudade da família? Claro que isso dói, mas não justifica o isolamento, afinal o congraçamento é o que de melhor se colhe em eventos dessa natureza e, ademais, todos temos família e todos dela sentimos saudade. Por que só em mim a saudade seria mais lancinante ?

Qual seria, então, a razão do isolamento?

Nem eu mesmo sei dizer. Só sei que sou um tipo estranho, muito estranho.

E os dias vão passando e mais introvertido, embotado, ensimesmado vou ficando.

A verdade é que, conquanto cercado de pessoas, estou sozinho, ou melhor, sinto-me sozinho.


Coisas da vida

Tudo que se constrói sobre  bases movediças tende a desmoronar, mais tempo, menos tempo; dura, quando muito, um inverno.

Assim são as coisas da vida.

Uma amizade construída à luz dos interesses pessoais, por exemplo,  tem data marcada para o fim; dura, se muito,  o tempo de um verão.

Assim são as coisas da vida.

A família que não fincar as suas escoras no  amor, mas em interesses materiais ou por mera conveniência, tende ao não  prosperar; dura – se durar! –  o tempo de uma primavera.

Assim são as coisas da  vida.

Um profissional que não tem amor pela profissão, que tem apego excessivo às coisas materiais, que coloca os interesses pessoais acima dos interesses dos destinatários do seu ofício, tende a ser desacreditado em pouco tempo; o descrédito decerto lhe alcançará antes que  flua o primeiro outono.

O ser humano que subjuga o semelhante, que usa de qualquer expediente para amealhar bens materiais, que deseja a qualquer  custo impor a sua  vontade,  certamente não lembra – ou não quer lembrar – das lições que a história nos legou.

Átila, por exemplo,  foi um dos mais temidos bárbaros de todos os tempos. O que fazia Átila temido era  o desejo de fazer guerra pelo prazer da guerra. Nada temia. Exaltava a violência. Conquistou  um império  a custo de muito violência e  de muitas vidas. Depois de morto, sem a força da sua espada, o império que  construiu desmoronou.

Não podia ser diferente.

Se o inimigo não tem defeito…

É sempre assim: se o profissional tem boa reputação, é preciso, logo, logo, achar um meio de mostrar aos que o têm em boa conta que ele não é tão correto assim, que essa boa reputação é pura ilusão.

É sempre assim: depois de uma acusação falsa, a honra não se recompõe. E aí não adianta o que se construiu. Tudo desmorona, para a felicidade dos iconoclastas (Fig. Aqueles para os quais nada é digno de culto ou reverência)

É sempre assim: o metido a besta (é assim que se qualifica o homem que se mostra correto no exercício de sua profissão) tem mesmo que ser “desmascarado” – na concepção dos calhordas -, para que todos saibam que todos são iguais.

É sempre assim: ninguém deve ter a petulância de, numa corporação, por exemplo, ser correto, apresentar-se correto, parecer correto, agir com retidão. Se assim se apresenta, se é essa a imagem que construiu, podem ter certeza – advertem os destruidores de imagem – que tem algum defeito que ainda não veio a lume. Mas que virá, espera-se, sem demora. Todavia, se não assomar o defeito, não tem problema, arruma-se um rapidinho, afinal, como se assiste no mundo da política mais rasteira, no mundo dos chamados homens de bem também prepondera, junto aos indignos, a máxima segundo a qual os nossos amigos, enquanto for conveniente, não têm defeito; os inimigos, se não os têm, nós botamos, nem que, depois, se for do nosso interesse, nós o desconsideremos.