Nada mais que um tolo

No Brasil é assim: as pessoas não cultuam os seus heróis. Aqui, ao contrário, cultuam-se alguns salafrários que fizeram da vida pública um trampolim para enriquecer. Os homens de bem passam pelo poder e em pouco tempo são esquecidos.

Ontem mesmo, durante a sessão do Pleno, fiquei algum tempo olhando para a cadeira que era ocupada pelo desembargador Stélio Muniz. Ninguém fala nele. Parece que nunca passou pelo Tribunal. Nenhum retrato na parede. Nenhuma homenagem. Tudo isso porque ousou ser correto, num mundo que não enaltece os seus heróis, que privilegia a esperteza.

Como dizia Heráclito, tudo flui. E no Tribunal parece que tudo flui ainda mais rápido. Por isso não tenho nenhuma ilusão acerca da minha passagem por lá. Não sou do tipo para ser lembrado. Não vou ser presidente e nem corregedor. Por isso não terei sequer um retrato na parede. Quando muito serei lembrado pelos meus assessores.

É vida, dirão! É a vida, direi!

Um dado histórico. Maria Quitéria de Jesus, uma mulher bela, simpática e de aspecto sadio, segundo cronistas da época, vestiu trajes militares e lutou com bravura, disfarçada sob o nome de José Cordeiro, durantes as lutas em Salvador, contra os portugueses. Maria Quitéria chegou a fazer prisioneiros dois portugueses e, encerrados os combates, foi enviada ao Rio de Janeiro, onde o próprio imperador a recebeu, condecorando-a com a Ordem do Cruzeiros do Sul. Tais honrarias não impediram que ela morresse cega e esquecida, na mais absoluta miséria, em 1853, aos 61 anos de idade (Eduardo Bueno).

É assim que cuidamos dos nossos heróis. Sei que, por pouco representar  dentro da estrutura de poder, eu também passarei, na certeza que, sem pelo menos um retrato na parede, também serei esquecido com muita rapidez. Quando de mim lembrarem, decerto haverá quem diga que não passei de um tolo, besta, metido a honesto e…muito chato.

Aliás, certa feita, um colega, numa das muitas viagens que fiz, depois de uns dois copos de cerveja, indagava para mim, com insistência, por que eu era tão chato, seguido de uma sonora gargalhada que a todos contaminava.

Ele fingia que era brincadeira e eu fingia que acreditava. No fundo, no fundo o que ele queria mesmo era questionar a minha esquisitice, que muitos, por maldade, confundem com chatice.

É isso.

Autor: Jose Luiz Oliveira de Almeida

José Luiz Oliveira de Almeida é membro do Tribunal de Justiça do Estado do Maranhão. Foi promotor de justiça, advogado, professor de Direito Penal e Direito Processual Penal da Escola da Magistratura do Estado do Maranhão (ESMAM) e da Universidade Federal do Maranhão (UFMA).

2 comentários em “Nada mais que um tolo”

  1. Meus parabens Dr.
    São por estes e outros contextos publicados e que externam a luz de sua postura e personalidade que a cada dia, lhe admiro mais e mais como profissional e pessoa. Não se preocupe que pelo menos um cidadão simples e humilde, lembrará de você.
    Que Deus lhe ilumine cada vez mais!

  2. Suas expressões são profundas, a ponto de nos fazer vidrar a cada matéria publicada. Já virou hábito, visualizar seu blog, com aquela sensação de ansiedade do próximo contexto que será publicado.
    O que percebo, é que o Sr. fica no meio de algumas pessoas (desembargadores), sem ambiente, sem se familiarizar com a criação e comportamento diferente de vossa pessoa. Enquanto estas outras pessoas estão falando de estórias e se vangloriando, seu pensamento fica bem distante, pensando nas coisas importantes da vida, detalhes estes que para maioria destas pessoas (desembargadores) não tem valor algum!

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