A ÁGUIA E O CORVO

A águia (nome popular dado a diferentes espécies de aves de rapina que se destacam por serem eficientes na captura de suas presas) tem pouquíssimos inimigos; um deles é o corvo (ave da família dos corvídeos, normalmente caracterizada por sua plumagem escura, popularmente interpretado como o sinal místico de mau presságio).

Para atacar a águia, o corvo se põe entre as suas asas, próximo à sua cabeça, quando ela está em pleno voo. Nessa privilegiada posição, é impossível a águia se defender dos ataques, mantendo-se o corvo infenso a qualquer reação, pondo-se a bicar-lhe a cabeça, incessantemente.

O que faz então a águia para se defender, diante dessa situação desfavorável? Desce ao chão para tentar se safar das bicadas? Ou permanece voando se submetendo às inclementes agressões?

Nem uma coisa e nem outra.

A águia, em sua defesa, sobe até uma altura que possa submeter o corvo à carência de oxigênio. Sem oxigênio, o corvo sucumbe e águia retorna a situação que lhe permita seguir em frente, livre das agressões.

Essa história serve como uma lição de vida para o enfrentamento das nossas dificuldades. É dizer, quando você se sentir atacado em pleno voo, nas mais diferentes situações da vida, você só tem duas alternativas: ou desce, se fragiliza, sucumbe, assume a derrota, ou sobe, altivo, definitivo e determinado, para, das alturas, com dignidade, com nobreza, vencer os adversários e as adversidades, infligindo derrotas aos inimigos, para, depois, seguir sua jornada. O pior a fazer é deixar tudo como está, permanecer inerte, não reagir.

Tenho tentado agir assim. Mas reconheço, nada obstante, que, às vezes, atacado pelos corvos (recutis: desafetos), tenho dificuldade de levá-los às alturas para tirar-lhes o fôlego, para, de consequência, derrotá-los. Ao reverso, reconheço, desalentado, que, muitas vezes, diferente da águia, me deixo abater em pleno voo, tamanha a minha fragilidade emocional diante dos reveses da vida, máxime os que vêm em detrimento da minha história – pessoal ou profissional.

É que, diante das adversidades, diante dos problemas da vida, eu simplesmente fico a remoer os pensamentos, fico a me martirizar, penso sempre no pior, faço projeções negativas, alimento a minha vida de maus pensamentos, incapaz que sou de enfrentar as intempéries da vida, conquanto saiba inevitável no mundo marginal em que vivemos, onde parcela significativa e perniciosa vive de maldades, perfídias, maquinações, de desprezo pela paz interior do semelhante.

Epiteto (filósofo grego estoico que viveu a maior parte de sua vida em Roma como escravo, nascido em Hierápolis, Turquia, falecendo em 135 d.C., em Nicópolis, Grécia) concluiu pela inevitabilidade de a vida nos esmagar, pouco importando quem somos. Diante do inevitável, deixou como legado, para o seu enfrentamento, três lições que destaco a seguir:

Lição I: Você não controla quase nada na vida;

Lição II: A única coisa que você controla é a sua mente; e

Lição III: O desejo te faz prisioneiro, por isso não deseje nada.

Importa para essas reflexões a segunda lição.

A propósito, nas minhas palestras tenho tentado me apresentar como um estoico. Mas vejo que, diferente de um estoico, eu não tenho nenhum controle sobre a minha mente, sobre os meus pensamentos, o que contrasta, ademais, com a visão de Marco Aurélio (ex-imperador romano, integrante da corrente estoicista) que ensinava que a virtude do homem é a aceitação das circunstâncias que não podem ser controladas, e que a qualidade dos seus pensamentos faz a diferença, na esteira do que ensinava Epiteto.

Pois bem. Eu nem sou de aceitar, passivamente, aquilo sobre o qual não tenho controle, nem tampouco tenha a capacidade de qualificar os meus pensamentos, incapaz que sou de depurá-los para me permitir ter qualidade de vida.

Diante de um problema, portanto, só sei remoer, só sei sofrer, povoando a minha mente de pensamentos desqualificados que terminam por me fragilizar, a deixar transparecer que, diferente do que prego, não sou estoico coisa nenhuma, e que, as vezes, diferente de uma águia, desço além do necessário, me tornando presa fácil aos corvos da vida.

É isso.

Autor: Jose Luiz Oliveira de Almeida

José Luiz Oliveira de Almeida é membro do Tribunal de Justiça do Estado do Maranhão. Foi promotor de justiça, advogado, professor de Direito Penal e Direito Processual Penal da Escola da Magistratura do Estado do Maranhão (ESMAM) e da Universidade Federal do Maranhão (UFMA).

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