Sentença condenatória.

 

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Inicialmente, um excerto do artigo Auto-retrato, publicado neste blog, para reflexão.

“[…]Tenho procurado, sempre, um ponto de equilíbrio. Como um pêndulo, às vezes oscilo, hesito, vou lá, venho cá. Sou assim mesmo: igualzinho a todo mundo. Mas nunca perco a noção do tempo e do espaço. Sei controlar as minhas emoções – paro, penso, reflito, conto até cem, para, só depois, agir – determinado, obstinado, sôfrego, ávido.

Sou, muitas vezes, desabrido, imoderado, insolente. Nada, no entanto, que ultrapasse os limites do razoável. Mas, afinal, todos o somos assim. Eu não sou diferente de ninguém. Sei, inobstante, ponderar e decidir com sensatez.[…]”

Juiz José Luiz Oliveira de Almeida

Titular da 7ª Vara Criminal da Comarca de São Luis, Estado do Maranhão


Cuida-se de sentença condenatória da qual antecipo os excertos abaixo, verbis:

01. O acusado, pode-se ver do conjunto probatório, não foi compelido a praticar o crime, como tentou fazer crer, ao dizer que se surpreendeu com a ação de T. H. C. da S., quando este entrou no coletivo e anunciou o assalto.

02. O acusado, é de rigor que se diga, gozava de plena capacidade mental, razão pela qual posso afirmar que tinha inteira capacidade de entender o caráter criminoso do fato que praticara, bem assim das consequencias dele decorrentes.

03. O Estado não pode, diante dessas questões, deixar de cumprir o seu desiderato; aquele que comete um crime, como o fez o acusado, deve, sim, ser punido – e exemplarmente, em face dos efeitos didáticos que uma punição irradia.


A seguir, a sentença, por inteiro:


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PODER JUDICIÁRIO

FORUM DA COMARCA DE SÃO LUIS

JUIZO DA 7ª VARA CRIMINAL

SÃO LUIS-MARANHÃO

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Acesse meu site – www.joseluizalmeida.com – e saiba o que penso e como decido.

Processo nº 120092009

Ação Penal Pública

Acusado: A.

Vítima: Expresso 1001 e outro

Ser e parecer, eis a questão

“[…] Quando se quer dizer que determinado juiz não trabalha, diz-se que ele só permanece na comarca às terças, quartas e quintas-feiras. São os chamados, jocosamente, juízes TQQ.

Na capital, quando se deseja atestar a falta de operosidade de um magistrado, diz-se, desdenhosamente, que ele não conhece os funcionários das secretarias que dão expediente no período da tarde.

Numa e noutra hipótese, o que se pretende dizer mesmo é que, para ser produtivo, o magistrado deveria fixar residência na sua comarca, no caso dos juízes das comarcas do interior, e se dirigir ao Fórum, pela manhã e à tarde, no caso dos juízes da capital.

Numa e noutra hipótese, há, não se pode negar, um grave erro de interpretação.

Na minha avaliação, fruto dos quase trinta anos de atividades judicantes, o fato de o magistrado só estar na comarca às terças, quartas e quintas-feiras não quer dizer que seja, necessariamente, um indolente; da mesma forma, o fato de o magistrado não ir ao Fórum no período vespertino, não demonstra, inequivocamente, ser improdutivo.

O juiz pode, com efeito, passar pouco tempo na comarca e produzir muito, como pode, noutro giro, nela fixar residência e nada produzir.

Da mesma forma, o magistrado pode se deslocar ao Fórum todos os dias, pela manhã e pela tarde, e pouco produzir, como pode, permanecendo em casa, produzir muito.

Compreendo, todavia, pelo sim e pelo não, que o correto mesmo é o magistrado morar na comarca e ir ao Fórum, se possível, todos os dias, pela manhã e pela tarde.

É recomendável, ademais, que a Corregedoria acompanhe, com rigor, a produtividade dos juízes, bem assim o tempo em que permanecem nas comarcas, para efeito de ascensão profissional.

É que, na minha avaliação, não basta ao juiz trabalhar; é preciso transparecer, também, que trabalha.

A presença do magistrado na comarca, full time, e no Fórum, também em tempo integral, deixa transparecer que ele, efetivamente, trabalha.

O ideal, pois, na minha avaliação, é que o juiz fixe residência na comarca – e ali desenvolva as suas atividades a contento.

O correto mesmo, nessa linha de argumentação, é que o juiz se desloque para o seu local de trabalho, pela manhã e pela tarde – e que produza […]”

Vistos, etc.

Cuida-se de ação penal que move o Ministério Público contra A, devidamente qualificado na inicial, por incidência comportamental no artigo 157,, §2º. I e II, e artigo 299, ambos do Código de Penal, de cuja denúncia destaco o excerto abaixo, litteris:

A peça pré-processual, iniciada por auto de prisão em flagrante delito, noticia a prática dos ilícitos previstos nos artigos 157,§2º, I e II, e 299, ambos do CPB, perpetrados pelo indiciado anteriormente qualificado, sendo o assalto, em concurso com o menor T. H. da S., na data de 24/04/2009, por volta das 11h20horas, em desfavor da empresa de ônibus 1001, quando roubaram a renda do veículo daquela empresa, que faz a linha do bairro da Vila Itamar, nesta cidade.(Sic)

Mais adiante, verbis:

Consta nos autos que o coletivo era conduzido pelo motorista, N. B. de M. (ouvido às fls. 05) o qual esclareceu que ao fazer a parada, na Av. Principal do aludido bairro, em frente a uma igreja católica, foram surpreendidos, ele e a cobradora, B. de F. C. V. ( ouvida às fls. 41/42), com a entrada de dois elementos, estando um deles de arma branca em punho, tendo ambos anunciado o assalto e, renderam cada um dos meliantes a cobradora e o motorista (Sic)

A persecução criminal teve início com o auto de prisão em flagrante (fls.07/12).

Auto de apresentação e apreensão às fls. 20.

Termo de entrega às fls. 22.

Recebimento da denúncia às fls. 59/63.

Defesa preliminar às fls. 74/77.

Durante a instrução foram ouvidas as testemunhas B. de F. C. V. (fls.92),K. G. V. M. 9fls.93), N. B. de M. (fls.104), J. M. P. (fls.105/106), F. P. de C. (fls.107), U. S. P. (fls.108) e S. C. F. (fls.109).

O acusado foi qualificado e interrogado às fls. 110/111.

As partes não requereram diligências.

O Ministério Público, em memoriais, pediu a condenação do acusado, nos termos da denúncia(fls.114/117).

A defesa, de seu lado, pediu a absolvição do acusado, por insuficiência de provas (fls.119/123)

Relatados. Decido.

01.00. O Ministério Público denunciou A., por incidência comportamental nos artigos 155, §§ 2º, I e II, e artigo 299, ambos do CP, em face de um assalto ocorrido no dia 24/04/2009, por volta das 11h20, em desfavor da Empresa 1001, contando com o concurso do menor T. H. C. da S..

02.00. As provas, em face da ação do acusado, foram produzidas em dois momentos distintos – sedes administrativa e judicial.

03.00. Na fase inaugural da persecução criminal o acusado se recusou a responder qualquer indagação da autoridade policial, reservando-se para falar em juízo (fls.12).

04.00. O adolescente infrator, T. H. C. da S., da mesma forma, se negou a prestar qualquer informação acerca do crime (fls.11).

05.00. O motorista do ônibus tomado de assalto, N. B. de M., também foi ouvido, tendo narrado o assalto em detalhes, ao tempo em que reconheceu o adolescente T. H. C. da S. como um dos autores (fls.10)

06.00. Na mesma senda foi o depoimento de B. de F. C. V., que, a seu tempo e modo, narrou o assalto em detalhes (fls.46/47).

07.00. Com esses dados, foi deflagrada a persecução criminal, no seu segundo momento, tendo o Ministério Público, como acima mencionado, denunciado A., por incidência comportamental nos artigos 157, §2º, I e II, e 299, caput, ambos do Digesto Penal.

08.00. Na fase judicial da persecução foi inquirida a ofendida B. de F. C. V., às fls. 92, de cujo depoimento ponho em relevo os seguintes excertos:

I – que, ao tempo do fato, estava trabalhando como cobradora, no ônibus da empresa 1001, cujo motorista era N. B. de M.;

II – que dois assaltantes entraram no coletivo, quando estava parado no ponto principal da Vila Itamar;

III – que um dos assaltantes se dirigiu ao motorista, armado de faca;

IV –que o outro assaltante se dirigiu à declarante;

V – que entregou a importância que trazia consigo ao assaltante; e

VI – que não sabe se o dinheiro foi recuperado

09.00. Em seguida foi ouvido o policial K. G. V. M., às fls. 93, que diligenciou e logrou prender o acusado, cumprindo destacar do seu depoimento os seguintes fragmentos:

I – que fizeram um cerco na residência onde provavelmente estariam os autores do fato;

II – que se recorda que uma pessoa que estava na residência, tentou fugir pelos fundos da casa;

III – que o acusado aqui presente foi detido na mencionada residência, amanhecendo o dia após a realização do assalto;

IV – que, na Delegacia, o acusado foi reconhecido pela cobradora e pelo motorista do ônibus tomado de assalto.

10.00. O motorista do coletivo tomado de assalto, N. B. de M., também foi inquirido, tendo confirmado a ocorrência do crime, o concurso de pessoas e o uso de faca (fls.104).

11.00. O depoimento mais relevante na identificação do acusado foi o de J. M. P. , donde apanho os seguintes excertos:

I – que não teve dificuldades em localizar o acusado, porque o mesmo age na área da Vila Itamar;

II – que, depois de preso o acusado, o motorista coletivo, amedrontado, recuou no reconhecimento do acusado;

III – que o motorista, antes de se defrontar com o acusado, o motorista disse que o reconhecia como um dos autores do assalto;

IV –que, depois, defronte do acusado, recuou;

V – que o motorista pediu, depois, que o depoente compreendesse as razões pelas quais deixou de apontar o acusado como autor do assalto, tendo em vista que, na condição de motorista de coletivo, ficava muito exposto.

12.00. A demais testemunhas – F. P. de C. (fls.107), U. S. P. (fls.108) e S. C. F. (fls.109) – nada souberam informar acerca do crime.

14.00. O acusado foi interrogado, tendo, na oportunidade, confessado a sua participação no assalto, muito embora aponte o adolescente T. H. C. da S. como autor intelectual do crime.

15.00. Do depoimento do acusado, às fls.110/111, destaco os seguintes fragmentos:

I – que participou do assalto narrado na denúncia, idealizado pelo adolescente T.;

II – que, no dia do fato, ao entrarem no coletivo,T., surpreendo o interrogado, sacou de uma faca e anunciou o assalto;

III – que foi o próprio interrogado que pegou o dinheiro junto à cobradora;

IV – que não estava armado;

V – que T., ao entrar no coletivo, determinou que o interrogado pegasse o dinheiro da cobradora.

16.00. Estas, as provas produzidas nas duas sedes.

17.00. Depois do detido exame das provas amealhadas, impende afirmar, sem enleio, que o acusado, com sua ação, malferiu, sim, o preceito primário do artigo 157 do CP, pois que subtraiu para si coisa alheia móvel, mediante ameaça, exercida com o emprego de arma branca.

18.00. O crime, pode-se ver, restou, ademais, consumado – a res furtiva não foi reincorporada ao patrimônio da empresa 1001 – e duplamente qualificado – pelo concurso de pessoas e pelo emprego de arma.

19.00. O acusado, bem se viu quando da análise das provas, praticou o crime, contando com o concurso do adolescente T. H. C. da S., que estava com arma branca, com a qual impossibilitou qualquer reação do motorista do coletivo e, por via reflexa, da cobradora B. de F. C. V..

20.00. O acusado, em sede extrajudicial, invocou o seu direito ao silêncio, para, depois, em sede judicial, decidir-se pela confissão do crime, imputando a autoria intelectual ao adolescente T. H. C. da S., dado irrelevante, à luz do que prescreve o artigo 29 do Codex Penal.

21.00. O acusado, agora, em face de sua ação, deverá receber do Estado a necessária contraprestação, traduzida em penas – privativa de liberdade e multa -, como resposta oficial, em face do crime que praticou.

22.00. O acusado, pode-se ver do conjunto probatório, não foi compelido a praticar o crime, como tentou fazer crer, ao dizer que se surpreendeu com a ação de T. H. C. da S., quando este entrou no coletivo e anunciou o assalto.

23.00. O acusado, é de rigor que se diga, gozava de plena capacidade mental, razão pela qual posso afirmar que tinha inteira capacidade de entender o caráter criminoso do fato que praticara, bem assim das consequencias dele decorrentes.

24.00. O Estado não pode, diante dessas questões, deixar de cumprir o seu desiderato; aquele que comete um crime, como o fez o acusado, deve, sim, ser punido – e exemplarmente, em face dos efeitos didáticos que uma punição irradia.

25.00. O crime, disse-o acima, restou consumado, vez que a res furtiva ( pecúnia) foi subtraída e não foi reincorporada ao patrimônio da ofendida.

26.00. As testemunhas que depuseram nas duas fases da persecução foram unânimes em noticiar a prática do crime, cuja autoria, já no primeiro momento, foi direcionada ao acusado, tanto que foi preso em flagrante.

27.00. A autoria do crime, convém reafirmar, restou provada, definitivamente, em face da confissão do acusado, conquanto tenha ele tergiversado, atribuindo a autoria intelectual do crime ao menor T. H. C. da S., mas admitindo ter praticado, também, atos de execução.

28.00. No que se refere ao crime de falsidade ideológica, entendo que o acusado, ao fornecer a idade errada, o fez no exercício de um direito constitucional.

28.01. É que, para mim, o acusado mentiu para se defender das ações dos órgãos persecutórios, razão pela qual não vislumbro o crime de falsidade ideológica, ao afirmar que era adolescente.

29.00. Nesse sentido a decisão segundo a qual

Aquele que, acusado de um crime, mente para se defender, não comete crime de falsidade ideológica. Nemo tenetur se detegere.(RT 494/314)

30.00. Não se pode deslembrar, ademais, que o acusado, em sede administrativa, apresentou a sua Carteira de Identidade (cf. fls.30), da qual consta a sua data de nascimento, disso inferindo-se que, de rigor, aqui se está a cuidar mesmo é de crime impossível.

31.00. Tudo de essencial posto e analisado, julgo procedente a denúncia, parcialmente, para, consequentemente,

condenar A., brasileiro, solteiro, estudante, filho de A. e M., residente e domiciliado na XXXX, Vila Itamar, nesta cidade, cujas penas-base fixo em 04(quatro) anos de reclusão e 10(dez)DM, à razão de 1/30 do SM vigente à época do fato, sobre as quais faço incidir mais 1/3, em face das causas de aumento de penas previstas no§2º, I e II, do artigo 157 do CP, totalizando, definitivamente, 05(cinco) anos e 04(quatro) meses de reclusão e 13(treze)DM, devendo a pena privativa de liberdade ser cumprida, inicialmente, em regime semi-aberto, ex vi legis.

32.00 Anoto que deixei de considerar a confissão do acusado como circunstância atenuante, tendo em vista que as penas básicas foram fixadas no mínimo legal.

33.00. O acusado foi preso em flagrante e preso permaneceu durante toda instrução.

34.00. O acusado, a meu sentir, deve ser mantido preso, agora que a ação penal foi julgada procedente.

35.00. No exame dessas questões o magistrado, tenho essa compreensão, nunca pode se descurar do interesse público, que, como sói ocorrer, deve sobrepor-se aos interesses individuais.

36.00. Vivemos momentos difíceis, com assaltantes infernizando a vida em sociedade.

37.00. Não se pode, pois, diante de casos desse matiz, agir com frouxidão.

37.01. É de rigor, pois, que o magistrado, diante de casos desse matiz, aja com sofreguidão, pois que a sociedade, as pessoas de bem, enfim, não podem ficar à mercê das ações marginais de quem não tem compromisso com a ordem pública.

38.00. O acusado, bem se viu, foi denunciado – e agora condenado – por crime de especial gravidade, razão pela qual, também por isso, deve ser mantido preso, pois que demonstrou, com sua ação, ser perigoso.

39.00. O acusado, viu-se acima, de posse de arma branca, praticou o assalto com o seu comparsa, utilizando tal instrumento para intimidar, para ameaçar – para agir, enfim, se necessário.

40.00. Por tudo o que acima expus, mantenho a prisão do acusado, para que, nessa situação, aguarde o julgamento de eventual recurso tomado desta decisão.

41.00. Recomende-se o acusado na prisão em que se encontra.

Sem custas

Com o trânsito em julgado desta decisão, lancem-se os nomes dos réus no rol dos culpados.

Após, expedir Carta de Sentença.

Arquivem-se os autos, finalmente.

São Luis, 19 de agosto de 2009.

Juiz José Luiz Oliveira de Almeida

Titular da 7ª Vara Criminal


Artigo publicado no blog www.joseluizalmeida.com

Autor: Jose Luiz Oliveira de Almeida

José Luiz Oliveira de Almeida é membro do Tribunal de Justiça do Estado do Maranhão. Foi promotor de justiça, advogado, professor de Direito Penal e Direito Processual Penal da Escola da Magistratura do Estado do Maranhão (ESMAM) e da Universidade Federal do Maranhão (UFMA).

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