Leia e tira as suas conclusões

por CHICO VIANA
Estava procurando por números que me informassem quantas pessoas morrem sem assistência médica no Estado, ainda sob o impacto de uma visita que fiz ao Socorrão I, com pacientes disputando a palmo, um local para se acomodar, enquanto profissionais iam e vinham, num desgastante esforço de suprir com suas forças, deficiências que se acumularam durante décadas, graças à imprevidência e a irresponsabilidade de gestores que colocaram a saúde sempre sem segundo plano.
Levou-me a isso, a constatação de que cada dez pacientes inquiridos, dos instalados nos corredores, seis provinham do interior do Estado, ali contados na ponta dos dedos e sem intermediação.
E deduzi, e tive a curiosidade de documentar, quais nesta cruel roleta, não eram contemplados, e não tinham condições de vir para a cidade de São Luis e morriam por lá mesmo, (a morte sem assistência médica), ou quantos só conseguiam alguma assistência em fase terminal, onde nem mesmo o médico sabia de que o paciente havia falecido, (morte de causa não sabida). Uma dolorosa rotina para adquirir o atestado de óbito.
Enfim, desejava dados sobre quantos atravessavam o rubicão e quantos eram levados por suas águas traiçoeiras e implacáveis, já que todos somos bombardeados com uma propaganda que ultrapassa o cinismo de Goebbels, anunciando hospitais que nunca foram construídos e serviços que só existem nos registros do DATASUS que nos informa dados de 2010, que dispomos: 84 hospitais municipais com serviço de internação, 126 estabelecimentos municipais e 21 estaduais com atendimento de urgência.
Os dados são de um trabalho realizado na Faculdade de Saúde Pública da Universidade de São Paulo, São Paulo, SP (CAUSAS MAL DEFINIDAS DE MORTE E ÓBITOS SEM ASSISTÊNCIA- http://www.scielo.br/pdf/ramb/v54n1/16.pdf)  e coloca o Maranhão em primeiro lugar em mortes sem assistência médica mais uma vez ascendemos ao pódio da vergonha nacional.
O estudo levou em conta que 7,1% dos óbitos sem assistência médica ocorridos no Brasil naquele ano, 2003, e conclui que o Maranhão foi responsável por 32,6 % deles, superando com folga o Piauí (17,7%), o Ceará (11,8%), Pernambuco (14,5%), Sergipe (15,5%), Rio Grande do Norte (20,6%), Paraíba (26,2%), Bahia (18,9%), e, finalmente, superando aquele que sempre porfia pela maior miséria no Brasil, Alagoas (19,1%) quase a metade.
Levadas em consideração dados das mortes sem causa definida, aquelas sequer houve tempo de diagnosticar o mal, correspondendo a 13,3 % de todos os óbitos do Brasil, o Maranhão continua no pódio disparado com 37,4%. Alagoas, nossa companheira história de malversações e incompetência, terra do Collor, fica ali pertinho, com 27,2%. O sempre menosprezado Piauí (26,2%).
Concluindo, das 24,1% das mortes registradas nos 27 Estados de todo o Brasil, o Maranhão é campeão em mortes sem assistência médica e sem causa definida, responde por 70% delas, isso quando o Piauí ainda nos socorria, imagine agora.
Só para ficar bem claro, dos 27 estados da federação, onde são registradas 24,1% de mortes sem assistência médica ou morte por causa não sabida, o Maranhão colabora com 70%. Uma vergonha a escancarar de vez o nosso descarnado ventre apodrecido.
O que eu vi no Socorrão I foi, ao mesmo tempo, degradante e exemplar. O hall da entrada, onde ficava o gabinete da Diretoria, tem pacientes, pacientes em todo lugar e de todos os cantos do Estado, depois que fomos enxotados do Piauí.
O exemplar foi a dedicação dos que lá trabalham. Uma dedicação, um esforço e uma solidariedade digna do mais rigoroso dos sacerdócios.
Ante o que vi eu acuso! Acuso o Ministério Público e todos os que, por leniência, ação, omissão, interesse, dolo ou mera crueldade mesmo, em nada contribuem para que o problema seja solucionado. Pelo contrário, aceitam procrastinações, colocam pedras, embargam obras, lançam mão de tudo para que o povo continuem sofrendo. E se dizem humanos.
Acuso o Governo do Estado que, numa situação dramática como esta, placidamente paralisa Unidades de Saúde importantes como o Hospital do IPEM, e hospitais únicos, como o Getúlio Vargas para aidéticos e tuberculosos, e até agora não apresentou nenhum nosocômio das dezenas que diz ter construído funcionando, ao menos, para assumir parte desta incontrolável demanda.
Acuso os representantes do povo, pelo silêncio conivente e omisso do desmantelamento da rede de assistência médica do Estado. Muitos torcem pelo pior, exultam quando o adversário se enreda em problemas. Incapazes de apresentar qualquer alternativa viável, não somam, não defendem. Torcem pelo caos, mesmo que isso custe vidas.
Acuso prefeitos desonestos, criminosos hediondos, que patrocinam a desgraça de seus munícipes, desviando os recursos da assistência médica, o SUS, a verba mais aviltada nos últimos anos, pela facilidade e impunidades garantidas.
Acuso, por fim e em meu desespero, até a Sociedade Protetora dos Animais que, poderia muito bem argüirna justiça que homem também é bicho e, como tal, deve ser tratado com humanidade e, em última instância, ter uma morte digna.

* Chico Viana é médico, jornalista e vereador de São Luís pelo PSDB

Autor: Jose Luiz Oliveira de Almeida

José Luiz Oliveira de Almeida é membro do Tribunal de Justiça do Estado do Maranhão. Foi promotor de justiça, advogado, professor de Direito Penal e Direito Processual Penal da Escola da Magistratura do Estado do Maranhão (ESMAM) e da Universidade Federal do Maranhão (UFMA).

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