Onde estou residindo?

Os principais blogs e os grandes jornais  da cidade repercutem a minha decisão de não votar – para promoção ou remoção, por merecimento ou antiguidade – em magistrados que não fixem residências no local de trabalho.

O que é mais curioso é que, de repente, o errado sou eu.

É como se fosse eu quem tivesse elaborado a nossa Carta Política, onde está consignado que os magistrados devem morar nas comarcas.

A propósito do tema em comento, é preciso fazer uma ressalva: eu não mando nas agendas de audiências dos juízes.

Digo mais: não sou algoz de juiz.

Todavia, eu tenho o direito de não votar em quem não comprovar que tem residência na comarca. Simples assim.

Eu acho, até, que, se, ao invés de me criticarem por essa decisão, os meus pares cerassem fileiras em torno da questão, nós daríamos uma enorme contribuição à sociedade.

E não adianta esse história de que juiz traz processos para despachar em São Luis, pois o que é relevante -também –  para os jurisdicionados é a presença física do juiz na comarca, para resolver as demandas de urgência.

E não adiante argumentar que existe juiz de plantão na região. Isso também não supre a presença física de um juiz na comarca, pelo que ela tem de mais relevante e simbólica.

A guisa de exemplo da importância do juiz na comarca, imagine a seguinte situação. Um jurisdicionado, numa sexta-feira,  com o filho gravemente enfermo,  precisando de atendimento de emergência, não consegue internar o filho no único hospital da cidade, porque esse se recusou a aceitar o plano de saúde. O  pai, desesperado, procura um advogado, na esperança de alcançar uma medida judicial cautelar que lhe permita internar o filho. Do advogado, no entanto, recebe a informação de que somente na terça-feira será possível conseguir a medida de urgência, porque o juiz não está na comarca, tendo dela se ausentasse  naquele dia, a ela só retornando na terça-feira subsequente.

E aí? O que fazer, nesse caso?

Imaginemos outra situação menos chocante. Um cidadão de bem se envolve numa briga e é preso, arbitrariamente, pela autoridade  policial, numa sexta-feira pela manhã. A família, desesperada, procura um advogado, dele recebendo a notícia de que na cidade não há juiz para examinar o habeas corpus, o que só poderá ser feito na terça-feira subsequente, quando ele retornar à comarca.

E aí? O que fazer, nesse caso?

Pense o quanto devem ser desesperadoras essas duas situações.

Fixei residência nas comarcas pelas quais passei e sei o quanto fui útil – também – nos finais de semana.

O certo e recerto é que quando se atenta contra os interesses de uma corporação nunca se é bem entendido.

Acho, até, que eu devo ser punido por ter tido  a ousadia de mexer com o que muitos consideram “imexível”.

Mas a minha fé e a minha obstinação permanecem inabaladas.

Como Sísifo, da mitologia grega, vou continuar conduzindo pedras morro acima, para, depois, vendo-a despencar, tentar outras tantas vezes carrega-las.

Eu tenho a esperança de que outros colegas me acompanhem nessa cruzada, além, claro, do desembargador Marcelo Carvalho, o único a se solidarizar, publicamente,  com a minha posição em torno desse tema.

Autor: Jose Luiz Oliveira de Almeida

José Luiz Oliveira de Almeida é membro do Tribunal de Justiça do Estado do Maranhão. Foi promotor de justiça, advogado, professor de Direito Penal e Direito Processual Penal da Escola da Magistratura do Estado do Maranhão (ESMAM) e da Universidade Federal do Maranhão (UFMA).

2 comentários em “Onde estou residindo?”

  1. Desembargador José Luiz,

    É com alegria, esperança e fé na vida que ainda existe pessoas como o senhor…..Tenho fé que com magistrados como você, um dia o judiciário maranhense irá para frente. Parabéns por esta louvável atitude e tenha certeza que se o senhor não tiver o apoio de seus pares no tribunal, com certeza terá o apoio de toda a sociedade maranhense que lhe aplaude pelo excelente servidor público que o senhor demonstra ser.
    PS. Sou servidora dessa Egrégia Corte e acompanho o seu belo trabalho. Mais uma vez parabéns!!!!

  2. O senhor deveria publicar os comentários que venho reiteradamente posatando no seu blog. A dvirtido-lhe, doutor, que se vc não fizer publicar esse texto, eu infelizmente, até para preservar minha liberdade de expressão, serei forçado a relatar esse fato aos outros blogs da cidade.

    Dito isso, passo ao meu comentário.
    Exigir que juiz more na comarca não é atribuição sua, e sim da Constituição, sua “chefe”. Então, AO DETERMINAR QUE JUIZ RESIDA NA COMARACA o senhor nada mais faz que cumprir A CARTA MAGNA.

    Daí para impedir que juiz more em hotel, albergue, pensão, flat ou o que seja o senhor ultrapassou o que diz a lei, e agiu de modo ilógico até. Pq não há proibição, óbice ou limitação no sistema jurídico pátrio que impeça o juiz ou qualquer outra pessoa de morar em hotel, albergue, pensão, ou congeneres.

    E obrigar juiz a fazer audiência em dia X ou Y?? Bem, tal determinação foi motivo de “chacota” no CNJ, tamanha a falta de sensatez e lógica disso…sem comentários!!

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