Encarcerado brasileiro, comemorai!

As revistas semanais repercutem as declarações do Ministro da Justiça, a propósito das prisões brasileiras. Só para ilustrar, lembro que o petista José Eduardo Cardoso, numa palestra a empresários, disse que preferia morrer a cumprir pena em certos presídios do Brasil.

A manifestação do ministro não proveio do nada; ela decorre, todos concluímos, em face da condenação de três renomados petistas ,ante a iminência de sua prisão.

O ministro Gilmar Mendes, repercutindo no STF as declarações do ministro da Justiça, foi incisivo: ” Eu também louvo as palavras do ministro da Justiça, preocupado agora com o sistema prisional. Eu só lamento que ele tenha falado isso agora”.

Todos lamentamos, ministro Gilmar Mendes. A verdade é que, não fora pelos petistas agora condenados, nenhuma palavra seria ouvida por um alto prócer da República a condenar aquilo que todos estamos cansados de saber, ou seja, que as prisões brasileiras não reeducam, são uma fábrica de reincidência e que os encarcerados tendem a voltar pior do que quando nelas entraram.

Condenações, quando  são exemplares e emblemáticas, como as que fazemos referência aqui, têm sempre um viés positivo. Nesse sentido, a sociedade brasileira em geral, e os encarcerados, em particular, podem comemorar, pois, depois das prisões dos petistas,  o cárcere brasileiro nunca mais será o mesmo, ou, pelo menos, será, a partir do evento, objeto de análise e preocupação; preocupação que sempre foi de uma minoria voluntariosa,  sem maiores consequências práticas, entretanto.

A verdade é que, depois da prisão dos chamados “mensaleiros”, as prisões brasileiras jamais serão as mesmas; pelo menos, serão repensadas,  o que já é um bom começo

O que se espera, agora, com a inevitável exposição das condições carcerárias do Brasil, é as autoridades da República se mobilizem para que milhares e milhares de encarcerados brasileiros recebam tratamento digno, sabido que a dignidade da pessoa humana, antes de ser um patrimônio pessoal, é um patrimônio social.

Kant dizia que as coisas têm preço e que os homens têm dignidade. Se é consabido que os homens têm dignidade, pelo menos formalmente, não é menos verdade que os nossos encarcerados são tratados pelo Estado como sub-raça, como gente da espécie que não merece do Estado nenhum tipo de consideração e respeito.

O ser humano tem uma dignidade que lhe é inerente e incondicional, bastando para o seu reconhecimento que seja humano. No Brasil, no entanto, uns são mais dignos que outros,  daí a discrepância de tratamento que se dá aos encarcerados, egressos,  na quase totalidade, das classes menos favorecidas. É como se o pobre, por ser pobre, não tivesse dignidade e merecesse, por isso, o desprezo do Estado.

Como lembra o eminente constitucionalista José Afonso da Silva, a dignidade da pessoa humana não é uma criação constitucional, pois ela é um desses conceitos a priori, um dado preexistente  a toda experiência especulativa, tal como a própria pessoa humana ( in A Dignidade da Pessoa Humana Como Valor Supremo da Democracia, Revista de Direito Administrativo, V. 212, p.84-94, abril/junho, 1998)

A dignidade, digo eu, não pode ser renunciada e nem negociada em favor do Estado.

Digo mais: o ser humano não precisa(ria), em nenhuma circunstância, defender a sua dignidade sabido que  é um atributo que lhe é inerente dada a sua própria condição de ser humano.

No Brasil, infelizmente, tem-se que lembrar, todos os dias, que o encarcerado tem dignidade e que a sua dignidade deveria ser respeita pelo Estado.

Agora, com a prisão dos mensaleiros, os nossos homens públicos decerto se lembrarão que os demais encarcerados também têm dignidade e que ela deveria ser respeitada, independentemente de sua classe social.

Os nossos homens públicos, assim espero, também serão instados a lembrar que a dignidade da pessoa humana é valor-guia  a irradiar os seus efeitos na direção de todos, pobres ou ricos, brancos ou  negros, bonitos  ou feios.

Autor: Jose Luiz Oliveira de Almeida

José Luiz Oliveira de Almeida é membro do Tribunal de Justiça do Estado do Maranhão. Foi promotor de justiça, advogado, professor de Direito Penal e Direito Processual Penal da Escola da Magistratura do Estado do Maranhão (ESMAM) e da Universidade Federal do Maranhão (UFMA).

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