Eugenio Raúl Zaffaroni com a palavra

ConJur — Há uma tendência de o Judiciário aplicar o chamado Direito Penal do inimigo?

Zaffaroni — Estamos vivendo um momento muito especial. Hoje, não é fácil pegar um grupo qualquer para estigmatizá-lo, mas há um grupo que sempre pode virar o bode expiatório. É o grupo dos delinqüentes comuns.  É um candidato a inimigo residual que surge quando não há outro inimigo melhor. Houve uma época em que bruxas podiam ser acusadas de tudo, das perdas das colheitas à impotência dos maridos. O que se pode imputar aos delinqüentes comuns é limitado, por isso é um candidato a bode expiatório residual. Nos últimos decênios, com a política republicana dos Estados Unidos, os delinqüentes comuns se tornaram o mais recente bode expiatório.

ConJur — Qual o resultado dessa escolha do inimigo?

Zaffaroni — Cria-se uma paranoia social, e estimula-se uma vingança que não tem proporção com o que acontece na realidade da sociedade. Através da história, tivemos muitos inimigos: hereges, pessoas com sífilis, prostitutas, alcoólatras, dependentes químicos, indígenas, negros, judeus, religiosos, ateus. Agora, são os delinqüentes comuns, porque não temos outro grupo que seja um bom candidato. Esse fenômeno decorre do fato de os políticos estarem presos à mídia. Seja por oportunismo ou por medo, eles adotam o discurso único da mídia que é o da vingança, sem perceber que isso enfraquece o próprio poder.

Reflita sobre essas palavras.

Autor: Jose Luiz Oliveira de Almeida

José Luiz Oliveira de Almeida é membro do Tribunal de Justiça do Estado do Maranhão. Foi promotor de justiça, advogado, professor de Direito Penal e Direito Processual Penal da Escola da Magistratura do Estado do Maranhão (ESMAM) e da Universidade Federal do Maranhão (UFMA).

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