CNJ em ação

Liminar proíbe mediação e conciliação em cartórios de SP

Por Gabriel Mandel

Uma liminar suspendeu a autorização aos cartórios de São Paulo para que promovam mediação e conciliação extrajudiciais. A liminar foi concedida pela conselheira Gisela Gondin Ramos, do Conselho Nacional de Justiça, durante análise de requerimento solicitado pelo Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil. Ela suspendeu o Provimento 17 da Corregedoria-Geral de Justiça do Tribunal da Justiça de São Paulo, que data de 5 de junho e previa o início das práticas em setembro, até a análise final do caso pelo CNJ.

Em sua decisão, a conselheira afirma que “o ato da Corregedoria Geral de Justiça de São Paulo parece extrapolar o âmbito regulamentar que lhe é próprio, imiscuindo-se em matéria de competência exclusiva da União”. Para Gisela Gondin Ramos, a questão vai de encontro ao princípio da legalidade administrativa, que é previsto pelo artigo 37 da Constituição.

Ela recorda que as atribuições de ofícios extrajudiciais foram determinadas pelo Decreto-Lei Complementar 3, de 27 de agosto de 1969. A análise do decreto-lei, continua, comprova que a autorização para prática de mediação e conciliação “é estranha às funções legalmente atribuídas a tais agentes”.

Gisela Gondin Ramos destaca que trata-se “de proteção da esfera de liberdade própria dos indivíduos”. O Provimento 17, segundo ela, invadiu a esfera de regulamentação reservada à lei, contrariando o artigo 236, parágrafo 1º, da Constituição. Se tem competência para fiscalizar, orientar, disciplinar e aprimorar os serviços notariais e registrais, a CGJ não pode estabelecer atividades próprias das serventias.

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Boa iniciativa

TJPI emprega mais de 20 apenados

26/08/2013 – 09h00
TJPI

TJPI emprega mais de 20 apenados

“Todos têm o direito de se reintegrar e mostrar que o erro ficou no passado”. Essa é a opinião  de I.K.M.S., egressa do sistema carcerário da justiça piauiense, que há um mês recebeu a chance de voltar a trabalhar. Ela e outros vinte e cinco apenados prestam serviços nas áreas de limpeza e construção civil do Tribunal de Justiça do Estado do Piauí (TJPI), parceiro do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) no “Projeto Começar de Novo”, voltado à reinserção social com oportunidades de capacitação profissional e de trabalho para detentos, egressos, cumpridores de penas alternativas e adolescentes em conflito com a lei.

Depois de ter sido demitida de uma padaria e de uma churrascaria, por causa do seu antecedente criminal (condenação por tráfico de drogas), I.K.M.S. disse que  está  agradecida pela oportunidade de participar do projeto que mudou a sua vida. Com 40 anos de idade, ela é mãe de três filhos. Dois deles trabalham e são estudantes universitários, cursam Direito e Serviço Social, e a filha mais nova, de três anos e cinco meses, nasceu na prisão. A criança chegou a ser levada para um abrigo, mas recentemente voltou ao convívio familiar.

A egressa afirmou que a ambição e o interesse em ter vida fácil fizeram com que ela passasse por toda essa situação, gerada também pelas dificuldades surgidas com a separação do marido. “Bati em muitas portas, mas fui resgatada por este projeto”, lembrou. Apesar de tudo, ela salienta que a experiência ruim, ao contrário do que muitos poderiam imaginar, foi positiva. “Mudei meus conceitos e valores. Foi um despertar, e o meio, graças à Deus, não me influenciou”.

I.K.M.S.  disse que está aproveitando a oportunidade e tem se sentido cada vez mais reintegrada na sociedade. “Agora, eu tenho um referencial e, para mim, não é humilhante varrer o estacionamento do TJ, por exemplo”, ressaltou. “É necessário batalhar para conseguir tudo e acho que estou no caminho certo”, completou. O próximo passo, afirmou, é  fazer um curso de segurança do trabalho. “Essa área está se expandindo aqui no Piauí”, contou.

“Hoje eu sou uma mulher livre. Paguei tudo o que eu devia para a Justiça e para a sociedade”, comemorou, ao avaliar que a chance existe para todos, mas a iniciativa é de cada um. “Não percam a dignidade”, recomendou aos que vivem a mesma situação que ela enfrentou.

Para o coordenador nacional do programa “Começar de Novo”, juiz auxiliar da Presidência do CNJ Luciano Losekann, o programa de contratação de egressos pelo TJPI é essencial para toda a população. “Sem ele, dificilmente se consegue a integração ou reintegração social do preso”, avaliou Losekann. Segundo ele, a participação da sociedade e dos seus setores, seja pelo poder público ou pela iniciativa privada, é imprescindível para a realização do projeto.

Reinserção – A Lei piauiense nº 6.344, de 12 de março de 2013, estabelece que 5% das vagas em contratos e editais de obras e serviços firmados pela administração pública devem ser destinadas a egressos do sistema carcerário. “Essa é uma forma de combater a reincidência e contribuir para a reinserção dos apenados na sociedade, reduzindo a violência e a criminalidade”, disse José Vidal de Freitas, juiz titular da 2ª Vara Criminal de Teresina (PI), a quem compete as execuções penais na comarca da capital. Ele lembrou que desde 2009, quando teve início o Projeto Começar de Novo, 21 apenados que cumprem pena em regime semiaberto foram contratados, voluntariamente, por cinco empresas que prestam serviços ao Tribunal, na área da construção civil, com base em um acordo de cooperação firmado com o sindicato dos proprietários de empresas.

O titular da 2ª Vara Criminal salientou que os contratos com os presos são realizados por tempo indeterminado e com todos os direitos trabalhistas previstos pela Consolidação das Leis do Trabalho (CLT). Segundo  ele, o Projeto Começar de Novo apresenta muitas vantagens, uma delas é que o egresso não precisa apresentar a certidão negativa para começar a trabalhar, exigência que sempre dificulta o retorno ao mercado de trabalho.

“A partir desse programa, há uma soma de iniciativas positivas, o que é excelente para a sociedade”, avaliou o juiz. Ele informou que o Tribunal de Justiça do Piauí tem a intenção de ampliar a lei estadual envolvendo no projeto não apenas egressos, mas também aqueles que ainda estão cumprindo pena. “É preciso acabar com o preconceito”, concluiu.

Edilene Cordeiro
Agência CNJ de Notícias

 

Como enfrentar os mascarados

Black BlocksVamos refletir em face de duas situações hipotéticas.

Primeira situação hipotética. A polícia de segurança, pelo seu serviço de inteligência, colhe a informação de que 10 (dez) homens, armados e com antecedentes criminais em face de crimes contra o patrimônio, estão reunidos, num determinado local da cidade, objetivando assaltar uma agência bancária.

 O que deve fazer a força de segurança diante dessa informação? Esperar que ocorra, pelo menos, atos que indiquem princípio de execução, para, só depois, (re)agir? Ou, como o bom senso recomenda, deve intervir para prevenir a prática do crime, em face mesmo das consequências de uma ação desse porte?

Segunda situação hipotética. Numa manifestação pública, vê-se, à frente de milhares de pessoas, 10 homens mascarados,  a indicar, em face de outras manifestações, que atentarão contra o patrimônio público e privado.

O que deve fazer a força de segurança nesse caso? Esperar que pratiquem os primeiros atos de execução, para, só então reagir? Ou, ao reverso, devem, preventivamente, agir para evitar que o crime ocorra? Nesse caso, sem atos de execução, a polícia de segurança está autorizada a retirar as máscaras dos manifestantes?

Do meu ponto de observação, com a Constituição diante dos olhos, entendo que a polícia de segurança deve intervir, nas duas hipóteses, para prevenir a prática dos crimes, ainda que não tenha havido atos de execução, ainda que não tenham os autores  saído do mundo da cogitação e ultrapassado os umbrais da preparação.

Nesse contexto, conquanto não se possa prendê-los pela prática dos crimes cogitados, pode – e deve – a polícia intervir para evitar que os crimes ocorram. É o mínimo que se espera da polícia de segurança.

Dessa ação, digamos, a priori, os meliantes não deverão ser presos em flagrante em face do crime de assalto e em razão da cogitada depredação aos patrimônios público e privados, que apenas cogitaram.

 Nas duas hipóteses, à luz das evidencias – não confundir evidencias com verdade – os meliantes cogitavam a prática de crimes, daí a legitimidade da ação preventiva, ainda que delas não resultem punições pelas transgressões que só cogitaram, sabido que, para a tipificação de crime, há que se praticar atos de execução, ainda que primários.

No caso específico das manifestações de rua, contextualizada a manifestação e assomando pelo menos indícios de que os mascarados objetivam atentar contra o patrimônio público e privado, em vista das ações antecedentes, devem, sim, ser compelidos a retirar as máscaras, para que sejam identificados, pois que as máscaras, nessa hipótese, são utilizadas como instrumentos para a prática de crimes, razão pela qual devem, inclusive, ser formalmente apreendidas, com a identificação do respectivo meliante.

 Não se pode, nesses casos, contemporizar, invocar franquias constitucionais como um biombo para esconder os rostos de quem viola a ordem publica, pois se é verdade que a intimidade das pessoas deve ser preservada, não é menos verdadeiro que esse direito, conflitando com o interesse público, deve ser circunstancial e eventualmente tangenciado.

Os argumentos no sentido preservação da identidade do autor em potencial de atos de vandalismo é uma agressão à lógica e ao bom senso. Se todas as vezes que se pratica um crime na clandestinidade um dos mais tenazes e difíceis  objetivos da persecução criminal é identificar o autor do fato, a conclusão óbvia é que, estando diante do autor das depredações ou de um potencial agressor, que se cuide logo de fazer a sua identificação, ainda que, para esse mister, se tenha que compelir que retirem as máscaras, sem que dessa atitude, desde o meu ponto de observação, se possa inferir  qualquer violação à Constituição, sabido, de mais a mais, que não há direito absoluto, nem mesmo os ditos fundamentais.

De bom tom que fique consignado que não estou pregando que se responda a uma ação criminosa com outra ação do mesmo jaez. Não! O que defendo é que, nesses casos, sempre à luz do contexto, havendo conflito entre dois princípios – direito à intimidade e preservação da ordem pública – , deve a polícia de segurança optar pelo que mais interessa à sociedade.

A polícia de segurança não pode, sob qualquer argumento, diante de um crime ou de uma potencial ação criminosa, sublimar o privado em detrimento do público.

Transigir com os mascarados, que, sob o manto do anonimato, depredam os patrimônios público e privado, a pretexto de preservar a sua intimidade, é flertar com a desordem. Aquele que comete crimes ou se prepara para praticá-lo, tem que compreender, por um raciocínio lógico, que, em face dos crimes cometidos ou cogitados, pode ter que suportar o sacrifício de algum direito.

É claro que haverá quem se contraponha a essas reflexões argumentando que nenhum acusado é obrigado a produzir provas contra si ou se auto-acusar (nemo tenetur se detegere), razão pela qual pecaria por excesso subtrair-lhe a máscara.

Aos que argumentarem nesse sentido, anoto que, na hipótese aqui ventilada, a máscara é, na minha avaliação,  é um instrumento, como outro qualquer,  utilizado ( ou ser utilizado) para a prática de crime e que, por isso, deve, inclusive, ser apreendida como prova material da ocorrência, na hipótese dela ter ocorrido, ou, simplesmente, numa atitude preventiva que, todos concordam, não deve transbordar as balizas legais, para não malferir direitos de um presumidamente inocente.

Para finalizar, convém indagar: se pode a polícia de segurança agir preventivamente em face da cogitação de um assalto, por que não pode fazê-lo ante as evidências de que os patrimônios públicos e privados, noutra vertente, podem ser depredados, também?

Nada mais simples; nada mais natural

Antes de iniciar o julgamento dos embargos de declaração em face do aórdão lavrado em face da AP 470, ouvi de alguns luminares do direito que os embargos em comento não tinham o poder de modificar as penas infligidas. Tão logo li essas afirmações, reuni a minha assessoria e com ela discuti a questão, já antecipando que a minha história de julgador havia me demonstrado, não raro, que os embargos de declaração, dependendo da omissão ou da contradição a ser reparada, poderiam sim proporcionar a mudança das penas fixadas no acórdão embargado. Tudo muito simples e muito óbvio. Ora, se deixo de considerar, na fundamentação, um aspecto relevante da tese defensiva e se, nos embargos, termino por reconhecer que deixei de examinar a questão importante (uma elementar do tipo, por exemplo) por ocasião do voto, é cedido que, ao fazê-lo agora, para suprir a omissão, devo, sim, reconhecer que tal ou qual crime não restou tipificado, razão pela qual deve ser expungido da condenação, com a consequente modificação do julgado anterior. Simples assim.

Pois bem, o próprio STF, agora, exatamente por ocasião dos embargos de declaração, que alguns ministros afirmaram não ter o poder de modificar o julgado, reconhece uma relevante contradição, para, nesse passo, modificar a pena de Ramon Hollerbach, sócio de Marcos Valério. Aliás, foi o próprio relator, Joaquim Barbosa, quem reconheceu a contradição; reconhecendo-a, como deve ser, modificou a resposta penal, pois, antes, ao invés da pena menor, consecutário lógico dos argumentos expendidos, havia fixado a pena maior. Resultado: os embargos foram providos e a pena modificada. Nada mais simples! Nada mais natural!

Então, por que insistiam em dizer que os embargos de declaração não tinham o condão de modificar as penas infligidas?

Com a palavra o decano do STF

celso-de-mello-e1344470185362Celso de Mello, em outro excerto do seu pronunciamento na abertura da sessão de ontem do STF, ponderou:

“Aquele que profere voto vencido não pode ser visto como espírito isolado nem como alma rebelde”

Mais adiante:

“Muitas vezes, como nos revela a própria história desta corte, é ele quem possui, ao externar posição divergente, o sentido mais elevado da ordem do direito e do sentimento de justiça.”

É isso.

Janio de Freitas

Do artigo de hoje, do jornalista Janio de Freitas, no jornal Folha de São Paulo, intitulado Lá como Cá,  apanho o seguinte excerto:

“Um tribunal que precisa relembrar a si mesmo o direito dos seus magistrados à divergência entre eles, a expô-la sem ter a palavra restringida, equivale, ressalvadas as proporções, a uma sugestão de que sejamos mais conformado com a desordem das ruas e com todas as incivilidades que marcam este país.”

É isso.

A lição do decano

celso-de-melloO ministro Celso de Mello exerceu, com a necessária moderação, a sua condição de decano, como, aliás, devem agir os decanos.

No início da sessão de ontem, com equilíbrio, desagravou o colega Lewandovisk e ensinou ao ministro Barbosa como se devem comportar os democratas.

Em determinado excerto do desagravo, o decano ensinou:

“Assim como ninguém tem o poder de cercear a livre manifestação dos ministros que integram o Supremo, também cada um dos juízes desta corte tem o direito de expressar, em clima de absoluta liberdade, as suas convicções em torno da resolução dos graves litígios que lhes são submetidos”

Celso de Mello, ministro do STF

Legislação judicial

Os operadores do direito sabem, prestigiam e aceitam com naturalidade a chamada legislação judicial. Por isso é mais que rotineiro nós, juízes, conferirmos à jurisprudência status de fonte imediata do direito.

Nessa perspectiva, é cada vez mais expressivo e farto os estudos sobre a normatividade das decisões judiciais, em diferentes partes do mundo. Por isso, a constatação. em todas as sessões de julgamento da quais participo, na condição de julgador, quanto naquelas que assisto apenas como espectador, é mais que comum a citação de precedentes, inúmeros precedentes, não raro ocorrendo de superarem, em muito, a melhor construção doutrinária.

Nesse cenário, é necessário que nós, julgadores, atentemos, com desvelo multiplicado, para as consequências das nossas decisões em face de demandas a serem manejadas, tendo por base os precedentes que introduzimos no mundo jurídico.

É claro que o magistrado não deve aplicar a lei quando a tenha em confronto com a Constituição, afinal toda decisão, a rigor, é decisão constitucional, já que, incidentalmente, não se pode decidir passando ao largo da Carta Política em vigor.

É claro, ademais, que a lei não encerra o direito. Mas é claro, também, que não se pode, pura e simplesmente, na condição de julgador, negar vigência às leis ou legislar em face de um caso concreto, a pretexto de fazer justiça.

Diferente é a situação em que se constata a inexistência de lei, hipótese em que o julgador tem o dever de formular uma regra de decisão, tarefa para a qual deve invocar dois argumentos fundamentais: que não pode se eximir de julgar a pretexto de haver lacuna e obscuridade na lei e de que, na omissão da lei, deve proceder como se fora legislador.

De qualquer sorte, o que importa ponderar é que, no caso específico do Brasil, o próprio Supremo Tribunal Federal  tem criado direito novo, mas o faz, ao que vislumbro, em face de conclusões que decorrem do próprio texto constitucional, como se deu, por exemplo, na decisão segundo a qual os mandatos pertencem aos partidos políticos, para ficar no exemplo de um julgamento emblemático para mudança dos maus costumes políticos do Brasil.

Nós, dos Tribunais inferiores, devemos seguir o exemplo do Supremo, sem nos arvorar de legisladores, salvo diante das hipóteses antes mencionadas, quando, então, estamos autorizados a criar a regra aplicável aos caso concreto, sem que disso resulte a usurpação das atribuições das Casas Legislativas.