Sentença condenatória – concurso de pessoas – concurso formal de crimes – reconhecimento de atenuante

“Na mesma linha de pensar grafo que ‘embora haja pluralidade de eventos, em seqüência, quando se apresentem fundidos como resultado de uma conduta material e subjetivamente única, configura-se um concurso ideal de infrações e não crime continuado’.
Vou adiante no raciocínio, ainda sob o mesmo tema, para dizer que “configura-se o concurso formal de crimes se o agente, mediante uma só ação, ainda que por vários, comete dois ou mais crimes, com ofensa a dois ou mais bens jurídicos’.”
Juiz José Luiz Oliveira de Almeida
Titular da 7ª Vara Criminal

 

Antecipo, a seguir, alguns excertos.

  1. Como consignado acima, as vítimas foram ouvidas em sedes administrativa e judicial, tendo confirmado o assalto, apontando a autoria aos acusados, daí a relevância do seu depoimento para definição da autoria do crime.
  2. A palavra dos ofendidos, sabe-se, destaca-se, in casu sub examine, com especial carga probatória, pois que, em tema de crimes contra o patrimônio, a sua palavra é a pedra de toque, na maioria das vezes, para definir a autoria, máxime se nada tinha de pessoal contra os autores do fato.Os Tribunais não dissentem, ao proclamarem que “Em sede crimes patrimoniais, geralmente praticados na clandestinidade, a palavra da vítima assume relevância no reconhecimento dos agentes”.
  3. No mesmo sentido a decisão segundo a qual “Nos crimes contra o patrimônio, como o roubo, muitas vezes praticados na clandestinidade, crucial a palavra do ofendido na elucidação dos fatos e na identificação do autor”. 

 

A seguir, a sentença, de corpo inteiro.

Processo nº 194032007

Ação Penal Pública

Acusados: J. dos S. S. e outro

Vítima: P. O. de J. e outra

Vistos, etc.

Cuida-se de ação penal que move o Ministério Público contra J. dos S. S., vulgo “Joça”, e F. F. M., vulgo “Porcão”, ambos qualificados na inicial e por ocasião do interrogatório, por incidência comportamental no artigo 157, §2º, II, do CP, em face de, no dia 16 de agosto de 2007, por volta das 16h40, assaltarem um coletivo da Empresa Primor, conduzido por J. da C. O. N.e tendo como cobradora P. O. de J., com a utilização de uma faca, os quais levaram a renda do coletivo, uma bolsa tira-colo de P. e o relógio de J. da C., cujos fatos estão narrados, em detalhes, na denúncia, que, no particular, passa a compor o relatório desta decisão.

A persecução criminal teve início com a prisão em flagrante dos acusados. (fls. 06/12)

Termo de Apresentação e Apreensão às fls. 18.

Termo de Restituição às fls.19.

Recebimento da denúncia às fls. 63/64.

Exame em arma de fogo às fls. 69/70.

O acusado J. dos S. S. foi qualificado e interrogado às fls. 83/94 e F. F. M. às fls. 95/99.

Defesa prévia de F. F. M. às fls. 101 de J. dos S. S., às fls. 103.

Durante a instrução criminal foram ouvidas a ofendida P. O. de J.. (fls.118/121) e o ofendido J. da C. O. N..(fls.122/124).

O Ministério Público, na fase do artigo 499 do CPP, nada requereu, bem assim a defesa. (fls.155v.)

O Ministério Público, em alegações finais, pediu, alfim, a condenação dos acusados, nos termos da denúncia. (fls.157/161)

A defesa dos acusados, de seu lado, pediu apenas que, em caso de condenação, seja a pena aplicada no mínimo legal, que seja reconhecida a circunstância atenuante decorrente da confissão do crime e que, ademais, se reconheça que ambos são menores de 21(vinte e um) anos. (fls.163/166)

Relatados. Decido.

01. O Estado, por seu órgão oficial, denunciou J. dos S. S., vulgo “Joça”, e F. F. M., vulgo “Porcão”, qualificados na inicial e por ocasião do interrogatório, por incidência comportamental no artigo 157, §2º, II, do Digesto Penal.

01.01. Aos acusados o Estado imputa uma lesão ao patrimônio de P. O. de J. e J. da C. O. M., fato que teria ocorrido no dia 16 de agosto de 2007, por volta das 16h40, no interior de um ônibus coletivo da Empresa Primor, próximo do Bequimão.

02. A denúncia, se pode ver, narra um fato absolutamente relevante, sob a ótica do Direito Penal. O fato descrito na inicial, evidencia, prima facie, uma conduta antijurídica dos acusados, daí a razão pela qual foi recebida, observadas, ademais, as condições exigidas pela lei para o seu exercício pelo Ministério Público.

03. A Carta Política vigente, importa anotar, a guisa de ilustração, “consagra que o fundamento do Estado Democrático de Direito é o exercício da cidadania e o respeito à dignidade da pessoa humana; na medida em que estes direitos estiverem sendo desrespeitados, há que se procurar o Estado, pedindo a solução do litígio” .

03.01. Nesse sentido, ocorrendo uma lesão ou ameaça de lesão a direito, deve ser levado fato ao conhecimento do Estado-Juiz, uma vez que, entre nós, só excepcionalmente se admite a autodefesa.

04. In casu sub examine, os acusados, segundo o Ministério Público, teriam atentado contra o patrimônio de P. O. de J. e de J. da C. O. N., daí a razão da sua submissão a julgamento perante o Poder Judiciário, a quem compete aplicar o Direito penal objetivo em face da ação dos acusados.

05. A deflagração da ação penal em exame se justifica porque, sabe-se, a pena sob pode ser infligida via processo, no qual se respeite todas as franquias legais dos acusados. É dizer: “ se não houver persecução criminal in judicium, não poderá haver inflição de pena propriamente dita”.

06. Artigo 157,§2º, I e II, do Digesto Penal está definido o tipo simples (preceptum iuris) de roubo, as penas previstas para os seus transgressores (sanctio iuris), bem assim as qualificadoras decorrentes do emprego de arma e do concurso de pessoas.

07. A conduta típica é subtrair, tirar, arrebatar coisa alheia móvel empregando o agente violência grave, ameaça ou qualquer outro meio para impedir a vítima de resistir.

08. O objeto material é a coisa alheia móvel. Coisa, para o direito penal, é qualquer substância corpórea, material, ainda que não tangível, suscetível de apreensão e transporte.

09. O elemento subjetivo do tipo é o dolo, que se traduz na vontade de subtrair, com emprego de violência, grave ameaça ou outro recurso análogo, com a finalidade expressa no tipo, que é o de ter a coisa para si ou para outrem(animus furandi ou animus rem sibi habend).

10. O crime sob retina se consuma, segundo consagrou a jurisprudência, com a inversão da posse, id. est, quando o agente tem a posse mais ou menos tranqüila da res, ainda que por pouco tempo, ou que a res esteja fora da esfera de vigilância da vítima.

11. Para o Superior Tribunal de Justiça, “ o roubo se consuma no instante em que a detenção da coisa móvel alheia se transforma em posse mediante a cessação da grave ameaça ou violência à pessoa, sendo irrelevante no direito brasileiro que o ladrão tranqüila e possa dispor livremente da res furtiva, ou lapso de tempo em que manteve a posse, ou ainda que tenha saído da esfera de vigilância da vítima”.

12. O sujeito ativo do crime pode ser qualquer pessoa, menos o seu proprietário, na medida em que o tipo exige que a coisa seja alheia. O sujeito passivo é o proprietário ou possuidor, ou até mesmo o detentor. É indiferente, ademais, a natureza da posse.

13. Sob essas diretrizes, sob essas considerações, passo ao exame das provas consolidadas nos autos, para, somente alfim e ao cabo do exame, concluir se os acusados, efetivamente, atentaram, ou não, contra a ordem pública, como pretende o Ministério Público.

14. Com a prática do ato criminoso, o dever de punir do Estado sai de sua abstração hipotética e potencial para buscar existência concreta e efetiva. A aparição do delito por obra de um ser humano torna imperativa sua persecução por parte da sociedade, “a fim de ser submetido o delinqüente à pena que tenha sido prevista em lei”

15. A par dos distintos momentos da persecução, passo ao exame do quadro de provas emolduradas nos autos sob retina

16. Pois bem, a primeira fase teve início com a prisão em flagrante dos acusados. (fls.06/12)

17. O acusado J. dos S. S. confessou a autoria do crime, dizendo tê-lo praticado contando com o concurso do alcunhado “Porcão” e com a utilização de uma faca.(fls. 11)

18. O acusado F. F. M., por se encontrar internado em casa de saúde, não foi interrogado.(fls.33)

19. Os ofendidos também foram ouvidos em sede administrativa, tendo P. dito que foram dois os assaltantes, um deles armado com um facão.(fls.09)

19.01. O ofendida disse que, depois de rendidos, entregou toda a renda do coletivo, não sabendo precisar o valor. (ibidem)

20. O ofendido J. da C. O. N. confirmou a ocorrência do crime, identificando o acusado J. dos S. S. como o que usava um facão.(fls.10)

20.01. Adiante o ofendido disse que entregou o seu relógio de pulso, marca Cássio e que foi subtraída a renda do coletivo.(ibidem)

21. Em poder dos acusados foram apreendidos os bens mencionados no auto de apreensão de fls. 18, tendo sido devolvido o valor de R$ 40,00(quarenta) reais à ofendida P. O. de J.. (fls.19)

22. Encerrada a primeira fase, o Ministério Público, de posse dos dados colacionados na fase extrajudicial ( informatio delicti), ofertou denúncia (nemo judex sine actore) contra J. dos S. S., vulgo “Joça”, e F. F. M., vulgo “Porcão”, imputando a eles o malferimento do preceito primário ( preceptum iuris) do artigo 157 do Digesto Penal, com as qualificadoras decorrentes do emprego de arma e do concurso de pessoas, fixando, dessarte, os contornos da re in judicio deducta.

23. Aqui, no ambiente judicial, com procedimento arejado pela ampla defesa e pelo contraditório, produziram-se provas, donde emergem, dentre outras, o interrogatório dos acusados (audiatur et altera pars) .

24. O acusado J. S. S., vulgo “Joça”, não hesitou em confessar o crime, dizendo tê-lo praticado em companhia de F. F. M., não saber, no entanto, por que praticou o crime. (fls.83/94)

24.01. Depois de muita insistência o acusado J. dos S. S. disse que praticou o crime porque passa fome e que era ele quem estava de posse da arma branca.(ibidem)

25. O acusado F. F. M., da mesma forma, confessou o crime, dizendo ter praticado o crime para comprar comida, o fazendo em companhia de J. dos S. S. que era quem usava arma branca.(fls.95/99)

25.01. F. F. M. disse que, quando foi preso, não estava de posse do dinheiro subtraído porque o tinha perdido na lama. (ibidem).

26. Na sede judicial os ofendidos também foram ouvidos.

27. Plabiana Oliveira de Jesus, v. g., disse que eram dois os assaltantes, sendo que um deles, armado de facão, se dirigiu ao motorista do coletivo e aplicou-lhe uma “facãozada” nas costas, que era para que ele passasse o relógio. (fls.118/121)

27.01. Mais adiante a ofendida disse que foi determinado a ela que passasse a bolsa e a renda, mas que nada levaram nos passageiros.(ibidem)

27.02. A ofendida disse que a renda do coletivo que tinha era vinte e um reais e umas moedas, os quais foram levados pelos acusados.(ibidem)

27.03. Noutro fragmento a ofendida disse que dela subtraíram a bolsa e documentos e do motorista o relógio, sendo que o dinheiro do coletivo foi recuperado, não tendo sido recuperado, no entanto, a sua bolsa e o relógio do ofendido J. da C. O. N.. (ibidem)

27.04. Adiante a ofendida confirmou que foram dois os assaltantes e que não viu com eles arma de fogo. (ibidem)

28. O ofendido J. da C. O. N. também foi inquirido em sede judicial, tendo confirmado o assalto, praticado por duas pessoas, uma das quais puxou um facão e colocou sob sua costela.(fls.122/124)

28.01. O ofendido confirmou que subtraíram a renda do coletivo, a bolsa da cobradora e seu relógio, os quais não foram reavidos.(ibidem)

29. Examinei a prova amealhada em toda a sua extensão.

30. Alfim e ao cabo do exame concluo, sem a mais mínima dúvida, que os acusados J. dos S. S., vulgo “Joça”, e F. F., vulgo “Porcão”, foram, sim, os autores dos crimes narrados na denúncia. É dizer, em concurso, afrontaram a ordem pública, fazendo subsumir a sua ação no artigo 157 do Digesto Penal.

31. Do exame da prova albergada nos autos resulta a constatação, ademais, que o crime restou qualificado pelo emprego de arma e pelo concurso de pessoas.

32. Do exame da prova restou consolidado, outrossim, que os crimes contra o patrimônio de P. O. de J. e J. da C. O. N. restaram consumados, vez que a res mobilis não foi recuperada.

33. Os acusados, com sua ação, subtraíram doa ofendidos coisas móveis, mediante violência, com o claro objetivo de terem a res para si, desfalcando, no mesmo passo, o patrimônio dos ofendidos, protegidos juridicamente.

34. A figura típica do crime de roubo, sabe-se, é composta pela subtração, que é uma característica do crime de furto, conjugada pelo emprego de grave ameaça ou violência contra pessoa.

35. Da ação dos acusados posso entrever, pois, que presentes estão, à evidência, a) a subtração; b) a finalidade da subtração ; d) a coisa alheia móvel; e c) o emprego de violência, daí porque, reafirmo, a sua ação se amolda ao preceito primário do artigo 157 do CP.

36. Da ação dos acusados, não restam dúvidas, resultou a subtração de coisa móvel dos ofendidos, pretendendo os acusados tê-las para si, com emprego, inclusive, de violência física (vis corporalis)

37. O crime, anotei acima, restou consumado, pois que, sabe-se, “a consumação do crime de roubo ocorre com a simples disponibilidade, ainda que momentânea, da res furtiva, desde que cessada a violência, prescindindo-se a posse tranqüila e a saída da coisa da esfera de vigilância da vítima”.

38. O crime, antecipei acima, restou, de mais a mais, qualificado, pelo concurso de pessoas. Importa anotar, em face dessa qualificadora (majorante, em verdade), que ela tem lugar em face da maior ameaça ao bem jurídico tutelado. No caso presente a qualificadora se manifestou mais evidente, pois que, creio, se os ofendidos tivessem sido assaltado apenas por um dos acusados, é provável que tivessem condições de proteger o seu patrimônio.

39. Os acusados, reafirmo, agiram dolosamente, pois que tinham consciência e vontade na realização da conduta típica. Os acusados tinham consciência de que o fato que pretendiam praticar era ilícito (elemento cognitivo) e, ainda assim, a realizaram (elemento volitivo).

39.01. Conquanto os acusados tivessem consciência da ilegalidade do ato que pretendiam praticar, ainda assim agiram, devendo, agora, responder pelas conseqüências da ação reprochavel.

40. Os acusados, em concurso e armados de facão, com vontade de realizar a conduta típica, abordaram as vítimas, aplicaram numa delas uma panada lhes subtraíram os bens que traziam consigo.

41. Vê-se do exposto que os acusados tiveram a intenção de realizar – e realizaram – uma conduta possível, influenciando, com sua ação, nos acontecimentos.

42. Os acusados, verte das provas, se propuseram a realizar uma conduta típica e, com essa vontade, realizaram fatos que configura um delito.

43. Os acusados, agora, em face de sua ação, terão que suportar a inflição de penas, merecida em face de um fato concreto, ou seja, dos crimes que praticaram.

44. A pena, todos sabemos, “é a perda de bens jurídicos imposta pelo órgão da justiça a quem comete crime”. É o direito penal em sua essência retributiva, “operando um mal ao transgressor”.

44.01. Os acusados, em face de sua ação, têm que se submeter à sanção penal, traduzindo em uma pena privativa de liberdade, consistindo esta “num mal imposto ao transgressor em virtude da violação da norma jurídica”.

45. Na ação dos acusados, importa gizar, restou configurado o concurso formal de crimes, devendo os acusados suportarem as conseqüência de sua ação, traduzida na exacerbação da resposta penal, vez que segundo a dicção do artigo 70 do CP, “Quando o agente, mediante uma só ação ou omissão, pratica dois ou mais crimes, idênticos ou não, aplica-se-lhe a mais grave das penas cabíveis ou, se iguais, somente uma delas, mas aumentada, em qualquer caso, de um sexto até metade”

45.01. A propósito do concurso formal, importe consignar que “ que não pode receber a mesma pena quem rouba uma única pessoa e aquele que assalta duas ou mais, em face do resultado plúrimo da ofensa.

45.02. Na mesma linha de pensar grafo que “embora haja pluralidade de eventos, em seqüência, quando se apresentem fundidos como resultado de uma conduta material e subjetivamente única, configura-se um concurso ideal de infrações e não crime continuado”.

45.03. Vou adiante no raciocínio, ainda sob o mesmo tema, para dizer que “configura-se o concurso formal de crimes se o agente, mediante uma só ação, ainda que por vários, comete dois ou mais crimes, com ofensa a dois ou mais bens jurídicos”.

45.04. Nessa mesma linha de argumentação, releva gizar que “ configura-se concurso formal de delitos e não crime continuada na conduta de quem subtrai vários objetos pertencentes a pessoas diversas, de forma simultânea, eis que inexistente na espécie uma pluralidade de ações autônomas, mas sim de atos componentes de uma única ação”.

45.05. Sem me afastar do tema, consigno, finalmente, que “na aplicação das penas privativas de liberdade, o atual Código Penal, como o antigo, determina, quando idênticas, a adoção de uma só, aumentada de um sexto até a metade”.

46. Definido albergar o processo concurso formal de crimes, impende consignar que o reconhecimento do concurso em comento não maltrata o princípio da correlação e nem nos compele à adoção de qualquer providência tendente a ouvir a defesa, tendo em vista que aqui se cuida de emendatio libelli, ou seja, aqui se cuida apenas de dar nova definição jurídica ao fato, ex vi do artigo 383 do Digesto de Processo Penal.

46.01. Nessa linha de argumentação anoto que o réu não se defende da capitulação dada ao crime na denúncia, “mas sim da sua descrição fática, dos fatos narrados”.

46.02. O Supremo Tribunal Federal, ao exame de questão similar, já proclamou que “a nova tipificação emprestada pelo juízo, em face da instrução processual, não constitui cerceamento de defesa ou oblívio do devido processo legal, porquanto o acusado se defende dos fatos narrados na denúncia e não do delito nela qualificado. Hipótese em que a falta de intimação do acusado, em face da desclassificação do delito, não configura cerceamento de defesa”.

47. Como consignado acima, as vítimas foram ouvidas em sedes administrativa e judicial, tendo confirmado o assalto, apontando a autoria aos acusados, daí a relevância do seu depoimento para definição da autoria do crime.

48. A palavra dos ofendidos, sabe-se, destaca-se, in casu sub examine, com especial carga probatória, pois que, em tema de crimes contra o patrimônio, a sua palavra é a pedra de toque, na maioria das vezes, para definir a autoria, máxime se nada tinha de pessoal contra os autores do fato.

49. Os Tribunais não dissentem, ao proclamarem que “Em sede crimes patrimoniais, geralmente praticados na clandestinidade, a palavra da vítima assume relevância no reconhecimento dos agentes”.

50. No mesmo sentido a decisão segundo a qual “Nos crimes contra o patrimônio, como o roubo, muitas vezes praticados na clandestinidade, crucial a palavra do ofendido na elucidação dos fatos e na identificação do autor”.

51. Definido, quantum sufficit, que os acusados atentaram contra o comando penal do artigo 157, crime qualificado, ademais, pelo concurso de pessoas e pelo emprego de arma branca, devo, agora, deter-me acerca das circunstâncias judiciais do artigo 59, para fixação da pena-base.

52. O acusado F. F. M. responde a processos-crime na 5ª Vara Criminal (processo nº 155872007), na 6ª Vara Criminal (processo nº 120032007 e 299632006).

53. Posso afirmar, à luz do exposto, que o acusado F. F. M. tem conduta daninha no meio social e que, por isso, embora tenha bons antecedentes, à luz do princípio da presunção de inocência – stricto sensu, portanto – não os têm lato sensu, pois que têm uma vida de deslizes, reveladores de seu desajuste social.

53.01. A personalidade perigosa do acusado decorre, também, do crime pelo qual está sendo julgado, vez que usou, com o comparsa, arma branca, com a qual aplicaram uma panada no ofendido J. da C. O.N..

54. Nada obstante possuidor de bons antecedentes o acusado F.o F. M., à vista, repito, do princípio da presunção de inocência, não os têm se a quaestio for examinada à luz de sua vida pregressa, do seu conceito e da sua conduta social.

55. O conceito de bons antecedentes, sabe-se, nem sempre deve limitar-se ao principio técnico-jurídico da primariedade processual. Para efeito de avaliação dos antecedentes dos acusados, “cada caso deve ser solucionado diante das provas e dos elementos dos autos, segundo o livre convencimento do julgador, fundamentando as razões da decisão”

55.01. No mesmo sentido há devo anotar que “por maus antecedentes não se consideram apenas as condenações criminais, porém o comportamento social, profissional e familiar”

56. Os maus antecedentes dos acusado F. F. M. e sua péssima conduta social, autorizam, sim, a majoração da resposta penal.

57. Os Tribunais, a propósito, não dissentem, como se colhe abaixo, litteris:

Os maus antecedentes, a conduta social e a personalidade do agente, requisitos de natureza subjetiva, podem ser considerados para fins de dosimetria da pena. A ausência de prejuízo à vítima, em virtude da restituição da res furtiva, não constitui requisito para a concessão do benefício previsto no § 2º do art. 155 do CP.

58. Devo anotar, só pelo prazer de argumentar e à guisa de reforço, que há Tribunais que, pese o princípio da presunção de inocência, entendem que só tem bons antecedentes, reputação ilibada e vida pregressa limpa, “quem não tem envolvimento com crimes”  e que o conceito de bons antecedentes deve ser analisado a critério do julgador, tendo o juiz, pois, liberdade para sua avaliação, de acordo cada caso concreto.

59. O Supremo Tribunal Federal já decidiu na mesma senda, como se vê abaixo, litteris:

A presunção de inocência não impede que a existência de inquérito policial e de processos penais possam ser levados à conta de maus antecedentes.

60. No mesmo diapasão:

EMENTA: “HABEAS CORPUS”. ROUBO QUALIFICADO. OITIVA DE TESTEMUNHA: PEDIDO FORMULADO EM ALEGAÇÕES FINAIS: INDEFERIMENTO: CONSTRANGIMENTO ILEGAL NÃO CONFIGURADO. PENA: EXACERBAÇÃO: FIXAÇÃO FUNDAMENTADA. MENORIDADE: CIRCUNSTÂNCIA ATENUANTE A SER OBSERVADA NA FIXAÇÃO DO QUANTUM DA PENA.

Não configura constrangimento ilegal o indeferimento de oitiva de testemunha, cujo pedido foi formulado pela defesa intempestivamente na fase das alegações finais.

Incensurável o decisum na parte em que, ao fixar a pena-base acima do mínimo legal, fundamentou o aumento com a apreciação dos “antecedentes pouco recomendáveis” do réu que antes se dedicava a pequenos furtos, constando da sua ficha de antecedentes registros de inquéritos e processos criminais relacionados com tóxicos. Todavia, tendo deixado de realizar a operação relativa a circunstância atenuante da menoridade, outra decisão deverá ser proferida, observado o disposto no art. 65, I, do Código Penal.

Habeas Corpus deferido para, mantida a condenação, anular o acórdão, na parte relativa à fixação da pena, devendo outra ser proferida, levando-se em conta o disposto no art. 65, I, do Código Penal.

62. Na mesma alheta a decisão a seguir, do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo, verbis:

“O conceito de bons antecedentes nem sempre deve limitar-se ao princípio técnico-jurídico da primariedade processual. Cada caso deve ser solucionado diante das provas e dos elementos dos autos, segundo o livre convencimento do julgador, fundamentando as razões da decisão.

63. O Tribunal de Alçada Criminal de São Paulo não dissente, como se vê abaixo, litteris:

MAUS ANTECEDENTES – Processos em andamento – Reconhecimento – Possibilidade: – Inteligência: art. 45, § 1º do Código Penal, art. 155, § 4º, IV do Código Penal.

24(b) – É possível reconhecer maus antecedentes com base em Processos em andamento, não havendo falar-se em violação do princípio constitucional da presunção de inocência, uma vez que não se pode tratar de forma igualitária acusados que respondem a Ações Penais e os que não têm contra si outros Feitos, pois, aí sim haveria desrespeito ao preceito constitucional da isonomia.

64. Sobreleva anotar, pelo prazer de argumentar, que “As circunstâncias judiciais previstas no artigo 59 do CP são da discricionária apreciação do magistrado, que, ao fixar a duração da pena, não está obrigado a analisar exaustivamente cada uma delas, bastando fixar-se nas reputadas decisivas para a dosagem” .

65. Importa refletir, ademais, que “a maneira de agir e as demais circunstâncias do crime devem ser consideradas para fins de adoção de pena-base, pois o dolo intenso, a violência e a ameaça desnecessárias, e o tempo da ação são dados que sempre devem ser pesados na fase inicial da fixação da reprimenda, dentre os limites máximo e mínimo da Lei, em obediência ao disposto no art. 59 do CP, como forma de individualização da punição”.

66. Tudo de essencial posto e analisado à farta, julgo procedente a denúncia, para, de conseqüência, condenar os acusados J. dos S. S., vulgo “Joça”, e F. F. M., vulgo Porção, por incidência comportamental no artigo 157, §2º, I e II, do CP, cuja penas-base para a fixar a seguir, individualmente:

®Para o acusado J. dos S. S.s, vulgo “Joça”, maranhense, solteiro, sem profissão definida, com vinte anos de idade, filho de H. D. de S. e de A. S., residente na Rua do A., s/n, Ipase, nesta cidade, fixo a pena-base em 04(quatro) anos de reclusão e 10(dez)DM, à razão de 1/30 do SM vigente à época do fato, sobre as quais faço incidir mais 1/3, em face das qualificadoras decorrentes do emprego de arma e do concurso de pessoas, totalizando 05(cinco) anos e 04(quatro) meses de reclusão e 13(treze)DM, sobre as quais faço incidir, outrossim, mais 1/6, em face da causa geral de aumento de pena prevista no artigo 70 do CP, perfazendo, agora e definitivamente, 06(seis) anos, 02(dois)meses e 20(vinte)dias e 15(quinze)DM, devendo a pena privativa de liberdade ser cumprida, inicialmente, em regime semi-aberto, ex vi legis.

®Para o acusado F. F. M., vulgo “Porção”, maranhense, solteiro, servente, filho de R. F. M., residente na Rua do A., nº 17, Ipase de baixo, nesta cidade, fixo a pena-base em 06(seis) anos de reclusão e 20(vinte)DM, à razão de 1/30 do SM vigente à época do fato, as quais reduzo em 06(seis)meses e 05(cinco)DM, em face da circunstância atenuante prevista no artigo 65, I, do CP (preponderante), perfazendo 05(cinco) anos e 06(seis)meses de reclusão e 15(quinze)DM, sobre as quais faço incidir mais 1/3, em face das qualificadoras decorrente do emprego de arma e do concurso de pessoas, totalizando, assim, 07(sete) anos e 04(quatro)meses de reclusão e 20(vinte)DM, sobre as quais faço incidir, finalmente, mais 1/6, em face da causa geral de aumento de pena prevista no artigo 70 do Codex Penal, perfazendo, agora e definitivamente, 08(oito) anos, 06(seis)meses e 20(vinte)dias, e 23(vinte e três DM, devendo a pena privativa de liberdade ser cumprida, inicialmente, em regime fechado, em face do que prescreve o artigo 33,§2º, letra a, e §3º, do CP.

67. Consigno que deixei de considerar a circunstância atenuante decorrente da idade do acusado J. dos S. S., tendo em vista que a pena-base foi fixada no mínimo legal.

68. Importa assinalar que “O aumento decorrente de concurso formal não deve incidir somente sobre a pena-base, mas sobre a pena acrescida em virtude da circunstância qualificadora”.

69. Os acusados estiveram presos durante a instrução e assim deveriam permanecer, em face da gravidade do crime que cometeram e, também, em face de sua perigosidade.

70. O acusado F. F. M., além do crime e da perigosidade demonstrada quando de sua execução, tem maus antecedentes, como consignei alhures.

71. Grafe-se que a decisão aqui albergada não se traduz em nenhuma injustiça, a vilipendiar quaisquer dos seus direitos fundamentais dos acusados, pois que a mesma Constituição que prescreve a presunção de inocência, admite, de outra parte, a prisão cautelar.

72. O só fato de os acusados, ad exempli, serem primários e não terem maus antecedentes, stricto sensu, não se constitui em obstáculo à sua segregação provisória, se dos autos despontam, à farta, razões para adoção da medida de força.

73. A propósito dos maus antecedentes dos acusados, o Superior Tribunal de Justiça na mesma senda da decisão aqui encartada, como se colhe da ementa abaixo transcrita, verbis:

RHC 12890 / CE ; RECURSO ORDINARIO EM HABEAS CORPUS 0002/0061857-8 Fonte DJ DATA:03/02/2003 PG:00318 Relator Min. FELIX FISCHER (1109) Ementa PROCESSUAL PENAL. RECURSO ORDINÁRIO EM HABEAS CORPUS. ARTS. 157, § 2º, I, II e III; 159, § 1º C/C ART. 288 DO CÓDIGO PENAL. LIBERDADE PARA APELAR. MAUS ANTECEDENTES CONSIGNADOS EXPRESSAMENTE NA SENTENÇA. AUSÊNCIA DE ANOTAÇÕES PENAIS. NECESSIDADE DA CUSTÓDIA PROVISÓRIA.I – Não faz jus ao direito de apelar em liberdade o réu portador de maus antecedentes, por não atender o disposto no artigo 594 do CPP.II – O Juiz não fica adstrito à ausência de anotações penais contra o acusado na análise de seus antecedentes, podendo, diante das circunstâncias do crime e de sua personalidade, concluir possuir ele maus antecedentes, não lhe concedendo, portanto, o direito de recorrer em liberdade. III – A condição de réu foragido durante toda a instrução criminal é suficiente para motivar a sua custódia preventiva.Recurso desprovido.

74. A orientação do Supremo Tribunal Federal é no mesmo sentido, ao proclamar que “na aferição dos bons antecedentes do réu não fica o juiz adstrito à objetividade de ausência de antecedentes penais e à ignorância de fatos negativos. Pode o juiz, em face das circunstâncias do crime e da personalidade do titular concluir validamente pela inexistência de bons antecedente a que fica,na lei, subordinado o direito de apelar solto o réu”

75. À guisa de reforço, aduzo que o mesmo Superior Tribunal de Justiça,, na mesma linha de entendimento do Supremo Tribunal Federal, em outra feita proclamou que tem bons antecedentes o acusado que “ostenta vida pregressa limpa, bom conceito social, reputação ilibada, nenhum envolvimento com crime”.

76. A propósito do crime de roubo e da prisão, em face da gravidade do crime, já tive a oportunidade de refletir no blog Ad scribendum – http://www.assimdecido.blogspot.com/ – onde expendi as seguintes considerações, verbis:

“A comunidade em que vivem o acusado e a vítima, sobreleva refletir, não entenderia como é que se afronta, de forma acerba, a ordem pública, e, em seguida, o meliante é colocado em liberdade, recebendo um “passaporte”, chancelado pelos agentes públicos, para, outra vez, macular, afrontar a ordem pública.

Essa situação, esse quadro, essa sensação, não tenho dúvidas, trazem descrença à nossas instituições – PODER JUDICIÁRIO, MINISTERIO PÚBLICO e POLÍCIA – e, mais grave ainda, estimula o exercício arbitrário das próprias razões.

A sociedade tem que acreditar, precisa acreditar que nós, agentes públicos, estamos vigilantes, atentos para, sendo o caso, tirar de circulação aqueles que teimam em afrontar a ordem pública, como se vivessem em terra sem dono e sem ordem.

Por essas e por outras razões é que tenho indeferido, sem hesitação, os pedidos formulados nesse sentido, em homenagem à ordem pública.

A perigosidade do autor de crimes desse jaez desautoriza a restituição de sua liberdade. A ordem pública não pode ficar à mercê das ações criminosas desse matiz, ainda que o acusado seja primário e possuidor de bons antecedentes.

É lamentável que muitos só se sensibilizem com a violência quando têm um membro de sua família vitimado por ela.

Ante situações que tais, não faço concessões, não tergiverso, não faço graça. A liberdade de um meliante vem sempre em detrimento das pessoas de bem. Dá-se liberdade a eles e nós outros somos compelidos a renunciar à nossa. A ordem pública, por isso, reclama a manutenção da prisão do acusado, em sua homenagem.

Reconheço os efeitos deletérios da prisão, máxime a não decorrente de um título executivo definitivo. Essa é uma questão que a todos preocupa, mas que não pode ser invocada como razão para colocar em liberdade quem demonstra não ter qualquer preocupação com a ordem estabelecida.

Anoto que em torno dessa questão não estou isolado. Com efeito, a jurisprudência sedimentada tem proclamado, à exaustão, que ‘a gravidade do delito, com sua inegável repercussão no meio social, justifica, por si só, a custódia antecipada do seu autor, ainda que primário, de bons antecedentes e outros fatores favoráveis’(RSTJ 104/474)”.

77. No mesmo blog, em outra oportunidade, também refleti, a propósito do crime de roubo, verbis:

“…Os assaltantes não escolhem cor, credo, raça, idade ou posição social. Assaltam o pobre, o preto, o branco, o rico, o alto, o baixo, o bonito, o feio, o desembargador, o juiz, o ministro do Supremo Tribunal Federal, o Ministro da Fazenda, o filho do ministro, o amigo do ministro, o promotor de justiça, o filho do promotor, o delegado, o policial, o defensor público, a criança, o adulto, o velho, o novo, o sadio e o doente. E qualquer um pode sucumbir diante da arma de um assaltante, bastando, para tanto, que se tente tão-somente frustrar-lhes a expectativa. Nesse contexto deve-se, sim, punir o meliante, exemplarmente, para preservar o pouco de liberdade que ainda nos resta e para desestimular a prática de crimes. Nós, julgadores, não podemos nos aliar à arrogância e ao descaso de nossas elites e governantes, para os quais essas questões só são levadas à ribalta no período eleitoral…”

77.01. Ponderei, ademais:

“…Não é admissível que a violência se espraia sobre a sociedade sob os nossos olhos. Não é aceitável que sejamos magnânimos com o roubador. A nossa magnanimidade pode ser confundida com covardia, fraqueza, falta de sensibilidade. Nós não precisamos esperar que se sacrifique outro JOÃO HÉLIO, para, só depois, clamar aos céus pedindo Justiça…”

77.02. Estimulei de outra feita:

“…O agente público, desde o meu olhar, deve, ao deparar-se com acusado da prática de roubo, qualificado ou não, envidar esforços para segregá-lo, como garantia da ordem pública, ou mantê-lo segregado, se preso já estiver, sob o mesmo fundamento. Não deve, portanto, entre uma e outra situação, agir com parcimônia…”

“…Sobreleva gizar, nessa mesma linha de argumentação, que o que se pretende, ademais, com uma medida de força, é prevenir a sociedade das ações deletérias dos meliantes, sem que isso implique julgamento ante tempus. É que a crônica policial já registrou inúmeros, incontáveis episódios em que as vítimas de um assalto, ao esboçarem a mais mínima reação – ou apenas um gesto interpretado como uma reação – sucumbiram diante da arma de um meliante, o que me faz crer que, no caso sob análise, só por muita sorte a vítima está viva para contar a história…”

“…A comunidade em que vivem o acusado e a vítima, sobreleva refletir, não entenderia como é que se afronta, de forma acerba, a ordem pública, e,em seguida, o meliante é colocado em liberdade, recebendo um “passaporte”, chancelado pelos agentes públicos, para, outra vez, macular, afrontar a ordem pública…”

“…Essa situação, esse quadro e essa sensação, não tenho dúvidas, trazem descrença à nossas instituições – PODER JUDICIÁRIO, MINISTERIO PÚBLICO e POLÍCIA – e, mais grave ainda, estimula o exercício arbitrário das próprias razões…”

“…A sociedade tem que acreditar, precisa acreditar que nós, agentes públicos, estamos vigilantes, atentos para, sendo o caso, tirar de circulação aqueles que teimam em afrontar a ordem pública, como se vivessem em terra sem dono e sem ordem…”.

78. Em recente decisão incidental – pronúncia –, nos autos do processo nº 7852005, decretei a prisão provisória do acusado, e o fiz sob os seguintes fundamentos, litteris:

“O acusado está preso, mas a sua prisão não decorre de decisão emanada deste juízo. O acusado, devo dizer, em face de seus maus antecedentes – lato sensu -, está desautorizado a retornar ao convívio social, pois que, a considerar as suas próprias afirmações, responde a processo-crime na 4ª e na 5ª Varas Criminais, do que se infere que, solto, representa um perigo à ordem pública.

A liberdade, todos sabem, é um dos mais relevantes bens a receber proteção do Estado. Mas a liberdade, pese a presunção de inocência, é relativa. Pode, sim, ser sacrificada, quando a ordem pública passa a reclamar a prisão de um acusado, ainda que seja primário e possuidor de bons antecedentes.

O Estado, em situações semelhantes à albergado nos autos sub examine, pode – e deve – interferir, com rigor, se a liberdade de alguém pode colocar em risco a sociedade.

É claro, é lógico, é cediço, que toda prisão é odienta e que deve ser limitada, por isso mesmo, a casos em que a perigosidade do acusado seja evidente. No caso presente, creio que não se tem a mais mínima dúvida de que o acusado, solto, representa um perigo à ordem pública. Não pode, por isso, ser colocado em liberdade. A presunção de inocência é princípio relevantíssimo em uma democracia, mas não pode ser invocado para obstar uma prisão, se o autor do fato tem uma vida prenhe de deslizes e, em liberdade, pode, com muita probabilidade, voltar a atormentar a ordem pública.

A prisão provisória, todos sabemos, é uma medida cautelar pessoal detentiva, de caráter excepcional, que se justifica como uma garantia de preservação da ordem pública, presentes o fumus boni iuris e o periculum in mora. A consagração do princípio da inocência, nada obstante, não tem o condão de afastar a constitucionalidade das espécies de prisões provisórias existentes em nosso ordenamento jurídico. Elas prosseguem sendo, por isso, pacificamente, reconhecidas pela doutrina e pela jurisprudência. Elas são, muitas vezes, uma necessidade e como tal, podem, sim, validamente incidir sobre status libertatis de um acusado.

A regra, à luz da nova ordem constitucional, é o acusado recorrer em liberdade de eventual decisão condenatória ou de pronúncia, objetivando a reforma de uma decisão. Mas essa regra, admite exceções, quando o recolhimento provisório do réu à prisão se faz necessária, na forma inscrita no art. 312, do CPP. E o recolhimento provisório do acusado, não tenho dúvidas, em face do acima expendido, é uma necessidade, premente necessidade, em tributo à ordem pública.

A prisão cautelar, tenho reiterado, é uma medida violenta. Nesse diapasão têm decidido os nossos Sodalícios. Por isso mesmo só deve ser buscada como ultima ratio, na medida de sua necessidade. No caso presente, pelas razões acima mencionadas, a prisão provisória do acusado é medida que se impõe.

A prisão provisória, em casos que tais, não tortura a presunção de inocência. In casu há que se conviver as duas situações não se excluem. É dizer que como uma situação – a prisão provisória – não se magoa a outra – a presunção de inocência. É que a medida que aqui se adota tem a marca da indeclinabilidade, da imprescindibilidade, da inarredabilidade, conquanto presuma-se inocente o acusado.

Constrangimento ilegal haveria, entristecimento da presunção de inocência se notaria, se fosse determinada a prisão do acusado, sem que fosse demonstrada a sua necessidade.

Luiz Flávio Gomes, a propósito da prisão cautelar, relembra, verbis:

‘O eixo, a base, o fundamento de todas as prisões cautelares no Brasil residem naqueles requisitos da prisão preventiva. Quando presentes, pode o Juiz fundamentadamente decretar qualquer prisão cautelar; quando ausentes, ainda que se trate de reincidente ou de quem não tem bons antecedentes, ou de crime hediondo ou de tráfico, não pode ser decretada a prisão antes do trânsito em julgado da decisão’ . ( Estudos de Direito Penal e Processo Penal. São Paulo: RT, 1999).

À luz do art. 312  do CPP pode-se inferir que a prisão preventiva só não atormenta o princípio da presunção de inocência, se for decretada – como se ver em o caso sob retina – para atender a sua finalidade cautelar, presentes o fumus boni iuris representado pelos seus pressupostos, e configurado o periculum libertatis, com a demonstração de que a liberdade do acusado colocará em risco a ordem pública.

Vivemos numa quadra de violência tão exacerbada, que, na minha avaliação, não se pode, sob o manto da presunção de inocência, obstar a decretação de uma prisão de réus perigosos, ainda que não sejam reincidentes, ainda que seja primário.

O acusado, todos sabemos, com a presunção de inocência, deixou de ser um mero objeto do processo. Mas a sua condição, nos dias presentes, de sujeito de direitos dentro da relação processual, não lhe garante liberdade de forma incondicional. A decretação da prisão do acusado, em face dos seus antecedentes, devo redizer, não torna o processo sub examine um instrumento injusto ou de opressão, nem fere a par conditio; não o torna inferior em face do órgão oficial do Estado. O acusado continua sendo um sujeito de direitos. E seus direitos constitucionais não deixaram de ser respeitados, em face desta decisão, cujo objetivo primordial é a garantia da ordem pública.

Com as considerações supra, decreto a prisão do acusado G. T. M., para que, preso, aguarde o julgamento de eventual recurso tomado desta decisão.

Expeça-se, pois, o necessário mandado de prisão, em três vias, uma das quais lhe servirá de nota de culpa.

P.R.I.

Preclusa a via de impugnação, encaminhem-se os autos à distribuição, para os devidos fins, com a baixa em nossos registros.

São Luis, 13 de março de 2007.

79. Esses argumentos incorporo a esta decisão, como argumentos adicionais para fundamentar esta decisão, na vertente em que cuida da manutenção da prisão dos acusados.

80. Mantida a prisão dos acusados, recomende-se-os, agora, na prisão em que se encontram.

81. P.R.I.

82. Após o trânsito em julgado, encaminhem-se os autos à distribuição, para os fins de direito, com a baixa em nossos registros.

83. Custas, na forma da lei.

São Luís, 29 de abril de 2008.

Juiz José Luiz Oliveira de Almeida

Titular da 7ª Vara Criminal

 RANGEL, Paulo, Direito Processual Penal, 6ª edição, LUMENJURIS, p. 190

 Art. 5º…

XXXV – a lei não excluirá da apreciação do Poder Judiciário lesão ou ameaça de lesão a direito;

 RANGEL, Paulo. ob.cit. p.196.

 Roubo

Art. 157 – Subtrair coisa móvel alheia, para si ou para outrem, mediante grave ameaça ou violência a pessoa, ou depois de havê-la, por qualquer meio, reduzido à impossibilidade de resistência:

Pena – reclusão, de quatro a dez anos, e multa.

§ 1º – Na mesma pena incorre quem, logo depois de subtraída a coisa, emprega violência contra pessoa ou grave ameaça, a fim de assegurar a impunidade do crime ou a detenção da coisa para si ou para terceiro.

§ 2º – A pena aumenta-se de um terço até metade:

I – se a violência ou ameaça é exercida com emprego de arma;

II – se há o concurso de duas ou mais pessoas;

III – se a vítima está em serviço de transporte de valores e o agente conhece tal circunstância.

IV – se a subtração for de veículo automotor que venha a ser transportado para outro Estado ou para o exterior; (Incluído pela Lei nº 9.426, de 1996)

V – se o agente mantém a vítima em seu poder, restringindo sua liberdade. (Incluído pela Lei nº 9.426, de 1996)

 RECr nº 10240-SP; HC 70304-SP

 MARQUES, Jose Frederico, in Elementos de Direito Processual Penal, Vol. I, 1997, fls.127

 STJ, Rel. Min. Paulo Medina, 6ª T., um. REsp. 476.375-0, MG, j. 26/06/2003

 Heleno Cláudio Fragoso, in Lições de Direito Penal, Parte Geral, 16ª edição, Edotora forense, 2005, p.348

 Heleno Cláudio Fragoso, ibidem

 Heleno Cláudio Fragoso, ibidem

 JUTACRIM 56/2008

 JUTACRIM 56/208

 JUTACRIM 36/323

 TJRJ – AC 10.448

 Júlio Fabbrini Mirabete, in Código de Processo Penal Interpretado, 8ª edição, Atlas, p.382

 RT 738/535

 Recurso : REVISÃO Processo : 363902 / 2 Relator : LOPES DE OLIVEIRA Órgão Julg.: 8. GRUPO Votação : VU

 Recurso : APELAÇÃO Processo : 1102311 / 9 Relator : WILSON BARREIRA Órgão Julg.: 11. CÂMARA.

 TJSP, EI, Rel. Ferraz Felisardo, RT, 728:527.

 STJ, HC 2.327-7-Rel. Costa Lima, DOU, 14-03-1994, p. 452

 TAPR – ACr 0265240-6 – (226026) – Jaguapitã – 2ª C.Crim. – Rel. Juiz Conv. Laertes Ferreira Gomes – DJPR 03.02.2005) JCP.155 JCP.155.2

 STJ , HC 4.965, Rel. Edson Vidigal, DJU, 18-03-1996, p. 7586, RT 731/534

 STF, HC 73:394-8, Rel. Moreira Alves, DJU, 21.03.1997, P. 8504

 HC 71791 / SP – SÃO PAULO HABEAS CORPUS Relator(a): Min. MAURÍCIO CORRÊA Julgamento: 26/03/1996 Órgão Julgador: Segunda Turma Publicação: DJ 25-10-1996 PP-41027 EMENT VOL-01847-01 PP-00168

 TJSP, E.I, Rel. Ferraz Felizardo, RT 728:527

Apelação nº 1.319.421/5, Julgado em 11/11/2.002, 12ª Câmara, Relator: Ivan Sartori, RJTACRIM 63/93

 RT 641/397-8

 RJDTACRIM 32/268

 Reclusão e detenção

Art. 33 – A pena de reclusão deve ser cumprida em regime fechado, semi-aberto ou aberto. A de detenção, em regime semi-aberto, ou aberto, salvo necessidade de transferência a regime fechado. (Redação dada pela Lei nº 7.209, de 11.7.1984)

§ 1º – Considera-se: (Redação dada pela Lei nº 7.209, de 11.7.1984)

a) regime fechado a execução da pena em estabelecimento de segurança máxima ou média;

b) regime semi-aberto a execução da pena em colônia agrícola, industrial ou estabelecimento similar;

c) regime aberto a execução da pena em casa de albergado ou estabelecimento adequado.

§ 2º – As penas privativas de liberdade deverão ser executadas em forma progressiva, segundo o mérito do condenado, observados os seguintes critérios e ressalvadas as hipóteses de transferência a regime mais rigoroso: (Redação dada pela Lei nº 7.209, de 11.7.1984)

a) o condenado a pena superior a 8 (oito) anos deverá começar a cumpri-la em regime fechado;

b) o condenado não reincidente, cuja pena seja superior a 4 (quatro) anos e não exceda a 8 (oito), poderá, desde o princípio, cumpri-la em regime semi-aberto;

c) o condenado não reincidente, cuja pena seja igual ou inferior a 4 (quatro) anos, poderá, desde o início, cumpri-la em regime aberto.

§ 3º – A determinação do regime inicial de cumprimento da pena far-se-á com observância dos critérios previstos no art. 59 deste Código.(Redação dada pela Lei nº 7.209, de 11.7.1984)

 Art. 65 – São circunstâncias que sempre atenuam a pena: (Redação dada pela Lei nº 7.209, de 11.7.1984)

I – ser o agente menor de 21 (vinte e um), na data do fato, ou maior de 70 (setenta) anos, na data da sentença; (Redação dada pela Lei nº 7.209, de 11.7.1984)

II – o desconhecimento da lei; (Redação dada pela Lei nº 7.209, de 11.7.1984)

III – ter o agente:(Redação dada pela Lei nº 7.209, de 11.7.1984)

a) cometido o crime por motivo de relevante valor social ou moral;

b) procurado, por sua espontânea vontade e com eficiência, logo após o crime, evitar-lhe ou minorar-lhe as conseqüências, ou ter, antes do julgamento, reparado o dano;

c) cometido o crime sob coação a que podia resistir, ou em cumprimento de ordem de autoridade superior, ou sob a influência de violenta emoção, provocada por ato injusto da vítima;

d) confessado espontaneamente, perante a autoridade, a autoria do crime;

e) cometido o crime sob a influência de multidão em tumulto, se não o provocou.

 STF – Rel. Octávio Galloti – JUTACRIM 84/476

 RHC 12890 / CE ; RECURSO ORDINARIO EM HABEAS CORPUS 0002/0061857-8 Fonte DJ DATA:03/02/2003 PG:00318 Relator Min. FELIX FISCHER (1109) Data da Decisão 07/11/2002 Òrgão Julgador T5 – QUINTA TURMA.

 RTJ 97/180

 RT 731/534

 Essa decisão pode ser encontrada no blog Ad Scribendum – http://assimdecido.blogspot.com/ – , de responsabilidade do magistrado prolator desta decisão.

 Art. 312. A prisão preventiva poderá ser decretada como garantia da ordem pública, da ordem econômica, por conveniência da instrução criminal, ou para assegurar a aplicação da lei penal, quando houver prova da existência do crime e indício suficiente de autoria. (Redação dada pela Lei nº 8.884, de 11.6.1994)

Autor: Jose Luiz Oliveira de Almeida

José Luiz Oliveira de Almeida é membro do Tribunal de Justiça do Estado do Maranhão. Foi promotor de justiça, advogado, professor de Direito Penal e Direito Processual Penal da Escola da Magistratura do Estado do Maranhão (ESMAM) e da Universidade Federal do Maranhão (UFMA).

Um comentário em “Sentença condenatória – concurso de pessoas – concurso formal de crimes – reconhecimento de atenuante”

  1. Acho suas sentenças muito claras, no teor, bem fundamentadas e, principalmente, tenho certeza que os sentenciados são capazes de compreendê-las, ainda que com elas não concordem. Ainda não firmei opinião sobre a prisão provisõria, especialmente nos casos do chamado clamor social, tema que pretendo aprofundar… Mas estou só começando! Parabéns pelo blog!
    Tania Franco.

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