Desagravo

Associação de juízes divulga nota de desagravo a Joaquim Barbosa

POR FREDERICO VASCONCELOS

05/02/14  06:59

Barbosa e André Vargas

Para a Anamages, o Congresso Nacional não é palanque eleitoral e não pertence a um partido.

A Associação Nacional dos Magistrados Estaduais (Anamages) divulgou nota pública de desagravo ao presidente do Supremo Tribunal Federal, ministro Joaquim Barbosa, em razão da provocação do vice-presidente da Câmara Federal, André Vargas (PT-PR).

O parlamentar repetiu na sessão de reabertura dos trabalhos do Congresso o gesto de erguer o punho cerrado –assim como fizeram o ex-presidente do PT José Genoino e o ex-ministro José Dirceu, quando se entregaram à Polícia Federal.

Para o  juiz de direito Antonio Sbano, presidente da Anamages, Vargas não ofendeu apenas o ministro, “mas toda a Nação brasileira, eis que o poder de julgar é atribuído aos magistrados pela vontade soberana do povo”.

Eis a íntegra da manifestação:

NOTA PÚBLICA

DESAGRAVO AO EXMO. SR.MINISTRO JOAQUIM BARBOSA

PRESIDENTE DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL.

 

A ASSOCIAÇÃO NACIONAL DOS MAGISTADOS ESTADUAIS – ANAMAGES, vem a público externar sua insatisfação pela falta de decoro e de respeito ao PRESIDENTE DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL, em razão da conduta antiética do Exmo. Sr. Deputado Federal André Vargas (PT-PR) durante a solenidade de abertura do ano legislativo.

A Constituição da República acolheu a tripartição de Poderes, atribuindo aos Chefes do Poder Executivo, do Poder Legislativo e do Poder Judiciário o mesmo status de mandatários da Nação.

Se o ilustre Deputado, como publicamente tem se manifestado, discorda do julgamento da AP 470, popularmente chamada de processo do mensalão, é um direito seu. Mas, o seu entendimento pessoal, não o autoriza a afrontar a honra e dignidade do Presidente da Suprema corte brasileira, em Sessão Solene na Casa Legislativa.

Ao se colocar de punho cerrado, gesto de contestação e insatisfação dos condenados na referida ação penal quando foram presos, S. Exa. não ofendeu apenas e tão só o Sr. Ministro Joaquim Barbosa, um dos julgadores, mas toda a Nação brasileira, eis que o poder de julgar é atribuído aos magistrados pela vontade soberana do povo, através das normas votadas pelas Casas Legislativas.

Não se diga, como o fez o Ilustre Deputado: “O ministro está na nossa Casa. Na verdade, ele é um visitante, tem nosso respeito, mas estamos bastante à vontade para cumprimentar do jeito que a gente achar que deve”.

O Congresso Nacional, o Senado a República e a Câmara dos Deputados não pertencem  a um partido ou a alguma pessoa, mas sim ao povo brasileiro e devem ser tratados como um santuário da democracia, da diversidade de pensamentos e de ideias.

A independência e harmonia entre os Poderes da República somente serão efetivamente respeitados se o protocolo e a fidalguia imperarem.

O Plenário não é palco ou palanque eleitoral, nem pode admitir condutas contrárias ao decoro parlamentar e à regras mínimas de educação e convivência.

Como cidadão e fora dos limites da casa do Povo, o Sr. Deputado pode se manifestar como bem entender, assim como qualquer outro cidadão, arcando, por óbvio, com as responsabilidade por eventuais ofensas à honra. Contudo, enquanto Parlamentar, tem o dever de se haver com lhanura e fidalguia, máxime quando recebe, junto com seu colegiado,  o Chefe de outro Poder.

Ao Ministro Joaquim Barbosa apresentamos nosso desagravo, com a certeza de que S.Exa. não se deixará abalar pelo incidente e que continuará conduzir o julgamento dos recursos com INDEPENDÊNCIA e LIVRE DE PRESSÕES, honrando a toga e a magistratura brasileira. Ao bom Juiz não importa o resultado de um julgamento, pressões de grupos ou a vontade pessoal de quem quer seja, mas sim A REALIZAÇÃO PLENA DA JUSTIÇA.

Brasília, 04 de fevereiro de 2.014
Antonio Sbano

STF em ação

STF deve retomar casos “represados”

POR FREDERICO VASCONCELOS

03/02/14  08:59

Barbosa e Janot

O Supremo Tribunal Federal retoma suas atividades nesta semana, acumulando questões relevantes “represadas” em 2013 pelo longo julgamento do mensalão, revela reportagem publicada nesta segunda-feira (3/1) naFolha.

Hoje será realizada a  solenidade de abertura do ano judiciário, conduzida pelo ministro Joaquim Barbosa. A sessão deverá contar com as presenças dos presidentes da República, da Câmara e do Senado ou seus representantes, que deverão proferir discursos.

Em seu pronunciamento, o procurador-geral da República, Rodrigo Janot, deverá enfatizar o combate à corrupção, a grave situação do sistema prisional do país e a necessidade de desafogar a pauta do Supremo.

A expectativa é que sejam retomados no STF processos na área da economia cuja decisão final orientará os tribunais sobre milhares de ações ajuizadas nas instâncias inferiores.

É o caso, por exemplo, das alegadas perdas nas cadernetas de poupança com os planos econômicos nas décadas de 80 e 90. A Corte deverá decidir se os bancos terão que indenizar poupadores que se sentiram prejudicados.

Aguarda-se também a definição sobre os prazos para pagamento de precatórios [determinação da Justiça para que um órgão público pague indenização devida].

Outros processos relevantes que deverão voltar ao plenário:

– a constitucionalidade das doações de empresas e pessoas jurídicas para campanhas eleitorais e partidos;

– o julgamento de embargos infringentes na ação penal do mensalão;

– a ação sobre os supostos desvios de dinheiro público na campanha de reeleição do então governador de Minas, Eduardo Azeredo (PSDB);

– a ação que questiona a proibição da publicação de biografias não autorizadas.

 

Versão para o jornal

Abaixo, artigo da minha autoria, publicado neste blog, na sua versão, revisada, para o Jornal Pequeno

Naturalmente bom

José Luiz Oliveira de Almeida*

Principio essas reflexões partindo da afirmação de Jean-Jacques Rousseau de que o homem é um ser naturalmente bom, cuja bondade restaria corrompida pela sociedade. É claro que, até onde vai a minha percepção, não dá pra dizer que todo homem é naturalmente bom, como não dá pra dizer que a sociedade necessariamente o torne mal. A experiência mostra, a contrariar a tese, que há pessoas que parecem ter nascido para fazer o mal; há outras tantas que, a despeito dos reveses da vida e das injustiças a que são submetidas, só disseminam o bem.

Dia desses, saí para dar as minhas habituais – e necessárias – pedaladas na Av. Litorânea, mantendo distância da Lagoa da Jansen, onde recentemente fui assaltado. A certa altura,  o pedal da bicicleta caiu. Fiquei desarmado com o inusitado do ocorrido.Tentei, em vão, colocar o pedal no lugar. Constatei logo a minha incompetência para resolver um problema que, desde a minha visão, parecia muito simples.

De repente, ao tempo em que eu insistia em recolocar o pedal, apareceu um rapaz  que, ao se aproximar, de súbito, me assustou. Pensei: meu Deus, outro assalto! O coração, claro, disparou. Apreensivo, cuidei de analisar o desconhecido por inteiro, como se essa análise boba – e precipitada, claro –, feita por conta apenas da aparência, me levasse a alguma conclusão sobre o desconhecido.

Muito simpático e solícito, o rapaz colocou o depósito de queijo que trazia consigo  (todos cortados em cubos, para venda) no chão, ao lado de um fogareiro já apagado, e passou a tentar colocar o pedal da bicicleta, me deixando em posição de absoluta reflexão. Nas primeiras tentativas, como não alcançasse êxito, tratou logo de, despojadamente, sentar no chão – absolutamente desprendido e à vontade.  Muito tranquilo, muito simpático, risonho, do tipo que não metia medo. Fui, nesse cenário, me acostumando com a situação, passando a dialogar com ele sobre o problema.

Fiquei a pensar com meus botões: de onde vem essa que me parece uma boa alma? Quem são os pais desse bom rapaz?  Seus amigos, quem são? Onde mora? De onde vem? Por que está me ajudando? Exigirá ele, depois, algo em troca? E o queijo? Pelo visto, ele se desinteressou de vendê-lo, certamente porque espera ser bem recompensado, pensava eu.

Um dado curioso. O desconhecido, muito à vontade, viu a tampa do depósito voar para longe, mas não largou o que estava fazendo. Continuou tentando colocar o pedal no lugar, com inaudita boa vontade. Um transeunte viu a tampa voando, correu atrás, trazendo-a de volta. A partir daí, eu próprio cuidei do depósito do desconhecido, atento para que a tampa não voasse mais. Ele, enquanto isso, lutava, embalde, para repor o pedal.

A certa altura, levantou-se e saiu correndo. Pediu que eu o aguardasse, pois iria procurar uma chave. Fiquei, ao lado da bicicleta, olhando para um lado e outro, enquanto aguardava o desconhecido, e persistia fazendo  questionamentos sobre a sua atitude e a pensar onde ele encontraria uma chave. Mas pensava positivamente: trata-se de uma boa alma, dessas que os reveses da vida não corrompem.

Em dado momento me dei conta dele saindo de um bar, com um alicate na mão, saltitante, alegre vislumbrando a possibilidade de resolver o meu problema. Ao se aproximar de mim, deu um sorriso, para, otimista, sentenciar:

– Agora vai!

Não foi! Mais uma tentativa debalde. A rosca estava estragada. Não havia mais o que fazer. Desanimado, olhei para um lado e para o outro, perdido. Ele percebeu o meu desânimo, e lamentou a minha frustração. Parecia que já me conhecia há muito tempo. Não! Ele não me conhecia! Não sabia de onde eu vinha, e nem para onde eu ia. Mas, ainda assim, procurou me ajudar, sem pedir nada em troca – por bondade.  Pelo desejo de servir ao próximo.

Decidido que não resolveríamos o problema, deixei a bicicleta em um bar e saí andando, desnorteado, pela Litorânea, apenas com as luvas nas mãos, decidido a voltar para casa a pé. No trajeto inicial, Chagas me acompanhou, lamentando o insucesso da empreitada. Ele seguia com o queijo no depósito, e o fogareiro,  apagado. Mas nada disso parecia preocupá-lo. O que ele lamentava mesmo era não ter podido me ajudar. Eu disse a ele, então:

– Amigo, não tenho nenhum trocado para te dar. Todavia, passo amanhã e deixo um dinheiro para você, no bar do Deusimar – onde a minha bicicleta ficou guardada, ao que ele objetou:

– Não se preocupe com isso. O que eu desejo mesmo, se fosse possível, é um emprego. Se o senhor puder me arranjar um, eu fico agradecido. Tá tudo muito difícil, doutor. O mais fácil seria roubar, como faz a galera, mas eu não quero isso pra mim. Eu quero mesmo é trabalhar.

Eu, lamentando, disse a ele que não tinha como lhe arrumar um emprego, ao que ele respondeu, sem mudar o tom e sem perder o sorriso, que não tinha problema, e que eu não me preocupasse com dinheiro, pois sabia que um dia a gente se encontraria e, nessa ocasião, eu daria a ele o que entendesse devesse dar. Não pediu mais nada. Seguiu o seu caminho e eu, segui o meu.

Ele partiu quando o fim de tarde ia chegando, para tentar vender  queijo assado na brasa. Seguiu com o depósito sob o braço esquerdo, e o fogareiro rodando com a mão direita, para atiçar o fogo. E sumiu da minha vista.

Chagas, para mim, é um ser naturalmente bom. As dificuldades da vida, o mundo, enfim, não o corrompeu, e quiçá não o corromperá jamais. Pena que eu não possa ajudar Chagas a conseguir um emprego. Fico te devendo essa, Chagas! Mas o mundo dá muitas voltas. Nós vamos nos encontrar novamente, em outra situação. E quando isso acontecer, quero, mais uma vez, agradecer-te e dizer-te que, mesmo as pessoas naturalmente boas como você, nesse mundo de pura competição e de ambição desmedida, podem ter que levar a vida desempenhando uma atividade menor, por falta de oportunidades. Mas o importante mesmo, em tudo aquilo que fazemos, é ter dignidade, fazer com dignidade; e dignidade você tem de sobra, pouco importando o tipo de trabalho que faça.

É desembargador do Tribunal de Justiça do Estado do Maranhão

e-mail: jose.luiz.almeida@globo.com

blog: www.joseluizalmeida.com

Ainda a Lei Anticorrupção

Como todo brasileiro, estou todo prosa com a vigência da Lei Anticorrupção. Todos esperamos que, sobretudo em face da multa dissuasória, que chega a 60 milhões de reais, e da inserção da responsabilidade objetiva, consigamos das um basta nessa promiscuidade entre o público e o privado.

Importa anotar, nessa expectativa, que esta é a primeira lei brasileira direcionada à punição de empresas, muitas das quais são exatamente aquelas que fazem doações de campanhas, onde está a gênese da promiscuidade que fiz referência acima, afinal, tenho dito, ninguém faz doação pelos belos olhos do candidato ou em face de uma ideologia; há sempre, por trás, o claro objetivo de, de alguma forma, tirar proveito da res publica, que, no Brasil, tem servido muito mais aos interesses privados, como é da sabença geral.

A lei foi inspirada em congêneres do mundo civilizado, onde o combate à corrupção é um objetivo a ser alcançado, daí, ademais, as alvíssaras que decorrem do estabelecimento da chamada responsabilidade objetiva, a que me reportei acima, da qual dimana inegável reforço no combate a essa chaga chamada corrupção.

A responsabilidade objetiva decerto que estimulará a que os mecanismos de controles internos das empresas se esmerem ainda mais no sentido de evitar o seu envolvimento com a prática de atos de corrupção, vez que, pela novel legislação, pouco importa, por exemplo, se os diretores de determinada empresa  tenham ou não autorizado o comportamento ilícito, bastando, tão somente, que resulte provado que a pessoa jurídica tirou proveito da ilicitude.

Outro aspecto que deve ser registrado, a desestimular a prática de ilicitudes, é que a empresa envolvida em ilicitudes, além de ser compelida a ressarcir os cofres públicos, deverá ser incluída no Cadastro Nacional de Empresas Punidas.

O bicho vai pegar mesmo é quando as empresas punidas resolverem – e decerto o farão –  recorrer ao Judiciário para rediscutir eventuais punições e os efeitos dela, como, por exemplo, o registro do seu nome no chamado Cadastro Nacional de Empresas Punidas. Aí, meu amigo, tudo pode ficar como dantes. Vai ser um guerra de liminares e uma demora tão grande, que, não tenho dúvidas, as punições poderão se tornar letra morta.

De qualquer sorte, já não era sem tempo. O Brasil precisava de uma lei como essa. Só a perspectiva de punição pode ter o efeito desestimular a prática de ilicitudes.

O que se espera, agora, que as instâncias persecutórias, quando provocadas, ajam com eficiência no combate a essas práticas que tanto mal têm feito a todos.

Vamos ver!

É, sem dúvidas, um avanço.

Tribunais suntuosos, varas sucateadas

POR FREDERICO VASCONCELOS

29/01/14  10:54

O Conselho Nacional de Justiça realizará audiência pública nos dias 17 e 18 de fevereiro para debater medidas que reduzam o desequilíbrio entre o primeiro e o segundo grau do Judiciário. Um dos temas será a necessidade de distribuição equânime do orçamento.

Grupo de Trabalho criado pelo CNJ propõe que a divisão do orçamento dos tribunais corresponda à demanda que recai sobre os órgãos, magistrados e servidores, o que, no primeiro grau, chega a 90% dos processos no país.

Segundo informa a assessoria de imprensa do CNJ, o grupo entregou minuta de resolução ao presidente do órgão, ministro Joaquim Barbosa.

O corregedor nacional de Justiça, ministro Francisco Falcão, identificou o contraste entre Cortes bem estruturadas e varas que atuam com graves deficiências.

“Notamos que em alguns tribunais há investimentos altíssimos nas sedes dos tribunais, com a construção de verdadeiros palácios e, às vezes, mordomia exacerbada, em detrimento de uma primeira instância sucateada”, diz Falcão.

Os tribunais de Justiça contam com um orçamento único, a ser administrado pela Corte em favor dos diferentes graus de jurisdição.

“Precisamos de boas instalações para tribunais de Justiça e Cortes Superiores, mas precisamos muito mais de aparelhamento e de instalações condignas para os juízes de primeiro grau”, afirmou o corregedor.

O evento terá transmissão ao vivo.

Naturalmente bom

thPrincipio essas reflexões partindo da afirmação de Jean-Jacques Rousseau de que o homem é um ser naturalmente  bom, cuja bondade restaria corrompida pela sociedade.

É claro que, até onde vai a minha percepção, não dá pra dizer que todo homem é naturalmente bom, como não dá pra dizer que a sociedade necessariamente o torne mal.

A experiência mostra, a contrariar a tese, que há pessoas que parecem ter nascido para fazer o mal; há outras tantas que, a despeito dos reveses da vida e das injustiças a que são submetidas, são incapazes de fazer o mal.

Pois bem. Hoje, à tarde, saí para dar as minhas habituais e necessárias pedaladas.

A certa altura,  o pedal da bicicleta caiu. Fiquei desarmado. Olhava para um lado e para o outro, sem saber o que fazer, numa sinuca de bico.

Tentei, em vão, colocá-lo no lugar. Fiquei apreensivo, com receio de que aparecesse algum malfeitor, ressabiado em face de um assalto que me vitimou há poucos dias.

Pois bem. De repente, ao tempo em que tentava recolocar o pedal, apareceu um rapaz,  que logo se aproximou,  a me  assustar. O coração, claro, disparou. Pensei com meus botões: outro assalto. Logo em seguida, constatei que se tratava de uma pessoa de bem.

Pois bem. Muito simpático e solícito, o rapaz –  desconhecido, claro –  colocou o depósito de queijo que trazia consigo  (todos cortados em cubos, para venda) no chão, ao lado de um fogareiro apagado, e passou a tentar colocar o pedal da bicicleta.

Nas primeiras tentativas, como não alcançasse êxito, tratou logo de sentar no chão, como se tivesse sido contratado por mim para fazer aquele serviço.

Fiquei a observá-lo, absorto! Ele, de seu lado, descontraído, cheio de boa vontade, ia tentando resolver o problema.

Fiquei a pensar com meus botões: de onde vem essa que me parece uma boa alma?

Quem são os pais desse bom rapaz?  Seus amigos, quem são? Onde mora? De onde vem? Por que está me ajudando? Exigirá ele, depois, algo em troca? E o queijo? Pelo visto, ele se desinteressou de vendê-lo, certamente porque espera ser bem recompensado.

Vi, depois do susto inicial, e depois de me fazer tantas interrogações, que se tratava  mesmo de uma boa alma.

Um dado curioso. O desconhecido, muito à vontade, viu a tampa do depósito voar para longe,  mas não largou o que estava fazendo. Continuou tentando colocar o pedal no lugar, com a maior boa vontade. Um outro transeunte passou, viu a tampa voando, correu atrás, trazendo-a de volta.

A partir daí, eu próprio cuidei do depósito do desconhecido, atento para que a tampa não voasse mais. Ele, enquanto isso, lutava, embalde, para repor o pedal.

A certa altura, levantou-se e saiu correndo. Pediu que eu aguardasse, pois ele iria atrás de uma chave.

Fiquei, ao lado da bicicleta, olhando para um lado e outro, enquanto aguardava o desconhecido, e persistia fazendo  questionamentos sobre a sua atitude.

Pensava: meu Deus, o que será que esse rapaz vai pedir em troca? E eu, sem um centavo no bolso! Como vou dizer a ele que não tenho como pagá-lo?

Em dado momento me dei conta dele saindo de um bar, com um alicate na mão, feliz com a possibilidade de resolver o meu problema.

Mais uma vez debalde. A rosca estava estragada. Não havia mais o que fazer.

Desanimado, olhei para um lado e para o outro, perdido, sem saber o que fazer. Ele percebeu o meu desânimo, e lamentou a minha frustração. Parecia que já me conhecia há muito tempo.

Não! Ele não me conhecia! Não sabia de onde eu vinha, e nem para onde eu ia. Mas, ainda assim, procurou me ajudar, sem pedir nada em troca – por bondade.  Pelo desejo de servir ao próximo.

Depois disso, saí andando, desnorteado, pela Litorânea, apenas com as luvas nas mãos, decidido a vir embora a pé.

No trajeto inicial, Chagas me acompanhou, lamentando o insucesso da empreitada.

Ele seguia com o queijo no depósito, e o fogareiro,  apagado.

Mas nada disso parecia preocupá-lo. O que ele lamentava mesmo era não ter podido me ajudar.

Eu disse a ele, então:

– Chagas, não tenho nenhum trocado para te dar. Todavia, prossegui, passo amanhã, deixo um dinheiro no bar do Deusimar – onde a minha bicicleta ficou guardada – pra ti.

Ele disse, então, que eu não devia me preocupar, e que, se fosse possível, ele gostaria mesmo era de arrumar um emprego. Disse mais:

–  Tá tudo muito difícil, doutor. O mais fácil seria roubar, como faz a galera, mas eu não quero isso pra mim. Eu quero mesmo é trabalhar.

Mas foi além. Disse que eu não me preocupasse com dinheiro, pois sabia que um dia a gente se encontraria, e, nessa ocasião, eu daria a ele o que entendesse devesse dar.

Respondi a ele que, infelizmente, não tinha como arrumar-lhe  um emprego.

Ele nada reclamou. Não pediu mais nada. Se despediu. E partiu, já a tarde findando, para tentar vender  queijo assado na brasa.

Seguiu com o depósito de queixo sobre o braço esquerdo, e o fogareiro rodando com a mão direita, para atiçar o fogo.

E sumiu da minha vista.

Acho que não encontrarei mais o benfeitor Chagas.

Mas ficou para mim a lição, a reafirmação, de que, felizmente, o mundo ainda está povoada de pessoas de bem, dispostas a ajudar o próximo, sem pedir nada em troca, pelo prazer de ser solidário.

Chagas, para mim, é um ser naturalmente bom.

As dificuldades da vida, o mundo, enfim, não o corrompeu, e quiçá não o corromperá jamais.

Pena que eu não possa ajudar Chagas a conseguir um emprego.

Fico te devendo essa, Chagas!

Capturada na página do CNJ

ONU aponta a falta de defensores públicos entre as causas da superpopulação carcerária no Brasil

20/01/2014 – 08h45
Luiz Silveira/Agência CNJ

ONU aponta a falta de defensores públicos entre as causas da superpopulação carcerária no Brasil

 

A escassez de defensores públicos no país prejudica o acompanhamento dos processos dos detentos, constituindo uma das principais causas da superlotação das prisões brasileiras, atesta relatório preliminar do Grupo de Trabalho sobre Detenção Arbitrária das Nações Unidas (GTDA/ONU), que realizou visita oficial ao país em março de 2013. A ampliação do número de defensores públicos está entre as mais frequentes recomendações feitas pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ) durante os mutirões carcerários.

A convite do governo brasileiro, integrantes do GTDA estiveram no País no período de 18 a 28 de março, ocasião em que entrevistaram detentos de unidades prisionais de Brasília, Campo Grande (MS), Fortaleza (CE), Rio de Janeiro e São Paulo. Eles também tiveram audiências com diversas autoridades estaduais e federais, incluindo representantes do CNJ.

Segundo o relatório, defensores públicos que oferecem assistência legal gratuita podem ter de lidar com até 800 casos de uma só vez. “Isso impacta negativamente no direito do detento à equidade e julgamento justo. Mesmo nos estados da Federação onde há um sistema de defensoria pública, comumente as áreas rurais não possuem defensores públicos para defender os detentos”, informa o documento.

Os inspetores da ONU apontam, no documento, que o deficiente acesso dos detentos à Justiça leva muitos deles, sobretudo os que não podem pagar por um advogado, a permanecer presos por tempo superior ao necessário. Foram verificados casos de detenções provisórias que duravam meses, até anos. “Durante este período, o detento não sabia o que estava acontecendo com o seu caso”, critica o documento.

Sem isonomia – Segundo o GTDA, a deficiência na assistência jurídica gratuita é uma das razões para o Brasil registrar alto índice de presos provisórios (ainda não julgados), da ordem de 40% da população carcerária. Além disso, a escassez de defensores impede que haja isonomia no tratamento aos presos.

“A maioria daqueles que estão nas prisões é de jovens homens negros, pertencentes a famílias de baixa renda e que não podem pagar por advogados particulares. O grupo de trabalho observou que, em geral, a maioria dos desfavorecidos no sistema de justiça criminal, incluindo adolescentes e mulheres, é de pobres e não pode pagar pela defesa legal”, aponta o relatório.

O GTDA conclui também que os mutirões carcerários do CNJ são importantes para diagnosticar as deficiências no sistema de Justiça brasileiro. “O atraso na obtenção de uma ordem judicial para iniciar o processo foi um tema frequente levantado ao longo da visita. O grupo de trabalho notou que a libertação em massa de prisioneiros por meio do Conselho Nacional de Justiça nos últimos dois anos é uma evidência de que o sistema de justiça criminal é severamente deficiente ao prover assistência legal efetiva e adequada, que poderia ajudar a dar seguimento aos casos dos detentos”, diz o relatório.

Desprivilegiados – O GTDA informa ter identificado muitos casos de detentos que, embora com direito a benefícios como progressão de regime de cumprimento de pena, não podiam desfrutá-los devido à falta de assistência legal adequada. “A natureza arbitrária desses casos é posteriormente exemplificada pelo fato de que aqueles qualificados, para serem libertados ou receberem benefícios, são os economicamente desprivilegiados, que não conseguem pagar pela assistência legal para ajudar em seus casos”, observa o documento.

O Grupo de Trabalho da ONU, ao citar as causas da superpopulação carcerária no Brasil, aponta também o excessivo uso da prisão, a lentidão na tramitação dos processos judiciais e a baixa aplicação, pelo Poder Judiciário, de medidas cautelares substitutivas à prisão e de penas alternativas.

O Conselho Nacional de Justiça tem feito reiteradas recomendações às autoridades estaduais com vistas à solução dos mesmos problemas apontados pelo GTDA. No mutirão carcerário aberto no Amazonas em 17 de setembro de 2013, o  CNJ conseguiu que o governo local anunciasse a nomeação de 60 novos defensores públicos para atuar no interior amazonense, que não contava com esse tipo de serviço.

Jorge Vasconcellos
Agência CNJ de Notícias 

 

Do blog do Frederico Vasconcelos

Promotor é empresário no Maranhão

CNMP cria comissão para investigar Promotor de Justiça.

O Plenário do Conselho Nacional do Ministério Público (CNMP) avocou 18 processos em tramitação na Corregedoria do Ministério Público do Maranhão e decidiu criar uma comissão para apurar irregularidades atribuídas ao Promotor de Justiça Carlos Serra Martins, titular da 1a. Promotoria de Justiça da comarca de Lago da Pedra (MA).

Desde 2008, o promotor é sócio-proprietário de uma empresa de material de construção civil e teria praticado atos incompatíveis com a função pública.

Segundo a portaria que criou a comissão de investigação  –assinada pelo conselheiro relator Cláudio Henrique Portela do Rego, no último dia 10–, “há uma grande pletora de processos judiciais e procedimentos administrativos paralisados pela ausência do promotor”, causando constrangimento ilegal de presos em flagrante delito que não são denunciados no prazo legal. Há casos em que o Poder Judiciário concedeu a liberdade provisória, para que cessasse esse constrangimento.

O promotor teria se afastado do exercício do cargo, deixado de assistir a atos judiciais que exigiam a sua presença, desobedecido prazos processuais e descumprido o dever de residir na comarca na qual é titular. Segundo foi apurado em inspeção, o promotor “locupleta-se de dinheiro público, pois recebe subsídios pelos dias não-trabalhados, bem como ainda uma gratificação de serviços eleitorais sem que tenha comparecido ao cartório eleitoral da comarca”.

“O Ministério Público, por sua vez, encontra-se com descrédito na prestação do serviço, pois há reclamações por parte de advogados, testemunhas e de cidadãos que se deslocam até a Promotoria de Justiça, mas não são atendidos pelo promotor”. Também há reclamações de que o promotor não devolveu duas ações cíveis. Martins teria deixado de tratar com urbanidade partes, testemunhas, funcionários e auxiliares da Justiça.

Num dos processos, o promotor é acusado de invadir os gabinetes de procuradoras, inconformado com a suspensão do pagamento de seus subsídios. Ainda segundo a portaria, foram juntadas cópias de ocorrências policiais e depoimentos que noticiam, em tese, faltas administrativas e condutas delituosas, “entre outras, a de ameaça, agressão verbal, estelionato, apropriação indébita de contribuições previdenciárias, exercício ilegal de profissão incompatível com o cargo de promotor de Justiça e abuso de incapaz”.

Foram designados para apurar os fatos o Promotor de Justiça Luiz Gustavo Maia Lima, do Distrito Federal e Territórios, Fabrício Carrer e Rafael Siqueira de Pretto, de Bauru (SP).

Em 29 de maio de 2013, o promotor Carlos Serra Martins firmou declaração, admitindo que “jamais escondeu” que é sócio-proprietário da empresa CS Martins e Cia. Ltda., e que “pretende se desvincular completamente da sociedade”, porque entende que “não é conveniente, como detentor do cargo de Promotor de Justiça, estar ligado de qualquer forma a atividades comerciais”. Segundo o Promotor, seu próximo passo será “o adiantamento da herança aos filhos que serão sócios da empresa”, passando a figurar como usufrutuário.