Triste realidade

“Prisão é de fato uma monstruosidade opção. O cativeiro das cadeias perpetua-se ante a insensibilidade da maioria, como forma ancestral de castigo. Para recuperar, para ressocializar, como sonharam os nossos antepassados? Positivamente, jamais se viu alguém sair de um cárcere melhor do que quando entrou. E o estigma da prisão? Quem dá trabalho ao indivíduo que cumpriu pena por crime considerado grave? Os egressos do cárcere estão sujeitos a uma terrível condenação: o desemprego. Pior que tudo, são atirados a uma obrigatória marginalização. Legalmente, dentro dos padrões convencionais não podem viver ou sobreviver. A sociedade que os enclausurou, sob o pretexto hipócrita de reinseri-los depois em seu seio, repudia-os, repele-os, rejeita-os.”

Evandro Lins e Silva

Quem ousa discordar? II

“O trânsito mostra de forma inequívoca como o brasileiro tem horror a situações em que é colocado em igualdade de condições com outros. Porque, ainda que uns dirijam suas limusines e outros, carrinhos populares, ou que uns tenham dinheiro para molhar a mão do guarda e outros não, o sinal vermelho é o mesmo para todos.”

Roberto da Mata.

Revista Veja 

Quem ousa discordar?

“A Justiça Criminal no Brasil por mais que nós tenhamos dado alguns passos à frente de 88 para cá, ainda é profundamente discriminatória. Ela vai alcançar, na maioria da vezes, a massa populacional situada nas bases econômicas da sociedade. São os mais pobres. Os miseráveis. São os que estão localizados na periferia – não necessariamente em termos geográficos – na periferia do sistema.

Nós temos as exceções, que acabam sendo manipuladas pela grande mídia como uma espécie de ‘democracia do poder’ – casos de grandes empresários, ou de políticos, ou de juízes -, mas que representam percentualmente um índice quase irrelevante se considerarmos os verdadeiro quadro de Justiça Criminal no Brasil, e no Rio de Janeiro especificamente. No Rio, esses casos representam menos de 1% dos casos.  Os alvos preferenciais da Justiça Criminal são as pessoas mais pobres. Hoje, no Rio, é um público marcado e demonizado como usuário de drogas. São jovens traficantes de comunidades carentes. Eu poderia dizer que o grupo maior é de meninos. Eu fui Juiz de Infância e Juventude e não dá para excluir a questão do adolescente dessa esfera. Eu diria que o público criminal hoje no Brasil, por excelência, é de meninos de 16 a 27 anos, das periferias, ligados à prática de roubo ou à prática de tráfico de drogas, e sem inserção social formal – esquemas formais de escola, trabalho, família. Para esse público não há muita coisa.”

Mochila da verdade

Triste daquele que pensa ser proprietário da verdade.

Triste daquele, que, tomado de  arrogância, imagina não ser capaz de errar.

Tenho dó dos que, sob as talares, pensam que tudo podem, que só de seu ponto de observação se pode vislumbrar o que é correto ou justo.

Tenho pavor dos que, sem humildade, se tornam taciturnos quando têm que enfrentar o brilho  do semelhante.

Tenho reservas e receio dos que  imaginam que somente da sua lente, somente do seu ponto de observação se pode vislumbrar a verdade.

Essas breves reflexões me fazem lembrar do professor Luis Roberto Barroso segundo o qual o mundo do direito é o mundo da relatividade e que, por isso, quem pretende navegar pela vida com uma mochila cheia de certezas absolutas não encontrará nem felicidade e nem a realização do direito.

Vontade de “ir-me”

Os juízes que dão assistência integral às unidades judiciais  deveriam estimular  qualquer  medida tendente a prestigiá-los e que, no mesmo passo, buscam impedir a ascensão dos que insistem em dar assistência parcial às comarcas.

É preciso ter presente que, quando adoto uma posição – antipática aos olhos dos TQQs, se é que existem – que busca prestigiar os magistrados de  dedicação integral, eu estou apenas e tão somente prestigiando a própria classe e o nome da nossa instituição.

Impressiona, assim, o silêncio “ensurdecedor” da quase totalidade dos meus pares acerca dessa questão.

Fico a imaginar, às vezes, que estou errado ou que não vale a pena adotar esse tipo de posição, que, ao que parece, não agrada nem mesmo à OAB e ao Ministério Públicos,  dos quais não se vê nenhuma manifestação tendente a apoiar esse tipo de medida.

Ortega y Gasset narra que a História registra, periodicamente, movimentos de “querer ir-se“, conforme aconteceu com os eremitas, que foram  para o deserto praticar a “moné” – solidão.

Confesso que, algumas vezes, tenho, também, vontade de “ir-me“. É dizer: tenho vontade de deixar de empunhar essa bandeira, pois, em face dela, eu apenas granjeio, ainda mais, a antipatia da classe.

Digo isso porque, desde que assumi a segunda instância, empunhando essa e outras bandeiras relevantes para o Poder Judiciário, só tenho alcançado desapreço e desafetos.

Antes de “ir-me”,  até que chegue o dia de praticar o “moné“, de retornar à minha já proverbial condição de quase ermitão, ainda vou continuar lutando.

Até quando?

Não sei.

Direito em movimento

Afastada a aplicação da insignificância em processo de réu que furtou cheque de amigo
O Superior Tribunal de Justiça (STJ) negou a aplicação do princípio da insignificância a um caso de furto em que o réu se aproveitou da relação de amizade com a vítima para lhe furtar quatro folhas de cheque em branco. A Quinta Turma concedeu parcialmente o pedido formulado pela defesa e fixou a pena em dois anos e 11 meses de reclusão, levando em conta a atenuante de confissão espontânea. A Turma considerou que a existência de maus antecedentes e a má conduta do réu, que abusou da confiança do amigo, justificam a condenação. 
O juízo da Segunda Vara Criminal de Dourados (MS) havia fixado a pena de três anos e quatro meses de reclusão em regime inicial fechado, considerando que o réu já estava preso por conta de outro processo e tinha inúmeras condenações em seu desfavor. A defesa interpôs apelação com o objetivo de reconhecer a insignificância do valor econômico das folhas furtadas e, subsidiariamente, obter a redução da pena-base. O argumento para a insignificância era de que cheques em branco não possuem valor econômico, não havendo objeto material para o crime de furto. O réu furtou as folhas de cheque e as vendeu por R$ 20, sendo que duas delas foram posteriormente descontadas, nos valores de R$ 510 e R$ 1.750. Ao fixar a condenação, o juiz levou em conta, além da malícia adotada no furto, o fato de o réu ter se aproveitado da condição de amigo para valer-se de menor vigilância. O réu, que fora convidado para passar a noite na casa da vítima, destacou também os canhotos para que nada fosse percebido. 

A defesa sustentou, no STJ, que o juiz, ao fixar a condenação, baseou-se em fatos acontecidos com o réu após o processamento da ação penal, o que justificaria a redução da pena. Segundo o relator do habeas corpus, ministro Sebastião Reis Júnior (foto), o abuso de confiança e o modo como ocorreu o furto, bem como a existência de maus antecedentes, denotam a maior reprovação da conduta e a elevada periculosidade social, o que afasta a aplicação do princípio da insignificância. 

A Sexta Turma fixou a pena-base em três anos e seis meses de reclusão, que, confrontada com a atenuante da confissão espontânea, foi reduzida para dois anos e 11 meses de reclusão.

Coordenadoria de Editoria e Imprensa 

Lamentável

Hoje, na sessão administrativa do Pleno, houve várias promoções.

Nas promoções por merecimento, reiterei a minha posição no sentido de só votar nos candidatos que residissem na comarca e que provassem fazer audiências às segundas e sextas-feiras.

Para minha surpresa, um colega fez questão de dizer, para hostilizar a minha posição, que esse era um dado irrelevante para ele.

Lamentável, sob todos os aspectos, que enquanto uns lutam para mudar o quadro atual, há os que pregam a sua manutenção.

A mim não importa se algum colega goste ou não das minhas posições.

O meu compromisso é com a instituição.

Com essa minha exigência, decerto que os leitores do meu blog e os que estiverem na sessão, saberão quais são os TQQs que tentam uma promoção.

Com essa atitude estou preservando a instituição.

Simpatico?

Nunca fui mesmo.

As pessoas parece que ainda não se deram que vivemos novos tempos.

Os que não mudarem a direção, certamente ficarão para trás.

Essas posições conservadores  e retógradas são um desserviço que se presta ao Poder Judiciário

O que eles disseram

“O rico, às vezes, vai para cadeia também. Isso acontece quando ele se confronta com outro rico, e perde e briga. Tiram a cobertura dele.É uma briga entre piratas. Nesse caso o sistema uso o rico que perdeu. E, excepcionalmente, o derrotado acaba na cadeia. Mas ter um VIP na prisão é usado pela mídia para comprovar que o sistema penal é igualitário…”

“Estamos vivendo um momento muito especial. Hoje, não é fácil pegar um grupo qualquer para estigmatizá-lo, mas há um grupo que sempre pode virar o bode expiatório. É o grupo dos delinqüentes comuns.  É um candidato a inimigo residual que surge quando não há outro inimigo melhor. Houve uma época em que bruxas podiam ser acusadas de tudo, das perdas das colheitas à impotência dos maridos. O que se pode imputar aos delinqüentes comuns é limitado, por isso é um candidato a bode expiatório residual. Nos últimos decênios, com a política republicana dos Estados Unidos, os delinqüentes comuns se tornaram o mais recente bode expiatório”.

Eugenio Raúl Zaffaroni

Entrevista concedida ao Consultor Jurídico em  05/07/2009