Não há que se negar: nós somos seres contraditórios. Na maioria, ou na quase totalidade, das vezes nós só condenamos determinadas condutas quando nos interessa a condenação. Se for conveniente que aplaudamos, então aplaudimos; se, ao contrário, for conveniente que condenemos, então condenamos.
Tudo depende, sempre, do ponto de observação, daí a reafirmação de que tudo na vida é relativo. Basta ver o que acontece, por exemplo, no mundo político: há pessoas que passam a vida pregando conduta moral, todavia, quando lhe é conveniente, o discurso moral vai pra privada.
Vejo, nos jornais, determinado político apelando para que não se denuncie as podridões de uma aliado, com receio de que a aliança política sobre as consequências. Para esses, pecados só são cometidos na casa do vizinho. Tudo, para eles, depende das conveniências. O pior é que o povo, inculto e incauto, termina por acreditar que tá tudo certo, tá tudo bem, que é assim mesmo que tem que ser.
Vejamos o casos dos mensaleiros. Todos sabemos que há caixa 2 e que parte das verbas destinadas ao financiamento de campanha vai para os bolsos de uns e outros, e servem, ademais, para comprar apoio político. Mas, quanto a isso, poucos são os que se atrevem a denunciar, porque, afinal, regra geral, estão todos no mesmo barco. Então, quando a questão é financiamento de campanha, como é conveniente a todos, todos se calam.
Não se iludam o mensalão é uma prática antiga. A infelicidade dos que estão presos é que um dos comparsas, insatisfeito com o tratamento que dispensaram ao seu partido, resolveu abrir a boca. Não fosse isso, tudo estava com dantes. Quanto isso, não me iludo, não devemos nos iludir.
Nos dias presentes tenho testemunhado uma louca contradição. As pessoas, revoltadas com o tratamento que tem sido dado aos mensaleiros na prisão, pedem que a eles, mensaleiros, seja dispensado o mesmo tratamento dado aos demais,ou seja, o mesmo tratamento desumano e degradante que se tem dados aos presos no Brasil em geral, quando poderiam aproveitar o ensejo para exigir isonomia, sim, mas para que a eles também fosse dado tratamento digno.
De qualquer sorte, a prisão dos mensaleiros tem um efeito didático fantástico: está mostrando ao Brasil aquilo que temos testemunhado há muitos anos, ou seja, que o tratamento dispensado aos detentos fere, sim, a dignidade da pessoa humana, e que, ademais, algo muito urgente precisa ser feito.
Pena que só agora, depois de tanto sofrimento infligido à população carcerária, o tema vem à tona, provocando as mais diversas reflexões, o que, nada obstante a demora, é muito positivo, a considerar que nunca foi preocupação dos nossos dirigentes a situação a que são relegados os nossos presos, cujo pena, infelizmente, vai além do preconizado nos tipos penais, para alcançarem a sua dignidades e a de seus familiares.
Falta aos nossos governantes sensibilidade. Até parece que a dor que dói num humilde é diferente da dor que dói nos egressos da elite.
Na condição magistrado e cidadão, almejo, sim, que se dê tratamento digno aos mensaleiros; mas desejo, da mesma forma, que aos demais encarcerados e seus familiares também seja dispensado tratamento digno, afinal, tratamento digno, mesmo ao encarcerado, não é favor.