Guimaraes Rosa dizia que “o animal satisfeito dorme”. Com isso queria dizer que o homem, satisfeito, corre o risco da monotonia existencial.
A verdade é que o homem, satisfeito com a situação presente, tende a perder substância, a entrar numa fase de indigência mental muito perigosa.
Acho que estou passando por essa fase!
Creio que, pelo menos no que concerne à minha condição de magistrado, a sedução do repouso e a acomodação parecem me contaminar.
Olho em volta, estando no Tribunal de Justiça, e fico com as impressão de que já estou satisfeito, que posso me aposentar, que posso voltar pra casa e iniciar um novo projeto de vida.
Ontem mesmo, por ocasião da posse solene do colega Raimundo Barros, fiquei com meus botões, olhando para um e para outro colega, e me indagando: o que estou fazendo aqui? Por que não vou para minha casa? O que ainda é possível realizar, estando desembargador? Por que, diferente de muitos, não almejo ser presidente? Por que, se todos se empolgam com o poder, eu me sinto desconfortável exercendo-o? O que tanto fascina nesse cargo que não consegue me atingir?
Tudo isso pode ser confusão da minha mente.
É possível que, mais logo, eu volte ao meu estado, digamos, normal, afinal, só mesmo não sendo normal para não se embevecer com algo que a todos fascina.
Estou há apenas seis anos em minha função atual, mas também sinto às vezes como se estivesse, não direi adormecido, mas “entorpecido” pelas dificuldades cotidianas e pela ausência de um desafio construtivo.
A fraqueza pessoal, que todos nós com freqüência percebemos quando nos deparamos com a vontade de fazer a diferenca engolida pela impossibilidade de a fazer, talvez tenha esse maléfico efeito.
Entretanto, um simples “obrigado” de um jurisdicionado ao perceber em nós o empenho para fielmente exercermos nossas atribuições sempre me faz pensar que fazemos sim uma grande diferenca, embora talvez individual e silenciosa para as pessoas que sao afetadas por nossos atos.
Nessas horas me encontro a imaginar se realmente errados não sejam os outros, com seus jogos de poder.
Lembro da ultima sessão do pleno a qual estive presente, nao lembro o orador, mas recordo que seus pares simplesmente o ignoravam, entretidos que estavam com seus assuntos particulares e conversas paralelas – e lembro de ter lhe avistado, como uma ilha de concentração, apreciando cada palavra, o que no mínimo me pareceu respeitoso.
Devo concluir que embora por vezes possa se sentir enfadado, sua ausência em nossa Corte se fará notar com certeza.