Segundo os estoicos, ser sábio é tomar a razão como guia; ser louco é deixar-se levar ao sabor das paixões. Nesse sentido, posso afirmar que todos somos um pouco loucos, pois, não raro, abdicamos da razão para agir movidos pela paixão, conquanto, de minha parte, tenho procurado, sempre, ser racional – e tenho conseguido, na maioria das vezes.
O homem, penso, não deveria se orgulhar de vencer uma disputa, sobretudo no campo das ideias, que não fosse pela razão e pela inteligência.
Não é a força, de qualquer viés, que deve, na minha avaliação, preponderar numa contenda.
Não é levantando a voz ou dando murro mesa que se vence um debate, que fazemos prevalecer as nossas ideias.
Muitas vezes, é preferível sair “derrotado” que “vencer” uma refrega na base da lei do mais forte, que, na verdade, esconde atos de covardia.
É inaceitável, de mais a mais, que o homem, como ser racional, não se dê conta quando, numa disputa, deixou de agir com a razão para agir movido pela paixão; paixão que cega, que obnubila a mente, que leva à irracionalidade; irracionalidade que nos leva aos desatinos e por caminhos muitas vezes íngremes e sinuosos, do tipo que não permite que por ele mesmo retornemos depois.
Quando, na defesa de uma tese, o debatedor alevanta voz para tentar sobrepujar os argumentos do oponente, o faz como age os animais selvagens, com o uso força e da violência desnecessárias.
Fico sempre com a sensação de que quem mais grita é quem menos argumentos tem para o debate, é quem menos tem razão. Por isso eleva a voz, gesticula, esbugalha os olhos, aponta o dedo, ruboriza, olha para os lados em busca de um aceno, de uma manifestação que seja, na vã tentativa de se convencer a si próprio que está certo.
Uma “vitória” nesses moldes, antes de orgulhar, deve, ao revés, envergonhar o contendor.
Os leões, os ursos, os javalis,os tubarões, dentre outros, combatem com a força física, o que é muito natural; o homem, inobstante, dotado de inteligência e discernimento, não deveria sob qualquer pretexto usar da violência, nas suas mais diversas formas, para sobrepujar aquele que elege como seu i inimigo ou algo semelhante.
Retomando a obra ficcional de Thomas Morus ( A Utopia), anoto que os utopianos lamentavam e chegavam mesmo a envergonhar-se com a informação de, numa contenda, um dos contendores ter alcançado a vitória de forma sangrenta, considerando mesmo uma loucura alcançá-la por esse preço.
Os mesmos utopianos se alegravam quando a vitória era alcançada pela inteligência e pela astúcia, pela força dos argumentos.
Quando, numa discussão, me virem deixar o proscênio, não pensem que me deixei abater, que saí derrotado; eu, simplesmente, me recuso a discutir qualquer questão, que não seja em alto nível, sobretudo durantes os julgamentos dos quais participo, nos quais se exige do magistrado mais equilíbrio e sensatez.
Os atos de violência, por irracionais e desnecessários que sejam, são capazes de justificarem a si mesmos quase imediatamente. A recompensa é clara quando a vontade do mais forte predomina sobre os dominados. Existe, afinal de contas, uma forma eficaz de esclarecer que os atos violentos são merecedores de constrangimento público? A meu ver o ciclo se renova cada vez que um ato violento precisa ser reprimido com outro ato ainda mais violento.