Zapolentando

Zapoletos, na obra de ficção de Thomas Morus ( A utopia), era um povo que vivia a quinhentas milhas a leste da Utopia. Eram selvagens, bárbaros e ferozes. Povo agreste, aptos a sofrer e suportar calor, o frio e o trabalho Para sobreviver, os zapoletos passam parte da sua existência na caça e na pilhagem.

Nascidos para guerra, vivem buscando motivos para a elas se entregarem. Vivem em bandos,  e oferecem os seus serviços por preços baixos a quem deles desejar. São, enfim, uns oportunistas; com uma vantagem: lutam com valentia, coragem e lealdade por aqueles que lhes pagam. Mas impõem uma condição:só aceitam se alistar na condição de, no dia seguinte, aderiram ao adversário se lhe pagarem melhor, e, novamente, voltarem para o senhores anteriores, por um pouco mais de dinheiro.

O zapoletos, como se constata, fizeram história e têm sequazes por todo lado, mesmo nos dias presentes, sobretudo no mundo da política,onde a fidelidade é matéria de pouco consumo, e donde se testemunha, ademais, a mudança de pensamento de acordo com a conveniência dos interessados.

O que tenho testemunhado, desde sempre, é que, pelo menos no mundo político, não se age por idealismo. Aliás, essa é uma constatação que tenho feito nos mais diferentes ambientes onde pontificam os agentes do Estado.

Tudo é muito fluido, muito efêmero, sem ideal, sem convicção, ao sabor das circunstâncias, na base do fico onde houver mais vantagem.

Infelizmente, são raros, raríssimos os homens públicos que mostram alguma coerência de ação, que se mantém fiel aos seus compromissos e às suas convicções. O comum, o corriqueiro, o trivial é a mudança de discurso, se for conveniente. E essa prática se tornou tão comum que as pessoas sequer se surpreendem com essas mudanças de atitude.

O homem público não pode agir como agem os zapoletos. Não pode lutar em duas frentes. Não pode acender uma vela para Deus outra para o diabo. Não pode fincar um pé aqui e outro acolá. Não pode“zapoletar”. Não pode aderir a quem der mais. Não pode pintar as cores da sua bandeira na base do agora chegou a minha vez ou na base do esqueça o que eu disse ontem pois hoje é um novo dia. Isso é pura canalhice, oportunismo, bandalheira, falta de pudor.

Mas essas reflexões valem também para eleitor. O eleitor tem que firmar posição. Tem que definir qual é a sua. Não pode votar não base da vantagem, não podem aderir por conveniência. Não pode ajustar o discurso ao sabor das circunstâncias.

Os zapoletas mudavam de lado ao sabor das circunstâncias. Muitas vezes, em face dessa mudança oportunista, se digladiavam com parentes mais próximos, pelo simples fato de terem sido arregimentados pelo príncipe inimigo. E aí, não importa se o sangue que derramam for da mesma origem.O que vale mesmo é a paixão e o dinheiro; dinheiro torrado, depois,  na devassidão mais torpe.

Autor: Jose Luiz Oliveira de Almeida

José Luiz Oliveira de Almeida é membro do Tribunal de Justiça do Estado do Maranhão. Foi promotor de justiça, advogado, professor de Direito Penal e Direito Processual Penal da Escola da Magistratura do Estado do Maranhão (ESMAM) e da Universidade Federal do Maranhão (UFMA).

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