A verdade não é moralmente neutra. A verdade é sempre transformadora. Daí por que o homem tem perseguido tanto a verdade.
Mas não se chega à verdade partindo de premissas equivocadas. Isso vale para o julgador, para o administrador ou para o legislador. Vale, ademais, para as nossas relações pessoais.
A busca da verdade sempre atormentou os homens. Os filósofos sempre a colocaram no centro das suas reflexões.
Mas a verdade é sempre algo muito complexo, daí que não são poucos os que a confundem com evidências, que dela se aproxima, mas verdade não é, conquanto possa contaminá-la, possa levar o sujeito do conhecimento a uma alucinação e, até, a comoção, que precisam, sem demora, ser exorcizadas, defenestradas do ambiente, sob pena de induzir a erros graves de avaliação e julgamento.
Um cidadão preso, logo após a prática do crime, com a res furtiva, pode não ter sido o roubador. Nesse caso, tem-se uma evidência, que pode, sim, não se transformar em verdade, ao longo da persecução criminal.
Ao lado disso, é preciso ter presente que as verdades que são indiscutíveis para alguns, podem não sê-lo para outros. Tudo depende do ponto de observação do sujeito do conhecimento; tudo depende da sua visão de mundo, das suas idiossincrasias, da sua ideologia, do meio em que vive. Por isso se diz, com Protágoras, que o homem é a medida de todas as coisas. Numa primavera em Atenas, dois homens podem, diante dela, ter conclusões diferentes acerca da temperatura. Para um visitante da Suécia, por exemplo, o clima é quente; um visitante do Egito, no mesmo ambiente, deve concluir que o clima está frito. Tem-se, assim, dois homens e duas verdades, avultando de importância o seu habitat natural.
O mesmo se dá quando se está diante da busca da verdade. A minha verdade, em face da minha formação cultural e moral, e de outros valores igualmente importantes, pode não ser a verdade de uma outra pessoa, cuja formação moral se tenha consolidada em ambiente diferente do meu.
Quem busca a verdade olhando, unicamente, para o seu umbigo ou olhando o mundo por um espelho, por exemplo, poderá jamais alcançar a verdade. Na primeira hipótese porque pensa que seu umbigo é o centro do universo; no segunda, porque só verá diante do espelho a sua imagem refletida. E a sua própria imagem já pode ser uma mentira. Partindo dela, portanto, o sujeito do conhecimento não chegará a lugar nenhum.
Nesse contexto, sem o discernimento do que está no entorno, a obliterar a visão, não se encontra a verdade; quando muito pode-se defrontar com uma evidência, que, já vimos, é um pouco menos que verdade; e quem tem o dever de julgar ou administrar, não deve, nunca, sob qualquer pretexto, decidir com esteio em evidências, tão somente. É preciso ir além, muito além.
Por isso, no enfrentamento de determinadas questões que condizem com a vida ou a liberdade das pessoas, é preciso ir além da primeira e precipitada avaliação, que pode, até, trazer conforto psicológico, mas não conduzirá à decisão mais justa. É preciso discernimento para estabelecer as premissas corretamente, caso contrário as conclusões serão sempre equivocadas, para não dizer injustas mesmo.
É por isso que, no exercício do poder, tem-se que decidir, sempre, estabelecendo corretamente as premissas que possam levar a uma conclusão mais próxima da verdade possível. Sob falsas premissas se constrói inverdades; inverdades que não servem bem a quem tem a obrigação de decidir acerca da vida das pessoas.
Um governante que escamoteia, dissimula, constrói bravatas, à luz de premissas equivocadas, pode, alfim e ao cabo, até decidir de acordo com os seus interesses, o fazendo, todavia, contra os interesses dos governados, que esperam dele, sempre, capacidade para separar o joio do trigo.
PS. Esse é mais um texto onde deixei apenas fluir o meu pensamento. É possível que, depois, eu mesmo constate os erros que agora não consigo vislumbrar. Peço compreensão.