Jogo esquizofrênico de poder

“[…]Mas acho que todos devemos, com as nossas ações, sem exceção, dar  bons exemplos,  sobretudo para novos magistrados, na certeza que eles, no futuro bem próximo, haverão de repudiar a pantomima, o jogo esquizofrênico de poder,  mercê de uma nova mentalidade que aos poucos vai se consolidando a olhos vistos[…].”

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Antes, um fato histórico, a guisa de introdução.

Pois bem. O acampamento de Cândido Mariano da Silva, futuro marechal Rondon, em Mato Grosso, foi atacado, em 21 de outubro de1907, pelos índios nhambiquara. Uma das flechas atingiu a bandoleira de couro de sua espingarda e outra feriu Rio Preto, o seu cão de caça. Cândido Mariano espantou os agressores com disparos feitos para o alto. Depois disso, travou uma luta íntima entre o desejo de vingança e a ponderação humanitária; optou pela última.

Agora, um fato atual.

Não sou do tipo vingativo! Não guardo mágoas! Não tenho ódio no coração! Por isso, imagino, sou feliz. Tudo o que se possa fazer em detrimento da minha pessoa, não abalará jamais as minhas convicções. Estou no exercício de uma ínfima parcela de poder, convicto de que sou servidor público; estou, portanto, a serviço do público e não a serviço dos meus interesses ou dos interesses de quem quer que seja. É assim que penso; é assim que tenho conduzido a minha carreira, na certeza de que, por ser assim, sou, muitas vezes incompreendido, afinal, para muitos, estar no poder e dele não tirar proveito é uma babaquice.

Ainda ontem conversei com uma colega dileta sobre a eleição para o Órgão Especial do Tribunal de Justiça, que ficou surpresa quando lhe relatei os bastidores do foi gestado para me alijar da disputa; que nem precisava, pois eu já me imaginava fora da disputa, pelas razões que todos conhecem. Mas era razoável que se deixasse que cada um fizesse a sua escolha, livremente.

Faço essas reflexões para registrar que, apesar de tudo, continuo com os olhos voltados para o bem da instituição, para servir a comunidade, independentemente de minhas eventuais mágoas em face de alguma ação pouco elogiável deflagrada contra a minha pessoa.

Não terei uma história profícua e exemplar como a do marechal Rondon, que não deixou que um sentimento de vingança modulasse a sua ação em face do ataque sofrido.  Mas acho que todos nós devemos, com as nossas ações, sem exceção, dar  bons exemplos,  sobretudo para novos magistrados, na certeza que eles, no futuro bem próximo, haverão de repudiar a pantomima, o jogo esquizofrênico de poder,  mercê de uma nova mentalidade que aos poucos vai se consolidando a olhos vistos.

Diante desse quadro, importa consignar que, se tenho de escolher entre a vingança e o perdão, prefiro perdoar quem trabalhou para me alijar da disputa; é o que de melhor posso fazer para o bem da instituição, que não tira nenhum proveito quanto as regras do jogo  são solapadas para atender a caprichos de quem não tem a exata dimensão do que seja uma disputa isenta e democrática.

Autor: Jose Luiz Oliveira de Almeida

José Luiz Oliveira de Almeida é membro do Tribunal de Justiça do Estado do Maranhão. Foi promotor de justiça, advogado, professor de Direito Penal e Direito Processual Penal da Escola da Magistratura do Estado do Maranhão (ESMAM) e da Universidade Federal do Maranhão (UFMA).

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