MONSTROS, SEDUTORES E OPRESSORES

Tendo assumido, recentemente, a Corregedoria-Geral de Justiça, deparei-me com números assustadores envolvendo a Violência Doméstica, para os quais lancei o meu olhar, desde o primeiro momento, buscando maior eficácia do Poder Judiciário quanto à punição dos transgressores, o que, de resto, já vinha sendo uma das minhas grandes preocupações, como magistrado e como cidadão, na medida em que a violência contra a mulher, como todos constatamos, tem números alarmantes/preocupantes, os quais decorrem da ação covarde/abominável dos que nomino monstros, sedutores e opressores.

Diante desse cenário, a inquietação, dentre outras, que me levou a pensar na construção dessa crônica, foi a minha incapacidade de conviver num ambiente de hostilidade e/ou de opressão – seja moral, seja física -, pois, nas minhas relações, sublimo a concórdia e a benquerença.

A propósito, trago à colação, para ilustrar, passagem relevante da nossa história, na qual desponta, com especial relevância, D. Pedro I, um dos nossos mais famosos monstros, sedutor e opressor.

Pois bem. A história dá-nos conta do tratamento desumano que D. Pedro I dispensava a Leopoldina, seduzida e, depois, desprezada por ele, que, ao que parece, sentia prazer em expor o lado mais perverso da sedução, em cujo cenário despontava, com especial destaque, como vetor para as agressões/humilhações, o tórrido romance que mantinha com a Marquesa de Santos.

Da última carta que D. Leopoldina enviou para sua irmã, Maria Luísa, ditada no seu leito de morte, apanho as passagens que reproduzo a seguir, pois que nelas está retratada, com tintas fortes, a sua angústia em face da ação opressora do, talvez, mais famoso monstro sedutor que habitou essas paragens.

“Minha adorada mana. Reduzida ao mais deplorável estado de saúde e chegada ao último ponto de minha vida, no meio dos maiores sofrimento, terei também a desgraça de não poder eu mesmo explicar-vos todos aqueles sentimentos que há tanto tempo existiam impressos na minha alma. Minha mana! Não a tornarei a ver! Não poderei outra vez repetir que vos amava e adorava. Pois já não posso ter esta tão inocente satisfação, igual a tantas outras que permitidas me não são, ouvi o grito da vítima que vós reclama não vingança, mas piedade e socorro de fraternal afeto para inocentes filhos que órfãos vão ficar em poder de pessoas que foram autores de minhas desgraças, reduzindo-me ao estado em que me acho, de ser obrigada a servir-me de intérprete para fazer chegar até vós os últimos rogos da minha aflita alma”.

Prossegue a princesa:

“Há quase quatro anos, minha adorada mana, como vos tenho escrito, que por amor a um monstro sedutor me vejo reduzida ao estado de maior escravidão e totalmente esquecida do meu adorado Pedro. Ultimamente, acabou de dar-me a última prova de seu total esquecimento, maltratando-me na presença daquela mesma que é a causa de todas as minhas desgraças”.

A propósito, alguns historiadores registram que D. Leopoldina fora tratada a pontapés por D. Pedro I, estando grávida. Mas não há testemunhas desse fato, razão pela qual não se pode afirmar, com certeza, que essas agressões tenham ocorrido, efetivamente.

Digo agora, em arremate, que nós, magistrados, responsáveis por uma relevante instância de controle social, devemos, diante de fatos que tais, com especial determinação, agir para punir, exemplarmente, os transgressores, convindo anotar que o que de pior se pode fazer, em face de uma situação de violência doméstica, é aconselhar a mulher a “baixar o facho”, como sugeriu o promotor de justiça Antônio de Sousa Filho, de uma Vara de Família do Espírito Santo, a Alessandra Sousa, depois de ouvir dela sobre os mais de 23 anos de sofrimento vividos sob o jugo de um desses monstros, sedutores e opressores que habitam entre nós.

É isso.

Autor: Jose Luiz Oliveira de Almeida

José Luiz Oliveira de Almeida é membro do Tribunal de Justiça do Estado do Maranhão. Foi promotor de justiça, advogado, professor de Direito Penal e Direito Processual Penal da Escola da Magistratura do Estado do Maranhão (ESMAM) e da Universidade Federal do Maranhão (UFMA).

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