Sentença condenatória. Porte Ilegal de Arma de Fogo de uso restrito.

“Réu com vida ante acta imaculada, não pode receber a mesma resposta penal infligida aos acusados com vida pregressa prenhe de deslizes.”
Juiz José Luiz Oliveira de Almeida
Titular da 7ª Vara Criminal

 

Cuida-se de sentença condenatória, em face do crime de porte ilegal de arma de fogo de uso proibido.

Um dos pontos polêmicos da decisão condiz com os antecedentes do acusado, para fins de majoração da resposta penal.

Antecipo, a seguir, alguns fragmentos acerca dessa questão.

 

  1. Na minha avaliação, o acusado, conquanto tenha bons antecedentes, à luz do princípio da presunção de inocência, não os tem à luz de sua vida ante acta.
  2. É cediço que quem responde a três ações penais, não pode, apenas porque presumidamente inocente, receber a pena mínima, nas mesmas condições de quem só tem uma incidência penal.
  3. Pensando dessa forma, ou seja, que o acusado tem maus antecedentes (lato sensu), à luz de sua vida ante acta, compreendo que deve suportar a exacerbação da resposta penal, traduzida em aumento das penas-base.
  4. Do meu ponto de observação, só deve ser contemplado com a pena mínima os réus que não tenham nenhuma mácula em sua vida pregressa. 
  5. Para mim seria um despautério tratar igualmente duas situações dispares. 

 

Agora, a sentença, por inteiro.


PODER JUDICIÁRIO
FORUM DA COMARCA DE SÃO LUIS
JUIZO DA 7ª VARA CRIMINAL
SÃO LUIS-MARANHÃO

 

PROCESSO Nº 94252008
AÇÃO PENAL PÚBLICA
ACUSADO: I. P.
VÍTIMA: INCOLUMIDADE PÚBLICA


Vistos, etc.


Cuida-se de ação penal que move o MINISTÉRIO PÚBLICO contra I. P., devidamente qualificado nos autos, por incidência comportamental no artigo 16 do ESTATUTO DO DESARMAMENTO, em face de, no dia 14 de abril de 2008, ter sido preso e autuado em flagrante portando uma pistola marca Taurus, PT 99, calibre 9mm, nº TPH09163, com carregador contendo dez munições intactas do mesmo calibre.
A persecução criminal teve início com a prisão em flagrante do acusado. (fls. 06/10)
Termo de apresentação e apreensão às fls. 12.
Recebimento da denúncia às fls. 100/101.
O acusado foi qualificado e interrogado às fls. 125/126.
Defesa prévia às fls. 133/134.
Exame em arma de fogo às fls. 155/156.
Durante a instrução criminal foram ouvidas as testemunhas D. T. C. (fls. 192/193) e M. C. L. L..(fls.194)
Na fase do 499 nada foi requerido pelas partes.(fl.s 199 203v.e 208)
Na as alegações finais o MINISTÉRIO PÚBLICO pediu a condenação do acusado nos termos da denúncia. (fls.210/214)
A defesa, de seu lado, pediu a absolvição do acusado, nos termos do artigo 386, VI, do CPP.(fls.219/220)


Relatados. Decido.

01.00. O MINISTÉRIO PÚBLICO denunciou I. P., porque o mesmo, com sua ação, teria hostilizado o artigo 16 do ESTATUTO DO DESARMAMENTO.
02.00. Ressai da prefacial que o acusado, no dia 14 de abril de 2008, foi preso e autuado em flagrante portando uma pistola marca Taurus, PT 99, calibre 9mm, nº TPH09163, com carregador contendo dez munições intactas, do mesmo calibre.
03.00. As provas, em face da ação do acusado, foram produzidas em dois momentos distintos: sedes administrativa e judicial.
04.00. Na fase inaugural da persecução criminal destacam-se

I – a negativa de autoria do acusado,
II – o auto de apresentação e apreensão,
III – bem assim os depoimentos dos policiais que efetuaram a prisão do mesmo.(fls. 06/12)

05.00. Com esses dados, foi deflagrada a persecução criminal, no seu segundo momento, tendo o MINISTÉRIO PÚBLICO, como suso mencionado, denunciado I. P. por incidência comportamental no artigo 16 do ESTATUTO DO DESARMAMENTO.
06.00. Da segundo fase da persecução criminal assoma, com especial carga probatória, a confissão do acusado, feita nos termos a seguir transcritos, verbis:
“…que é verdadeira a imputação que lhe é feita; que estava, realmente, portando uma pistola marca Taurus PT 99, calibre 09mm, contendo dez munições intactas; que jogou a arma fora por temeu ser preso, com a chegada da polícia; que estava armado porque trabalha no Portinha e que já tinha sido assaltada…” (cf. fls.125)

07.00. Além do acusado, foi ouvido, nesta sede, o moto-taxista, D. T. C., que o conduzia, ao tempo de sua prisão.
08.00. A testemunha em comento confirmou que o acusado, no dia do fato, jogou a arma no chão, quando foram abordados pela Polícia.(fls. 192)
09.00. O depoimento de D. T. C. foi ratificado pelo depoimento da testemunha M. C. L. L., policial militar que fazia parte do batalhão que prendeu o acusado.(fls.194)
10.00. A arma apreendida foi periciada, tendo os experts concluído estar a mesma em condições de efetuar disparos.(fls.155/156)
11.00. Depois de analisada o patrimônio probatório consolidados nas duas fases da persecução criminal – sedes administrativa e judicial – concluo, sem a mais mínima dúvida, que o acusado, com sua ação, malferiu, sim, o preceito primário do artigo 16 do ESTATUTO DO DESARMAMENTO.
12.00. O acusado, agora, em face de sua ação, deverá receber do Estado a correspondente sanção penal, preconizadas no preceito secundário do artigo antes mencionado.
13.00. Do que restou colacionado, não há dúvidas de que o acusado, ao ser preso, portava arma de fogo de uso restrito (cf. dec. nº 3.665, de 20 de novembro de 2000), daí a subsunção de sua ação no tipo penal do artigo 16 da Lei 10.826, de 22 de dezembro de 2003.
14.00. Importa dizer que, in casu, para conformação típica, é suficiente que o agente pratique qualquer das condutas reguladas – possuir, deter, portar, ter em depósito, transportar, manter sob guarda e ocultar -, independentemente de finalidade específica.
15.00. Convém anotar, ademais, que, para configuração penal das condutas típicas preconizadas no artigo 16 do ESTATUTO DO DESARMAMENTO, exige-se, em complemento, que a conduta tenha sido praticada sem autorização e em desacordo com determinação legal ou regulamentar, como, efetivamente, se deu no caso sob análise.
16.00. De se grafar, noutro giro, que aqui está-se a cuidar de crime consumado, pois que, tratando-se da espécie em comento, a consumação se verifica com a prática das condutas proibidas.
15.00. O acusado, não há dúvidas, portava, ou seja, trazia consigo arma de fogo de uso restrito, daí que, por isso, incidiu nas penas do artigo 16 antes mencionado, devendo, agora, por conseqüência, suportar a inflição de penas – restritiva de liberdade e multa.
16.00. Definido, quantum satis, que o acusado vilipendiou a ordem jurídica, importa, agora, analisar as circunstancias judiciais do artigo 59 do CP, para fins de fixação das penas-base.
17.00. O acusado, ao que dimana da certidão de fls. 62, responde a mais uma ação penal, na 9ª Vara Criminal, sob o nº 217642005 e foi preso em flagrante em mais duas oportunidades.
18.00. O acusado, por ocasião do seu interrogatório, disse que responde a mais duas ações penais – uma na 3ª Vara Criminal, por porte ilegal de arma, e outra na 9ª Vara Criminal, por assalto.(fls.125)
19.00. Na minha avaliação, o acusado, conquanto tenha bons antecedentes, à luz do princípio da presunção de inocência, não os tem à luz de sua vida ante acta.
20.00. É cediço que quem responde a três ações penais, não pode, apenas porque presumidamente inocente, receber a pena mínima, nas mesmas condições de quem só tem uma incidência penal.
21.00. Pensando dessa forma, ou seja, que o acusado tem maus antecedentes (lato sensu), à luz de sua vida ante acta, compreendo que deve suportar a exacerbação da resposta penal, traduzida em aumento das penas-base.
22.00. Do meu ponto de observação, só deve ser contemplado com a pena mínima os réus que não tenham nenhuma mácula em sua vida pregressa.
23.00. Para mim seria um despautério tratar igualmente duas situações dispares.
23.01. Réu com vida ante acta imaculada, não pode receber a mesma resposta penal infligida aos acusados com vida pregressa prenhe de deslizes.
24.00. TUDO DE ESSENCIAL POSTO E ANALISADO, JULGO PROCEDENTE a denúncia, para, de consequencia,

CONDENAR I. P., brasileiro, autônomo, filho de J. S. P. e de M. A. P., residente e domiciliado na Rua Riacho Doce, nº 37, Vila Embratel, nesta cidade, cujas penas-base fixo em 4(quatro) anos de reclusão e 15 (quinze)DM, à razão de 1/30 do SM vigente à época do fato, sobre as quais faço incidir menos 06(seis) meses e menos, 03(três)DM, em face da circunstância atenuante prevista no artigo 65, III, d, do Digesto Penal, tornando-as, definitivamente, em 03(três) anos e 06(seis) meses de reclusão e 12(doze) DM, devendo a pena privativa de liberdade ser cumprida, inicialmente, em regime semi-aberto, ex vi do §3º, do artigo 33, do Digesto Penal.

P.R.I.C.
Custas, na forma da lei.
Com o trânsito em julgado, remetam-se os autos à distribuição, para os devidos fins.
Lance-se, antes, no nome no réu no rol dos culpados.
Dê-se baixa, após, em nossos registros.

São Luis, 17 de março de 2009.

Juiz JOSÉ LUIZ OLIVEIRA DE ALMEIDA
Titular da 7ª Vara Criminal

Autor: Jose Luiz Oliveira de Almeida

José Luiz Oliveira de Almeida é membro do Tribunal de Justiça do Estado do Maranhão. Foi promotor de justiça, advogado, professor de Direito Penal e Direito Processual Penal da Escola da Magistratura do Estado do Maranhão (ESMAM) e da Universidade Federal do Maranhão (UFMA).

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