No voto a seguir publicado, cuidei de prescrição em face de ilícito administrativo. O Tribunal Pleno, por unanimidade, declarou extinta a punibilidade da sindicada, tendo por argumentos os albergados no voto em comento.
Em determinado fragmento anotei:
“[…]”A verdade é que a administração pública, in casu sub examine, descurou-se de suas obrigações, permitindo, por omissão, que o feito em comento fosse fulminado pelo decurso do tempo, consolidando uma situação aparentemente conflituosa, como consequencia da teoria do fato consumado.
O tempo, é consabido, tem, sim, a força de estabilizar a relação do agente com o Poder Público, não como forma de estímulo à possíveis irregularidades, mas sim para manter efetiva a paz social. A isso dá-se o nome de segurança jurídica. Mesma segurança jurídica que, em face do decurso do tempo, convalida, ad exempli, o ato nulo e anulável, na esfera administrativa.
Importa consignar, nessa senda, que um dos interesses fundamentais do Direito é a estabilidade das relações constituídas.”[…]”
A seguir, o voto, por inteiro.
SINDICÂNCIA Nº 6399/2004-TJ
SINDICADA: O.G.
INCIDÊNCIA PENAL: ARTIGO 3º, ALÍNEA A, 4º, ALÍNEA A E HA, DA LEI 4898/65
RELATOR: DESEMBARGADOR JOSÉ LUIZ OLIVEIRA DE ALMEIDA
VOTO
Li, com o necessário vagar e costumeiro desvelo, os termos da representação formulada por Raimundo Soares Cutrim, então Gerente de Justiça e Segurança Pública do Estado do Maranhão, em desfavor de O. G., juíza de Direito, titular da titular da 11ª vara da Fazenda Pública desta comarca.
Em vista da representação formulada, entrevejo que a pena mais grave que se poderia infligir à representada, na hipótese de serem verdadeiros os fatos narrados na representação, alfim de um regular processo administrativo, seria a pena de censura, ao argumento de que tivesse adotado algum procedimento incorreto, à luz do que prescrevem os artigos 42, II, e 44, ambos da Loman.
Nessa linha argumentativa, anoto – sempre em vista dos fatos albergados na representação – que restaria inviável, porque desproporcional, infligir à sindicada as penas de: I – remoção compulsória; II – disponibilidade com vencimentos proporcionais ao tempo de serviço; III – aposentadoria compulsória com vencimentos proporcionais ao tempo de serviço e; IV – demissão, previstas na Loman, nos incisos III, IV, V e VI, do artigo 42.
Vou explicar. A remoção é a pena intermediária entre a censura e a disponibilidade. Pouco utilizada, ela visa retirar o magistrado do local onde exerce suas funções. Ela se destina aos casos em que o juiz se envolve em situação de fato que o impede de exercer, com acerto, suas funções. Não é o caso presente, como se pode ver, pois que não há dados que permitem concluir que a sindicada tenha se envolvido em algum conflito com a sociedade, que autorizasse a sua remoção.
A disponibilidade e a aposentadoria compulsória são as sanções aplicadas aos casos mais graves. Disponível é o que se pode dispor. Juiz em disponibilidade significa que ele poderá ser convocado a atuar a qualquer momento, ao critério discricionário da administração do Tribunal. Enquanto isto não se dá, ele recebe seus vencimentos de forma proporcional ao tempo de serviço.
Seria um exagero, a meu ver, sequer cogitar-se em infligir esse tipo de sanção à sindicada, em face dos fatos albergados na representação.
Nós não podemos nos dar ao luxo – e aqui me permito fazer uma digressão – de dispensar os préstimos da representada, que, ao que pude compreender – pelo que há nos autos e pelo conhecimento pessoal que tenho – pecou por excesso, por querer acertar, por ser cumpridora, extremada cumpridora de suas obrigações.
Voltando ao tema que estimulou a digressão, anoto que a aposentadoria, como medida punitiva, destina-se a idêntica situação, com a diferença de que o juiz já tem tempo para aposentar-se. Como não o faz voluntariamente, o tribunal pode fazê-lo, como sanção administrativa. Seus vencimentos serão integrais, como o de todos os demais magistrados.
A pena de demissão, que é a última do rol do artigo 42. Essas, por óbvias razões, não se há sequer de cogitar, em face das acusações imputadas à sindicada.
A considerar, pois, a pena de censura, a par da representação formulada, tendo em vista que não houve indiciamento, ter-se-á de convir que a pretensão punitiva do Estado foi fulminada pela prescrição, à luz do que prescreve o inciso II, do artigo 142 do Estatuto dos Funcionários Públicos ( Lei 8112/90), aplicado à espécie, subsidiariamente, vez que a Loman não cuidou dos prazos prescricionais.
E por que estaria prescrita a pretensão punitiva? Porque passaram-se mais de cinco anos da única causa interruptiva de prescrição (adiante, reflexões sobre essa questão, a propósito das manifestações dos nossos Sodalícios acerca dos §§3º e 4º, do artigo 142, do Estatuto dos Funcionários Públicos) que foi a portaria (cf. fls 72), que determinou a instauração da sindicância, como se pode inferir do §4º, do artigo 142, do Estatuto dos Funcionários Públicos, aqui, também, aplicado subsidiariamente.
Reafirmo que, a considerarem-se os termos da representação e a pena em perspectiva, na hipótese de serem tidos como verdadeiros os fatos albergados na representação sob retina, depois de regular processamento, asseguradas todas as franquias constitucionais da requerida, a ser infligida à sindicada, seria a de censura, à luz do princípio da proporcionalidade.
Nesse sentido, à vista do que preconiza o artigo 142 e incisos do Estatuto dos Funcionários Públicos Civis da União, o prazo de prescrição, in casu sub examine, é de dois anos, já fluidos, na pior das hipóteses, a contar da causa interruptiva antes mencionada.
Nessa direção têm decido os nossos Tribunais:
Ementa.ADMINISTRATIVO. MAGISTRADO ESTADUAL. PENALIDADE. CENSURA. PRESCRIÇÃO. PRAZO. LEGISLAÇÃO. APLICAÇÃO SUBSIDIÁRIA DA LEI Nº 8.112/90. GARANTIA. UNICIDADE. TRATAMENTO. MAGISTRATURA NACIONAL. I – A Lei Orgânica da Magistratura Nacional – LOMAN é silente acerca da prescrição administrativa das penalidades nela previstas. Nessa hipótese, o Superior Tribunal de Justiça decidiu ser possível a aplicação analógica da Lei nº 8.112/90 a magistrado federal. Na ocasião concluiu, também, que o lapso a ser observado em relação à pena de censura, previsto no referido Estatuto da Magistratura, seria semelhante àquele relativo à pena de suspensão, elencada no Regime Jurídico Único dos Servidores Públicos Civis da União. II – O art. 93 e seguintes da Constituição da República, além de fixarem os princípios, garantias e deveres básicos inerentes aos magistrados, remeteram à lei complementar federal a disciplina das demais questões inerentes à magistratura. III – Preocupação demonstrada, pelo Constituinte, no sentido de conceder tratamento isonômico a todos os integrantes da magistratura nacional, sejam eles juízes vinculados à União ou aos Estados-membros. IV – A questão da prescrição das penalidades cometidas por magistrado, sem dúvida, por estar diretamente ligada ao exercício do cargo, é matéria a ser tratada no Estatuto da Magistratura. Entretanto, por ser a atual legislação vigente omissa quanto a esse aspecto e, sendo necessário o tratamento uniforme da matéria, é aplicável subsidiariamente o Estatuto dos Servidores Públicos Civis da União, ainda que se trate de juiz estadual. V – Interpretando o artigo 142 e demais artigos relativos ao tema, insertos na Lei nº 8.112/90, o Supremo Tribunal Federal concluiu que, embora haja a interrupção da prescrição com a instauração do processo administrativo, recomeçará o início da fluência do lapso prescricional quando ultrapassados 140 (cento e quarenta) dias sem que tenha havido a conclusão do processo disciplinar, porquanto esse seria o prazo legal para seu término. VI – In casu, ocorreu a instauração da representação em 13 de agosto de 1997, por decisão da Corte Superior do Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais, sendo que, adicionando 140 dias à data, temos que o direito de punir tinha como prazo final o dia 30 de dezembro de 1999. VII – O julgamento definitivo ocorreu em 27 de outubro de 1999, com a publicação da decisao em 17 de dezembro do mesmo ano, tendo sido, portanto, proferido antes que houvesse a prescrição. Recurso desprovido (STJ – RECURSO ORDINÁRIO EM MANDADO DE SEGURANÇA: RMS 13439 MG 2001/0090911-0 Resumo: Administrativo. Magistrado Estadual. Penalidade. Censura. Prescrição. Prazo. Legislação. Aplicação Subsidiária da Lei Nº 8.112/90. Garantia. Unicidade. Tratamento. Magistratura Nacional.
No mesmo diapasão :
Ementa RECURSO ORDINÁRIO EM MANDADO DE SEGURANÇA. ADMINISTRATIVO. MAGISTRADO ESTADUAL. PENA DE CENSURA. PRAZO PRESCRICIONAL. AUSÊNCIA DE PREVISÃO NA LOMAN. APLICAÇÃO, EM CARÁTER SUBSIDIÁRIO, DA LEI N.º 8.112/90 (ART. 142, INCISO II). RECONHECIMENTO DA PRESCRIÇÃO DA PRETENSÃO PUNITIVA. ANULAÇÃO DA PENALIDADE APLICADA. 1. Este Superior Tribunal de Justiça firmou orientação no sentido de que, tendo em vista a ausência de previsão na Lei Orgânica da Magistratura Nacional (LOMAN)sobre o prazo prescricional para apuração de infrações disciplinares cometidas por magistrados, deve ser aplicado, em caráter subsidiário, o Regime Jurídico dos Servidores Publicos Civis da União (Lei n.º 8.112/90)e, ainda, que a pena de censura, prevista naquele diploma legal, está sujeita à prescrição bienal de que trata o art. 142, inciso II, da Lei n.º 8.112/90. 2. A contagem do prazo prescricional, interrompida com a instauração do processo administrativo disciplinar, volta a correr por inteiro após o transcurso de 140 (cento e quarenta) dias, prazo máximo para o encerramento do processo disciplinar, nos termos dos precedentes desta Corte e do Supremo Tribunal Federal. 3. No caso em tela, a instauração do procedimento disciplinar contra o magistrado, ora Recorrente, ocorreu 05/11/1998. Em 25/03/1999 encerrou-se o prazo de 140 (cento e quarenta) dias para a sua conclusão, voltando a correr por inteiro o lapso prescricional bienal, o qual, por sua vez, findou-se em 26/03/2001. Assim, quando aplicada a pena de censura ora combatida, em 17/05/2002, já estava prescrito o direito de punir do Estado. 4. Recurso ordinário provido para declarar a prescrição da pretensão punitiva estatal quanto à falta administrativa imputada ao Recorrente, restando, por conseguinte, desconstituída a pena de censura a ele imposta. Julgo prejudicadas as alegações aventadas em caráter alternativo. STJ – RECURSO ORDINÁRIO EM MANDADO DE SEGURANÇA: RMS 19609 SP 2005/0025098-2 Resumo: Recurso Ordinário em Mandado de Segurança. Administrativo. Magistrado Estadual. Pena de Censura. Prazo Prescricional. Ausência de Previsão na loman. Aplicação, em Caráter Subsidiário, da Lei N.º 8.112/90 (art. 142, Inciso Ii). Reconhecimento da Prescrição da Pretensão Punitiva.
O Supremo Tribunal Federal não discrepa:
EMENTA: ADMINISTRATIVO. MAGISTRADO ESTADUAL. PENALIDADE. CENSURA. PRESCRIÇÃO. PRAZO. LEGISLAÇÃO. APLICAÇÃO SUBSIDIÁRIA DA LEI Nº 8.112/90. GARANTIA. UNICIDADE. TRATAMENTO. MAGISTRATURA NACIONAL. I – A Lei Orgânica da Magistratura Nacional – LOMAN é silente acerca da prescrição administrativa das penalidades nela previstas. Nessa hipótese, o Superior Tribunal de Justiça decidiu ser possível a aplicação analógica da Lei nº 8.112/90 a magistrado federal. Na ocasião concluiu, também, que o lapso a ser observado em relação à pena de censura, previsto no referido Estatuto da Magistratura, seria semelhante àquele relativo à pena de suspensão, elencada no Regime Jurídico Único dos Servidores Públicos Civis da União. […] IV – A questão da prescrição das penalidades cometidas por magistrado, sem dúvida, por estar diretamente ligada ao exercício do cargo, é matéria a ser tratada no Estatuto da Magistratura. Entretanto, por ser a atual legislação vigente omissa quanto a esse aspecto e, sendo necessário o tratamento uniforme da matéria, é aplicável subsidiariamente o Estatuto dos Servidores Públicos Civis da União, ainda que se trate de juiz estadual. V – Interpretando o artigo 142 e demais artigos relativos ao tema, insertos na Lei nº 8.112/90, o Supremo Tribunal Federal concluiu que, embora haja a interrupção da prescrição com a instauração do processo administrativo, recomeçará o início da fluência do lapso prescricional quando ultrapassados 140 (cento e quarenta) dias sem que tenha havido a conclusão do processo disciplinar, porquanto esse seria o prazo legal para seu término. VI – In casu, ocorreu a instauração da representação em 13 de agosto de 1997, por decisão da Corte Superior do Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais, sendo que, adicionando 140 dias à data, temos que o direito de punir tinha como prazo final o dia 30 de dezembro de 1999. VII – O julgamento definitivo ocorreu em 27 de outubro de 1999, com a publicação da decisao em 17 de dezembro do mesmo ano, tendo sido, portanto, proferido antes que houvesse a prescrição. Recurso desprovido. (RMS 13439) (grifos meus) 7. Nesse fluxo de ideias, tenho que o prazo de prescrição começa a contar da data em que o fato se tornou conhecido (§ 1º do art. 142 da Lei 8.112/1990). Prazo que se interrompe com a abertura do processo disciplinar e retoma sua fluência quando ultrapassados 140 (cento e quarenta) dias sem que tenha havido a conclusão do processo disciplinar (MS 23299). Ora, segundo informa o próprio impetrante, o processo disciplinar foi aberto em 16/05/2007. Daí que a o prazo de prescrição recomeçaria a fluir a partir de 03/10/2007 e consumar-se-ia tão somente em 02/10/2009. 8. À derradeira, é juridicamente plausível que o Conselho Nacional de Justiça, em sua função constitucional de revisão dos processos disciplinares de Juízos e de membros de Tribunais julgados a menos de um ano (inc. V do § 4º do art. 103B da CF), possa exercer sua competência no caso de sanção disciplinar não aplicada pelo arquivamento do processo disciplinar por falta de quorum. É o que me parece cabível, pelo menos neste juízo prefacial das coisas. 9. Pelo exposto, indefiro o pedido de medida liminar. 10. Publique-se. Após, dê-se vista ao Exmo. Sr. Procurador-Geral da República. Brasília, 15 de setembro de 2009. Ministro CARLOS AYRES BRITTO Relator
Na trilha da moldura jurisprudencial aqui trazida à colação, impede consignar que desde 1976 o STF fixou o entendimento segundo o qual a prescrição, no processo administrativa, tem limite, – ao contrário do que preconiza, equivocadamente, a Lei 8.112/90, tema sobre o qual vou me deter logo a seguir – como se vê infere do excerto abaixo, extraído do voto do Min. Moreira Alves:
“E, em matéria de prescrição em nosso sistema jurídico, inclusive no terreno do direito disciplinar, não há que se falar em in singulare, uma vez que a regra é a prescritibilidade”
A propósito do que estabelecem os §§3º e 4º, do artigo 142 do Estatuto dos Funcionários Públicos, convém que se faça uma análise moderado do seu alcance, sob pena de tornar imprescritível o direito de punição do servidor, pela simples instauração de uma sindicância.
Essa questão – antecipada acima – já foi enfrentada e de há muito pacificada no e. Supremo Tribunal Federal, como se pode ver do escorreito voto do Min. Marco Aurélio, no RMS nº 23.436/DF, verbis:
“[…] Por outro lado, não se coaduna com o nosso sistema constitucional, especialmente no campo das penas, sejam de índole criminal ou administrativa, exceto relativamente ao crime revelado pela ação de grupos armados, civis ou militares, contra a ordem constitucional e o Estado democrático – inciso XLIV do art. 5º, da CF/88, a inexistência de prescrição. Inconcebível é que se entenda, interpretando os preceitos da Lei nº 8.112, de 11 de dezembro de 1990, que, uma vez aberta a sindicância ou instaurado o processo disciplinar, não se cogite mais, seja qual foi o tempo que se leve para a conclusão do feito, da incidência da prescrição. É sabido que dois valores se fazem presentes: o primeiro, alusivo à Justiça, a direcionar a possibilidade de ter-se o implemento a qualquer instante; já o segundo está ligado à segurança jurídica, à estabilidade das relações e, portanto, à própria paz social que deve ser restabelecida num menor tempo possível. Não é crível que se admita encerrar a ordem jurídica verdadeira espada de Dâmodes a desabar sobre a cabeça do servidor a qualquer momento.”
Antes, o mesmo Sodalício, em decisão relatada pelo e. Min. Ilmar Galvão, decidiu no mesmo diapasão, verbis:
“A regra, é certo, acabou por consagrar-se no artigo 142,§3º, do novo estatuto acima referido, que atribui efeito interruptivo da prescrição à instauração de processo disciplinar, ou à abertura de mera sindicância, explicitando, ainda, que a interrupção da prescrição ‘até a decisão final proferida por autoridade competente’, norma que está a merecer moderada interpretação, sob pena de tornar imprescritível, pela instauração de simples sindicância, o direito de punição do servidor faltosos, o que, em absoluto, não se coadnua com os princípios que informam o nossos sistema jurídico’
O pleno do STF, fiel a toda construção jurisprudencial acerca do tema sob retina, no ano 1998, no MS nº 22728/PR, seguindo voto do Min. Moreira Alves, em outra decisão lapidar, unificou, a uma só voz, a regra da prescrição intercorrente no processo disciplinar, litteris:
“[…] não há como sustentar-se que, em se tratando de processo disciplinar, aberta a sindicância ou instaurado o processo disciplinar haja a interrupção do prazo de prescrição que começa a correr de novo e por inteiro a partir do próprio fato interruptivo, à semelhança de como sucede no direito penal. A interpretação mais consentânea com o sistema dessa Lei – que no artigo 169,§2º, admite que a autoridade julgadora, que pode julgar fora do prazo legal, seja responsabilizada quando der causa à prescrição de infrações disciplinares capituladas também como crime, o que implica dizer que o prazo de prescrição pode correr antes da decisão final do processo – é a que, em se tratando de inquérito, instaurado este a prescrição é interrompida, voltando esse prazo a correr novamente por inteiro a partir do momento em que a decisão definitiva não se der no prazo máximo de conclusão do inquérito, que é de 140 dias ( artigos 152, caput, combinado com o artigo 169,§2º, ambos da Lei 8.112/90)
O advogado Mauro Roberto Gomes de Mattos, vice-presidente do Instituto Ibero Americano de Direito Público, também refletiu, com sabedoria, acerca dessa questão, como se infere dos excertos abaixo transcritos, capturados na internet, no artigo “PRESCRIÇÃO DO PROCESSO DISCIPLINAR COMEÇA A FLUIR DA DATA DO FATO INVESTIGADO”:
“[…]Não bastassem estas ilegais divergências, o fato jurídico irracional é que o disposto no parágrafo primeiro traz ao ordenamento jurídico exatamente o contrário do que se espera dele, visto que a insegurança jurídica, desde o período da história Medieval não é mais admitida e, em nome da estabilidade das relações jurídicas, o STF colocou limites no disposto pelo parágrafo 3º, do art. 142, da Lei nº 8.112/90, que propugnava pela interrupção da prescrição ad eternum, até que decisão final fosse proferida por autoridade competente quando da abertura de sindicância ou a instauração de processo disciplinar.
Estabeleceu-se, na hipótese do parágrafo 3º, do art. 142, da Lei sub oculis que o texto legal é inverso, ou seja, prevalece a “prescrição intercorrente” no procedimento administrativo disciplinar, não vigorando a interrupção da prescrição, (9) tal qual ocorre no direito penal.
Assim, houve a devida e necessária adaptação dos §§ 3º e 4º, da Lei nº 8.112/90, à Constituição Federal, que estipula como imprescritíveis apenas os crimes de racismo, o ressarcimento ao erário e crime praticado pela ação de grupos armados, civis ou militares, contra a ordem constitucional e o Estado Democrático. Fora dessas situações legais, a regra é justamente a da prescritibilidade dos atos e fatos praticados.
Por esta razão, o STF estabeleceu, com ampla aceitação doutrinária, a regra da prescrição intercorrente no processo disciplinar e adequando os efeitos da redação dos parágrafos 3º e 4º, do art. 142, da Lei nº 8.112/90, a realidade de nosso ordenamento jurídico.
Sucede que é necessário um redimensionamento da interpretação do retromencionado § 1º, do art. 142, da Lei nº 8.112/90, por parte da doutrina e da jurisprudência, tendo em vista que ele afronta a regrada prescritibilidade, deixando indefinida a situação jurídica, em total colisão à segurança e a estabilidade que vigoram no ordenamento legal.
Portanto, deixamos explícito o nosso posicionamento quanto à presente ilegalidade legislativa, que deverá ser interpretada com o devido e o necessário ponderamento jurídico, sob pena de criar um grande desserviço ao direito[…]”
A Loman, reafirmo, não estabeleceu critérios acerca da fluência dos prazos prescricionais das sanções administrativas aplicáveis a magistrados, nem regulamentou as condutas de alguns tipos disciplinares.
Tendo em vista o caráter nacional da magistratura, a jurisprudência, como se viu acima, entendeu se devesse aplicar aos magistrados o regime de prescrição das sanções disciplinares dos servidores públicos federais normatizado pela lei n. 8112/90, afastada a eficácia dos preceitos que conduzem à imprescritibilidade dos ilícitos administrativos.
Nesse contexto, a busca supletiva do Estatuto dos Funcionários Públicos se impõe, pois que, se assim não o fosse, estar-se- ia a defrontar o absurdo da imprescritibilidade dos ilícitos praticados pelos funcionários públicos, numa flagrante antinomia com o que prescreve a Carta Republicana de 1988.
O Conselho Nacional de Justiça deliberou que o processo administrativo destinado à apuração de faltas disciplinares perpetradas por juizes passou a ser regido pela Resolução nº 30/2007, que, é verdade, inovou em matéria procedimental, mas, no mesmo passo, manteve o mesmo sistema da Lei 8.112/90, no que se refere à prescrição e à contagem do seu prazo.
A resolução em comento, expressamente admite a aplicação subsidiária da Lei 8.112/90, conforme vejo do seu artigo 24, verbis:
Aplicam-se aos procedimentos disciplinares contra magistrados, subsidiariamente as normas e princípios das Leis nºs 8.112/90 e 9.784/99.
No mesmo sentido dispõe o artigo 83, do Regimento Interno do Conselho Nacional de Justiça, verbis:
O processo disciplinar instaurado contra magistrado obedecerá ao procedimento ditado no Estatuto da Magistratura, inclusive no que concerne à aplicação pelo Conselho das penas disciplinares respectivas, aplicando-se, no que for compatível, a Lei nº 8.112/90 e Lei 9.784/99.
A verdade é que a administração pública, in casu sub examine, descurou-se de suas obrigações, permitindo, por omissão, que o feito em comento fosse fulminado pelo decurso do tempo, consolidando uma situação aparentemente conflituosa, como consequencia da teoria do fato consumado.
O tempo, é consabido, tem, sim, a força de estabilizar a relação do agente com o Poder Público, não como forma de estímulo à possíveis irregularidades, mas sim para manter efetiva a paz social. A isso dá-se o nome de segurança jurídica. Mesma segurança jurídica que, em face do decurso do tempo, convalida, ad exempli, o ato nulo e anulável, na esfera administrativa.
Importa consignar, nessa senda, que um dos interesses fundamentais do Direito é a estabilidade das relações constituídas. É necessário, nesse contexto, a pacificação dos vínculos estabelecidos, a fim de preservar a ordem.
O tempo, máxime no Direito Administrativa, tem o poder, sim, de convalidar certas situações, no afã de tranquilizar as relações que não comprometam o interesse público.
Compreendo que, por força do tempo, tem-se, aqui, um fato consumado, uma situação fática construída e consolidada, que não pode mais ser molestada, sob pena de afrontar-se o próprio ordenamento jurídico, sobretudo a segurança jurídica.
A administração pública, tenho dito, não pode, em casos que tais, se beneficiar de sua inércia, para, nessa condição, trazer instabilidade jurídicas aos seus subordinados.
A sindicada tinha o direito de ser julgada a tempo e hora. Nenhum processo – ou sindicância – pode durar indefinidamente. É a própria Constituição que assegura a duração razoável do processo, ao que se colhe da EC/2004.
Nos dias atuais, em fase da nova fase do direito público que vivenciamos, não mais se tolera que o processo administrativo disciplinar não tenha duração razoável.
A propósito, Sérgio Bermudes preleciona:
“A celeridade da tramitação traduz-se na presteza da prática de cada ato do processo, porquanto a demora na prática de um deles repercute, negativamente no conjunto, como acontece com a retenção de um trem num dos pontos de parada do seu percurso. Atos praticados celeremente asseguram a duração razoável senão rápida do processo, o qual outra coisa não é, desde a etimologia, que o conjunto de atos que se sucedem para a consecução de determinado fim”
Caio Tácito, de seu turno, ensina:
A ordem jurídica contempla entre seus pressupostos, a par da busca da justiça e da equidade, os princípios da estabilidade e da segurança.
O efeito do tempo como fator de paz social conduz a que, salvo direitos inalienáveis e imperecíveis por sua própria natureza – como, por exemplo, os direitos da personalidade ou da cidadania – as pretensões ( e as ações que as exercitam) tenham, como regra, um limite temporal”
Retomo o tema de fundo para redizer que o princípio é o da prescritibilidade dos atos ilícitos administrativos (art. 37, §5º, da CF).
Nesse sentido, a apuração e a punição do agente restará inviável,
“Se a administração não toma providência para sua apuração e responsabilização do agente, sua inércia gera a perda do seu ius persequendi”
Com as considerações supra, declaro extinta a punibilidade da sindicada, pela ocorrência de prescrição, para, de consequência, determinar o arquivamento dos presentes autos.
É o voto.
DESEMBARGADOR José Luiz Oliveira de Almeida
RELATOR
Sou advogado há mais de 25 anos e tenho me deparado com a defesa de vários magistrados. O voto proferido pelo eminente Desembargador reflete a posição atual dos nossos Tribunais, todavia, alguns Tribunais Estaduas, através de suas Cortes Plenas, baseados em pareceres equivocados dos Procuradores Regionais que mitigam a aplicação da degressão da pena, sob o fundamento de que o representado se defende dos fatos e é impossivel a tipificação antes da condenação, o que discordo integralmente. Brilhante o voto do Desembargador.
Fala-se que a Administração Pública ´não dispõe do aparelhamento humano em quantidade razoável para apuração e decisão sobre desvio de conduta dos servidores. Entendo que se poderia amenizar, em muito, essa deficiência se fosse evitado a instauração de procedimentos disciplinares nos casos onde, indiscutivelmente, já se constatasse a ocorrência da prescrição, vez que, perdido o direito de ação termina o interesse de agir. Com essa medida chegaria-se mais perto do cumprimento dos princípios da Economicidade, da Razoabilida e da Eeficiência.