Poder e compromisso

Numa crônica publicada em abril de 2009, externei a minha preocupação com o que me esperava no Tribunal de Justiça. Em determinado excerto, preocupado, consignei:

“[…]Mas, agora, quando vislumbro a possbilidade de ser promovido – por antiguidade, registre-se – , sou tomado de medo, muito medo – quase pânico. Eu não sei como é a vida de desembargador. Não sei quais são as tentações materiais do cargo, pois de todas as pessoas com as quais dialogo ouça sempre a mesma ladainha: quando chegares lá não serás o mesmo! E por que não? O que diabo há nesse cargo que todos têm que mudar? Por que não posso ser diferente? Por que tenho que me embriagar com o cargo? Por que tenho que me sentir superior aos jurisdicionados, em face desse naco de poder? Que poder é esse que enebria? Que poder é esse que despersonaliza, que perturba, medra e pode, até, machucar?

Não sou capaz de responder a essas indagações, sem viver o problema. Sei que, seja o que for, tenho que resistir a tudo. Eu não posso deixar que as “facilidades” do cargo possam molificar as minhas convicções, afinal, se bem conheço muitos dos meus pares, não são todos que se deixam contaminar por esse vírus. Muitos – a maioria quiçá – não mudam[…]”

Passados mais de oito meses de minha promoção, posso afirmar, preocupado, que não há nada de extraordinário, capaz de provocar mudança de personalidade. Essa constatação me preocupa porque me faz crer que os que se embriagam com esse naco de poder são pobres de espírito. Para mim, em relação a mim, posso afirmar, nada mudou. Sou rigorosamente a mesma pessoa. O poder que a muitos embriaga, para mim é apenas compromisso. Nada mais que isso. Estou, pois, preparado para, a qualquer tempo, deixar a ribalta, sem a mais mínima preocupação com o porvir. É que quem exerce o poder tendo-o apenas como um instrumento para servir, decerto que, ao deixar o proscênio, terá apenas a doce sensação de ter cumprido o seu dever.

Autor: Jose Luiz Oliveira de Almeida

José Luiz Oliveira de Almeida é membro do Tribunal de Justiça do Estado do Maranhão. Foi promotor de justiça, advogado, professor de Direito Penal e Direito Processual Penal da Escola da Magistratura do Estado do Maranhão (ESMAM) e da Universidade Federal do Maranhão (UFMA).

7 comentários em “Poder e compromisso”

  1. Excelência,

    bom dia!

    O novo sempre nos traz medo e preocupação.

    Eu como futura advogada fico feliz e tranquila em saber que ainda há juízes que não mudam/alteram suas personalidades na 2ª instância, gostei da expressão “´pobres de espírito”!

    Tem certas atitudes e posturas que infelizmente nos afastam dos juízes, e de certa forma prejudica e muito, o ofício dos advogados. Há muitas barreiras.

    É uma pena que o Judiciário paulista esteja tão longe dessa realidade de humildade.

    Um grande abraço,
    Fernanda Martins

  2. Creio perfeitamente que esse “medo, quase pânico” que lhe apavorou meses atrás foi, no mínimo, infundado, porque essência e índole não se modificam assim de uma hora para outra, a menos que se trate de mudar para melhor.
    Além disso, embora alguns o vejam de forma diferente, o seu coração NUNCA abrigou a soberba, e a simplicidade continua sendo a sua marca registrada. Talvez por isso tenha sido tão fácil comprovar “que não há nada de extraordinário, capaz de provocar mudança de personalidade”.
    Obrigada pela coerência que sempre norteou a sua vida, deixando-nos cada dia mais orgulhosos por fazer parte da sua história.
    Um abraço,
    Azenate

  3. Creio perfeitamente que esse “medo, quase pânico” que lhe apavorou meses atrás foi, no mínimo, infundado, porque essência e índole não se modificam assim de uma hora para outra, a menos que se trate de mudar para melhor.
    Além disso, embora alguns o vejam de forma diferente, o seu coração NUNCA abrigou a soberba, e a simplicidade continua sendo a sua marca registrada. Talvez por isso tenha sido tão fácil comprovar “que não há nada de extraordinário, capaz de provocar mudança de personalidade”.
    Obrigada pela coerência que sempre norteou a sua vida, deixando-nos cada dia mais orgulhosos por fazer parte da sua história.
    Um abraço,
    Azenate

  4. Creio perfeitamente que esse “medo, quase pânico” que lhe apavorou meses atrás foi, no mínimo, infundado, porque essência e índole não se modificam assim de uma hora para outra, a menos que se trate de mudar para melhor.
    Além disso, embora alguns o vejam de forma diferente, o seu coração NUNCA abrigou a soberba, e a simplicidade continua sendo a sua marca registrada. Talvez por isso tenha sido tão fácil comprovar “que não há nada de extraordinário, capaz de provocar mudança de personalidade”.
    Obrigada pela coerência que sempre norteou a sua vida, deixando-nos cada dia mais orgulhosos por fazer parte da sua história.
    Um abraço,
    Azenate

  5. Olá excelência, boa tarde
    escrevo para compartilhar que penso da mesma forma, e tenho plena consciencia de que o poder é realmente compromisso, que não deve enebriar ninguém, mas não é isso que se constata, infelizmente. Assumi o cargo de delegada de polícia há dez meses numa cidadezinha de mais ou menos cinco mil habitantes no estado do Acre, localizada na triplice fronteira do Brasil com o Peru e a Bolívia. Sou a primeira delegada a residir na cidade, que já tem 34 anos de emancipação. Graças a Deus tive uma formação muito boa, cresci em família muito humilde e tive que batalhar muito até aqui. Dessa forma a humildade e o bom senso fazem parte de minhas ações enquanto delegada, entretanto, tudo o que a população faz é reclamar, reclama porque reduzi o horário de funcionamento dos bares (o que diminuiu as ocorrencias em no mínimo 40%), reclama porque prendi alguém em flagrante por roubo, etc, etc, etc. Assim, o ônus para quem detém “Poder” e age com retidão é o de não ser bem quisto.
    Desabafei, e quero parabenizá-lo pela consciencia, que me serviu de exemplo de que estou no caminho certo, e por mais que todos me achem “carrasca” ou qualquer outro adjetivo mau aplicado, tenho consciencia de quem sou, e quem tem a oportunidade de conviver comigo também sabe, mas realmente, não é facil o encargo que nos incumbe.

  6. Eminência,
    José Luiz Oliveira de Almeida.
    “Tão humano,tão humano que parece ser Divino.”
    (Infelizmente não me recordo onde ouvi ou li essa frase para fazer as referências devidas,mas marcou.E nesta perspectiva, pelo menos a colocarei para alguém que realmente tem essa postura,cuidado e sensibilidade de considerar o ser humano.
    Parabéns pela credibilidade que alcanças por ser íntegro,correto e virtuoso.

    Abraços e gratidão!

    Adriana Nascimento.

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