“É que o poder que a muitos fascina, deslumbra, transforma e entorpece, em mim não desperta nenhum interesse especial, pois, para mim, segundo tenho dito reiteradas vezes, poder é apenas compromisso. Solenidades, fotografias em jornais, bajulações, mordomias, tapinhas nas costas e coisas que tais, a mim não interessam; aliás, eu, muitas vezes, até abomino a bajulação, na mesma medida da repulsa que tenho por algumas solenidades.”
José Luiz Oliveira de Almeida
O artigo que publico a seguir – O FATO E A VERSÃO – foi veiculado, no dia de hoje, no Jornal Pequeno.
Em determinado fragmento anotei:
“[…]Devo dizer, todavia, que a versão não me causa nenhum desconforto. Eu não tenho mesmo nenhuma pretensão de ser corregedor ou presidente do Tribunal de Justiça. É que, desde meu olhar, a direção de qualquer confraria só se legitima via eleição direta; ou seja, pelo voto da maioria dos seus membros. Eleição realizada por 23 desembargadores, de rigor, não é eleição. Com essa eu não compactuo. Nessa condição, não quero mesmo ser presidente ou corregedor. Prefiro dar a minha contribuição ao Poder Judiciário como o tenho feito ao longo da minha carreira[…]”
A seguir, o artigo, por inteiro.
O FATO E A VERSÃO
José Luiz Oliveira de Almeida*
Para as ocorrências do dia a dia há fatos e versões. Muitas vezes a versão prepondera sobre o fato. O fato, nesse sentido, passa ocupar o lugar da versão e vice-versa. A história registra vários episódios nos quais as versões acabaram por preponderar sobre os fatos. A recíproca também é verdadeira.
Um registro histórico. Evaristo de Moraes atuou em defesa do seu próprio pai, em 1898, a quem acusavam de levar menores, à noite, para o seu quarto. Diante dessa acusação, o pai, seu Basílio Evaristo, argumentou que as menores iam a sua residência coçar-lhes os dedões do pé. Não obstante, foi condenado. Nesse caso, prevaleceu o fato.
Pois bem. Por ocasião do meu discurso de posse, afirmei: “Meu tempo de validade é o tempo de poder realizar. Não sendo possível fazer um trabalho que dignifique a minha história, volto para casa, vou curtir a minha família, vou viver a minha vida. Não como um covarde. Não como quem deixa um campo de batalha, pois que o tempo que permanecer nesta Corte será de inteira e total entrega, perseverante que sou”.
Sem titubear, consignei na mesma peça: “Assim pensando, aproveito o ensejo para consignar que, desde agora, mantidas as regras atuais e o nível de disputa que tenho observado, estou abdicando – repito, estou abdicando – de disputar qualquer cargo de direção, para que eu possa estar à cavaleiro e firmar posição em torno do que for melhor para o Poder Judiciário”.
Esse é o fato. A versão, no entanto, é a de que abdiquei, incondicionalmente, de concorrer a qualquer cargo de direção. Esqueceram, quiçá de má-fé, da condicionante “mantidas as regras atuais”.
Em face do meu discurso, portanto, tem prevalecido a versão. O fato? Bem, o fato, ao que parece, não importa. Fazer o quê?
Devo dizer, todavia, que a versão não me causa nenhum desconforto. Eu não tenho mesmo nenhuma pretensão de ser corregedor ou presidente do Tribunal de Justiça. É que, desde meu olhar, a direção de qualquer confraria só se legitima via eleição direta; ou seja, pelo voto da maioria dos seus membros. Eleição realizada por 23 desembargadores, de rigor, não é eleição. Com essa eu não compactuo. Nessa condição, não quero mesmo ser presidente ou corregedor. Prefiro dar a minha contribuição ao Poder Judiciário como o tenho feito ao longo da minha carreira.
Releva anotar, ademais, que quando disse não pretender concorrer a cargos de direção, mantidas as regras atuais, afirmei porque, ao que tenho testemunhado, as “eleições” para os cargos de direção do Tribunal de Justiça têm açulado as divergências (veladas ou não) que nele vicejam – próprias das corporações, ter-se-á de convir.
Conforme minha compreensão, se decidisse participar do pleito, na condição de “eleitor”, à luz das regras atuais, votaria, sempre, no mais antigo, como faz Supremo Tribunal Federal. Nesse sentido, ninguém deveria contar com o meu voto – a não ser, claro, o mais antigo. Compreendo que se o Tribunal de Justiça voltasse à velha prática, de escolher o mais antigo, já que não é possível a eleição direta, muitas das divergências internas que hoje existem seriam afastadas.
De toda sorte, o que importa mesmo neste artigo é reafirmar a minha nenhuma intenção de concorrer – no futuro, claro, já que agora seria mais que prematuro – a qualquer cargo de direção. É que o poder que a muitos fascina, deslumbra, transforma e entorpece, em mim não desperta nenhum interesse especial, pois, para mim, segundo tenho dito reiteradas vezes, poder é apenas compromisso. Solenidades, fotografias em jornais, bajulações, mordomias, tapinhas nas costas e coisas que tais, a mim não interessam; aliás, eu, muitas vezes, até abomino a bajulação, na mesma medida da repulsa que tenho por algumas solenidades.
Para completar e ilustrar as presentes reflexões, excertos da crônica “Apenas um Retrato na Parede”, de minha autoria, publicada neste mesmo diário:
“[…]Quem age apenas sob perspectiva de ganhos pessoais em face do Poder que exerce, faz muito mal à instituição que dirige. Quem faz do exercício do poder apenas um meio para desfilar a sua vaidade merece o repúdio de todos os que têm o mínimo de ética a motivar as suas ações. Aquele que pensa que a história lhe rendera homenagem, apenas porque logrou colocar o seu retrato na galeria dos que lhe antecederam, comete um grave equívoco e terá, inelutavelmente, a condenação da história. Exercer o poder é muito mais que um mero exercício de vaidade, repito. O exercício do poder público vai muito além da distribuição de cargos e honrarias aos acólitos. Se não for digno do poder que exerceu, passará para história, seguramente, apenas como mais um oportunista. Exercer o poder público é bem servir ao interesse público. Exercer o poder com honradez e respeito, é renunciar, é abdicar das vendetas pessoais, das perseguições, das idiossincrasias[…]”.
*Desembargador do Tribunal de Justiça do Estado do Maranhão
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