Direito concreto.

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“A ausência de intimação para a oitiva de testemunhas no juízo deprecado não consubstancia nulidade (precedentes). Havendo ciência da expedição da carta precatória, como no caso, cabe ao paciente ou a seu defensor acompanhar o andamento no juízo deprecado” (HC 89.159/SP, rel. Min. Eros Grau, 2ª Turma, DJ 13.10.2006). Precedentes

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No voto que publico a seguir é digno de destaque o enfrentamento das preliminares de nulidade. Uma, acerca da falta de intimação do advogado e do seu constituinte, para audição de testemunhas no juízo deprecado, do que teria resultado prejuízo para sua defesa; a outra, em face da inépcia da denúncia, que, no entender do recorrente, não preencheria os requisitos legais, vez que, por não descrever, pormenorizadamente, a participação de cada acusado, teria inviabilizado o exercício amplo da defesa.

Acho que essas questões merecem, sim, uma reflexão, máxime porque elas têm sido discutidas com muita frequência, quer no juizo de primeiro grau, quer em sede recursal.

No caso específico da audição de testemunhas,  via precatória, o que tenho entendido, na esteira da mais lúcida construção jurisprudencial, é que, tendo sido cientificada a defesa da expedição da deprecata, a ela cabe, doravante, acompanhar o seu desenrolar. Não pode a defesa , a meu sentir, quedar-se inerte, para, depois, tentar tirar vantagem de sua negligência. Em sentido oposto, se a defesa não é intimada da expedição da carta, aí, sim, não tenho dúvidas que pode, sim, ocorrer alguma nulidade; alguma nulidade, sim, pois que, se se tratar de nulidade relativa, cabe à parte apontar os prejuízos decorrentes da omissão, sem o que não se reconhece a eiva.

A seguir, a decisão, por inteiro.

PRIMEIRA CÂMARA CRIMINAL

Sessão do dia 15 de fevereiro de 2011.

Nº Único 0027645-35.2009.8.10.0000

Apelação Criminal Nº 027645/2009 – Matões

Apelantes                  :   Í. O. P. de M. e outros

Advogado                  :   F. N.de B. F.

Apelado                     :   Ministério Público Estadual

Incidência Penal      :   Art. 129, §1º, I e II, do CPB

Relator                     :   Desembargador José Luiz Oliveira de Almeida

Acórdão Nº _____________

Ementa. PROCESSUAL PENAL. LESÃO CORPORAL DE NATUREZA GRAVE. PRELIMINARES. NULIDADE DO DEPOIMENTO DE TESTEMUNHA POR PRECATÓRIA. INEXISTÊNCIA. INÉPCIA DA DENÚNCIA. NÃO CONSTATAÇÃO. EXTINÇÃO DA PUNIBILIDADE DE ALGUNS RÉUS PELA PRESCRIÇÃO. VERIFICAÇÃO. ABSOLVIÇÃO PARA OS DEMAIS RÉUS. AUSÊNCIA DE LAUDO PERICIAL COMPLEMENTAR. DESCABIMENTO. COMPROVAÇÃO POR OUTROS MEIOS DE PROVA. PROVIMENTO PARCIAL DO APELO. PRESCRIÇÃO DA PENA IN CONCRETO.

1. Se os recorrentes foram intimados da expedição da carta precatória, não há que se falar em nulidade por ausência de intimação da oitiva da testemunha no juízo deprecado, eis que cabe aos interessados o seu acompanhamento.

2. A denúncia não pode ser considerada inepta quando viabiliza a defesa dos acusados dos fatos que lhe são imputados, ao descrever as suas condutas, ainda que de forma sucinta, mas em consonância com os pressupostos do art. 41, do Código de Processo Penal.

3. Se entre o recebimento da denúncia e a sentença decorre prazo superior ao definido em lei para prescrição dos crimes pelos quais foram condenados os recorrentes, considerando a pena in concreto, deve-se declarar a extinção da punibilidade pela prescrição superveniente.

4. É inviável o pleito absolutório quando as provas são harmônicas e coesas para comprovação da existência do crime e sua autoria.

5. A falta de exame complementar para aferir a incapacidade da vítima para as ocupações habituais por mais de 30 (trinta) dias, a fim de fazer incidir a qualificadora prevista no art. 129, §1º, I, do Código Penal, pode ser suprida pela prova testemunhal.

6. A existência de circunstâncias judiciais desfavoráveis autoriza o aumento da pena-base acima do mínimo legal.

7. É obrigatório o reconhecimento de circunstância agravante quando esta não é elementar do tipo em exame, e não foi considerada na avaliação das circunstâncias judiciais.

8. Provimento parcial da apelação, para declarar a extinção da punibilidade dos recorrentes Í. O. P., R. A. da S. F., F. F. da S. e F. T. dos S., e manter intacta a sentença condenatória em relação a C. M.de O. e F. T. dos S..

Acórdão – Vistos, relatados e discutidos os presentes autos em que são partes as acima indicadas, ACORDAM os Senhores Desembargadores da Primeira Câmara Criminal do Tribunal de Justiça do Estado do Maranhão, por unanimidade e de acordo com o parecer da Procuradoria Geral de Justiça, adequado em banca, em dar parcial provimento ao recurso, para declarar extinta a punibilidade dos recorrentes Í. O. P., R. A. da S. F., F. F. da S. e F. T. dos S., nos termos do voto do Desembargador Relator.

Participaram do julgamento os Excelentíssimos Senhores Desembargadores Antonio Fernando Bayma Araújo (Presidente), Raimundo Nonato Magalhães Melo e José Luiz Oliveira de Almeida. Presente pela Procuradoria Geral de Justiça a Dra. Domingas de Jesus Froz Gomes.

São Luís(MA), 15 de fevereiro de 2011.

DESEMBARGADOR Antônio Fernando Bayma Araújo

PRESIDENTE

DESEMBARGADOR José Luiz Oliveira de Almeida

RELATOR


 

Apelação Criminal Nº 027645/2010 – Matões

 

Relatório – O Sr. Desembargador José Luiz Oliveira de Almeida (relator): Cuida-se de recurso de apelação, interposto por Í. O. P. de M., C. M. de O., R. A. da S. F., F. F. da S., F. T. dos S.e F. T. dos S., por meio do seu procurador, contra a sentença de fls. 265/276, que os condenou pela prática do crime capitulado no art. 129, §1º, I e II, do Código Penal.

 

Consta da exordial acusatória de fls. 04/06, que Í. O. P. de M., C. M. de O., F. das G. de S., R. A. da S. F., F. F. da S., F. T. dos S. e F. T. dos S., em 07/12/2003, agrediram, com socos, J. A.F. de O., causando-lhe lesão corporal grave.

 

Colhe-se da inaugural, ainda, que, em seguida, os denunciados começaram a agredir fisicamente outra vítima, A. B. de A., aplicando golpes de garrafa em sua cabeça, além de chutes e socos, fato que ocasionou tumulto na cidade.

 

Recebimento da denúncia às fls. 04.

 

Durante a instrução criminal foram ouvidas as testemunhas I. M. F. (fls. 132), H. S. O. (fls. 164), e F. J. C. Costa (fls. 246), além das vítimas J. A. F. de . (fls. 133), e A. L. B. A. (fls. 220/221), todas arroladas na denúncia, e as testemunhas do juízo, I. O. N. (fls. 141), C. G.de B. (fls. 142), e A. L. de A. (fls. 143).

 

Termos de qualificação e interrogatório às fls. 83/115, nos quais os apelantes negam a autoria delitiva.

 

Houve separação do processo em relação ao acusado F. das G. de S. (fls. 137/138).

 

Encerrada a instrução, o Parquet estadual apresentou alegações finais (fls. 248/250), na qual requereu a condenação de todos os denunciados.

 

A defesa dos recorrentes, na mesma fase processual, preliminarmente, alegou inépcia da denúncia, por não descrever a participação individualizada de cada réu, e nulidade do processo, por infringência do princípio constitucional da ampla defesa. No mérito, requereu a absolvição dos acusados por insuficiência de provas contundentes para a condenação.

 

A ação foi julgada parcialmente procedente, para condenar os apelantes como incursos no art. 129, §1º, I e II, do Codex Penal, fixando-se as seguintes penas: a) 02 (dois) anos e 01 (um) mês de reclusão para F. T. dos S.; b) 02 (dois) anos e 01 (um) mês de reclusão para C. M. de O.; c) 01 (um) ano e 11 (onze) meses de reclusão para Í. O. P. de M.; d) 01 (um) ano e 08 (oito) meses de reclusão para R. A.da S.; e) 01 (um) ano e 08 (oito) meses de reclusão para F. F. da S.; e f) 01 (um) ano e 08 (oito) meses de reclusão para F. T. dos S..

 

Quanto ao mais, a sentença julgou extinta a punibilidade, pela prescrição, no que pertine ao delito praticado contra o ofendido J. A. F. de O., constante do art. 129, caput, do Codex Penal, e determinou a suspensão condicional da pena em relação aos acusados Í. O. P. de M., R. A. da S. F., F. F. da S. e F. T. dos S., na forma do art. 77, do Código Penal, olvidando-se, contudo, de estabelecer o regime inicial de cumprimento de pena dos demais.

 

Contra esta decisão, insurgiram-se os recorrentes, arguindo, em suas razões recursais, as preliminares que já haviam sido suscitadas nas alegações derradeiras, além da extinção da punibilidade, pela prescrição, em relação aos acusados Í. O. P.de M., R. A. da S.F., F. F. da S. e F.T. dos S., e, no mérito, a absolvição, por insuficiência de provas.

 

Nas contrarrazões de fls. 300/306, o Ministério Público Estadual, através do seu representante legal, requereu o improvimento do recurso para manter inalterada a sentença guerreada.

 

Em seu parecer, a d. Procuradoria de Justiça, às fls. 330/341, manifesta-se favoravelmente à declaração da prescrição da pretensão punitiva em relação aos acusados Í. O. P., R. A.da S. F., F. F. da S. e F. T. dos S., e, rejeitando as demais preliminares, opina, no mérito, pelo improvimento do recurso interposto, para manter a condenação de F. T. dos S. e C. M.de O., tal como decidido na sentença ostilizada.

 

É o relatório.

 

 

Voto – O Sr. Desembargador José Luiz Oliveira de Almeida (relator): Presentes estão os pressupostos de admissibilidade do recurso, razão pela qual dele conheço.

 

Consoante anotado, infere-se dos autos que Í. O. P. de M., C. M.de O., F. das G. de S., R. A. da S. F., F. F. da S., F.T. dos S. e F. T. dos S. foram denunciados pelo Ministério Público Estadual, por incidência comportamental no art. 129, §1º, I e II, c/c art. 69, ambos do Código Penal.

 

O MM. Juiz de Direito da Comarca de Matões, após analisar o acervo probatório, julgou parcialmente procedente a denúncia, fixando aos réus, finalmente, as seguintes reprimendas: a) 02 (dois) anos e 01 (um) mês de reclusão para F. T. dos S.; b) 02 (dois) anos e 01 (um) mês de reclusão para C. M. de O.; c) 01 (um) ano e 11 (onze) meses de reclusão para Í. O. P. de M.; d) 01 (um) ano e 08 (oito) meses de reclusão para R. A. da S.; e) 01 (um) ano e 08 (oito) meses de reclusão para F. F. da S.; e f) 01 (um) ano e 08 (oito) meses de reclusão para F. T. dos S..

 

Em relação a Í. O. P. de M., R. . da S. F., F. F. da S. e F. T. dos S., foi determinada a suspensão condicional da pena, na forma do art. 77 do Código Penal, não restando, porém, estabelecido o regime inicial de cumprimento da sanção dos demais.

 

Irresignados, os acusados, por meio dos seus procuradores, recorreram da sentença, aduzindo o seguinte:

 

I – preliminarmente: a) que há nulidade do feito em razão da ofensa ao princípio constitucional da ampla defesa, eis que os recorrentes não foram devidamente intimados da oitiva da testemunha H. S. O., quando do envio da carta precatória de fls. 162, impossibilitando sua contradita e que foi ouvida sem a nomeação de um defensor ad hoc para os réus; b) que a denúncia é inepta por ausência de individualização das condutas dos acusados; c) que há ocorrência da prescrição da pretensão punitiva em relação aos réus Í. O. P., R. A. da S. F., F. F. da S. e F. T. dos S.;

 

II – no mérito, que a dosimetria da pena foi realizada em desacordo com os princípios do art. 59 do Código Penal;

 

III – que não é cabível a aplicação da circunstância agravante prevista no art. 61, II, a, do Código Penal;

 

IV – que não há comprovação, por meio de exame pericial complementar, do perigo de vida à vítima e da sua incapacidade para as ocupações habituais por mais de 30 (trinta) dias; e

 

V – que a declaração da vítima André Luiz Bezerra Aragão se encontra em desarmonia com os demais depoimentos colhidos nos autos.

 

Requerem, nesse passo, o provimento do recurso, para que sejam acolhidas as preliminares arguidas, ou, ainda, seja reformada a sentença monocrática, diante da ausência de provas suficientes para a condenação (sic).

 

Inicialmente, cumpre analisar as preliminares suscitadas.

 

A primeira, referente à nulidade do feito decorrente da “ausência de intimação dos recorrentes para oitiva da testemunha arrolada pela acusação que foi ouvida por Carta Precatória” (fls. 283/284), fato que teria gerado ofensa aos princípios constitucionais da ampla defesa e do contraditório, entendo que não merece acolhida.

 

Explico. Conforme consta das fls. 116 dos autos, as partes tomaram ciência, em banca, da expedição de carta precatória para a oitiva das testemunhas arroladas na denúncia em foro diverso da tramitação do processo, sem que apresentassem, nesta oportunidade, qualquer impugnação.

 

Logo, era do conhecimento da defesa a realização do referido ato processual, cabendo-lhe, portanto, o seu acompanhamento, de acordo com o entendimento dos nossos sodalícios, in verbis:

 

A jurisprudência do Supremo Tribunal Federal é firme no sentido de que, expedida a carta precatória, cabe aos interessados o seu acompanhamento.[1]

 

No mesmo sentido:

 

No que se refere especificamente à intimação da defesa quanto à data da audiência para oitiva de testemunha no juízo deprecado, registro que a jurisprudência consolidada desta Corte Suprema já assentou que “A ausência de intimação para a oitiva de testemunhas no juízo deprecado não consubstancia nulidade (precedentes). Havendo ciência da expedição da carta precatória, como no caso, cabe ao paciente ou a seu defensor acompanhar o andamento no juízo deprecado” (HC 89.159/SP, rel. Min. Eros Grau, 2ª Turma, DJ 13.10.2006). Precedentes.[2]

 

E ainda, no mesmo norte:

 

Em se tratando de inquirição de testemunha realizada em foro diverso da tramitação do processo, não se exige que o réu preso seja intimado para acompanhar a audiência, bastando tão-somente que as partes sejam intimadas da expedição da carta precatória, nos termos do art. 222, do Código de Processo Penal. Incidência do verbete sumular 273: “Intimada a defesa da expedição da carta precatória, torna-se desnecessária intimação da data da audiência no juízo deprecado.”[3]

 

Noutro dizer, se era do conhecimento da defesa a expedição da carta precatória para oitiva de testemunha arrolada pela acusação, era de sua incumbência o acompanhamento deste ato processual, sendo desnecessária a sua intimação da audiência designada no juízo deprecado[4].

 

Ademais, ao tratar-se de nulidade relativa, não vislumbrei, tal como afirmado pela defesa, a demonstração de efetivo prejuízo aos recorrentes, de não terem a oportunidade de, durante a audiência em que foi inquirida, contraditar a testemunha H. S. O. (fls. 164).

 

Assim sendo, não observo malferimento, nesse contexto, aos princípios constitucionais da ampla defesa e do contraditório, visto que, além do exposto, o depoimento da testemunha citada não foi o único elemento de prova a compor o título condenatório, como demonstrarei mais adiante.

 

Com relação ao argumento de inépcia da denúncia, compreendo que melhor sorte não assiste aos apelantes. Vejamos.

 

A inicial acusatória, a teor do que dispõe o art. 41 do Código de Processo Penal, deve conter: a exposição dos fatos criminosos, em tese, com todas as suas circunstâncias, a qualificação do acusado ou esclarecimentos que possam identificá-lo, a classificação do crime, e, se possível, o rol de testemunhas.

 

In casu, a denúncia descreve, a meu ver, a conduta dos recorrentes, embora sucintamente, mas da forma como estavam conhecidos até então, suficiente a possibilitar o exercício da ampla defesa pelos mesmos. Noutros termos,

 

não há que se falar em inépcia da denúncia, se essa descreve como teriam ocorrido e em que circunstâncias se deu o fato criminoso, ainda que sucintamente, possibilitando a mais ampla defesa. CPP, art. 41.[5]

 

Significa dizer que, se a prefacial consegue descrever a conduta atribuída aos réus, a par dos elementos investigatórios colhidos até então, ainda que não pormenorizadamente, mas atendendo aos requisitos elencados no preceito legal em tela, não se pode falar em inépcia.

 

Ressalto, sobremais, que quando se cuida de delito supostamente cometido por vários agentes, atuando de modo coletivo, é muito difícil, nesta fase embrionária, especificar a participação de cada um, detalhadamente, razão pela qual os pretórios entendem que, se

 

a denúncia que expõe, satisfatoriamente, condições de tempo, lugar e modo de execução dos fatos delituosos não é inepta.[6]

 

Diante do exposto, rejeito as preliminares até então examinadas.

 

Noutro giro, entendo ser cabível a pretensão relativa à prescrição da pretensão punitiva dos recorrentes Í. O. P., R. A. da S. F., F. F. da S. e F. T. dos S..

 

A prescrição, após o édito condenatório, regula-se pela pena concretamente fixada[7], considerando-se os prazos descritos no art. 109, do Código Penal, consoante preleciona o doutrinador Celso Delmanto[8], in verbis:

 

[…]. Portanto, não se trata de prescrição depois de transitar em julgado sentença final condenatória para ambas as partes (que acarretaria a só perda da pretensão executória), mas de prescrição verificada antes desse trânsito em julgado (com efeito de extinguir-se a própria pretensão punitiva). Todavia, a prescrição subsequente não se baseia mais no máximo da pena abstratamente prevista em lei, mas na pena em concreto, ou seja, na quantidade da pena que a sentença condenatória julgou ser merecida por aquele determinado acusado, em razão de sua conduta apurada no processo.

 

No caso em testilha, aos apelantes Í. Ol. P., R. A. da S. F., F. F. da S. e F. T. dos S., restaram fixadas reprimendas em patamar inferior a 02 (dois) anos de reclusão.

 

Desse modo, de acordo com a redação do art. 109, V, do Código Penal, a pretensão punitiva prescreve em 04 (quatro) anos, para crimes cujas penas não ultrapassem a 02 (dois).

 

Do que dos autos assoma, entre a data do recebimento da denúncia, 20/03/2003, e a prolação da sentença condenatória, 13/07/2009, transcorreram mais de 04 (quatro) anos, sem que tenha havido nenhuma causa interruptiva ou suspensiva do prazo prescricional.

 

Forçoso concluir, portanto, que o jus puniendi estatal, no que concerne aos recorrentes Í. O. P., R. A.da S. F., F. F. da S. e F. T. dos S. está fulminado, com a incidência da prescrição da pretensão punitiva, restando, assim, extinta a punibilidade dos mesmos.

 

Face ao exposto, passo a expender considerações acerca do mérito somente em relação aos apelantes C. M. de O., vulgo “paulista” e F. T. dos S., vulgo “Kinho”, os quais não tiverem extinta a sua punibilidade pela prescrição.

 

Quanto a estes, do que vejo dos autos, não há como prover o pleito absolutório, ou mesmo reformar a sentença condenatória.

 

A materialidade está suficientemente evidenciada, como pode se depreender dos exames de corpo de delito nas vítimas, constante às fls. 13/14 e 18/19, e pela reprodução xerográfica das fotos do segundo ofendido com ferimentos, acostada às fls. 67/68.

 

A autoria, da mesma forma, restou incontroversa, como demonstrarei a seguir, à luz dos depoimentos coligidos em juízo.

 

Nesse sentido, importante destacar o seguinte excerto, da declaração de J. A.F.de O. em juízo (fls. 133), primeiro ofendido, in litteris:

 

[…]

 

– que se encontrava no dia do ocorrido por volta das 17:00 horas no bar do Zé Adalton, em uma mesa juntamente com o A. e A. (Cara Ruim) e I.;

 

– que primeiramente entrou no bar o Í., “Ferrugem”, “Paulista”, “Kinho”;

 

– que o “Kinho” perguntou quem estava chamado os Alagoanos de veado, tendo o depoente dito que estava equivocado;

 

– que logo em seguida o “Kinho” lhe deu um soco, seguido pelo “Ferrugem”;

 

– que logo depois os quatro já mencionados partiram em direção ao A., enquanto o F. das C., o R. A. e o F. Ferreira apareceram repentinamente e começaram a agredir o depoente;

 

– que o I.l e A. (Cara Ruim) saíram correndo do local;

 

– que a esposa do dono do bar presenciou a confusão;

 

-que a vítima André ficou com vários hematomas no corpo e um profundo corte no pescoço e cabeça;

 

– que ficou o depoente com hematomas no olho;

 

– que não haviam discutido com os acusados ante da confusão;

 

[…].

 

A testemunha presencial I. O. N. (fls. 141), na mesma direção, ao prestar depoimento, asseverou:

 

– que primeiramente encontrava-se no bar o A. L. I. M., J. A. F. e Antônio L.;

 

– que a depoente após servir os quatro indivíduos citados se dirigiu até a porta do bar, sendo que algum tempo depois chagaram no bar diversas pessoas, recordando-se da presença dos acusados Í. O. C. M., F. T. e F. T.;

 

– que algum dos presentes dentre os acusados, perguntou quem estava chamando os Alagoanos de veados;

 

– que o João A. F. disse que ele estava falando com a pessoa errada;

 

– que logo em seguida começou a briga;

 

– que o acusado que pediu a cerveja foi o Í.;

 

– que os acusados não chegaram a sentar em uma mesa;

 

– que a briga ocorreu no local onde estava a mesa onde se encontravam sentados A. L., I., J. A., e A. L.;

 

– que após o início da briga a depoente correu e saiu através da porta, pela frente, pois estava com seus dois filhos menores;

 

– que a briga se iniciou no bar e continuou na rua;

 

– que chegou a presenciar o A. sujo de sangue, mas não sabe o local onde foi ferido;

 

– que o J. A. possuía vários hematomas;

 

– que os acusados não estava aparentemente bêbado;

 

[…]

 

A segunda vítima atingida, A. L. B. A., também ofereceu detalhes da execução do crime, ao narrar (fls. 220/221):

 

[…]

 

– que no dia do fato o declarante e outras pessoas encomendaram almoço no Bar de Zé Adauto e que o declarante e foi almoçar acompanhado de J. A.o e C. J. e que almoçaram no dito bar e ao final do almoço, por volta das 16:00 hs, adentraram ao recinto oito pessoas e que sem mais nem menos os agressores partiram para cima do declarante e de João Antônio, ficando esclarecido que não houve qualquer discussão entre as vítimas e os agressores;

 

– que o bar era pequeno, mais ou menos 9 metros quadrados e que só tinha uma porta de acesso;

 

– que quando os agressores adentraram ao bar o réu Ítalo jogou uma garrafa contra o declarante e que a garrafa bateu na sua testa e que depois recebeu outra garrafada no meio da testa e que não sabe quem deu a garrafada e que o declarante caiu e ficou embaixo da mesa se defendendo e depois os agressores puxaram a mesa e começaram a chutar, esmurrar e dar paulada no declarante e que o declarante avistou a porta e conseguiu sair do bar se arrastando e na porta do bar o declarante recebeu uma pancada nas Costa;

 

– que a partir daí chegou o réu C. M.l de O., vulgo Paulista, e de posse de uma faca ou de um canivete partiu para cima do declarante para furá-lo no pescoço e que o declarante no reflexo com a mão amenizou o “golpe” e que a faca pegou de raspão no pescoço;

 

– que em seguida vinha passando um amigo do declarante de prenome O. e que ele parou para ver a confusão e os infratores partiram para cima de O.;

 

[…]

 

É de ver-se, portanto, a par da coerência entre as declarações acima, ratificadas pelos depoimentos das testemunhas I. M. F. (fls. 132) e A. L. de A. (fls. 143), que os apelantes, realmente, praticaram o crime de lesão corporal contra as vítimas, em que pese a negativa de autoria (fls. 85/86 e 91/92), tornando inviável, reafirmo, o pedido de absolvição.

 

Ao contrário do que afirmam os recorrentes, portanto, a declaração da vítima A. L. B. A. se encontra harmônica com o contexto fático descrito na inicial acusatória e com os demais depoimentos colhidos nos autos.

 

No que se tange ao laudo pericial de fls. 13/14 e 14-v., relativo ao exame de corpo de delito realizado no ofendido em comento, a meu juízo, atesta, indene de dúvidas, que as lesões produzidas resultaram em efetivo perigo de vida ao mesmo, fazendo incidir a qualificadora disposta no §1º, II, do art. 129, do Código Penal.

 

Cediço que, para a comprovação da incapacidade para as ocupações habituais por mais de 30 (trinta) dias, inserta no inciso I, do mesmo dispositivo, é necessária a realização de exame complementar, a fim de atestá-la, a teor do que dispõe o art. 168, do Código de Processo Penal.

 

Entretanto, a ausência do exame complementar poderá ser suprido pela prova testemunhal, consoante preceitua o §3º, do mesmo art. 168, da Legislação Processual Penal. Na lição de Nestor Távora e Fábio Roque Araújo[9]:

 

[…]. Não sendo realizado, a qualificadora cai, desclassificando-se o delito para lesão leve. Subsiste, entretanto, a possibilidade de demonstração pela prova testemunhal.

 

No caso em tela, embora não haja comprovação da ocorrência do mencionado inciso II, do §1º, do art. 129, do Código Penal, por meio de exame complementar, a declaração prestada pela vítima A. L. B. A. dá conta do seu afastamento do trabalho por mais ou menos 60 (sessenta) dias (fls. 221).

 

E mais. Ainda que fosse desconsiderada, por ausência do laudo complementar para demonstrar a incidência da qualificadora em questão, havendo prova da existência de outra qualificadora, in casu, perigo de vida, não há que se cogitar em desclassificar o delito para lesão corporal leve.

 

Desse modo, incabível a desclassificação do crime de lesão corporal grave.

 

Na mesma senda, entendo serem insubsistentes os argumentos referentes à dosimetria da pena, visando a sua modificação, eis que, a meu sentir, estão em consonância com as disposições legais.

 

A pena-base, como se vê às fls. 272/273, foi fixada acima do patamar mínimo estabelecido em lei, haja vista a existência de várias circunstâncias judiciais desfavoráveis na avaliação da conduta dos recorrentes, fator que autoriza ao juiz sentenciante a aumentá-la acima do mínimo legal, conforme precedentes pretorianos, ad exempli:

 

Esta Corte tem considerado que, diante da valoração das circunstâncias judiciais do art. 59 do Código Penal, é perfeitamente possível a fixação da pena-base acima do mínimo legal, desde que a decisão esteja devidamente fundamentada. Precedentes.[10]

 

No mesmo diapasão:

 

Não há que se falar em ofensa ao art. 59 do Código Penal pois a fixação da pena-base acima do mínimo legal fundamentou-se nas circunstâncias desfavoráveis e conseqüências do delito, que evidenciaram alta culpabilidade e a maior necessidade de reprovação e prevenção do crime.[11]

 

Portanto, no que pertine a essa primeira fase da sentença, a meu sentir, agiu com acerto o MM. Juiz de primeiro grau em elevar a sanção para acima do mínimo legal, quando, justificadamente, verifica a presença de circunstâncias judiciais negativas, não havendo o que reparar na sentença, nesse aspecto.

 

Com relação à agravante disposta no art. 61, II, a, do Código Penal, aplicada para o crime em tela – motivo fútil -, na mesma linha de pensar, nada há a reparar.

 

É que, tal circunstância, restou evidenciada através dos depoimentos colhidos em juízo, dos quais se extrai que a briga foi iniciada por provocação dos apelantes ao questionarem às vítimas se estas o chamavam de “veados”, motivo, portanto, ínfimo, banal, desproporcional ao resultado do crime.

 

Outrossim, os motivos do crime, tal qual disposto na sentença vergastada, não serviram para majorar a pena-base na primeira fase, enquanto circunstância judicial negativa, e não sendo elementar da figura típica, devem ser obrigatoriamente reconhecidos como agravante, exatamente como no caso presente.

 

Ante as considerações supra, em conformidade com o parecer da d. Procuradoria de Justiça, dou parcial provimento ao recurso, para declarar extinta a punibilidade dos recorrentes Í. O. P., R. A. da S. F., F. F. da S. e F. T. dos S., pela prescrição superveniente, e manter a condenação em relação a C. M. de O. e F. T. dos S., nos termos em que consta da sentença fustigada.

 

É como voto.

 

Sala das Sessões da Primeira Câmara Criminal do Tribunal de Justiça do Estado do Maranhão, em São Luís, 15 de fevereiro 2011.

 

 

 

DESEMBARGADOR José Luiz Oliveira de Almeida

 

RELATOR

 


 


[1] STF – RHC 93817, Relator(a):  Min. CARLOS BRITTO, Primeira Turma, julgado em 30/06/2009, DJe-162 DIVULG 27-08-2009 PUBLIC 28-08-2009 EMENT VOL-02371-03 PP-00442.

 

[2] STF – HC 96026, Relator(a):  Min. ELLEN GRACIE, Segunda Turma, julgado em 09/12/2008, DJe-025 DIVULG 05-02-2009 PUBLIC 06-02-2009 EMENT VOL-02347-05 PP-00854 RTJ VOL-00209-02 PP-00777.

 

[3] STJ – HC 130.662/MG, Rel. Ministra LAURITA VAZ, QUINTA TURMA, julgado em 26/08/2010, DJe 27/09/2010.

 

[4] Súmula 273 do STJ.

 

[5] STF – HC 103569, Relator(a):  Min. DIAS TOFFOLI, Primeira Turma, julgado em 24/08/2010, DJe-217 DIVULG 11-11-2010 PUBLIC 12-11-2010 EMENT VOL-02430-01 PP-00011.

 

[6] STF – HC 89908, Relator(a):  Min. EROS GRAU, Segunda Turma, julgado em 24/11/2009, DJe-027 DIVULG 11-02-2010 PUBLIC 12-02-2010 EMENT VOL-02389-01 PP-00127.

 

[7] Art. 110, §1º, do Código Penal.

 

[8] Código Penal Comentado. São Paulo: Saraiva, 2010. p. 414.

 

[9] Código de Processo Penal para Concursos. Bahia: Editora JusPodivum. p. 241.

 

[10] STF – HC 101819, Relator(a):  Min. ELLEN GRACIE, Segunda Turma, julgado em 22/06/2010, DJe-145 DIVULG 05-08-2010 PUBLIC 06-08-2010 EMENT VOL-02409-04 PP-00982 LEXSTF v. 32, n. 380, 2010, p. 435-442.

 

[11] STJ – REsp 975.243/SP, Rel. Ministro JORGE MUSSI, QUINTA TURMA, julgado em 19/10/2010, DJe 08/11/2010.

Autor: Jose Luiz Oliveira de Almeida

José Luiz Oliveira de Almeida é membro do Tribunal de Justiça do Estado do Maranhão. Foi promotor de justiça, advogado, professor de Direito Penal e Direito Processual Penal da Escola da Magistratura do Estado do Maranhão (ESMAM) e da Universidade Federal do Maranhão (UFMA).

5 comentários em “Direito concreto.”

  1. SENHOR DES. RELATOR DO CASO CONCRETO: O VOTO É BRILHANTE E ESTÁ EM HARMONIA COM A JURISPRUDENCIA DO STJ, NO QUE DIZ RESPEITO A AUSENCIA DE INTIMAÇÃO DO ADVOGADO PARA COMPARECER AO JUIZ DEPRECADO, QUANDO, INTIMADO DO DESPACHO QUE DETERMINA A EXPEDIÇÃO DE CARTA PRECATORIA.OCORRE QUE O SEGUNDO ARGUMENTO DA PRELIMINAR, SE REFERE AO FATO DA JUIZA DEPRECADA TER REALIZADA A ADUDIENCIA DA TESTEMUNHA DE ACUSAÇÃO SEM A NOMEAÇÃO DE DEFENSOR PARA O ATO, MESMO, AUSENTE O ADVOGADO CONSTITUIDO.DESTA FORMA, SE O UNICO ARGUMENTO FOSSE AUSENCIA DE INTIMAÇÃO DO ADVOGADO CONSTITUIDO , CREIO QUE NÃO HAVERIA RAZÃO PARA A REFERIDA NULIDADE.

  2. meu marido foi condenado,a pena de reclusão de 10anos por crime hediondo,a advogada dele entrou com recurso errado no STJ,sendo julgado intepestível,o que fazer pois foi observado que nos autos no dia que a vítima foi ouvida e testemunhas de acusação não estava presente o defensor público ninguém havia observado está falha durante o processo,qual a saída pois ele foi prejudicado pela advogada no erro do recurso com proceder nesta fase,pois contratamos um novo advogado até agora ele não entrou com nada,existe alguma resolução ou jurisprudencia quanto este caso ele pagou para advogada fazer o recurso,ele será prejudicado pelo erro do advogado,pois no STJ o ministro iria observar que não foi assistido pelo defensor com as partes acusadoras e nulária o processo,por amor de Deus nos de uma luz.

  3. Obrigado DR.Luiz por ter respondido o meu email do dia 22/04/11,conforme havia dito anteriormente,o meu esposo foi condenado a 10 anos por crime hediondo,transitado em julgado no STJ.Ele não constituiu um advogado na época da 1°grau,contratou uma advogada para fazer o recurso dele no TJ,sendo mantido a pena,posterior ela entrou com o recurso errado no STJ,sendo que o ministro não julgou sendo dado como intempestível,devolvendo o processo de volta mantendo a pena,agora o meu esposo está com mandado de prisão,uma pessoa bacharel em direito pegou o processo do meu irmão para dar uma estudada,observou um fato grave quando a vítima e testemunhas de acusações foram ouvidas em juizo não estava presente o defensor público(nem o meu esposo sabia deste fato),aparece assinatura do juizo,promotor,pessoas ouvidas no processo e do defensor em branco,está falha não foi observada por ninguém e processo dele está transitado em julgado,constitui um novo advogado,onde e entrou com habeas corpus preventivo a cerca de 20 dias até agora não entrou no sistema para analise,ficaria grato com um parecer do senhor,pois em um parecer anterior o senhor disse que o processo poderia ser nulo desde o inicio,o que o relator poderar intepretar neste caso mesmo depois de haver passado a época de contestar,ele foi condenado sem defesa prévia,por fazer me responda,não sei o porquê da demora sem sair o parecer,será por que o meu advogado não é conhecido como tantos e nós somos pobre.

  4. Obrigado DR.Luiz por ter respondido o meu e-mail do dia 22/04/11, conforme havia dito anteriormente, o meu esposo foi condenado há 10 anos por crime hediondo, transitado em julgado no STJ. Ele não constituiu um advogado na época da 1°grau,contratou uma advogada para fazer o recurso dele no TJ,sendo mantido a pena, posterior ela entrou com o recurso errado no STJ,sendo que o ministro não julgou sendo dado como intempestível,devolvendo o processo de volta mantendo a pena, agora o meu esposo está com mandado de prisão, uma pessoa bacharel em direito pegou o processo do meu irmão para dar uma estudada, observou um fato grave quando a vítima e testemunhas de acusações foram ouvidas em juízo não estava presente o defensor público(nem o meu esposo sabia deste fato),aparece assinatura do juizo,promotor,pessoas ouvidas no processo e do defensor em branco, está falha não foi observada por ninguém e processo dele está transitado em julgado, constitui um novo advogado, onde e entrou com habeas corpus preventivo estou esperando a decisão do TJ,ficaria grato com um comentário do senhor, pois em um comentário anterior o senhor disse que o processo poderia ser nulo desde o inicio,o que o relator poderá interpretar neste caso mesmo depois de haver passado a época de contestar, ele foi condenado sem defesa prévia, por fazer me responda, não sei o porquê da demora sem sair o parecer, será por que o meu advogado não é conhecido como tantos e nós somos pobre.

  5. Boa tarde DR.Luiz meu nome é Dainy Borges Salgado irmã da Dayane Borges Salgado, quero por meio deste agradecer a justiça que por mais que demorrou foi feita tudo que minha irmã Dayane Borges relatou é a mais pura verdade contra o Adeildo Alves de Macedo.

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