Para espairecer

Para iniciar bem a semana, ouça – e acompanhe a letra abaixo – uma das obras primas de Chico Buarque de Holanda.

Construção

Chico Buarque

Composição: Chico Buarque

Amou daquela vez como se fosse a última
Beijou sua mulher como se fosse a última
E cada filho seu como se fosse o único
E atravessou a rua com seu passo tímido
Subiu a construção como se fosse máquina
Ergueu no patamar quatro paredes sólidas
Tijolo com tijolo num desenho mágico
Seus olhos embotados de cimento e lágrima
Sentou pra descansar como se fosse sábado
Comeu feijão com arroz como se fosse um príncipe
Bebeu e soluçou como se fosse um náufrago
Dançou e gargalhou como se ouvisse música
E tropeçou no céu como se fosse um bêbado
E flutuou no ar como se fosse um pássaro
E se acabou no chão feito um pacote flácido
Agonizou no meio do passeio público
Morreu na contramão atrapalhando o tráfego

Amou daquela vez como se fosse o último
Beijou sua mulher como se fosse a única
E cada filho seu como se fosse o pródigo
E atravessou a rua com seu passo bêbado
Subiu a construção como se fosse sólido
Ergueu no patamar quatro paredes mágicas
Tijolo com tijolo num desenho lógico
Seus olhos embotados de cimento e tráfego
Sentou pra descansar como se fosse um príncipe
Comeu feijão com arroz como se fosse o máximo
Bebeu e soluçou como se fosse máquina
Dançou e gargalhou como se fosse o próximo
E tropeçou no céu como se ouvisse música
E flutuou no ar como se fosse sábado
E se acabou no chão feito um pacote tímido
Agonizou no meio do passeio náufrago
Morreu na contramão atrapalhando o público

Amou daquela vez como se fosse máquina
Beijou sua mulher como se fosse lógico
Ergueu no patamar quatro paredes flácidas
Sentou pra descansar como se fosse um pássaro
E flutuou no ar como se fosse um príncipe
E se acabou no chão feito um pacote bêbado
Morreu na contra-mão atrapalhando o sábado

Por esse pão pra comer, por esse chão prá dormir
A certidão pra nascer e a concessão pra sorrir
Por me deixar respirar, por me deixar existir,
Deus lhe pague
Pela cachaça de graça que a gente tem que engolir
Pela fumaça e a desgraça, que a gente tem que tossir
Pelos andaimes pingentes que a gente tem que cair,
Deus lhe pague
Pela mulher carpideira pra nos louvar e cuspir
E pelas moscas bicheiras a nos beijar e cobrir
E pela paz derradeira que enfim vai nos redimir,
Deus lhe pague

Reflexões sobre a mentira

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“[…]Eu minto, tu mentes, ele mente. Todos mentimos. Essa é a melhor, a mais apropriada conjugação do verbo.
Ninguém escapa, no dia a dia, de uma mentira banal, de um fingimento, de uma simulação, de uma fraude, de uma ilusão.
Nesse sentido, mesmo os irracionais falseiam, dissimulam, com o propósito de se preservar.
É necessário convir, inobstante, que, no exercício de um múnus público, é, terminantemente, proibido mentir. Essa é a regra – sem exceção.
Nessa hipótese, ninguém é melhor ou pior que ninguém. Ninguém é mais sabido que ninguém. Não se deve fazer concessão à mentira, no exercício do poder público[…]”
José Luiz Oliveira de Almeida
Juiz da 7ª Vara Criminal da Comarca de São Luis, Estado do Maranhão


O artigo que publico a seguir foi encaminhado, nesta data, ao Jornal Pequeno, para ser publicado na edição do próximo domingo, dia 13 de setembro de 2009.


Reflexões sobre a mentira


Pode-se afirmar, sem receio, que o homem não vive sem mentir. Mentir, pois, faz parte da vida. Da minha vida; da nossa vida. Uns mentem mais; outros, mentem menos. Uns mentem, porque a mentira faz parte da cultura que logrou assimilar; outros, apenas porque, muitas vezes, a mentira é melhor que a verdade.

Todos começamos a mentir muito cedo. Desde criança, nos acostumamos a mentir, para, por exemplo, nos livrar de alguma punição. Mentiras sem maiores consequencias é verdade. Todavia, ainda assim, mentira. Verdade falseada, vilipendiada, maltratada.

A par da óbvia constatação de que todos mentimos, posso afirmar que, no mundo em que vivemos, a verdade verdadeira, a verdade das verdades, a verdade inquestionável, a implacável verdade, é que todos nós, aqui e acolá, contamos uma lorota – por bazófia ou gabolice, para se livrar de uma punição ou mesmo para ludibriar; todavia, ainda assim, lorota, mentira, engodo, tapeação.

De regra, as pessoas de boa índole não mentem para ferir, para maltratar, para escarnecer, para tirar vantagem de ordem pessoal. Não maltratam a verdade, pois, de má-fé, por esperteza. O fazem, muitas vezes, porque lhes é conveniente. E uma mentira, não se há de negar, é, muitas vezes, menos dolorido que a verdade.

A mentira, reafirmo, faz parte de nossa vida. Essa é uma verdade que não se pode ocultar. É verdade sabida e ressabida. Salta aos olhos. Está em torno de nós – em casa, na rua ou no trabalho.

Diante dessa inquestionável constatação, não se pode deslembrar, todavia, que há mentiras e mentiras.

Mentir, sem causar danos, mentir para se livrar de um pequeno aborrecimento, mentir para preservar uma relação, mentir para não ferir, mentir para não magoar, para evitar um mal maior, é aceitável, sim.

Nessa linha de pensar sou instado a trazer à colação a afirmação de Marquês de Maricá, segundo o qual “há mentiras que são enobrecidas e autorizadas pela civilidade”.

Desse mesmo matiz as reflexões de Roberto Carlos, o qual, na música Trauma, de sua autoria, admite que, no futuro, talvez fosse necessário mentir para o seu filho, pra enfeitar os caminhos que ele um dia teria que seguir.

A sociedade, constata-se, tolera, sim – todos nós toleramos, enfim – , as pequenas mentiras, as mentiras despretensiosas, destituídas de malícia e do desejo de auferir vantagem, de ferir suscetibilidades.

Eu minto, tu mentes, ele mente. Todos mentimos. Essa é a melhor, a mais apropriada conjugação do verbo.

Ninguém escapa, no dia a dia, de uma mentira banal, de um fingimento, de uma simulação, de uma fraude, de uma ilusão.

Nesse sentido, mesmo os irracionais falseiam, dissimulam, com o propósito de se preservar.

É necessário convir, inobstante, que, no exercício de um múnus público, é, terminantemente, proibido mentir. Essa é a regra – sem exceção. Nessa hipótese, ninguém é melhor ou pior que ninguém. Ninguém é mais sabido que ninguém. Não se deve fazer concessão à mentira, no exercício do poder público.

Aquele que faz da sua vida pública uma mentira, um engodo, que mente para dar sustentação às suas estripulias, às suas travessuras, para tirar vantagens de ordem pessoal, não merece o nosso respeito.

Devemos, pois, com sofreguidão – e democraticamente -, expungir, defenestrar da vida pública quem vive de traquinices, de simulação, de mentiras, de falsa postura moral, sobretudo se ao mendaz tiver sido outorgado um mandato para no meu, no nosso nome, exercer o poder.

O homem público que mente, reafirmo, tem que ser apeado, arremessado do poder, pois que das mentiras que conta resultam prejuízos inexoráveis para o conjunto da sociedade.

É assim que meus olhos vêem essa questão. Sou, sim, intolerante com o homem público mentiroso. Com o homem público mendaz não se pode ser condescendente.

Não se pode, é proibido – terminantemente proibido -, no exercício de uma atividade pública, fazer apologia da esperteza, da desfaçatez, da maquinação, da tramóia.

Não se pode condescender, transigir não se pode com mentiroso, para que não transpareça, aos olhos da opinião pública, que valha a pena viver de mentiras, de enganação, de perfídia e deslealdade.

A verdade é que a burla, a fraude, a lorota e o engodo, em todas as esferas de poder, tem os dias contados – uns, mais espertos, mais ardilosos, ludibriam por muito tempo; outros, menos inteligentes, menos sagazes, por pouco tempo.

Tenho certeza, todavia, que, mais dias menos dias – para não perdermos a esperança – , o espertalhão será flagrado, para, no mesmo passo, ser desmoralizado; e melhor será se a desonra se der em vida, para que todos que giram no entorno do canalha saibam que ele, malgrado fingidor esperto e sagaz, não passa mesmo de um calhorda, de um ser desprezível, como muitos de sua estirpe.

Mentir por mais ou menos tempo depende, sim, da esperteza, da sagacidade do biltre. Contudo, um dia, conforme provérbio popular, a casa cai e a coisa muda,

Diante de tudo que se tem visto e lido, o leitor deve estar se perguntando: se, no exercício de um múnus público, é proibido mentir, por que alguns homens públicos mentem tanto?

Sem receio, respondo: porque, muitas vezes, a sua vida e a sua obra são apenas uma mentira, uma enganação, uma falácia.

Mas como não se consegue enganar todo mundo por todo o tempo, é razoável compreender, que, algum dia, mais cedo ou mais tarde, o mentiroso, no exercício do poder, meta os pés pelas mãos, até ser mostrado na sua verdadeira dimensão, na sua real estatura moral.

Nessa balada, digo mais, arriscando-se numa conclusão que pode estar cientificamente equivocada: muitos homens públicos fazem da mentira a sua arma, porque foram forjados, cevados num mundo de mentiras, de intrigas, de futricas e baixarias.

Mentir, pois, para determinados homens públicos, é uma necessidade. Eles mentem tanto que a mentira é a sua verdade. Enredados, envolvidos em tantas mentiras, já não acreditam na verdade; a verdade é a sua mentira.

A vida e a obra de determinados homens públicos escoradas em mentiras, estripulias e maquinações, exigem que faça uso permanente desses expedientes, sob pena sucumbir; todavia, sucumbirá, mais dias, menos dias, pois a sua vida e sua obra foram edificadas em base movediças.

É razoável, nessa ordem de idéias, lembrar da célebre frase de Abraham Lincoln, de todos conhecida, segundo a qual “podeis enganar toda a gente durante um certo tempo; podeis mesmo enganar algumas pessoas todo o tempo; mas não vos será possível enganar sempre toda a gente”.

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Vaidade, câncer da alma

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“[…]A vaidade, como uma erva daninha, aniquila as relações com seu veneno. Incontáveis foram as relações, até mesmo as familiares, que se deterioraram em face desse sentimento deletério. É que o vaidoso é, necessariamente, arrogante e prepotente. As verdades que só ele sabe, que é privilégio só dele, conflitam com as mentiras que, para ele, só os outros contam[…]”

Juiz José Luiz Oliveira de Almeida

Titular da 7ª Vara Criminal da Comarca de São Luis, Estado do Maranhão

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Em face da grande repercussão do artigo sob retina – republicado, inclusive, em vários sítios nacionais – entendo deva republicá-lo neste blog, nos moldes em que foi publicado no Jornal Pequeno ( edição do dia 30/08/2009), sobretudo em face da observação que faço, no final, do texto, acerca da possibilidade de algumas frases se constituirem repetições das muitas que li, em face da pesquisa que fiz para fazer as reflexões.

A seguir, pois, o artigo, exatamente como foi publicado na imprensa local.

Vaidade, câncer da alma

Ao lado das misérias materiais, há outras, de maior gravidade, que são as misérias morais; a vaidade é uma delas.

A vaidade (doentia, claro), tem o poder de manchar os pensamentos e interceder, negativamente, nas relações pessoais.

A vaidade, de tão corrosiva, penetra no coração e no cérebro de quem absorve a chaga, com efeitos nefastos.

A vaidade, como uma erva daninha, aniquila as relações com seu veneno. Incontáveis foram as relações, até mesmo as familiares, que se deterioraram em face desse sentimento deletério. É que o vaidoso é, necessariamente, arrogante e prepotente. As verdades que só ele sabe, que é privilégio só dele, conflitam com as mentiras que, para ele, só os outros contam.

O homem excessivamente vaidoso se esquece de Deus, e a Ele só recorre nos momentos de extrema aflição. É que ele, muitas vezes, se imagina o próprio Deus.

A vaidade é reconhecida como um grave obstáculo ao progresso moral dos homens; se está de mãos com o poder, aí, meu amigo, torna-se funesta.

A vaidoso, no exercício do poder, se imagina um super-homem, um ser supremo, pairando acima do bem e do mal, cujos pecados, imagina, devem ser sempre perdoados, porque ele, segundo sua ótica, não erra nunca; às vezes, se equivoca.

O vaidoso, de regra, tem ambição desmedida – é hipócrita, gosta de ostentar; é presunçoso, arrogante, altivo, e tudo isso de forma extremada – nessa condição, com esse sentimento, não sustenta nem mesmo as relações familiares.

O vaidoso tem orgulho excessivo e conceito elevado ou exagerado de si próprio. Ninguém é tão bom quanto ele. Ninguém é mais sábio que ele. Ninguém é mais correto. Só ele acerta. Ele nunca erra o alvo. Ele tem resposta para tudo. Ele não se importa de ser ridículo. Mas ele é ridículo.

No campo profissional, o vaidoso diz para si mesmo: “Eu sou melhor que os outros”, muito embora não o seja; eu sou o mais bonito, sem ser; eu sou o mais competente, mas não é.

O vaidoso tem uma imagem inflada de si, todavia, ela nem sempre correspondendo à realidade. A vaidade não deixa que ele veja a realidade. Tudo em torno dele é falácia, engodo…

O vaidoso tem uma incontida vontade de aparecer, de ser o alvo das atenções, e vê os seus colegas e colaboradores como meros coadjuvantes, cujas ações são sempre minimizadas, como se não tivessem nenhuma importância.

Geralmente, pessoas com essas características ocupam cargos elevados e utilizam seu poder para impor suas vontades, manipulando as pessoas ao seu redor com o intuito de conseguirem que tudo seja feito conforme seus desejos.

A pessoa com essa característica, e por sua necessidade de destaque dentro de uma corporação, despreza as ideias e decisões da equipe; não reconhece a capacidade desta. Toma as decisões, muitas vezes sozinho, entretanto, na hora de reconhecer o fracasso, diz que a decisão foi em equipe e, no sucesso, diz que a ideia foi dele.

A pessoa acometida pela soberba sacrifica, quase sempre, sua tranquilidade, a convivência com a família, uma relação afetiva saudável, a própria saúde, para conquistar ou manter uma posição de destaque, não importando o preço a ser pago – em geral, muito alto.

O orgulhoso costuma menosprezar os sentimentos das pessoas, colocando-se sempre como um ser superior, como se estivesse num pedestal difícil de ser alcançado.

O vaidoso tem necessidade de auto-afirmação, por isso mesmo tem o conceito exagerado de si mesmo.

A ambição pelo poder e a aquisição de bens materiais podem ser uma forma que o vaidoso encontra para compensar um sentimento de vazio.

A vaidade não casa com a humildade, característica básica de quem possui algum autoconhecimento.

É lamentável que algumas pessoas só percebam que a vaidade é um sentimento deletério no final de suas vidas, muitas vezes num leito de hospital, quando muito pouco podem fazer para reconstruir o que destruíram – nos outros e, principalmente, em si mesmas.

A inveja destrói o vaidoso e amarga a sua vida. Com isso, ele tende a se isolar, ficar sozinho, pois até a mulher e os próprios filhos, fartos da difícil convivência, um dia lhe virarão as costas.

Sinto muita pena do vaidoso.

PS. Essas reflexões são uma síntese dos vários textos que li, recentemente, acerca do tema, em face da minha obsessão de conhecer o homem, sobretudo o que exerce o poder. É possível, pois, que no texto assome alguma frase que não tenha sido construída por mim.

Larry Rother e nós

A propósito de tudo que se tem lido e assistido, em face da impunidade que permeia a vida em sociedade, que tal refletir acerca do que disse sobre nós um jornalista americano que conhece o Brasil mais do que muitos de nós mesmos e dos nossos representantes legais?

  1. “Nos Estados Unidos aprendemos que o nosso país é ‘uma nação de leis’. Admito que algumas dessas leis, como as que estabeleciam a segregação racial, não são justas ou imparciais, e às vezes as pessoas tentam fugir a seu cumprimento. Mas há um respeito maior pelas leis, porque há maior probabilidade de elas serem aplicadas e normalmente a todos. Quando um senador republicano foi flagrado no ano passado solicitando sexo gay no banheiro de um aeroporto, ele usou um recurso muito conhecido no Brasil: ‘ Você sabe com quem está falando?’ Mas isso não funcionou, assim com a riqueze e a posiçao social de Paris Hilton não impediram que ela fosse mandada para a cadeia por dirigir bêbada. E quando ela recorreu a uma falsa queixa médica para ser solta logo, o clamor público contra o tratamento especial dado a ela obrigou as autoridades a mandá-la de volta à prisão.

  2. Por causa das deficiências em seu sistema político – tanto no ramo legislativo como no judiciário -, o Brasil ainda não alcançou esse estágio. Uma das coisas que eu achava mais difícil de entender quando visitei o Brasil pela primeira vez era a frase: ‘Ah, aquela lei não pegou’. Por causa do modo como fui criado, minha reação era sempre: ‘Como não pegou? É uma lei, portanto, tem que pegar’. Só mais tarde compreendi que a maioria dos corpos legislativos aqui age como se a declaração de intenções em um regulamento fosse a mesma coisa que sua aplicação. A Constituição de 1988, por exemplo, é cheia de declarações de princípios, muitas das quais dão garantias que vão além daquelas contidas na Constituição americana ou em outras. Mas dizer é uma coisa, fazer é outra. Muitas dessas promessas não foram cumpridas porque os legisladores não aprovaram nem as medidas que as implementasse nem os fundos necessários. Para eles, ter feito a declaração de boas intenções para ser suficiente, como se ela equivalsse a realmente ter feito algo.” (Larry Rohter, in Deu no New York Times, o Brasil segundo a ótica de um repórter do jornal mais influente do mundo, Objetiva, 2007, p. 147)

Ministros discutem em sessão do Supremo

Extraído de: Estadão –  1 hora atrás


BRASÍLIA – O início da sessão no Supremo Tribunal Federal (STF) já dava sinais de que o julgamento seria nervoso. Antes que a Corte começasse a analisar o processo de extradição do italiano Cesare Battisti, o ministro Marco Aurélio Mello pediu para registrar “nos anais do Supremo” que discordava da inclusão do tribunal no site do Conselho Nacional de Justiça (CNJ).

Presidido pelo presidente do STF, Gilmar Mendes, o CNJ é o órgão que exerce o controle externo do Judiciário e, recentemente, impôs metas para que a Justiça acelere o julgamento de processos. De acordo com essa meta, os juízes devem julgar até o final do ano todos os processos distribuídos no Brasil até 31 de dezembro de 2005.

“Não concebo que o Supremo seja colocado no sítio do CNJ como se o Supremo fosse submetido a esse órgão. E o Supremo não está. O tribunal é Supremo. Nós não prestamos contas ao CNJ”, disse Marco Aurélio. De fato, pela legislação brasileira, os atos do STF e de seus ministros não podem ser analisados pelo CNJ.

Gilmar Mendes respondeu dizendo que não havia nenhuma violação a essa regra. Segundo ele, o próprio STF teria decidido em sessão administrativa aderir à meta de julgar os processos. “O CNJ não impôs ao Supremo. Foi o Supremo que adotou esta meta”, afirmou.

Marco Aurélio novamente discordou. Disse que não poderia se comprometer com as metas já que é o único juiz em seu gabinete. “Que o tribunal me cobre e, se achar que estou sendo relapso, que tome as providências. Não sou criança. Trabalho de sol a sol”, afirmou o ministro no intervalo da sessão.

Autor: AE – Agencia Estado

É preciso prudência II

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“[…]”Confesso que não consigo compreender a razão pela qual, sempre que se noticia alguma coisa envolvendo magistrados, se atira pedras na direção doPoder Judiciário, sem se atentar para o fato de que muitos não são merecedores dos ataques desferidos[…]”

Juiz José Luiz Oliveira de Almeida

Titular da 7ª Vara Criminal da Comarca de São Luis, Estado do Maranhão

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Depois que postei o artigo “É preciso prudência”, em face da decisão do CNJ, que determinou que alguns magistrados devolvam aos cofres públicos as diárias que teriam recebido irregularmente, muitos foram os que, por e-mail e por telefone, me questionaram por que tomei a defesa dos desembargadores.

Devo dizer, em face desses questionamentos, que não tomei a defesa de ninguém, mesmo porque muitos não têm o menor interesse nas minhas reflexões.

O que pretendi com o artigo foi, tão-somente, pedir que não se apedreje, que não se desconsidere, por um fato isolado – e, quem sabe!, nem esclarecido na sua inteireza – , a história de vida de alguns magistrados, que conheço razoavelmente bem e sei que não cometeriam tamanha indignidade.

É preciso convir, ademais, que a decisão do CNJ não é definitiva. Ela pode, sim, ser questionada no Poder Judiciário, daí que, para mim, também por isso, é preciso ter prudência.

O meu artigo foi gestado na noite de ontem, depois de ter lido vários comentários em blogs, em face da decisão do CNJ, muitos dos quais desrespeitosos, como se os magistrados fossem verdadeiros bandidos.

Não gosto de injustiça! É por isso que, ainda que a pessoa seja minha inimiga, ainda que me tenha feito muito mal, não aceito que lhe joguem pedras, sem que os fatos que se lhe imputem a prática estejam definitivamente esclarecidos.

Nenhum bandido, por pior que seja o seu passado, pode ser tratado com desrespeito e menoscabo. Com os magistrados, como qualquer outro acusado – lato sensu – , não pode ser diferente.

Confesso que não consigo compreender a razão pela qual, sempre que se noticia alguma coisa envolvendo magistrados, se atira pedras na direção doPoder Judiciário, sem se atentar para o fato de que muitos são são merecedores dos ataques desferidos.

Disse antes – e repito, agora – que essas linhas não estão sendo redigidas em face do espírito de corpo. Eu já disse, alto e bom som, reiteradas vezes, que, para sacanagem, não contem comigo. Mas não admito, todavia, que se faça um julgamento açodado dos colegas, muitos dos quais, repito, tem um história de vida que deve ser respeitada.

Vamos aguardar, com prudência, sem açodamento, o desfecho definitivo dessa questão.

Por enquanto o que se deve ter é calma e, acima de tudo.

É preciso prudência

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“[…]O episódio envolvendo alguns os desembargadores do Tribunal de Justiça do Maranhão – caso das diárias – não pode nos fazer concluir, a priori, que sejam todos bandidos, afinal, há toda uma historia de vida e de dedicação à magistratura que não pode ser jogada na lama em face de um deslize que, de rigor, pode ter sido apenas decorrência de um descuido[…]”

Juiz José Luiz Oliveira de Almeida

Titular da 7ª Vara Criminal da Comarca de São Luis, Estado do Maranhão

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Todos nós estamos passíveis de erros. Eu mesmo tenho a mais absoluta convicção de que cometi muito erros ao longo da minha vida, pessoal e profissional, o que reafirma a minha condição de ser humano.

O episódio envolvendo alguns os desembargadores do Tribunal de Justiça do Maranhão – caso das diárias – não pode nos fazer concluir, a priori, que sejam todos bandidos, afinal, há toda uma historia de vida e de dedicação à magistratura que não pode ser jogada na lama em face de um deslize que, de rigor, pode ter sido apenas decorrência de um descuido.

Não conheço as razões apresentadas por eles e nem tampouco os fundamentos da decisão do CNJ, razão pela qual não me atrevo a julgá-los.E nem tenho condições para tanto.

Acredito, sinceramente, que o episódio não se encerra aqui. Creio que a última palavra será do próprio Poder Judiciário.

Muitos magistrados já receberam diárias. É possível que muitos não tenham os comprovantes, o que não os torna, automaticamente, um marginal togado, mesmo porque, em tempo algum, se exigiu comprovação das despesas efetuadas.

O que fica da lição é que, doravante, todos que receberem diárias terão o cuidado – que nunca tivemos, essa é a verdade – de guardar os comprovantes das despesas.

Tenho a mais absoluta convicção que qualquer um – juiz ou desembargador – que for instado a comprovar despesas feitas com viagens em face das diárias recebidas – sobretudo viagens e despesaas feitas há mais de três, quatro, cinco anos – terá muitas dificuldades de comprova-las; não porque não tenha viajado, mas porque simplesmente nunca, no Poder Judiciário, exigiu-se a comprovação das despesas feitas.

Essa minha manifestação não é movida pelo espírito de corpo; ela é movida por sentimento de Justiça. Todos sabem que não sou de panelinha e de conchavos.

Digo mais: não sou amigo de nenhum dos envolvidos e nem preciso ser simpático para ser promovido.

O que entendo é que esse episódio ,isoladamente, não pode servir de pretexto para se macular uma história de vida.

Erros, omissões, descuidos, podem, sim, ter ocorrido. Não acredito, no entanto, que tenha havido má-fé, mesmo porque nenhum magistrado precisa de diárias para viver, sabido que somos muito bem remunerados.

Sei que muitos não compreenderão essa minha manifestação, mesmo porque é mais do que comum as pessoas se regozijarem com a desgraça alheia, máxime se o atingido for um membro do Poder Judiciário, sempre visto com muita reserva, em face da arrogância e prepotência de muitos no exercício de suas atividades.

Eu me recuso a concluir, em face de um episódio isolado, que os colegas do segundo grau sejam bandidos. É só ver a historia de muitos deles.

Há quem tenha, ao longo da vida profissional, cometido vários deslizes? Há, sim.

Esse episódio pode não ser algo isolado? Pode ser que sim, pode ser que não.

Todavia, não se pode, à conta dessa constatação, generalizar, na suposição de que sejamos todos bandidos.

Não presto a minha solidariedade a ninguém, porque, afinal, como disse acima, desconheço o teor da defesa e da decisão. E ademais porque não está entre as minhas atribuições discutir decisão do CNJ.

O que não posso aceitar é que, em face de um deslize, de um descuido, se esqueça uma trajetória, uma história de vida.

Vamos com calma. Não nos precipitemos.

Sei que, com essa posição, sou passível de críticas. Pouco me importam as críticas, pois, para mim, o que importa mesmo é ter a coragem de expor as minhas impressões. Nunca me preocupei em ser simpático com quem quer que seja. E não precisava ser simpático com os colegas, porque, afinal, essa não é a minha prática de vida.

O que tenho medo, o que me incomoda mesmo é a facilidade que as pessoas têm de, por um erro, julgar toda uma história de vida. Quem erra, seja juiz, seja quaquer pessoa do povo, deve, sim, pagar pelos erros cometidos. Mas não se pode, como num passe de mágica, em face de um episódio, esquecer toda uma trajetória profissional.

Ao homem público, é verdade, se impõe retidão. Mas, todos sabemos, aqui e acolá, todos erramos, afinal não somos deuses, apesar de alguns magistrados se julgarem o Próprio.


Juízes dizem que Meta 2 do CNJ virou martírio

Li no Consultor Jurídico


http://www.conjur.com.br/2009-set-08/meta-conselho-nacional-justica-vira-martirio-juizes


POR GLÁUCIA MILÍCIO

Juízes federais de São Paulo e Mato Grosso do Sul são unanimes ao afirmar que a Meta 2, definida pelo Conselho Nacional, vai atrapalhar em vez de ajudar a baixar a pilha de processos que aguardam julgamento nas varas espalhadas pelo país. O objetivo é que todos os processos distribuídos até 31 de dezembro de 2005 sejam julgados até o final deste ano. Para os juízes, representados pela Ajufesp (Associação dos Juízes Federais de SP e MS), a meta poderá acarretar acúmulo de novos processos e, por isso, cobram mais estrutura.

Em nota pública, a Ajufesp afirma que as varas federais têm realidades e acervos distintos, algumas com quadro funcional reduzido e maior número de demandas antigas, como as varas que julgam processos previdenciários ou os Juizados Especiais Federais, onde existem situações específicas, como a necessidade de obter documentos antigos para o julgamento de demandas relativas à seguridade social. Com isso, os juízes pedem que o fornecimento de estrutura adequada de material e de pessoal seja simultâneo à fixação de qualquer meta, para que ela não se torne inatingível.

“Não se discutem os benefícios da fixação de metas de trabalho, ainda que seus critérios possam ser questionados. Todavia, discorda-se do tratamento da questão sob a perspectiva da responsabilidade funcional. Mais do que avaliar os processos que não foram julgados, devem ser analisados os processos que receberam o devido andamento, considerando a complexidade de cada demanda”, argumenta a associação.

A Ajufesp também é contra a adoção de medidas que impliquem punição ou interferência no processo de promoção ou ascensão na carreira dos magistrados que não atingirem a Meta de Nivelamento 2.

Recentemente, a Associação dos Magistrados do Paraná (Amapar) divulgou carta pública com críticas à resolução do Tribunal de Justiça do estado editada para cumprir a Meta 2 do CNJ. A Instrução Normativa 1 foi assinada pelo corregedor e pelo presidente do TJ. Para os juízes da entidade, a resolução implicará na paralisia das varas durante os últimos quatro meses de 2009. “A consequência disto será nova acumulação de trabalho a ser enfrentada no futuro, à custa de novos sacrifícios dos juízes de primeiro grau, de indiscutíveis prejuízos ao serviço judiciário e, principalmente, ao povo, destinatário da nossa atividade”, registraram. Eles estimam que o atraso será em mais de 200 sentenças de mérito e acúmulo de dezenas de audiências.

Ainda segundo a entidade paranaense, a instrução normativa, a pretexto de solver problemas, cria outros ainda mais graves. Segundo eles, todas as varas iniciarão 2010 congestionadas. “A resolução criará um círculo vicioso de mutirões, que só tornará a Justiça ainda mais lenta”, destacou a entidade. “Os objetivos impostos pela resolução, impossíveis de cumprir, autorizam-nos a recear, com tristeza, que a Instrução sirva apenas, ao fim e ao cabo, para expor os juízes, aos olhos da opinião pública e do CNJ, como culpados únicos pelo fracasso anunciado no cumprimento da Meta 2.”

Em artigo publicado pela Consultor Jurídico no último dia 31, o secretário-geral da Associação Nacional dos Magistrados Estaduais, juiz Antonio Sbano também reclamou da Meta 2. Segundo ele, a meta é ambiciosa. “Todo sistema novo, ainda que traga em sua essência a vontade de todos nós para a construção de um Judiciário célere e de qualidade, esbarra, como é natural, em falhas decorrentes do novo e do desconhecido, que devem ser sanadas com humildade e bom senso”, registrou.

Ele também acrescenta que, para atingir os objetivos traçados, alguns tribunais, como medida de última hora, suspenderam as férias de seus juízes, “esquecendo-se que, os magistrados apresentam elevado grau de estresse em razão de suas condições de trabalho e que muitos assumiram compromissos para período de férias — já deferidos, vale dizer. Eles ficarão sujeitos a multas e perdas financeiras para transferir, sabe-se lá para quando, o novo período de gozo de seu direito” finaliza.

Leia a nota da Ajufesp

NOTA PÚBLICA – META DE NIVELAMENTO 2

A AJUFESP – Associação dos Juízes Federais de SP e MS, considerando a interpretação dada pelos tribunais quanto ao cumprimento da meta estabelecida no II Encontro Nacional do Judiciário, de julgar, na integralidade, todos os processos distribuídos até 31/12/2005, bem como a Resolução Conjunta n° 01/2009, do Conselho Nacional de Justiça – CNJ e o Provimento n° 106, da Corregedoria Regional da Justiça Federal da 3ª Região, manifesta-se a seguir:

1 – Todos os magistrados têm interesse em julgar a totalidade dos processos sob sua responsabilidade e, cotidianamente, se empenham para esse fim;

2 – processo julgado não significa processo transitado em julgado, ou seja, a ação ainda não acabou, normalmente cabendo algum tipo de recurso em primeira ou segunda instância;

3 – os juízes não podem desrespeitar o devido processo legal, encontrando limites no que determina a lei e nos prazos e atos que dependem de terceiros, assim há, por exemplo, processos que aguardam a realização de perícias, atos que cabem às partes ou cumprimento de Cartas Precatórias. Na área criminal, feitos que aguardam o cumprimento da suspensão condicional do processo, etc.

4 – existem processos aos quais, por lei, deve ser dada prioridade de análise, não importando a data em que foram distribuídos, tais como processos com réus presos, Mandados de Segurança, demandas ajuizadas por idosos, entre outros;

5 – é preciso considerar que as Varas Federais têm realidades e acervos distintos, algumas com quadro funcional reduzido e maior número de demandas antigas, como, por exemplo, as Varas que julgam processos previdenciários ou os Juizados Especiais Federais, onde existem situações específicas, como a necessidade de obter documentos antigos para o julgamento de demandas relativas à seguridade social, no intuito de assegurar a produção da prova e contornar dificuldades decorrentes da hipossuficiência técnica dos jurisdicionados, que não pode ser desprezada;

6 – o fornecimento de estrutura adequada de material e de pessoal deve ser simultâneo à fixação de qualquer meta, para que ela não se torne inatingível;

7 – há Varas com grande quantidade de processos antigos, sob responsabilidade de juízes que as assumiram recentemente e eles não podem ser cobrados por um acervo que não surgiu em sua jurisdição, sem que lhes seja dado tempo hábil para solucionar a questão;

8 – não se discutem os benefícios da fixação de metas de trabalho, ainda que seus critérios possam ser questionados. Todavia, discorda-se do tratamento da questão sob a perspectiva da responsabilidade funcional;

9 – mais do que avaliar os processos que não foram julgados, devem ser analisados os processos que receberam o devido andamento, considerando a complexidade de cada demanda;

10 – a função essencial de um juiz não é fazer números, mas JUSTIÇA, pois por trás de cada processo há um cidadão à espera da análise do seu caso individual;

11 – o número de sentenças proferidas deve ser levado em conta, mas não pode ser considerado de forma isolada para a aferição da produtividade de um magistrado, pois os resultados numéricos são enganosos. Montanhas de sentenças não significam que serão realizadas na prática. Esse modelo de números serve apenas para uma fábrica de parafusos. Decisões precisam de execução;

12 – Em razão desses fatos, a Ajufesp é contrária à adoção de medidas que impliquem punição ou interferência no processo de promoção ou ascensão na carreira dos magistrados que não atingirem a Meta de Nivelamento 2.

São Paulo, 8 de setembro de 2009.