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“[…]A essas alturas, repito, em face do que tinha narrado o reconhecedor, em seu depoimento, nas duas oportunidades nas quais fora ouvido, eu não tinha nenhuma dúvida de que não hesitaria em apontar o acusado como autor do crime. Para minha surpresa, entretanto, a testemunha apontou, sem titubeio, o motorista do advogado como autor do fato. É dizer:não reconheceu o verdadeiro autor do crime[…]”
José Luiz Oliveira de Almeida
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Não é minha intenção aprofundar o exame da complexa questão acerca da prova testemunhal, já dissecada, a mais não poder, por ilustrados juristas. Pretendendo, tão somente, narrar um fato, fruto da minha experiência enquanto magistrado, para reafirmar o que todos sabem: a falibilidade da prova testemunhal.
Pois bem. Certo feita, conduzindo uma audiência de instrução, em face de um crime de roubo, decidi formalizar o reconhecimento do autor do fato, vez que o crime, pelo que continha nos autos, tinha efetivamente ocorrido. Provada, pois, a existência do crime, faltava, agora, a legitimar uma decisão de preceito sancionatório, identificar o autor do fato, tarefa que imaginei de fácil desate.
A vítima, em face mesma das circunstâncias do crime ( emprego de arma de fogo, ameaças, etc), não teve condições de reconhecer o autor do fato, que, registro, estava preso.
Diante do titubeio da vítima, a mim só me restava apelar para o reconhecimento pela testemunha presencial do crime, que, ao que tudo estava a indicar, não teria dúvidas acerca da autoria, vez que estava próxima dos acontecimentos, tendo, inclusive, auxiliado na prisão do autor fato.
Para mim, bastava, agora, partir para a formalização do reconhecimento, que, desde meu olhar, repito, seria inevitável, em face do que já tinha sido produzido em termos de provas. Para essa finalidade, convidei pessoas que estavam no corredor do Forum, dentre elas o motorista de um advogado, que passava nas imediações. Perfilados o autor do fato e os cidadãos que escolhi, com as devidas cautelas, levei a testemunha para a minha sala, fazendo-me acompanhar pelo Promotor de Justiça e do advogado do acusado, para que apontasse, por uma abertura mínima da porta que ligava meu gabinete à sala de audiência, o autor do fato.
A essas alturas, repito, em face do que tinha narrado o reconhecedor, em seu depoimento, nas duas oportunidades nas quais fora ouvido, eu não tinha nenhuma dúvida de que não hesitaria em apontar o acusado como autor do crime. Para minha surpresa, entretanto, a testemunha apontou, sem titubeio, o motorista do advogado como autor do fato. É dizer:não reconheceu o verdadeiro autor do crime.
Não preciso dizer o quanto fiquei desapontado. Mas não surpreso, pois, ao longo dos anos, acostumei-me com a falibilidade da prova testemunhal.
É claro que, sem que fosse reconhecido o autor do fato e tendo ele negado a autoria do crime, a sua absolvição era de rigor.