As datas comemorativas devem ser levadas em conta, não só para o consumo, mas também para reflexões, o que faço aqui e agora, a propósito do dia dos pais, começando por uma ilustração literária, do clássico O Complexo de Portnoy, de Philip Roth (Pos 45, de 3882, Companhia de Bolso), no qual o personagem central da trama, Alexander Portnoy, além dos seus próprios conflitos, era obrigado a conviver com posições díspares e controvertidas dos pais, causando-lhe inquietação moral, pois, enquanto a sua mãe adotava a honestidade como prática de vida, o pai, em direção oposta, orientava o filho, por exemplo, a não se casar por beleza e nem por amor, mas por dinheiro.
Conflitos morais desse jaez, ao lado da disputa pelo poder, importa dizer, não se veem apenas nas obras ficcionais; criação distorcida e ambientes forjados à luz de disputas por dinheiro e por um naco de poder tem-se verificado, infelizmente, em muitos ambientes familiares, muitas das quais fruto de orientações paternas equivocadas. E assim, não são poucos os pais que, com suas ações e seu modo de vida, com os seus (maus) exemplos, induzem os filhos a acreditarem que nesse mundo o que vale mesmo é vencer a qualquer custo, e que, pelo poder, e em face do que dele decorre, tudo é permitido, tudo pode ser feito, pouco importando os valores morais.
A verdade é que, conquanto admita-se não seja regra geral o estímulo à convivência regada a interesse escusos, há, sim, muitos cujo exemplo e prática de vida deixam evidente que, por vantagens materiais/poder, vale qualquer expediente, mesmo que seja a forja de um casamento sem amor e por interesses materiais, com reflexo na criação da própria prole, como no exemplo acima, apanhado da literatura do grande Philip Milton Roth, festejado romancista norte-americano (Newark, Nova Jersey, 19/03/1933-Nova York, 22/05/2018).
Admito, sim, que sou do tipo careta, do tipo démodé, pois, apesar dos exemplos negativos que permearam a minha vida, fruto de uma convivência tóxica com o provedor do lar, apesar de todas as dificuldades pelas quais passei, acredito – e aposto -, sofregamente, no amor, na concórdia e na retidão no ambiente familiar, relegada a ambição material e a ambição pelo poder a um plano secundário.
Tenho dito e redito, com a ênfase necessária, que aqueles que orientam os filhos – por palavras ou pela prática de vida – a formarem uma família à luz de interesses menores, que não seja, portanto, em face do amor, os conduzem à construção de um castelo de areia, que sucumbirá à primeira tempestade. Afinal, não se orienta filhos a formarem uma família alicerçada no interesse econômico e outros que tais, porque, afinal, não se constrói uma sociedade minimamente decente, ministrando conselhos daninhos aos filhos, ensinando-os a levarem vantagens, em detrimento dos valores morais.
Quero, sim, ver meus filhos vencendo as dificuldades e conquistando o seu espaço na sociedade. Também quero que meus filhos sonhem e realizem os seus sonhos, pelo fato de desejar que eles construam a sua história como eu construí a minha. Todavia, não os estimulo às conquistas a qualquer preço, de toda sorte, sob os escombros de sua dignidade.
A casa de pai não deve ser apenas a escola dos filhos, mas uma boa escola, decente, fraterna e honrada, que os conduza pelos caminhos da dignidade e da decência. Logo, os desejos do homem, a sua ambição, a sua volúpia pelo poder e pelos bens materiais não podem ser de tal monta que o levem à degradação moral e, nessa faina, seus próprios filhos, pois, afinal e definitivamente, os fins nem sempre justificam os meios.
Para encerrar, lembro que Sócrates, tido por muitos como o mais sábio dos homens, entendia que se encontrava mais próximo dos deuses quando menos desejava. Por isso, se orgulhava de viver uma vida modesta, sem ambição; sentimento que, para mim, definitivamente, tem limites, os quais ensino, do mesmo modo, aos meus filhos.
É isso.
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