Legisladores sábios?

Estou sempre refletindo sobre a arte de julgar. Melhor dizendo: estou sempre refletindo sobre o quão difícil é a arte de julgar, sobretudo em face da abertura semântica, da plasticidade, enfim, de algumas regras jurídicas, a exigir de nós, magistrados, redobrados esforços intelectuais para compreender o real sentido do comando legal que nos predispomos a aplicar em face de um caso concreto.

Tenho ouvido, até com certa insistência, de alguns colegas, a afirmação, diante de um determinado comando legal, que o legislador é sábio, por essa ou por aquela razão. Esse tipo de afirmação me choca, aguça ainda mais a minha já conhecida inquietação.

Diante desse tipo de afirmação, fico,   cá de meu canto,  a questionar, com o devido respeito, essa sapiência legiferante de que falam alguns colegas, pois que, na minha avaliação, sábio mesmo não é quem elabora o enunciado normativo , muitas vezes confuso  e, outras tantas, até incoerentes, quando não inconstitucionais; sábio é quem o interpreta, quem tira dele o seu real sentido,  para aplicá-lo a um caso concreto.

A verdade é que os textos legais, não raro, são enunciados que não veiculam comandos precisos, daí a relevância da atuação do intérprete, sobretudo se levarmos em conta que, nos dias presentes, é inaceitável que o magistrado se limite  a pronunciar as palavras da lei, como preconizava Montesquieu.

É o julgador, portanto, que, diante de um comando legal,  declara o  seu real sentido, para, a partir dele, construir uma decisão justa. É do julgador, posso concluir, que se exige sapiência, para, na sua função cognitiva, diante de cada situação hermenêutica, dizer o direito, para dar a cada um o que é seu.

Para mim, portanto, é  equivocada, permissa vênia, a conclusão acerca da sapiência do legislador, que, muitas vezes, ao revés, nem lucidez tem, a exigir de nós, intérpretes do verdadeiro sentido do texto legal,  redobrado esforço intelectual para captar-lhe o sentido.

Comandos legais imprecisos, com as suas fórmulas abertas, estão a exigir do julgador esforço hercúleo para retirar deles a mais correta e justa conclusão.

O texto da lei, diferente do que pensam muitos, só num primeiro olhar parece de fácil interpretação. A proporção que aprofundamos a análise, concluímos,  sem muito esforço, o quão difícil e complicado é incursionar na mente do legislador, disso inferindo-se, a fortiori, a importância do papel do intérprete. Não é por outra razão que há países onde  a jusrisprudência desponta  relevante na evolução do direito, fato que, sem muito esforço, constata-se  na cultura jurídica brasileira.

Autor: Jose Luiz Oliveira de Almeida

José Luiz Oliveira de Almeida é membro do Tribunal de Justiça do Estado do Maranhão. Foi promotor de justiça, advogado, professor de Direito Penal e Direito Processual Penal da Escola da Magistratura do Estado do Maranhão (ESMAM) e da Universidade Federal do Maranhão (UFMA).

Um comentário em “Legisladores sábios?”

  1. TENHO UMA GRANDE ADMIRAÇÃO PELO SR.,SUAS REFLEXÕES EXPRESSAM EXATAMENTE O QUE GOSTARÍAMOS DE OUVIR DE TODOS OS MAGISTRADOS, DOS POLÍTICOS, ENFIM. MAS HOJE, CONFESSO, QUE MAIS UMA VEZ FIQUEI DECEPCIONADA COM O JULGAMENTO DO DESEMBARGADOR JORGE RACHID AO CONCEDER LIMINAR PARA A EX-PREFEITA DE PIRAPEMAS, MARIA SELMA DE ARAUJO PONTES, A PARTIR DE UMA SUPOSIÇÃO, “ACHANDO” ELE, QUE A EX-GESTORA, NÃO TEVE DIREITO DE DEFESA NO JULGAMENTO DE SUAS CONTAS PELA CÂMARA MUNICIPAL. QUE JULGAMENTO MAIS “FAJUTA”, QUALQUER PESSOA, POR MAIS LEIGO QUE SEJA, SABE QUE NÃO SE PODE NEGAR O DIREITO DE DEFESA A QUEM QUER QUE SEJA E PRINCIPALMENTE A CÂMARA INCORRER NUM ERRO DESSES TENDO UMA ASSESSORIA JURÍDICA PRÁ AUXILIAR. FICA DIFÍCIL “ENGOLIR” ESSA DECISÃO, ACHO ATÉ QUE LEIGO É O DESEMBARGADOR (sic), OU NO MÍNIMO, ELE QUER SUBESTIMAR A NOSSA INTELIGÊNCIA,MAS PODEMOS INFERIR QUE ALGO DE MUITO GRAVE ESTÁ OCORRENDO COM NOSSOS MAGISTRADOS.

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